Nacional

Bruno Leo lança “Conversas de Apartamento”, seu 2° álbum no ano, e discorre sobre os dilemas do músico independente

Ser um artista independente em 2023 em meio a tantas mudanças de tecnológicas e barreiras para monetizar seu trabalho é um dilema por si só. Desde traçar estratégias de divulgação, planejar o lançamento, entre todos os outros fatores envolvidos…agora imagina lançar dois álbuns em 6 meses? Foi isso que Bruno Leo fez em 2013. Em abril veio Delusional e agora em Outubro, Conversas de Apartamento.

Nesse processo que criativamente o influenciou, como comenta na entrevista, está a mudança da Finlândia, onde vivia a 11 anos, para a Califórnia. Mas o material também passa por temas que vão do legado que construiu, passando pelas pessoas que ama às duras verdades sobre viver em sociedade.

Entre as influências o novo disco passa pelas bandas de rock dos anos 1980, 1990 e 2000, como Cardigans, Placebo, Pato Fu, Blondie, Smashing Pumpkins, Gram e Los Hermanos, desta vez também incluindo Paramore, Marina Lima e Skank.


Bruno Leo lança seu segundo álbum em 2023. – Foto Por: Carolina Ribeiro

Entrevista: Bruno Leo

Conversamos com o Bruno Leo para saber mais sobre a odisseia de lançar dois discos no mesmo ano, o uso de inteligência artificial na música, as mudanças do mercado, os caminhos da música pop entre outros assuntos. Confira o papo!

A indústria da música tem cada vez mais “Gurus” e estrategistas dispostos a mostrar cartilhas de como agir voltadas para o sucesso. Como você observa quando artistas quebram justamente essas barreiras e chegam a quem precisa ouví-los?

Bruno Leo: “Eu acho que a maioria desses gurus vendem essas formulinhas baseadas em alguma coisa que deu certo, mas cada pessoa tem uma necessidade e um público e uma mensagem diferente. Mesma coisa com as playlists. Você faz um pitch pra colocar sua música numa playlist e as pessoas falam “ahhh gostei, uma das coisas mais criativas que já ouvi, mas no final da música tem um prato da bateria que me incomodou, desculpe. Sucesso pra você!”.

Se é aceito pode até aumentar o número de plays, mas e aí? As pessoas olham pro telefone toda vez que uma música vai pro aleatório? A conexão ainda tá faltando. Por isso acho que os artistas que quebrar essas barreiras são os que quebram as barreiras desde sempre… quando a música delas conecta com as pessoas.”

Pegando a deixa, qual o maior desafio que você vê nos dias de hoje para um artista se destacar em meio a algoritmos e hypes?

Bruno Leo: “O maior desafio é fazer as pessoas se importarem. Se você é pequeno e desconhecido, ninguém se importa. As pessoas vão ouvir os artistas que elas já gostam ou vão assistir uma série. O desafio é ter um trabalho mais interessante do que horas vendo os stories dos amigos. A gente tá na disputa de tempo. E parece que a música virou apenas mais um conteúdo ali no meio. Como que eu vou disputar tempo com a HBO? Impossível. Então os artistas acabam tentando conquistar as pessoas por suas pessoas primeiro e depois falar, “então, gente… lancei um disco. Taca play aí peloamordedeus!”. ”

Aliás, você lançou dois discos em 2023, sendo um artista independente que vive fora mas se auto produzindo, é até injusto comparar com o King Gizzard & the Lizard Wizard que lançou diversos em um ano. Como foi essa escolha para você? Como essa mudança da Finlândia para os EUA te afetou no processo?

Bruno Leo: “Eu acho que fazer música é estar com o radar ligado. A gente vai captando as ideias que aparecem. Tem hora que a gente está mais inspirado e acaba fazendo um monte de música. Quando lancei Delusional em abril, em maio eu já tava fazendo música nova. Então aproveitei o embalo da inspiração.
Vou confessar aqui que o This is Why do Paramore foi determinante pra eu querer fazer um disco novo. Ele me inspirou demais de várias maneiras. A diferença entre a Finlândia e os EUA é que até minha energia ficou mais ensolarada. Eu amo uma melancolia, mas senti que precisava expandir minha zona de conforto, que é fazer música triste. Mas se as ideias continuarem, de repente eu alcance os King Gizzard e faça um disco em cada estilo diferente igual eles.”

Sinto que o primeiro você volta mais para o rock alternativo e neste segundo você se aventura em fazer algo mais pop, com sintetizadores e um ar mais tropical. A ideia era brincar com novas referências?

Bruno Leo: “Acho que o Delusional foi uma continuação dos meus outros 2 discos, o Limbo, de 2022 e o Constantes Casos do Tempo Que Parou, de 2020. Todos eles nessas influências bem direcionadas pro Rock Alternativo dos anos 2000.
Agora em Conversas de Apartamento eu tentei expandir um pouco mais, mas sem tirar o temperinho Pop ali do meio. Algo que me fascina é conseguir fazer uma coisa Pop com roupa de Independente. As coisas que mais tenho curtido atualmente é Soccer Mommy e Snail Mail, que fazem isso brilhantemente.”

O trabalho também tem diversas homenagens as pessoas mais próximas, tem faixas sobre autoconhecimento e até mesmo de se defender das mentiras que nos contam. O momento de composição foi um exercício de olhar para o que construiu ao longo da vida e lembrar de quem realmente importa?

Bruno Leo: “Totalmente. Como eu penso muito mais no processo do que no resultado, acaba que eu faço música pra ficar registrado pros meus filhos no futuro. Acho que eles vão acabar me conhecendo melhor, o jeito que eu penso e como vejo o mundo ouvindo minhas músicas no futuro. E não poderia deixar eles de fora dessa homenagem.

Acabei fazendo uma música pra cada um dos meus dois filhos e uma música pra minha esposa, tentando passar uma mensagem pras pessoas que elas não precisam idealizar um amor perfeito. Esse amor se constrói juntos. Não é fácil, mas a gente tem que segurar a onda tanto no calor ou no frio, como diz o nome da faixa final do disco.”



Você também sempre tenta produzir clipes, teve até com a ajuda da Inteligência Artificial. Como vê o advento da tecnologia para acelerar processos e produzir música com mais facilidade?

Bruno Leo: “Acho a tecnologia ótima. Acaba que a gente perde muito tempo fazendo trabalho braçal e perde o tempo da criatividade. Eu acho que o AI bem usado vai ajudar a gente nisso. Colocamos uma automação ali pra gente poder gastar mais energia na parte que nenhuma máquina vai conseguir nos copiar, que é ter ideias e sentir emoções.

Se for pra ajudar um artista a criar um clipe, um post pra divulgar ou qualquer outra coisa do tipo, acho que é super válido e Inteligência Artificial é apenas replicação do que já existe. É tipo uma banda cover. Mas pra existir uma banda cover, alguém tem que criar uma coisa nova e isso os artistas sabem fazer.”

Outro dia vi uma empresa que basicamente exclui o papel do beatmaker e já tem gente compondo utilizando AI ‘s. Como observa essas movimentações, tendências e a arte no meio disso tudo?

Bruno Leo: “É coisa do mercado. Os loops já existem há anos, mas alguém tem que saber usar. Com Beatmaker de AI uma hora vai saturar porque vai deixar de ser lucrativo. As pessoas vão cansar de ouvir os mesmo beats e alguém vai ter que criar um beat novo, uma tendência nova.
O Popzão mainstreaming já tá cada vez mais pasteurizado. Os mesmo 4 acordes e mesmas melodias e agoras os mesmos beats. Meu maior problema com isso é que tem muito marketing e muita gente vai acabar ouvindo. E isso vai moldando os gostos das pessoas. É tipo colocar muito açúcar em achocolatado. Claro que fica mais gostoso, mas só comer coisa super doce, tira todas as suas referências do amargo, do ácido, do diferente. Meu maior receio é com isso. Por isso que o Indie é resistência. Tem que ser meio desafinado mesmo, meio fora do tempo mesmo. Mostrar que é feito por gente real. Tudo muito no grid e perfeito, deixa tudo meio plastificado. Torço pras pessoas enjoarem disso logo pra gente poder ter alguma mudança.”

Em “Sem Esperar Se Consagrar” você até mesmo fala sobre as motivações de criar arte sem se importar com a opinião dos outros. Hoje em dia, num mercado mainstream dominado por estratégias e números, como vê que isso resiste?

Bruno Leo: “Eu sou um romântico da arte real sem se importar com as opiniões dos outros. Eu tenho formação em comunicação e também em artes visuais. Na minha profissão eu não faço arte porque tenho um objetivo de venda ou de comunicação. Fazendo música eu posso ser livre.
E acho que o Indie e o Alternativo sempre viveram isso. Por isso que acho que é muito legal curtir o Pop Mainstream, mas se você quer uma coisa mais verdadeira e mais real, o independente entrega tudo. Claro que você pode não gostar. Mas acho super importante essa resistência. Eu digo que você tem que escrever um livro que gostaria de ler, tirar uma foto que você gostaria de olhar e fazer uma música que você gostaria de ouvir. Em primeiro lugar, eu tenho que curtir. Se eu não gostar, não tem porque eu jogar pro mundo. E eu descarto muita coisa que faço (risos).”

Você também é produtor de conteúdo com o podcast Silêncio no Estúdio. Como sente todas essas trocas e debates influenciam no seu projeto?

Bruno Leo: “Podcast me força de uma maneira boa a ficar mais ligado no que tá rolando de novo no mercado e nas tendências e isso acaba me influenciando a fazer música. Eu escuto um disco legal e já quero fazer música. Todo mundo no nosso podcast tem projetos musicais. O Vinícius Cabral tem a banda godofredo lá de BH, o Brunno Lopez e o Márcio Viana tem projetos solos também. A gente acaba trocando figurinha entre a gente e cada um inspira o outro no processo. Tanto pra fazer música como pra criar conteúdo sobre música.”

Pra fechar, como observa o momento da música pop em geral?

Bruno Leo: ” Eu vejo o Pop de duas maneiras. Uma é o Pop lucrativo que vai gerar um monte de músicas parecidas até cansar e ficam em ciclos nostálgicos. É disco music, dance dos anos 90, pop 2000 e por aí vai. O ciclo é infinito. Aparecendo pouquíssimos artistas novos nessas levas.

E tem o Pop que tá se expandido e é gigante também, que é o K-Pop. Não sou grande conhecedor, mas escuto bastante coisa pra tentar entender o que tão fazendo por lá. Tem discos de Popzáço lá que tem guitarra distorcida dobrada com peso. Tem música que parece o Nuno Bettencourt do Extreme tocando guitarra no Pavement só que fazendo Popzão.

Tem Popzáço fazendo um Neo Soul com R&B. Acho legal demais essa criatividade. Eles não tem medo de testar e os fãs vão expandindo os próprios gostos. E acho que o Pop pasteurizado geral poderia olha pra lá e tentar sair um pouco desses ciclos de nostalgia e revivals. Mas infelizmente é isso que vende e o que temos no momento.”

Bruno Leo Conversas de Apartamento



Confira o faixa a faixa de Conversas de Apartamento, por Bruno Leo:

Faixa 01 – Renascendo

Renascendo é uma faixa que fiz em homenagem ao meu filho de 10 anos. Quando ele nasceu, a sensação é de que uma nova vida começava. Novos dilemas, medos, certezas e sentimentos. A minha vida sem filho parece uma vida distante, como fotografias mofadas com o tempo. É um registro pra que tudo fique na memória.

Faixa 02 – A Melhor Parte de Mim

Outra faixa em homenagem, dessa vez para minha filha de 8 anos. Seu jeito divertido e imaginativo são encantadores e essa música é sobre os nossos momentos juntos. É sobre ela continuar sendo quem ela é.

Faixa 03 – O Que É Preciso Pra Ser Imortal

Essa faixa é uma reflexão pessoal sobre a imortalidade e desejo por reconhecimento. Será que vale de tudo para ser relevante? No fim, podemos ser imortais com uma palavra de conforto. O que a gente faz na vida, nunca será esquecido por quem está ao nosso lado. Assim, podemos ser imortais.

Faixa 04 – Pessoa Oposta

Fazendo jogo de palavras sobre os opostos do dia a dia, a música fala sobre a importância da individualidade. Não ter vergonha de ser diferente. Aceitar suas esquisitices e ser feliz. Não importando suas manias e diferenças.

Faixa 05 – Guardado Como Souvenir

A faixa é sobre lembranças e autoconhecimento. As dificuldades da vida vão nos afetar e precisamos entender que algumas coisas passam, que algumas coisas mudam e que nem tudo é definitivo. Mudar é bom e nos aceitar nessa mudança é fundamental pra gente apenas seguir.

Faixa 06 – Sonhar Para Fingir

É uma faixa sobre saudade e luto. Sobre as coisas que deixamos de falar, das coisas que deixamos de viver. Esse sentimento fica martelando na nossa cabeça, quase nos culpando pela saudade. É sobre seguir a vida. Tem coisas que podemos fazer e outras a gente apenas torce pra que seja curado.

Faixa 07 – Essa Mania

Essa Mania é uma faixa sobre as pessoas que têm o costume de mentir pra nos poupar. Acham que não vamos aguentar a verdade e acabam escondendo mentiras em uma nova verdade. É sobre a relação de poder emocional sobre o outro. É um alerta sobre as mentiras que nos contam todos os dias.

Faixa 08 – Sem Esperar Se Consagrar

É uma música sobre o ato de criar música. Sobre as motivações de se criar uma arte. Nem tudo precisa de sucesso. Nem tudo precisa ser consagrado pra ser validado. Você pode apenas criar uma arte ou uma música que você vai gostar sem se importar com as opiniões dos outros. É sobre a liberdade de criar sem amarras pelo sucesso e buscar por uma influência.

Faixa 09 – Barulho Calado

É outra faixa sobre o ato de compor. É a reflexão da página em branco. De como começar uma música. É sobre misturas, sentimentos, melodias e coragem de jogar suas ideias pro mundo. Com participação da cantora e compositora Fernanda Reche, a música nos conecta pra enfrentarmos nossas amarras e continuar fazendo música.

Faixa 10 – No Calor ou No Frio

A última faixa do disco é uma homenagem à minha companheira. São mais de 18 anos juntos e conto como que não existe segredo pra um amor duradouro. É sobre construção e momentos difíceis. É sobre conforto, amizade, respeito e companheirismo. Um registro de amor verdadeiro.

This post was published on 26 de outubro de 2023 5:43 pm

Rafael Chioccarello

Editor-Chefe e Fundador do Hits Perdidos.

Posts Recentes

Renata Swoboda lança clipe apolítico para “Meu Dengo ♥️” às vésperas do segundo turno das eleições

Após lançar na sexta (18) o single "Meu Dengo ♥️", a artista catarinense Renata Swoboda…

23 de outubro de 2024

C6 fest anuncia line-up da 3ª edição com Nile Rodgers & Chic, Air, Wilco, Pretenders, Gossip, The Dinner Party, English Teacher e mais

C6 Fest chega a sua terceira edição com line-up de peso Após a primeira edição…

22 de outubro de 2024

Paul McCartney encerra passagem pelo Brasil em Florianópolis

No sábado (19), Paul McCartney fez a última apresentação da atual passagem da Got Back…

21 de outubro de 2024

Fin Del Mundo mergulha nas profundezas em “Hicimos crecer un bosque”

Que a cena de rock argentino é bastante prolífica não é nenhuma novidade. Após lançar…

18 de outubro de 2024

Maria Beraldo reflete sobre identidade de gênero e explora timbres em “Colinho”

Não parece, mas já se passaram 6 anos do lançamento de CAVALA (RISCO), álbum de…

18 de outubro de 2024

Dora Morelenbaum explora as curvas sonoras em “Pique”

Após o fim do ciclo ao lado da Bala Desejo, os músicos têm retomado suas…

18 de outubro de 2024

This website uses cookies.