[Premiere] Em nova fase, Heitor Vallim funde folk, eletrônica, espiritualidade e simbolismos
Depois de certo tempo cobrindo o cenário independente começamos a observar a evolução do artistas. E são em diversos fatores. Tanto no quesito das composições, este mais perceptível para quem escuta, quanto perante seu cuidado em trabalhar seu material de maneira profissional.
É tudo um processo e envolve uma porção de coisas. A estrada é o principal elemento de quebra de paradigmas. Através dela o artista é levado a conhecer novas pessoas, é apresentado a novas ideias, busca por novas referências, perde o medo de tocar em distintos palcos – e nas mais diversas condições. Uma verdadeira escola.
Algumas coisas não estão em manuais ou vídeos na internet, é necessário viver para conseguir enxergar como as coisas acontecem de fato na prática. E a cada dia que passa vemos os músicos se posicionando de uma melhor forma para encarar os mais distintos desafios (e são muitos).
Esse processo de construção artística foi vivido intensamente pelo músico santista Heitor Vallim que após em seu primeiro EP flertar com o folk e MPB parece agora estar encontrando seu próprio estilo. Um processo completamente natural, diga-se de passagem, e muito válido.
Mas como costumo dizer sempre por aqui: é necessário incentivo para que a evolução e a identidade de um artista comece a transparecer. Se a criação por si só é um processo traumático, essa transformação é ainda mais. É por este caminho de pedras que vemos Heitor trilhar neste primeiro single a ser lançado após Naissance (2016).
O Single
Foi a imersão por novos horizontes e perspectivas que fez com que Heitor traçasse novos caminhos. O processo de pesquisa pela temática da fé o motivou a ir mais longe e isso se reflete em “Dancing In The Sun”.
“Vi a necessidade de algo mais coeso, bem trabalhado e que abordassem os temas os quais sempre me encucavam. Comecei a estudar histórias que iam do budismo ao cristianismo e tentava entender as pessoas a partir de como as religiões se apresentam para elas, e a partir daí me entender. Ouvi muito Bon Iver, Ben Howard, Jack White, Pink Floyd e algumas coisas de música eletrônica”, detalha Heitor Vallim sobre o processo de criação da música.
Tanto é que você nota claramente a influência de Bon Iver na faixa porém sente aquele ar de caras como William Elliott Whitmore, Cory Branan, Rocky Votolato, Lucero e da carreira solo do Chuck Ragan (Hot Water Music).
Ou seja um tom moderno e com background fora do folk by the book. A faixa “Dancing In The Sun” ao meu ver combina Bon Iver com The National podendo agradar a fãs de ambos. Seu lado eletrônico e de “quebra” flerta com o clássico OK Computer do Radiohead.
Se o folk flerta bastante com a espiritualidade e os temas místicos ele vai por este caminho e mostra a fascinação pelo número 33 e o salmo 22 da Bíblia.
“Quanto ao salmo 22, eu repito ele diversas vezes porque acho a história interessante. Eu não sou um crente, ou religioso. Porém, eu acho que as religiões dizem muito sobre como a humanidade se relaciona com ela mesma e o salmo 22 é a passagem mais humana de Jesus Cristo na Bíblia.
É quando ele está prestes a morrer na cruz e ele se questiona no sentido de… e se? A música fala dessa dança no sol também, porque quando Jesus morreu, ocorreu um eclipse e a dança sobre o sol, seria um pouco a lua na frente do sol e etc”, analisa Heitor.
Para seu lançamento a canção ganhou um lyric video produzido por Rafael Souza do Lavanderia Estúdio. A parceria surgiu quando Heitor Vallim esteve presente para gravar sua session no estúdio.
Na oportunidade ele estava na fase de pré-produção do disco e após conversaram durante a gravação sentiram uma afinidade de pensamentos. Tanto é que Rafael acabou ficando responsável pela masterização do processo. Já a gravação e mixagem foram feitas em Santos, no Red Studio, por Neto Tezotto.
A música que estará presente no disco, Calvário, é um lançamento Peixinho Records, com apoio da Seventy Surfboards. Desta vez Heitor gravou junto a uma banda e contou ao seu lado com Heittor Jabbur (bateria e percussões), Raphael Lapetina (baixo) e Gustavo Chinarelli (violino). Ele que na faixa foi o responsável pela voz, letra, guitarra, sintetizador, piano e banjo (ufa!).
O lyric video por sua vez é perspicaz em captar a essência do tom espiritual da canção, traz colagens de momentos bíblicos, brinca com a maçonaria e a energia de movimento e profundidade do mar. Em alguns momentos é até de certa forma apocalíptico trazendo a imagem forte e transcendental do eclipse solar e referências claras ao tão sagrado número 33.
Entrevista
[Hits Perdidos] Antes de mais nada gostaria que comentasse sobre o novo momento como artista. Conheci seu trabalho acredito que no começo de 2017 e é notável que foi incorporando novos elementos, timbres e referências. Como foi esse processo?
Heitor Vallim: “Eu comecei a conhecer vários tipos de músicas. A medida que você vai tocando nos lugares, conhecendo pessoas, sua cabeça começa a abrir e eu vi muita gente fazendo muita coisa legal. Comecei a quebrar preconceitos musicais meus e tentei adaptar as novas referências ao meu jeito de compor.”
[Hits Perdidos] O single “Dancing In The Sun” chega já mostrando um tom inclusive ao meu ver mais profundo, desde a melodia a letra que busca referências sagradas. Queria que comentasse mais sobre esse processo de pesquisa e o lance mágico/místico do número 33 e admiração pelo salmo 22. Particularmente lembrei do filme número 27 em que é de certa forma um número “maldito” de perfeição e trevas. Você acredita no poder da numerologia?
Heitor Vallim: “O número 33 é inclusive tatuado em mim! Eu sempre curti esse tipo de simbolismo com alusões religiosas. A história de Jesus Cristo é uma que eu acho muito interessante. Não sou religioso, muito pelo contrário, me considero bastante cético. Porém, acho interessante como as religiões falam muito sobre como o ser humano se relaciona com outras pessoas. O número 33 vem das suas diversas “coincidências” com fatores científicos e também religiosos, por exemplo:
– É a idade de que Jesus Cristo morreu;
– O número de ossos na coluna vertebral;
– Número de voltas do nosso material genético;
– A pirâmide de Quéops tem 33 câmaras e 33 metros de profundidade.
e muitos outros! A música “33 GOD” do Bon Iver também foi um marco do que é fazer música para mim. Desde a desconstrução, ao advento da música eletrônica, samples e etc. Já o salmo 22 tem muito a ver com a parte humana de Jesus Cristo. É nesse salmo que ele questiona toda sua divindade e o silêncio de Deus perante ao seu sofrimento, eu adaptei esse sentimento do messias, à minha realidade.”
[Hits Perdidos] A faixa é o primeiro single do próximo registro, o que você pode adiantar que vem por aí? O lançamento vai sair pelo Peixinho Records, que é um selo razoavelmente novo, queria que contasse mais sobre esta movimentação de vocês.
Heitor Vallim: “Teremos algumas faixas que também serão liberadas ao longo de junho e julho, para no início desse segundo semestre vir o disco Calvário.
A Peixinho Records é um selo novo aqui da região que surgiu da reunião de músicos, artistas, fotógrafos ligados a cena independente com a intenção de centralizar essa galera que faz um trampo diferenciado auxiliando na troca de material. Tem no casting a The Scuba Divers, o Nadal, Cavve, muita galera fazendo um som muito bom e que fogem dos padrões, aqui na Baixada Santista.”
[Hits Perdidos] Outro dia pude entrevistar o Rafael Souza, do Lavanderia, e ele disse que estava se aventurando em fazer lyric videos e clipes. Como veio a ideia do lyric e como foi o processo de produção?
Heitor Vallim: “O Rafael não só fez o lyric como também mixou e masterizou o meu disco. Na minha opinião ele é um dos artistas mais talentosos que já pude conhecer. O cara é absurdo. É louco que quanto mais incrível é a pessoa que você trabalha, menos palavras você consegue usar para descrever sua genialidade.
A gente se conheceu através do Lavanderia Session no início de janeiro e eu estava em fase de pré-produção desse trabalho novo. E na hora bateu a ideia com ele. Em tudo.”
[Hits Perdidos] Você gravou a faixa no formato banda, para tocar ao vivo será acompanhado deles também?
Heitor Vallim: “A música tem dois formatos ao vivo, com banda e solo. Teremos shows nos dois jeitos! Por exemplo, esse domingo, tem show na Paulista de graça com banda completa! Já no dia 30, tem show em Santos no formato solo. São diferentes, mas ao mesmo tempo compatíveis. Gosto da variação.”
[Hits Perdidos] Para fechar, como enxerga o momento do cenário independente de Santos e quais bandas indicaria para os leitores do Hits Perdidos?
Heitor Vallim: “Acho que tem uma crescente de música autoral muito legal aqui! Eu indico o Nadal, a The Scuba Divers (que são do casting da Peixinho Records), Cabana Jack (que lançou um single novo animal) e indico entrar no bandcamp da Peixinho para sempre conhecer esse novo cenário.
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