Hot e Oreia vai da nostalgia a Bacurau em um dos melhores clipes do ano

 Hot e Oreia vai da nostalgia a Bacurau em um dos melhores clipes do ano

A “Última Ceia” de Hot e Oreia – Foto: Reprodução / Youtube

Política, bom humor e sétima arte, esse é o espírito que costuma permear os videoclipes dos mineiros Hot e Oreia (leia entrevista). O duo neste ano lançou seu segundo álbum de estúdio, Crianças Selvagens (leia resenha), em setembro, e agora apresenta o clipe duplo para “Domingo | Presença”.

Referências não faltam dentro da produção audiovisual assinada por Belle de Melo e com produção da Cave.

O vídeo faz alusões às artes plásticas – mais especificamente aos quadros  “Antropofagia”, de Tarsila do Amaral, “A Sereia”, de Alfredo Volpi, “Exu Black Power”, de Abdias do Nascimento e “A Última Ceia” de Leonardo da Vinci – e cita a história da música popular brasileira, reproduzindo parte do discurso de Caetano Veloso no Festival Internacional da Canção em 1968. Além, claro, da mais notória ao filme Bacurau.

Aliás ainda há uma espécie de sinestesia entre o filme e o disco que conta com samples da voz de Caetano Veloso na faixa “Presença”, assim como a do cantor e compositor Nelson Ned em “Domingo”. Ambas acabam ganhando presença na trama simulando uma volta no tempo – e nos levando para anos difíceis.


Hot e Oreia Domingo Presença
A “Última Ceia” de Hot e OreiaFoto: Reprodução / Youtube

Hot e Oreia “Domindo | Presença”

“Escolhemos Bacurau como pano de fundo porque traz essa representação do que é ser brasileiro e como as figuras em cargos de poder não nos representam enquanto coletivo”, explica Hot.

“Mostra uma visão nossa sobre como esses políticos de hoje são ainda tão coloniais quanto os que chegaram aqui há mais de 500 anos”, continua.

A veia política volta a ressoar no videoclipe que encosta na ferida de temas contemporâneos. A teatralidade e leveza para trazer os assuntos a tona é um dos grandes méritos da produção audiovisual que também se destaca pelo figurino e atuações do seu grande elenco.

“Como nos nossos outros clipes, queríamos provocar uma reflexão sobre a diferença de classes e a supremacia branca que rolam no país. A referência a Bacurau veio disso. De certa forma, durante as filmagens, essa diversidade também surgiu, nos servindo como um processo de aprendizagem profundo”, afirma Oreia.

A Direção

É o terceiro clipe que Belle dirige do duo mineiro, “Eu Vou” inclusive foi premiado no m-v-f- awards 2019.

“As releituras de filmes que fiz para os videoclipes do Hot e Oreia me permitiram desaguar a minha insatisfação sociopolítica frente ao cenário atual brasileiro”, diz Belle.

“‘Domingo’ e ‘Presença’, que são músicas separadas, ficam unidas neste trabalho de uma forma muito singular e especial em uma narrativa que espero reverberar e provocar reflexões mesmo após o videoclipe terminar. É uma ficção sobre histórias muito reais: a nossa”, finaliza

Como entretenimento o videoclipe é uma aula que conta com elementos que prendem dentro da trama. Claro que a teatralidade nata dos rappers também acaba sendo elemento chave para retratar temas como repressão, censura, supremacismo e tortura. Assim como “Eu Vou”, o vídeo vai na contramão e provoca simpatizantes do conservadorismo e totalitarismo.



Hot e Oreia Crianças Selvagens

O segundo álbum do Hot e Oreia, Crianças Selvagens, já chega com status de clássico instantâneo. Com direção musical de Daniel Ganjamen, o disco tem o nome inspirado em livro mas que também carrega diretamente o significado do amadurecer. Como eles mesmos disseram na audição do disco: a responsabilidade e as contas chegaram.

Com letras mais maduras, mas sem perder a ironia e o senso de humor, eles abraçam personagens para falar sobre temas como a Quarentena, a política, as falcatruas, a religião e o amor. Os beats também são destaques tendo inúmeras parcerias ao longo do registro como por exemplo, de Coyote Beatz, Vhoor e produção musical de Fantini.

Parcerias também se destacam ao longo do disco que tem faixas de peso como “Juro$”, o hit “Saiu o Sol” e baladas como “Papaya” parceria com Black Alien. Samples também aparecem com direito a Nelson Ned em uma faixa com participação do duo Tropkillaz.

O flerte com a música brasileira é cada vez mais forte em um registro espiritualizado, sarcástico e com direito a até mesmo love songs. Essa versatilidade que mostra como eles estão a cada dia mais prontos para palcos, e desafios, maiores.

O salto é grande em relação ao primeiro disco e eles continuam com o mesmo senso de humor mas parecem ser do tipo que quando entram no estúdio: o papo fica sério. Compromisso esse que faz com que esse disco faça com que esse álbum quebre ainda mais barreiras do que eles já quebraram com o debut.

Eles revelaram durante a audição que as letras estavam demorando para sair mas que em poucos dias trabalhando sob pressão, e com cronograma apertado, a caneta decidiu rabiscar e saíram 6 faixas em uma tacada só. Ou seja, não procurem regras para a criação, apenas, façam.


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