Às vésperas das eleições, artistas comentam sobre o avanço do fascismo (Parte 1)

 Às vésperas das eleições, artistas comentam sobre o avanço do fascismo (Parte 1)

Estamos a poucos dias do primeiro turno das eleições onde serão eleitos representantes para assumir os cargos de Presidente, Senador, Governador, Deputado Federal e Deputado Estadual.

Em tempos de polarização política, ou ao menos tentam “criá-la”, é notório o crescimento candidatos trazendo discursos conservadores, outros até contendo racismo, homofobia, misoginia, preconceito religioso, xenofobia, discurso de ódio entre outras atitudes definitivamente reprováveis. Estas que além de irem contra os direitos humanos, ainda estimulam a violência, vão contra os valores morais e a ética.

Um movimento que foi ganhando força nos últimos anos, não só no Brasil mas como no mundo inteiro onde vemos sendo eleitos políticos com um perfil agressivo, xenofóbico, com pautas retrógradas e com atitudes dignas de tirania.

A classe artística por sua vez costuma se manifestar contra atitudes retrógradas e nos últimos dias não foi diferente após assinaram um manifesto coletivo online. Falar que fazer arte é política é chover no molhado porém é necessário lembrar de como a opinião dos artistas sempre teve peso ao longo da história do nosso país. Por isso decidi fazer uma série de entrevistas com artistas de norte a sul do país. Confira a primeira parte.

Confira Também a Parte 2
Confira Também a Parte 3

Rio Grande do Sul (RS) 

Dingo Bells (Porto Alegre / RS)


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Dingo Bells. – Foto Por: Rodrigo Marroni

Como você vê o crescimento do fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo?

Fabricio Gambogi: “Vejo com temor e como algo que deve ser combatido. É compreensível que muitas pessoas estejam sendo seduzidas por discursos de soluções fáceis para problemas complexos, mas acredito que cabe a todos nós a defesa intransigente da liberdade e do respeito como condição fundamental para qualquer debate.

A necessária (re)construção do Brasil passa pelo comprometimento profundo com a pluralidade que nos caracteriza como brasileiros. A intolerância pode se voltar contra qualquer um de nós. A intolerância deseja a eliminação do outro. Não se pode tolerar a intolerância.”

Como enxerga o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições?

Fabricio Gambogi: “Cativar a atenção das pessoas através da escuta é um privilégio e cria uma relação que deve ser tratada com responsabilidade.

Tudo o que um artista produz traz em si seu posicionamento. A reflexão provocada por um verso, o comprometimento com uma sonoridade, sua postura num ambiente de trabalho, tudo isso traz as marcas de uma visão de mundo e de uma determinada postura diante dele.

Atuando de um modo mais direto nesse contexto, há muitos artistas que constroem seu caminho musical em relação estreita com pautas específicas, como moradia, visibilidade, luta por direitos, etc. Assim, me parece bastante legítimo que esse artista aproveite a oportunidade de fazer uso do vínculo que ele conquistou com seu público para provocar uma reflexão ou até mesmo defender uma pauta específica – basta lembrar que, ao menos teoricamente, somos livres para pensar sobre aquilo que nos dizem.

Imagino que haja mais utilidade num artista provocando que num artista calado.”

Alpargatos (Porto Alegre / RS)


ALPATGATOS _ Foto de Divulgação (Kim Costa Nunes)
Alpargatos. – Foto Por: Kim Costa Nunes

Como você vê o crescimento do Fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo?

Afonso: “O primeiro reflexo desse crescente ódio que nos coloca frente a uma possibilidade real de um governo fascista ser eleito – democraticamente, diga-se de passagem – é a total perplexidade. Mas, infelizmente, se pararmos pada pensar friamente, isso é resultado de um processo muito mais profundo de afunilação social e cultural que vem rolando há algum tempo.

O fascismo começa na desvalorização do professor. O fascismo começa na falta de incentivo à cultura. O fascismo começa na alienação e na falta de espaços de debate. Não é um fenômeno isolado, artificial. As minorias sofrem isso na pele desde sempre: repressão, intolerância, violência.

O que rola, agora, é um desavergonhamento dos preconceitos, um empoderamento desse discurso segregador. É muito triste assistir a isso, dói muito, mas a gente precisa ter a força levantar a cabeça e lutar pelo que a gente acredita, que é uma educação libertária, uma cultura valorizada, uma arte capaz de questionar.”

Como enxerga o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições?

Afonso: “Acho que a arte – em situações comuns – tem um papel mais de reflexão e questionamento do que de didatismo. Nunca acreditei em discursos prontos, em doutrinas, em sermões. Acontece que – nesse quadro quase distópico em que nos encontramos – se posicionar e se articular através da arte é uma obrigação. Temos que influenciar, bater de frente, enfrentar o fascismo. É uma questão de sobrevivência não só da nossa arte, mas também dos nossos afetos e das nossas crenças.”

Nosso Querido Figueiredo (Porto Alegre / RS)

Nosso
Nosso Querido Figueiredo. –Foto: Divulgação

Como você vê o crescimento do Fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo?

Matheus Borges: “Eu, particularmente, considero ruim todo tipo de conservadorismo. Qualquer cristalização conceitual é ruim, acredito, mas o conservadorismo é a cristalização das cristalizações, uma reação burra a um estado de caos aparente. O mais importante talvez seja olhar para outros períodos igualmente críticos em que saídas autoritárias foram oferecidas à população, milagreiros políticos oferecendo soluções fáceis, apontando dedos para setores fragilizados da sociedade. Nunca deu certo. Ou deu, mas somente a quem não teve escrúpulos para acumular poder e dinheiro às custas da opressão e do extermínio de vidas humanas.

Estamos num período crítico da história recente, em que o projeto globalista neoliberal parece mais do que nunca fadado à ruína. A disseminação de intolerância, preconceitos e violência é um reflexo dessa falência, resultado direto da lógica de mercado aplicada às relações humanas, o chamado darwinismo social ou sistema de meritocracia. É uma doutrina enganosa, contrária ao humanismo, que coloca indivíduo contra indivíduo, homens contra mulheres, brancos contra negros, etc. Para se discutir propostas para um novo mundo pós-capitalismo, precisamos inventar uma nova hegemonia de ideias, muito diferente da que ainda vigora.”

Como enxerga o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições?

Matheus Borges: “Nesse momento crítico, o artista se encontra em posição de protagonismo. Os outros momentos críticos da história a que me refiro são guerras, revoluções, conflitos armados. Basta ver a produção artística dos períodos belicistas. Coisas esvaziadas de sentido, reduzidas a nada. O momento crítico atual é uma guerra conceitual travada nas trincheiras da cultura. Isso porque o esvaziamento dos sentidos não ocorreu em função de uma grande guerra mundial, mas de uma redução literal das coisas a absolutamente nada (crise de 2008).

Cabe agora explorar essa dissonância cognitiva, penetrar as metáforas que parecem dominar a paisagem. No caso de uma eleição, em que tudo é metáfora, em que tudo é retórico, o artista deve endurecer essa postura, oferecer resistência aos ideais perversos que se apresentam no campo de batalha. Isso porque a arte é o ato máximo de expressão humana e tem ligação intrínseca com os valores humanistas.

A presente guerra conceitual é justamente essa:os que acreditam no humanismo e os que querem enterrá-lo. É impossível que alguém se considere artista ao mesmo tempo que demonstra apoio a discursos anti-humanidade.”

Minas Gerais (MG)

Guto (Belo Horizonte / MG)


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Guto. – Foto Por: Júlia Maria

Como você vê o crescimento do Fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo?

Augusto Brant: “Essa infeliz tendência tem sido observada não só no Brasil, mas pelo mundo afora; é algo assustador, cujo reflexo é imensurável.

O fato é que o discurso fascista corrobora à sua prática. O discurso e a prática, aliás, são indissociáveis nesse contexto. Inevitavelmente, a ascenção de uma figura misógina e racista — respaldada por parte considerável da população —fomenta a proliferação de pensamentos e práticas também misóginas e racistas.

Acontece que a maior parte dos brasileiros não é boba, não engole mais qualquer discurso. Já sabemos, por exemplo, que essa frente fascista tem seu pior desempenho entre as eleitoras mais pobres, e isso não é atoa: quem vive a violência de forma cotidiana sabe que problemas estruturais não são solucionadas de maneira simplista, no grito ou com mais violência.

A verdade é que há uma elite brasileira que não quer abrir mão dos privilégios e que, a fim de salvá-los, está disposta a sujar as mãos de sangue.”

Como enxerga o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições?

Augusto Brant: “É um dever primordial. Sempre. Em momentos como esse, é natural que essa necessidade se aguce e eleve consigo a importância desses pronunciamentos, das grandes correntes e da pressão que elas geram; é algo muito significativo.

Se há alguma dúvida quanto a isso, basta se observar o rápido impacto que o movimento #elenão vem provocando nas intenções de voto dos brasileiros. Ações feito essa tem a capacidade de fazer com que milhões de eleitoras e eleitores — muitas vezes pressionados no contexto de suas relações cotidianas — se sintam mais seguros para se pronunciar e escolherem o candidato a quem mais se identificam. Isso é um imenso ganho para a democracia, um real fortalecedor da política.”

Jota Quércia (Belo Horizonte / MG)


Jota
Jota Quércia. – Foto: Divulgação

Como você vê o crescimento do Fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo?

Pepo: “Vemos com preocupação o crescimento do fascismo e do ódio no país e no mundo, a história nos mostra exatamente que caminho é este que estamos seguindo, suas causas e, principalmente, consequências. Mas precisamos entender este movimento para combate-lo.

É necessária uma intensa reflexão sobre os erros cometidos no passado para que possamos absorver as particularidades deste momento e buscar novas alternativas para pacificar os ânimos. É muito claro que não há conversa com o fascismo, mas é importante lembrar que este movimento recente é apoiado em sua maioria por pessoas comuns que, apesar de seus defeitos e preconceitos, não são necessariamente fascistas.

Vivemos num país continental, multi-cultural, desigual e violento, onde multimilionários dividem as ruas com miseráveis. Vivemos num país onde uma meia dúzia de famílias controla toda a comunicação midiática e outra meia dúzia é dona dos meios de produção, sistema bancário e de 90% da riqueza. Este é um país historicamente intolerante e preconceituoso e este movimento bolsonarista vem aí apenas para escancarar algo que, infelizmente, sempre foi uma realidade do país.”

Como enxerga o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições?

Pepo: “Acreditamos que todo artista tenha uma responsabilidade com seu público em se posicionar nesses momentos. Não existe nenhum trabalho artístico criado num vácuo histórico-social, a arte é, em si, política, se não essencialmente ao menos indiretamente. Somos frutos do nosso ambiente e, como seres humanos, somos inevitavelmente políticos.

A criminalização da política como forma natural de debate de ideias serve apenas ao propósito dos que desejam a manutenção das injustiças e do obscurantismo. Infelizmente muitos tem medo de se posicionar por temerem perder parte de seu público (ou uma reação violenta dele), não acreditam que a política seja algo inerente ao viver em sociedade e separam o que enxergam como “opinião” e a responsabilidade dele com seu público.

Dito isso é importante lembrar que nem sempre nossos artistas favoritos vão ter a mesma posição que a nossa (ou a que gostaríamos que ele ou ela tivessem, vide Anitta e a comunidade LGBT) e precisamos ter equilíbrio para analisar o outro tendo consciência de que eles vivem no mesmo contexto sócio-político que nós e, assim como o “cidadão comum”, cada um vive em sua bolha, teve sua criação e tem ideologias diferentes, chegando, enfim, a ter convicções diferentes.

A maior dificuldade que temos atualmente é: como acabar com um discurso de ódio, intolerância e violência através da arte? Independente da resposta é importante se posicionar e traçar a fronteira entre a civilização e a barbárie, utilizando as armas que temos à nossa disposição sem nunca esquecermos que a mesma máquina que mata fascistas pode cultivar suas raízes dependendo de quem as porta.”

Pata (Belo Horizonte / MG)


Pata
Pata. – Foto: Divulgação

Como você vê o crescimento do Fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo?

Lúcia Vulcano: “Vejo com perplexidade e espanto. Estávamos há tempos lutando por mudanças estruturais – como a luta das mulheres, das lésbicas, das negras, das trans – e avançando. Lentamente, mas estávamos. Havia uma esperança de que as coisas estavam mudando para melhor e estávamos conquistando nada menos do que direitos básicos de existência e sobrevivência.

Pelo menos eu estava com esse sentimento. Mas agora, é um descrédito na humanidade… Eu não consigo achar razões ou porquês dessa onda facista ter nos atingido em cheio – alias, razões tem sim… É o patriarcado sentindo a perda de privilégios, são os racistas se mostrando indignados com avanços de direitos de pessoas não-brancas, homofóbicos e lesbofóbicos dando as caras. Isso é muito triste e assustador.”

Como enxerga o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições?

Lúcia Vulcano: “Eu vejo como um papel crucial. Artista, principalmente os com ampla visibilidade, tem que se posicionar. A grande máxima ainda vale: não se posicionar é se posicionar.”

João Bernardo (Belo Horizonte / MG)


João
João Bernardo. – Foto Por: Rogério von Krüger

Como você vê o crescimento do Fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo?

Joao Bernardo: “Penso que tudo é cíclico e se retroalimenta; Não tenho a menor dúvida de que essa maré baixa passará. Mas é muito complexo. Essas pessoas horríveis estavam caladas. Acho que o fenômeno da web deu voa a todos os malucos, Isso ajudou a uni-los.

Além do mais, o Brasil tem um histórico violento que não ficava muito claro. Não somos o povo pacífico que acreditávamos. também temos a barbárie dentro do nosso organismo Brasil. E somos muuuuito conservadores. Se houvesse consulta popular para a legalização da maconha, casamento homoafetivo, legalização do aborto, enfim, essas pautas progressistas, penso que nada passava. É um fenômeno nacional e mundial o que está acontecendo agora. Mas tudo é cíclico. O que significa que até isso passará. Não sem sofrimento pra quem tem a cuca boa, como eu, vocês, nossos amigos. Mas sigamos!”

Como enxerga o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições?

João Bernardo: “Acho que é o mesmo papel de qualquer um que tenha lucidez. Ficar do lado progressista da história, do lado da luz, do amor, do cuidado com o outro. Na micropolítica, no dia a dia, no nosso cotidiano, é onde temos mais poder de atuação.”

Henrique Frederico (Belo Horizonte / MG)


Henrique
Henrique Frederico. – Foto: Divulgação

Como você vê o crescimento do Fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo?

Henrique Frederico: “Vejo como uma tremenda pena. Grandes “amigos” e familiares meus com essa intolerância, com o pensamento que a solução é pegar um extremista, com discurso raso “Tem que mudar isso aí”,

um rei de memes, sem nenhuma condição, sem nenhuma experiência, sem nenhum apoio do congresso para a presidência. O famoso “tem que pegar um doidão pra ir lá e arrebentar tudo. Ai o Brasil dá certo.”

Independentemente do resultado das eleições e dessa ameaça, o que é mais triste é ver o índice da pesquisa que apoia uma candidatura dessa natureza, ou seja, a maioria da população ao nosso redor. Isso sem falar a questão da moral, o apoio à inúmeros retrocessos com o povo e a classe trabalhadora, além de apoios à tortura, à violência como solução, o racismo, a homofobia, a xenofobia e a misoginia.

Não é algo que tenha meu respeito, não dá pra entender como se pode achar isso algo aceitável. Não. Não é a solução.”

Como enxerga o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições?

Henrique Frederico: “Importantíssimo. A arte e o artista inspiram todos ao redor, “This Machine Kills Fascists” já dizia isso em 1941, o que inspirou inúmeros.  Esses inspirados, me inspiraram e hoje eu o faço com minha música.  Eu particularmente, digo que eu faço música por questões de saúde, por presenciar atrocidades como essas e ter a obrigação de fazer algo pra mudar.

Não se posicionar no caso é um posicionamento, um péssimo posicionamento. E, num momento tão crítico e perigoso, ficar em cima do muro vai custar muito caro. Ainda temos poucos dias, mas agindo diariamente, seja com a arte e fora dela, conseguiremos reverter esse quadro.”

Rio Grande do Norte (RN)

Valvulosa (Natal / RN)


Val
ValvulosaFoto Por: Catarina Santos

Como você vê o crescimento do Fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo?

Valvulosa: “Acreditamos que o avanço do fascismo é um projeto bem idealizado e que está em curso há muito tempo no Brasil. O desprezo por uma educação para a autonomia e senso crítico, a falta de investimentos nessa área, na cultura, na arte que extrapole o simples entretenimento, são as armas que mantém a sociedade brasileira refém da mediocridade.

Seres medíocres, analfabetos funcionais e sem consciência de classe são terrenos férteis para ideias fascistas. Somam-se a eles setores da classe média e da elite, que embora tenham acesso a educação e cultura, apoiam e servem ao capitalismo selvagem, e passam a odiar tudo que não é o homem branco, cishetero e rico e cristão.”

Como enxerga o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições?

Valvulosa: “A arte deve se posicionar sempre contra discursos e práticas que limitem a liberdade de expressão, que preguem o pensamento único, pautado na hipocrisia religiosa e na moral conservadora, historicamente responsáveis por tantas perseguições e mortes.

Qualquer pessoa que faça música no Brasil não deve esquecer dos tempos da censura da ditadura militar, e partindo disso deve lutar pelo direito à sua criatividade e manifestação.

Nesse momento em que estamos sofrendo a ameaça de um governo antidemocrático, temos que resgatar a história e nos mobilizarmos em torno dos projetos políticos em que acreditamos.” 

Galactic Gulag (Natal / RN)


Gula
Galactic Gulag – Foto: Divulgação

Como você vê o crescimento do Fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo?

César: “O crescimento do fascismo e da intolerância é um fenômeno mundial. A concentração de renda do capital com seus monopólios chegou a um ponto em que os donos do poder não precisam mais do povo para gerar riqueza. Dinheiro gera dinheiro. A mão de obra está cada vez mais barata e descartável, então eles simplesmente estão ligando o “foda-se”, vários interruptores de “foda-se” sendo ligados aos poucos; “foda-se” nos EUA com Trump, “foda-se” na França com a família Le Pen, “foda-se” na Croácia, na Ucrânia, “foda-se” no Brasil com Bulbassauro sendo aplaudido por milhões…

Esperemos e nos preparemos para muitos outros “foda-se” que estão por vir. E esse “foda-se” é para nós, meros mortais, que dependemos de salário e não de renda, que nos fodemos todos os dias trabalhando pra sobreviver. Isso é preocupante? Sim, mas não surpreendente. É o capitalismo agonizando em seu projeto falho, dando o último suspiro em desespero e parindo o fascismo.

Antigamente, o lema da conquista tirânica era “dividir e conquistar”, hoje é o “distrair e conquistar”. Enquanto o povo estiver entorpecido com suas dancinhas, musiquinhas, bibelôs, joguinhos e redes “sociais”, tá tudo bem. É a mandioca entrando e o povo rindo, fazendo o jogo dos poderosos. E algumas ferramentas, como o Facebook têm um papel fundamental nisso.

A gente achava que ia ser lindo toda aquela informação disponível, mas veio tanto entulho junto que estamos mais desinformados que nunca. Não há filtros confiáveis. E aí estamos à deriva, bombardeados por fake news, brigando uns com os outros. A razão e os fatos não mais importam, e o próximo passo deve ser reescrever o passado, como já fazem os que, por exemplo, negam o holocausto ou dizem que o nazismo é de esquerda. Eles aprenderam direitinho com o 1984 do Orwell.

Devemos resistir, tentar abrir os olhos dos que não querem enxergar. É difícil, pois o pior cego é aquele que também é surdo. Muita gente se condicionou a acreditar na mídia, só que hoje mais que nunca ela faz o trabalho dos poderosos, de distrair pras questões elementares e inventarem um inimigo imaginário pra pôr a culpa. O povo não é acostumado a pensar e a criticar, então vai na onda.

É o Gulag Galáctico em plena expansão. A pior prisão é a da sua mente. Acho que o buraco é ainda mais fundo, a mandioca não entrou toda e nada é tão ruim que não possa piorar. Infelizmente não vejo saída pacífica pra isso. Podia falar em educação, mas só funcionaria a longo prazo, então acho que vai rolar uma guerra grande em breve. Quem sabe lutar, vai lutar, quem sabe plantar e viver da terra, vai sobreviver, e o povão mesmo vai morrer a rodo.”

Como enxerga o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições?

César: “Essencial! Esse “distrair e conquistar” muitas vezes envolve a arte. Hoje em dia, ela perdeu muito do seu papel de conscientização, problematização, reflexão. Mas ainda tem muita gente em evidência, respeitada pelas massas, que tem esse poder de mandar o recado e ser ouvido.

Não adianta pedir pra um eleitor de Bulbassauro ler Edgar Morin ou Hakim Bay, ele vai dizer que é coisa de comunista, ou sei lá o que. Mas se o famoso que passa na Globo falar, ele segue. Se um artista que ele respeita mandar o recado, ele pode chamar de “comunista”, mas aquilo vai plantar uma semente na mente dele, e se muitos plantarem essa semente talvez ele acorde.

Não dá mais pra fazer arte como puro entretenimento, os artistas precisam assumir posições. Já que o povo virou “gado”, os artistas têm que guiar para o lado bom da força, o lado da solidariedade, do pensamento crítico, da pesquisa de fatos, da compaixão, do amor, e apontar pro verdadeiro inimigo, que são os que controlam os botões de “foda-se o povo” mundo afora. Já que os meios de informação desinformam, cabe aos artistas assumirem esse papel.

E já estamos num ponto em que não é PT contra PSDB ou fulano contra cicrano. Aliás, acho que nunca foi assim, isso parece coisa de torcida de futebol. Mas agora ficou mais sério que nunca, é escolher entre ser escravo ou dono de si. E o mais importante é não deixar aquele candidato filho da puta chegar no poder, porque pra tirar, a merda vai ser grande.

Todo artista que se respeite, que saiba o que arte significa, tem a obrigação moral de se manifestar contra o fascismo crescente atual. A hora é essa.

Paz e fraternidade galáctica a todos!”

Piauí (PI)

Valciãn Calixto (Teresina / PI)


Valciãn Calixto por Christopher Moreira
Valciãn Calixto. – Foto Por: Christopher Moreira

Como você vê o crescimento do Fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo?

Valciãn Calixto: “Intolerância é quase sinônimo de Fascismo, né? E bem, analisando friamente esse contexto no nosso país, as pessoas não apoiam atos de ‘justiça com as próprias mãos’ simplesmente porque temos índices altos de violência, porque trabalhadores são roubados ou assaltados, mas também porque há uma cultura educacional intolerante com o que é diferente, padrão, seja uma opinião, um gênero, uma orientação política, religiosa ou mesmo sexual. O Conservadorismo, aliado do Fascismo e da intolerância não quer o avanço nem a evolução da sociedade, das novas discussões, das pautas progressistas por interesses pessoais ou de classe.

Políticos não apoiam o Uber porque fere interesses das cooperativas e empresas de táxi, políticos não legalizam a maconha porque a maconha comercializada na farmácia vai ser mais cara que a comprada numa boca de fumo e a clientela vai continuar correndo pra boca de fumo, não legaliza o aborto porque o estado vai ter de custear os gastos e a Saúde no Brasil já possui receita estrangulada, por isso a galera fascista prefere deixar tudo amarrado como está, partindo para a intolerância perante o avanço que a sociedade vai impondo dia após dia.

Então me preocupa que muito dos meus amigos, de vizinhos, pessoas que estudaram comigo, cresceram comigo agora apoiem pensamentos e atitudes fascistas por desespero, medo, falta de consciência e humanismo mesmo.”

Como enxerga o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições?

Valciãn Calixto: “Quem deixou para se posicionar a poucos dias das eleições majoritárias vai acabar sendo culpado, caso assuma a partir do próximo 01 de janeiro o #elenão. Quem podia ter se posicionado antes e não fez até agora terá culpa em dobro. A gente sabe do poder de influência que tem uma pessoa pública e o artista começa a perder esse espaço e esse poder exatamente por não manifestá-lo, por não praticá-lo fazendo um chamamento para que a audiência dos artistas passem a refletir, a pesquisar sobre seus candidatos e suas propostas de fato.

Digo isso porque no twitter eu tenho visto a galera dizendo que o Don L cantando é ótimo, comentando sobre política podia ficar calado. Isso já é uma mostra de que o artista está perdendo a credibilidade perante o público, ficando apenas com o papel do entretenimento e entretenimento tem menos arte que a política.”

Bahia (BA) 

Thrashard (Vitória da Conquista / BA)


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Thrashard. – Foto: Divulgação

Como você vê o crescimento do Fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo?

Thrashard: “A cadela do fascismo está sempre no cio. Essa frase de Brecht acho que diz tudo sobre esse nosso momento atual, no mundo inteiro mas especialmente no Brasil, porque a gente tem um histórico muito ruim com ditaduras e fascismo, de Vargas até a Ditadura Militar foi um período muito curto, e do fim da ditadura pra cá também é um período curto de democracia, ver isso ameaçado de novo e ficar apreensivo a cada notícia é muito ruim.

A internet hoje é uma faca de dois gumes né, por que a gente tem acesso a muita informação, tanto pra boa quanto pra ruim, e essa é uma das coisas que fortaleceram esse fascismo, tem gente que fala abertamente sobre nazismo, eugenia, sendo racista e homofóbico na internet e não dá nada, eles se sentem protegidos ali, ou pelo anonimato ou pelo espaço virtual e a não possibilidade de um confronto, a gente viu recente o caso dos brasileiro “ensinando” pra a embaixada alemã o que era nazismo, dizendo que é de esquerda, tipo, é bizarro, e isso tudo unido a formadores de opinião de extrema direita, somado com um ódio irracional ao comunismo e a esquerda, que na maioria das vezes não fazem a menor ideia do que seja. E de uns anos pra cá, essas pessoas viram um totem, que a gente sabe bem quem é, que permitiu a eles exprimirem mais ainda esses preconceitos.”

Como enxerga o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições?

Thrashard: “A gente tem que combater esse fascismo de alguma forma, e nós como artistas além das atitudes do dia-a-dia temos a arte pra fazer isso. Como uma banda de crossover thrash, a gente tá bem ligado ao hardcore/punk, e sempre que há a oportunidade, principalmente em shows a gente se posiciona e discursa, bate de frente, fala o que acha errado, o público gostando ou não, porque sempre tem aqueles reaça nos role de metal e punk.

Mais ainda além de todo mundo do underground, que tem pouca visibilidade midiática que já faz isso, os artistas mainstream tem mais que a obrigação de fazer também, o poder que a arte tem de mais que influenciar, de fazer pensar, de conscientizar, é como se ele tivesse dando de volta ao público o que o público deu a ele, em troca de todo o apoio, ainda mais se o/a artista for contrário/a a esse tipo de pensamento fascista, principalmente em estilos como o rap, metal, punk, funk, que tem esse histórico de luta contra repressão e de apoio a minorias. Nesses casos, a omissão se torna conivência.”

São Paulo (SP)

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2De1Foto: Divulgação

Como você vê o crescimento do Fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo?

Fernando Soares: “Quando a gente tem, concorrendo a presidência da república, um ‘coiso’ fascista, isso se torna o aval que algumas pessoas esperavam pra disseminar ódio sem medo.

Principalmente quando essas atitudes fascistas não são devidamente punidas. Essas algumas pessoas passam a entender esse pensamento preconceituoso como ‘opinião’,
e sem qualquer receio, compartilham suas ‘opiniões’ carregadas de intolerância.

E mais do que triste, isso é assustador. Se hoje, sem o endosso de uma eleição vencida, já morre um LGBT a cada 19 horas, um jovem negro é assassinado a cada 23 minutos no Brasil, uma mulher é assediada a cada 1 segundo no Brasil, o poder nas mãos fascistas pode piorar ainda mais essas estatísticas.”

Como enxerga o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições?

Fernando Soares: “Justamente pela força que o endosso de um fascista concorrendo a presidência gera em algumas pessoas, a força de um artista se posicionando contra é muito potente.

É preciso usar a voz no microfone pra gritar contra essa onda intolerante. É preciso usar a influência em redes sociais pra se colocar contra. Pra que as pessoas não se sintam tão sozinhas, e se empoderem ainda mais pra lutar contra essa ameaça pro Brasil.

Não dá mais pra passar pano pra fascista e esperar que tudo vá ficar bem, até porque não se posicionar hoje, já é um posicionamento. É compactuar com toda essa intolerância que caminha contra corpos como o meu.”

WRY (Sorocaba / SP)


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Mario Bross do WRY. – Foto Por: Fabricio Vianna

Como você vê o crescimento do Fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo?

Mario Bross: “Eu acho assustador. A má qualidade na educação do povo ajudou bastante no crescimento desse negócio. Isso, mais a internet, principalmente o Facebook e as fakenews, aliados a fraqueza em interpretar de texto, deixou o caminho fácil pra essa filosofia radical crescer (e rápido), entrando na cabeça do povo.

Lógico, sem generalizar, não é o povo todo. Entretanto a parcela que está indo nessa, faz questão de deixar claro, e a gente fica assim, de queixo caído sem entender a lógica. Ignorância com poder de fala é uma das coisas mais perigosas que existem, e para um país como o Brasil, fica mais perigoso ainda, vira uma bola de neve.”

Como enxerga o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições?

Mario Bross: “Eu acho que os artistas precisam se posicionar sim, pois pode ser ainda muito mais perigoso se não o fizer. Principalmente as que tem poder de fala, que alcançam um monte de gente. Essas devem alertar o povo, tentar abrir a cabeça dessas pessoas, e colocar um pouco de consciência sensata em meio ao emaranhado de asneiras que ecoam dentro dessas cabeças.”

Alaska (São Paulo / SP)


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Alaska – Foto Por: Stefano Loscalzo

Como você vê o crescimento do Fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo?

Alaska: “O crescimento e a normalização do fascismo na nossa sociedade (e em boa parte do mundo) é muito sintomático. Ele mostra que tanto o discurso de ódio quanto outras atitudes violentas se tornaram aceitáveis por parte da sociedade, deixando os grupos oprimidos ainda mais expostos a situações de risco.

Uma sociedade que respeita a diversidade é o mínimo que poderíamos esperar em 2018. Mas, hoje, acho que ainda estamos muito longe disso.”

Como enxerga o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições?

Alaska: “É importante que o artista se posicione em uma situação onde o resultado do silêncio trás mais força para o crescimento de pensamentos e atitudes fascistas. Não se posicionar, muitas vezes, é um posicionamento.”

The Bombers (Santos / SP)


Roberto Gasparro
The BombersFoto Por: Roberto Gasparro

Como você vê o crescimento do Fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo? 

Matheus Krempel: “Eu vejo tudo isso com preocupação e tristeza. No mundo inteiro existe um avanço dos ultra conservadores. As mascaras caíram. As pessoas não tem mais medo de se mostrarem preconceituosas, egoístas e iludidas.”

Como enxerga o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições? 

Matheus Krempel: Acho muito importante. Não temos mais espaço para quem fica em cima do muro. Se as máscaras que cobriam a face que refletem o que temos de pior caíram, já passou da hora para que a outra face se apresente.”

Saltines (São José dos Campos / SP)


Saltines 1 _ Foto por Bel Gomes 17-08-2018
SaltinesFoto Por: Bel Gomes

Como você vê o crescimento do Fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo? 

Bruno Mantovanni: “Respondendo as questões, pra mim historicamente o fascismo se faz presente, e não é de hoje que vemos o seu crescimento, desde os discursos reproduzidos no impeachment que aconteceu em nosso país ou em escala mundial nos discursos que se concretizam com Donald Trump assumindo a presidência dos EUA, e agora que se funde nas ideias ultradireitistas e supremacistas do Bulbassauro. Pra mim o que se vê é uma nova “roupagem” do fascismo, que talvez até banalize o conceito histórico de fascismo, pois pra mim essas ideias hoje chegam a beirar o “absurdo” sem a coerência intelectual e ideológica que o fascismo já teve.

Essa onda conservadora e autoritária gera a intolerância generalizada, o embate das ideias polarizado nas redes virtuais, e temos como reflexo disso agressões, ofensas, chegando a ultrapassar o senso racional na esfera da violência. Na maioria das vezes essa violência se dá, nem por uma disputa ideológica ou política, mas por preconceitos sociais e opressão as minorias que tem tido no decorrer dos tempos protagonismo e direitos se posicionando.

Pra mim é lamentável a alienação que ocorre tanto na direita quanto na esquerda, vejo pessoas em sua maioria despolitizadas e totalmente instrumentalizadas pela mídia, sem “escuta” ou sem argumento pra seguir em suas “defesas”, ou se vê um discurso ultradireitista ou “anti-petista” e que estão aí pra brigar por isso. No meu ver esses discursos usam seu lema como símbolo do seu patriotismo e não conhecem a história do seu país, quando flerta (sem saber o que é?) com a ditadura militar no Brasil ou não conhecem a história de mundo, quando flertam com pensamentos nazistas como o de Adolf Hitler.

Penso que precisamos seriamente discutir essa conjuntura e buscar alternativas de uma nova perspectiva. No meu caso utilizo da música, do rock e seu viés contestatório pra contaminar a minha bolha e quem sabe outras bolhas, sou totalmente contra alguém que deslegitima a luta das mulheres, é homofóbico, é preconceituoso, que apoia a ditadura e que concorda com o assassinato de outras pessoas, independente de quem essas pessoas sejam. Mais do que uma questão política se trata de uma questão moral.

Inclusive as mulheres estão dando uma lição de como se constrói uma unidade contra o fascismo com esta mobilização suprapartidária contra o Bulbassauro, ao invés de ficar nessa discussão inútil entre candidato esquerdista A ou B, construiu essa unidade na prática, contra o facismo e o retrocesso. Vide os movimentos #elenão #elenunca e “Mulheres contra o Bulbassauro”.

Como enxerga o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições? 

Bruno Mantovanni: “Acho que o papel do artista se posicionar é essencial. A arte é veiculo de expressão, de resistência, de luta. E o rock essencialmente tem por legitimidade esse viés contestatório.

Aqui no Vale do Paraíba e no interior de São Paulo nós e mais algumas bandas independentes estamos nos posicionando em apresentações com algumas covicções na intenção de politizar  também conscientizar, e agora estamos tentando fazer um ato contra o fascismo através da música, em data a ser definida, um palco no centro da cidade de São José dos Campos, cidade que abriga a Rodovia Pres. Dutra, uma das principais do país e que interliga o eixo RJ-SP.

Estou tentando fazer com a minha banda e com a nossa música o nosso papel, independente de odiadores ou adoradores. Muito me entristece nesse cenário musical quem se silencia ou não se posiciona, e infelizmente ultimamente todos na cena tem estado meio “apáticos” não só na política, mas em todos os sentidos.

Pior do que isso, somente aqueles artistas que apoiam o Bulbassauro, esses perderam sua essência. O rock, a música e a arte não tem nada a ver com isso e esse cara. A gente tá aqui pra subverter essa lógica excludente.

Pra esse momento, precisamos escutar Rage Against The Machine, The Clash, Dead Kennedys.”

Goldenloki (São Paulo / SP)


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Goldenloki. – Foto: Divulgação

Como você vê o crescimento do Fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo?

Goldenloki: “Vivemos em um momento de instabilidade política e econômica em diversas partes do nosso globo, temperado com conflitos militares e mais recentemente guerras comerciais.

Não é apenas no Brasil que ideias como essa está ganhando força, vimos recentemente diversos episódios de intolerância e violência contra minorias no Estados Unidos e o avanço da extrema direita na Europa. E agora esse perigo assombra o futuro do nosso país.

Creio que todas as pessoas que tiveram aulas de história ou se inteiraram de outra forma a respeito do nazismo e do fascismo sabem que a ascensão dos seus respectivos líderes ao poder se deu em um momento de instabilidade social e econômica em períodos de guerra (coincidência?).

Acho que vivemos em um momento chave na história, precisamos mostrar que aprendemos com os erros do passado (o que não faltam são exemplos) e nesse sentido vejo muitas pessoas coibindo ações de intolerância, tentando conscientizar os seus próximos. Algo que me chamou a atenção nas redes sociais foi a mobilização das mulheres contra a campanha de Jair Bulbassauro, o efeito disso foi impressionante (elas vão salvar nosso país).”

Como enxerga o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições?

Goldenloki: “Enxergamos que cada um faz da forma que acredita ser coerente, não existe muita regra, afinal quem está com o microfone tem a chance de formar opinião.

O que as vezes parece acontecer é um oportunismo barato, como se todas as bandas tivessem que ter uma espécie de ‘Que País É Esse?’ ou gritar ‘Fora Temer’ sem ter um discurso no mínimo afundado, é mais sobre a impressão que causa do que a real sinceridade das palavras. Da pra sentir quando o discurso é da boca pra fora modista e quando é algo embasado.

Um exemplo são as falas da Larissa Conforto durante os shows, sempre com assuntos e argumentos que realmente deixam a maioria dos homens velhos e alguns jovens desconcertados rs. Questão de conversa olho no olho. É importante, principalmente nessas eleições, deixarmos claro que não apoiamos ideias retrógradas que ferem o direito de outros seres humanos e na Goldenloki já deixamos isso claro em alguns shows.”

Moblins (São Paulo / SP)


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Moblins. – Foto: Divulgação

Como você vê o crescimento do Fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo?

Moblins: “É algo muito claro de se ver. Basta prestar atenção no discurso que vem ganhando força para enxergar que é, de fato, um discurso fascista. E intolerância faz parte do fascismo.

Um ótimo termômetro pro fascismo em qualquer época e qualquer país é o texto “Ur-Fascismo” do Umberto Eco:

“O Ur-Fascismo deriva da frustração individual ou social. É por isso que uma das características mais típicas do fascismo histórico foi o apelo a uma classe média frustrada, uma classe que sofre uma crise econômica ou sentimentos de humilhação política, e assustada pela pressão de grupos sociais mais baixos.”.

O fascismo pode ser relativamente difícil de definir mas os sintomas não são:

“O Partido Fascista nasceu gabando-se de que trouxe uma nova ordem revolucionária; mas foi financiado pelos mais conservadores entre os latifundiários que esperavam dele uma contra-revolução.”

O primeiro passo para resistir a este movimento é identifica-lo. E para isso, é preciso se informar, pois em um pais onde “artistas e feministas fomentam a pedofilia”, “nazismo nasceu da esquerda”, “As escolas públicas, universidades e meios de comunicação foram dominados por uma ‘Patrulha ideológica’ de inspiração bolivariana”,

“Fernando Henrique Cardoso (responsável pelo maior programa de privatizações da historia do Brasil) e o multimilionário George Soros patrocinam o comunismo” são pautas que são levadas a sério, há muito trabalho a ser feito ainda.

‘um povo que não conhece a sua história está condenado a repeti-la’ citando Edmund Burke.”

Como enxerga o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições?

Moblins: “Ser artista já é resistir” corre o risco de soar um tanto preguiçoso mas no contexto onde nos encontramos (o crescimento do fascismo no Brasil novamente), desafiar conceitos e unir pessoas, que são requerimentos básicos para qualquer forma de expressão, são noções automaticamente contrárias ao fascismo.

Não é fácil se posicionar como artista com candidatos à presidência do Brasil soltando frases como “Artistas merecem ser fuzilados”. De acordo com Eco, para o fascista “Pensar é uma forma de emasculação. Portanto, a cultura é suspeita na medida em que é identificada com atitudes críticas.

A desconfiança do mundo intelectual sempre foi um sintoma do Ur-Fascismo, da alegação de Goering (‘Quando eu ouço falar de cultura eu alcanço minha arma’) ao uso frequente de expressões como ‘intelectuais degenerados’, ‘Esnobes esbeltos’, ‘as universidades são um ninho de comunistas’. Os intelectuais fascistas estavam engajados principalmente em atacar a cultura moderna e a intelligentsia liberal por ter traído valores tradicionais.”

Não acho que seja uma questão de se posicionar apenas como artista, nem por estar perto das eleições. Precisa ser um exercício contínuo, não só a cada 4 anos. Nós usamos nossa plataforma para fazer e falar o que achamos certo, o que não tem a ver necessariamente com a nossa arte.

É responsabilidade e dever de qualquer pessoa que tem o mínimo de respeito pela democracia e por outros seres humanos, artista ou não, se opor ao fascismo. Se não for com a arte ou a plataforma que ela nos dá, será de outro jeito.”

Theuzitz (Jandira / SP)


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Theuzitz. – Foto: Divulgação

Como você vê o crescimento do Fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo?

Theuzitz: “Existe hoje na verdade um crescimento de impunidade em relação à atos fascistas. As bolhas ideológicas que nós vivemos e que se potencializaram com a internet, tornaram algumas pessoas mais corajosas para serem agressivas com as minorias que elas sempre repudiaram e que ascenderam socialmente na última década.

As novas gerações de brasileirxs não querem viver mais como antes, presos, infelizes, na miséria e hoje batem de frente… é um caminho sem volta. O fascista busca o que é mais puro, uma sociedade pura, mas ele não entende que a verdade não é uma só, que as etnias não são só uma, os gêneros e orientações sexuais também. É uma onda que não vai durar.”

Como enxerga o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições?

Theuzitz: “Nesse momento é essencial. A gente já perdeu muitos direitos em pouquíssimo tempo e a entrada desse governo é a possibilidade de afundar o país em níveis que a gente nem imagina. Eu já expus os meus votos, eu vejo outras pessoas fazendo o mesmo e acho importante que haja a discussão do porque de cada um. Para além do fascista candidato, a gente tem todo um congresso que precisa urgentemente ser renovado e atender as nossas demandas, nos representando efetivamente.”

Ozu (Cotia / SP)


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OZUFoto Por: Mariana Harder

Como você vê o crescimento do Fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo?

Francisco Cabral: “Já aconteceu no Brasil antes com o nome Udenismo. Uma resposta à decepção com um governo progressista. A extrema direita se fortalece oferecendo jargões e soluções simplistas para as situações que a população está cansada. No Brasil isso é particularmente perigoso por temos um parte considerável da elite que é bem escrota e se distancia da população mais pobre, até mesmo pela nossa histórica falta de identidade nacional.”

Como enxerga o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições?

Francisco Cabral: “É importante lembrar que a especialidade do artista é a arte. Assim como todo cidadão ele tem o direito de se expressar mas é importante lembrar que á priori ele não é especialista no assunto. Fazer um paralelo de arte com politica pode ser bem perigoso.

A arte tem essa terrível tendencia de criar ídolos e isso é um erro crasso no desenvolvimento do pensamento politico. Mas é claro que nesse nosso momento o mais importante é #elenao.”

Linna Karo (São Paulo / SP)


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Linna Karo. – Foto Por: Gal Oppido

Como você vê o crescimento do Fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo?

Linna Karo: “O crescimento do fascismo no Brasil na minha opinião é sintoma de uma ausência de direção na esquerda. Sinto que infelizmente o PT contribuiu muito para esse desmantelo, esse confusionismo, essa falta de unidade na esquerda. E agora vivemos um momento desesperado, todo momento de crise é propício para que uma direção fascista tome a frente.

As pessoas aderem à posições desastrosas e perigosas por medo, ficam irracionais. Muita gente de centro se inclina pra direita. E a esquerda dividida. É um momento muito difícil, e que de repente nos encerramos a fazer política no âmbito das eleições, da democracia burguesa. A esquerda só será construída na organização de movimento.”

Como enxerga o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições?
Linna Karo: “O papel do artista é determinante a todo momento, mas nesse momento de eleição significa usar a voz no sentido público, no alcance que o artista tem, inclusive como referência para outras pessoas. Mas sobretudo, sinto que o maior papel do artista nesse momento é tirar a discussão do emburrecimento, das posições chapadas preto no branco, é ampliar o espectro de cores e interpretação da realidade.

Esse de fato é o papel da arte. Ela expressa a complexidade e contradições da vida, das pessoas. E além de trazer esse outro tipo de discernimento, ela estimula a comunicação e potencializa a ação.” 

Heitor Vallim (Santos / SP)


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Heitor Vallim. – Foto: Divulgação

Como você vê o crescimento do Fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo?

Heitor: “Quando há qualquer problema econômico no país, as pessoas ficam desesperadas em busca de alguma resposta e discursos de salvadores da pátria são abraçadas. O fascismo vem do desespero. Vem do medo. Vem quando massas de diversos setores se vêem “prejudicadas” por algo e abraçam uma ideia ou alguém, com esse discurso que vai salvar tudo.

O problema é que quem faz esse discurso geralmente é alguém com viés fascista. O problema é que as pessoas tão mostrando o seu pior lado nessa busca por um salvador. Um cara sem preparo, preconceituoso, racista, esdrúxulo e burro vira uma mudança para as pessoas. Ele representa tudo o que muita gente sempre pensou e só não tinha coragem de falar/fazer, junto ao desespero e ansia por mudança nasce esse bicho horrível. E claro, um povo que conhece o mínimo de história jamais deixaria algo do gênero ganhar voz.”

Como enxerga o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições?

Heitor: “Cada um no seu espectro tem sua necessidade. Eu tenho a minha. Eu acho perigoso. Muito perigoso a ascensão de algo do gênero. E não posso jamais estar do lado ou ser passivo a algo que pode devastar muita gente.”

Bears Witness (São Paulo / SP)


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Bears Witness. – Foto: Divulgação

Como você vê o crescimento do Fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo?

Bears Witness: “Acreditamos que a tendência mundial da ascensão do fascismo está diretamente ligado a última grande crise econômica mundial em 2008, se a gente pegar pra analisar o cenário catastrófico em alguns países como Grécia e Espanha com taxas alarmantes de desemprego, principalmente na população jovem, você nota uma radicalização política e que grande parte da população volta ao conservadorismo/fascismo, já que este por sua natureza populista promete trazer de volta os “belos dias” que estes países viveram.

A situação brasileira, no momento não é muito diferente, já que após as eleições em 2014 e todo o projeto de barrar a governabilidade da ex-presidenta Dilma, nós fomos lançados em uma das piores recessões da história. Este cenário de falta de esperança aliado a criação de um grande inimigo para a nação: “A corrupção”, isto gerou uma grande desconfiança por parte do brasileiro médio em relação ao PT (que mesmo com todas as criticas que podem ser feitas, ainda é o símbolo maior da esquerda brasileira) e a qualquer projeto de esquerda.

Claro que também temos outras particularidades neste cenário, o fato do Brasil ter sido governado por 12 anos pelo mesmo partido gera na população esse sentimento de fazer parte da cruzada contra o “establishment”, se a norma é ser progressista, quem quer se considerar transgressor se volta ao comportamento conservador. (O que é bem patético e contraditório por sí só), neste contexto surgiram figuras bizarras como Danillo Gentilli, ou até o próprio MBL.

Dito isso tudo, é triste demais ver como estivemos perto de grandes avanços em pautas importantes para qualquer um que se considere progressista: direito das mulheres, de toda a comunidade LGBTQI++, descriminalização das drogas e o fim desse modelo falido de “guerra as drogas”. É inaceitável ver uma população enraivecida buscando numa falsa figura messiânica a solução para nossos problemas.”

Como enxerga o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições?

Bears Witness: “Toda forma de arte é um ato político, isso é incontestável. Nós como uma banda de metal, rock temos a obrigação moral de se posicionar contra qualquer pensamento intolerante, fascista. Mesmo que a “norma” atualmente seja a figura do metaleiro “conservador”, o que é extremamente contraditório e ridículo.

É de extrema importância que nós, como artistas, deixemos claro essa linha, mostrar que este comportamento não vai ser tolerado. Se infelizmente, o candidato líder das pesquisas está representando o pensamento da grande maioria da população brasileira, que foi seduzida por este discurso retrógrado. Cabe a nós, que estamos do outro lado do espectro político, deixar claro que nossa frágil e recente democracia não vai ser ameaçada por mais um tirano.”

Porno Massacre (São Paulo / SP)


Porno
Porno Massacre. – Foto Por: Tiago Barbosa

Como você vê o crescimento do Fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo?

Porno Massacre: “Vemos com grande tristeza mas também com grande surpresa essa escalada do pensamento fascista e preconceituoso, principalmente quando vemos essas idéias vindo de uma pessoa que sofre esse preconceito todos os dias. Também é uma vergonha pensarmos que boa parte dessa onda de direita é alimentada por pessoas da mesma geração que a nossa, trinta e tantos anos, que chegamos a pegar um pouco do rock anti censura e ditadura como Garotos Podres, Cólera, Ratos de Porão…

É importante lembrar que essa a direita vem crescendo em vários lugares do mundo, Trump, Duterte na Indonésia, Brexit, Piñera no Chile. Por outro lado os líderes de “esquerda” que mais são lembrados são também os mais absolutistas como Maduro, Kim Jong-un… Talvez seja um momento de acirramento mesmo, só vamos saber depois que a história acontecer, mas quero acreditar que esse momento seja só um soluço da história, nos fazendo relembrar que a qualquer momento podemos cair em extremismos cruéis e desumanos.”

Como enxerga o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições?

Porno Massacre: “Entendemos que arte é algo que nos faz refletir sobre a humanidade, é uma das principais características que nos dá individualidade, personalidade. A manifestação política e ideológica através da arte é fundamental, talvez seja a melhor forma de se comunicar com as pessoas, conscientizá-las. Tivemos grandes exemplos disse durante a ditadura, onde artistas escondiam críticas em letras de músicas para driblar a censura, eram perseguidos, tinham que se exilar para não serem torturados.

Nesse momento entendemos que é importante se posicionar, deixar claro que os valores humanistas são fundamentais para uma sociedade igualitária, sem preconceitos e com liberdade de expressão. Temos que nos posicionar não só nas redes sociais mas também nas apresentações e nas músicas, é muito importante passar isso pra quem está tem vendo / ouvindo. E o mais importante é fazer refletir sobre qual é o nosso papel no atual momento e do que poderemos nos arrepender quando estivermos lendo sobre essa eleição (e suas consequências) nos livros de história! #elenao

Foto feita por Tiago Barbosa num rolê com nome de Antifonda 2018 (eram contra uma festa pátria que estava acontecendo no período). O local se chama 14 de la Fama, localizado na periferia de Santiago, de um coletivo que organiza shows embaixo de um viaduto que ocuparam!!!”

Wabi Sabi (São Paulo / SP)


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Wabi Sabi. – Foto: Divulgação

Como você vê o crescimento do Fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo?

Bárbara Monteiro: “O crescimento da extrema direita e de políticos que são abertamente racistas, machistas e homofóbicos é infelizmente uma tendência global – temos Trump nos EUA, temos Bulbassauro no Brasil. E também há Nigel Farage na Inglaterra e Marine Le Pen na França. Esses políticos não têm vergonha alguma de dar declarações extremamente ofensivas e desrespeitosas, de culpar imigrantes pelas crises econômicas de seus países, achar que as mulheres devem mesmo receber salários menores etc.

Sempre gostei muito de história, política e ciências sociais e, apesar de ser apenas uma jornalista, sem especialização nesses temas, sempre acompanhei a fundo. Me considero bem informada e também tive o privilégio de ter uma ótima educação em boas escolas e faculdades. Nessas aprendi que a história é espiral e que pode mesmo acontecer de alguns movimentos se repetirem.

O que me espanta, no entanto, é esse caráter retrógrado que acompanha a ascensão desse tipo de políticos. Aceitar um discurso racista em pleno ano de 2018 é muito absurdo, mas se eles estão crescendo e de fato conquistando cargos de poder é porque boa parte da sociedade apoia e abraça esse discurso.

Quem vota no Bulbassauro encontra nele um espelho, um semelhante, alguém que compactua das mesmas opiniões. Por isso, me entristece enormemente ver que 30% dos brasileiros pensa dessa forma. A gente já sabia que tinha muito racista aqui. Só que agora eles “saíram do armário” e têm um líder que idolatram.

Cabe aí o paradoxo da intolerância. É importante viver em democracia e respeitar o outro, saber conviver com diferenças. Mas não dá pra tolerar machismo, racismo, homofobia e derivados. Afinal, discurso de ódio não é opinião.

Opinião é você achar Nescau melhor que Toddy. Discurso de ódio é você dizer com todas as letras que quem é gay merece apanhar e aí viver no país que mais mata homossexuais do mundo. Gera violência, gera morte, gera preconceito, prejudica de fato a vida das pessoas. Agora, eu tomar Nescau não faz mal a ninguém. Essa é a diferença.”

Como enxerga o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições?

Bárbara Monteiro: “Não acho que o artista tem de obrigatoriamente se manifestar, muito menos defender ou fazer campanha para um candidato e declarar votos, mas é verdade que a arte reflete a sociedade e o tempo em que se vive – podendo até mesmo ser vanguardista e já olhar pro futuro, estando à frente desse tempo.

Acontece que o silêncio e o ficar em cima do muro já são também uma forma de posicionamento. E quem não se manifesta corta diálogo – ou, pior, parece um traidor, um hipócrita. A Anitta, por exemplo, não tinha obrigação de falar em quem ia votar. Mas tinha a responsabilidade de dialogar com seu público, que é formado majoritariamente por mulheres e homossexuais, em um momento em que a maioria os brasileiros apoia um candidato que é abertamente machista e homofóbico e que representa portanto uma ameaça a esses dois grupos.

As pessoas estão super apreensivas e querem apoio de quem tanto admiram. Aí a ídola vai lá e fica na moita. Dizer que ela não compactua com um candidato como o Bulbassauro já seria o suficiente, ela não precisava declarar voto. Do jeito que agiu, no entanto, deu a entender que votaria justamente no Jair. Natural a frustração e as críticas, portanto. Na hora eu lembrei da Nina Simone e da entrevista em que ela afirma que é dever do artista refletir os tempos. E também tem aquela máxima: quem se cala em situações de opressão fica do lado do opressor. Não tem como a gente não se envolver com política, porque ela norteia nossa vida, nossa sociedade e por fim nossa sobrevivência. E você como artista e pessoa pública vai acabar sendo cobrado pelos fãs em uma situação como essa. Ficar calado e se abster também é uma mensagem – um grande “eu não me importo”. E aí você vira apenas um produto.

Se a Anitta foi rainha da maior parada gay do mundo e depois quis ficar calada sobre um candidato que declara com todas as letras que gay merece apanhar, ela soa contraditória, como se tudo fosse apenas uma jogada de marketing para lucrar, como se ela de fato não se importasse com essas pessoas. É claro que os fãs se sentiram traídos. O artista se posicionar é um ato de responsabilidade e respeito. Com sua obra, sua sociedade e seus fãs.

Quem não se posiciona se abstém e interrompe o diálogo, que é parte fundamental da arte. Arte também é comunicação, afinal de contas. É expressão. Mas vai ver que para alguns não passa de um produto, mesmo. E é aí que mora o perigo – na apropriação indevida. Usar o feminismo apenas pra inglês ver, apenas pra vender, é uma coisa perniciosa. Ninguém deveria levantar uma bandeira se de fato não entende e não apoia aquilo. Não se pode esvaziar um movimento digno e legítimo a favor da igualdade fazendo dele um mero produto. Mesma coisa na luta contra a homofobia. Olha, eu vim do punk e do hardcore. E mesmo dentro desses movimentos, que são tradicionalmente bastante politizados, há muita contradição, gente isentona por pura covardia, muito machismo.

Aquela galera que escuta Dead Fish mas não entende as letras. O que tem de bolsominion no HC, gente. Nos anos 80, o único punk que se posicionava contra a homofobia era o Redson, do Cólera. Ele era visionário e responsável. Uma pessoa coerente, que entendia que não fazia sentido apoiar a liberdade, a anarquia e um mundo melhor sem defender também os homossexuais.

Hoje em dia, rola ainda muito machismo nessa cena. Eu sinto na pele. E são poucos os que não apenas se posicionam, como também de fato agem para melhorar o quadro. Não adianta nada cantar “Respeita as Mina” e depois fazer piadinha machista no grupo de Whatsapp, chamar mulher de louca, forçar a barra pra transar sem camisinha e trair a namorada – e, pior, apoiar um candidato que perpetua cultura de estupro e acha que mulher tem que ganhar menos porque engravida.”

Danger City (São Paulo / SP)


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Danger City. – Foto: Divulgação

Como você vê o crescimento do Fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo?

Pedro Gesualdi: “A crise de 2008 arrebentou todo mundo e a pessoa sem dinheiro tende a querer conservar o seu a todo custo – ainda mais numa cultura individualista como a nossa. Some isso à total desinformação da internet e a gente tem uma coisa bem perigosa. E mesmo sabendo tudo isso, tem hora que é difícil entender como foi chegar num ponto tão extremo de ignorância, fascismo, total desprezo pelos direitos humanos. Tipo, acordei na distopia. E tenho muito medo do que vem a seguir.”

Como enxerga o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições?

Pedro Gesualdi: “Acho que o artista sozinho dificilmente vai mudar a opinião de alguém (talvez a Ivete consiga, não os pobres mortais), mas ele pode fazer parte de uma mobilização que, aí sim, pode fazer a diferença. Acompanhando as redes sociais nos últimos tempos, tenho inclusive percebido uma efetividade maior na luta contra o Capiroto. Acho que se posicionando, a gente até aprende, juntos, a fazer política melhor.

Isso é mais fácil quando o adversário é uma figura abjeta e manipulada como o bicho lá. Quando a questão envolve mais nuance, acho ainda tem espaço pra gente aprender a se posicionar e debater melhor.” 

Máquina Monstro (São Paulo / SP)


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Máquina Monstro. – Foto: Divulgação

Como você vê o crescimento do fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo?

Ricardo Flausino: “O crescimento do fascismo é preocupante. Geralmente linhas de pensamento extremistas ganham força em momentos como o atual, de crise econômica e de insatisfação geral. Nestes momentos cresce o senso comum da busca por “culpados” e, humanos que somos, sempre temos a visão de que culpado é o outro.

Tendo a acreditar que se trata de uma reação às manifestações e posicionamentos de grupos não dominantes na sociedade, tais como os negros, mulheres, comunidade LGBT, organizações de lutas por reforma agrária e demais, que hoje exigem igualdade, aceitação e plenos direitos, incluídos aí os grupos políticos que os apoiam.

A sociedade manteve seus preconceitos sob controle na medida em que tais grupos se mantiveram em relativo silêncio. Uma vez que estes grupos vêm à tona e com força em suas reivindicações, a contrapartida é proporcional.

Some-se a isto a facilidade de manifestações de opiniões e à velocidade das comunicações, que desfavorecem debates e reflexões profundas, levando a reducionismos e, por conseguinte, generalizações culminando nas polarizações de opiniões. Substituímos hoje grandes ensaios por memes e sempre se espera que alguém vá “mitar” e “lacrar” o assunto.

Desta forma, tende-se aos tão propalados “Fla x Flu”, que obscurecem toda a distância a se percorrer entre os extremos. Chega-se ao absurdo de encontramos pessoas defendendo posições com as quais sequer concordam 100%, mas como quem não é Fla, é Flu, não se permitem ponderações.

No fim das contas, para encerrar estas poucas linhas sobre um tema tão complexo, há infinitos outros fatores que influenciam, mas o cerne da questão reside na falta de conhecimento e comunicação entre as partes, prejudicando a criação de empatia e levando a intolerância.”

Como enxerga o papel do artista em se posicionar a poucos dias da eleição?

Ricardo Flausino: “Acho que os artistas devem se posicionar, tal qual todo formador de opinião, sejam eles músicos, blogueiros, jornalistas.

Qualquer um que tenha voz deve falar. Ninguém, cuja opinião tem alcance deve se omitir quando vemos ameaçados direitos básicos seja de quem for, especialmente quando estes direitos chegam a ser tão básicos quanto o mero direito à existência!

Obviamente que esta é uma questão complexa quando se trata de bandas, pois opiniões diferentes precisam ser conciliadas.

Ainda que os pensamentos dos integrantes possam ser convergentes, as maneiras pelas quais cada um sente que deve manifestar, ou não, podem ser bastante distintas. Muitos se manifestam através de sua própria obra, outros através de perfis em suas redes sociais e declarações à imprensa.

No meu caso particular, tenho deixado mais minha obra falar, muito pelo fato de que nós da Máquina Monstro ainda não vivemos exclusivamente da música e eu trabalho em uma empresa de economia mista sobre a qual o governo tem bastante influência e manifestações mais explícitas poderiam tanto me expor quanto causar problemas para a própria instituição.”

Smoners (Paulínia / SP)


Smoners
Smoners. – Foto Por: Eric Alves

Como você vê o crescimento do Fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo?

Eder: “O que vemos hoje no país é um clima de renascimento e fortalecimento dessa intolerância, de uma forma que não se via desde a época da ditadura. De forma mesmo que mambembe, vivíamos uma democracia até pouco tempo, podendo nos expressar livremente, semeando opiniões sem receio.

O pior, sem dúvida, é a tendência de hoje aos comportamentos intolerantes, desrespeitosos e perigosamente fascistas. A grande massa de hoje, infelizmente, não mantém a cabeça ativa, e se acostuma a consumir as imagens simplistas e de manobra dos canais de TV, das mídias sociais e notícias breves e questionáveis. É tudo um grande jogo de manobras políticas, onde temos os mesmos partidos se aliando e se repulsando em diferentes esferas da política.

Em qualquer mídia, qualquer espaço, ficou validada a aceitação da desqualificação, sem qualquer espécie de fundamentação histórica, política e, arrisco dizer, lógica. Achamos mais necessário que nunca promover a discussão a respeito de um tema de tamanha relevância para o país.”

Como enxerga o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições?

Eder: “Entendemos que é um lance de aguçar o senso crítico de quem vai às urnas, gerando reflexão de fato. A banda em si vota e prega o voto nulo, e não somos a favor de eleger a base ou o presidenciável. Somos contra reeleger político com mandato em andamento ou que já tenha entrado e não feito nada.

Acreditamos que o dever do artista, em qualquer época, é proliferar, é aguçar os pensamentos do público, criando questionamentos e buscando respondê-los. Sabemos que, por gerações, ainda seremos um grande celeiro mundial, sob especulações do comércio que dificilmente permitirão nossa liberdade.”

[Selo] Hérnia de Discos (São Paulo / SP)


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Cintia Ferreira com o In Venus. – Foto: Divulgação

Como você vê o crescimento do Fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo?

Cintia Ferreira e Desirée Marantes: “O fascismo do estado sempre existiu. A prova disso é a quantidade de gente preta, pobre, homossexuais e afins que caem todos os dias e nós, classe média não sabemos e talvez nunca saberemos.

O que é preocupante é possivelmente ter esse discurso legitimado. Eles poderão literalmente acabar conosco e a violência será garantida por leis que ainda não sabemos como serão aplicadas. A história é cíclica, mas dessa vez está nebulosa, não conseguimos nos pautar no passado para antever o futuro e a falta de spoiler é que nos trás angústia. A intolerância é reflexo de que nossa sociedade está doente, e isso não exclui nem a nós mesmos.

Quando pensamos em salvar a nossa pele utilizando o “voto útil” como alternativa, nós esquecemos que estamos transferindo a responsabilidade de construir uma sociedade melhor a uma pessoa que não conhecemos e esse é o grande erro.

Claro que o voto antifascista, como eu prefiro chamar, é importante para que não dê poder a violência. Mas precisamos lembrar sempre que “votar no menos pior” nunca deveria ser uma alternativa. E pra mudar isso, a gente precisa falar, discordar, concordar, achar denominadores comuns e principalmente ir pra cima deles como uma grande força popular que podemos ser. Mas isso requer paciência, tempo, organização, dedicação que num país como o nosso, é difícil de ter, pois precisamos trabalhar 16h por dia pra sobreviver. O que vemos é um sistema construído pra foder 90% da população e os outros 10% gozarem pq estão no topo da cadeia.”


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Desirée Marantes. – Foto: Divulgação

Como enxerga o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições?

Cintia Ferreira e Desirée Marantes: “O que nós, responsáveis pela arte independente precisamos fazer é falar mais sobre o assunto, discutir a fundo e não só em época de eleição. A eleição acaba, ficam aí 4 anos pra cerca de 200 eleitos fazerem algo por nós.

Nós não podemos falar sobre política só de 4 em 4 anos. A gente precisa viver política, fazer política, e a arte/cultura tem uma responsabilidade imensa na formação de opinião. A gente PRECISA FAZER MAIS, apenas se posicionar em momento de desespero não faz tanta diferença.”

Lo-Fi (São José dos Campos / SP)


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Lo-Fi. – Foto: Divulgação

Como você vê o crescimento do Fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo?

Thiago: “Não podemos ignorar o fato do Brasil ser um país de educação fraca e sem memória. Ao mesmo tempo tem uma “elite” que não quer perder privilégios vindos lá de trás. O que me assusta mais é as pessoas que mais são prejudicadas por isso, apoiarem. É complexo e difícil de responder, mas não podemos ignorar o fato de que provavelmente, é essa mentalidade que vai governar o país nos próximos anos. A pergunta que temos que fazer é: o que fazer? Como agir?”

Rogerio: “País que não conhece sua história esta condenado a repeti-la, palavras de Eduardo Bueno. Eu estou morrendo de medo, pois isso sempre aconteceu na história do mundo, tempos de escassez extrema de recursos e mudança social necessária freada por uma elite que teme perder seus privilégios; hoje misturada com uma imensa quantidade de informações superficiais espalhadas em mídias sociais, sempre tendenciosas, vazias. Estas, invadindo a cabeça e a mente de pessoas egoístas que só pensam em si e não no futuro de si próprias, da sua família e país.

A saída é estudar muito, ser neutro nas reflexões, pensar como sociedade e não individuo. Não acredito que isso aconteça, pela primeira vez na minha vida não vejo nada de esperança. Pessoas que teriam a capacidade e oportunidade de fazer a diferença viram as costas para a solução em troca de uma viagem pra Disney e uma horrível estadia em Paris. Já que conhecimento e a razão não vão fazer a diferença, torceremos para o amor entrar nas pessoas e que isso  mude um pouquinho delas, sentimento mais forte que conheço na humanidade.”

Marcelo: “Vejo como a maior decadência histórica da nossa nação. É o reflexo da não aceitação: dos mais necessitados, de governos democraticamente eleitos, das mulheres, nos negros, das identidades de gênero, entre outros. Muitos dizem que este não é o problema político do Brasil e sim deveria ser uma preocupação com economia, desemprego, violência e etc. Porém, esta não aceitação parte de vários princípios, sendo uma delas é da manipulação das mídias de massa e de discursos sem embasamento cientifico, teórico ou pratico, um reflexo de uma educação falha.

Com uma educação falha levando a esta não aceitação, temos essa realidade fascista que encontramos hoje e que leva a todos esses problemas que enfrentamos de classe econômica, social, segurança pública, etc. Portanto, pra mim é o puro reflexo de uma educação falha, partindo do principio onde professores são extremamente mal vistos e mal tratados e as estruturas educacionais não auxiliam em nada. Muitas crianças preferem ficar na rua a ir à escola, pois não tem estimulo nenhum – é decadente.”

Como enxerga o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições?

Thiago: “Artista, assim como qualquer pessoa que queira se posicionar tem que ser coerente, não pode chamar os outros de sonegador de impostos e quando o faturamento anual na MEI passar do limite, parar de tirar nota pra não aumentar o imposto, não pode ter esquemão em edital público e nem fazer carteirinha de estudante falsa né. Senão perde a credibilidade.

Mas pra quem não faz essas coisas, eu acho importante o artista se posicionar afinal de contas, muita gente se influencia pelo artista. Para o bem ou para mal.”

Rogerio: “O artista se expressa como quiser, sem obrigação nenhuma, a pessoa como cidadão deve pensar em si e na sociedade em que vive e fazer a diferença, mudar, crescer, o artista é apenas uma pessoa como qualquer outra.”

Marcelo: “A arte ela é a sensibilização do ser humano como essência e tem uma extrema função social pelo fato de trazer características históricas e culturais de uma determinada sociedade. Através da arte a gente pode determinar movimentos de contra cultura em diversos momentos políticos. Se posicionar neste sentido nada mais é do que construir história.

A arte não é neutra politicamente falando, por mais que você toque em barzinhos ou em roda de amigos você está fazendo um movimento político. Por isso que o artista deve ter a plena consciência politica no momento que ele se posiciona e que ele exerce sua arte, pois ela sempre será politica. Em uma situação de crise na qual vivemos, cabe aos artistas mostrarem claramente a sociedade o que realmente está acontecendo aqui para que as pessoas abram os olhos.”

Lucas Adon (São Paulo / SP)


Lucas
Lucas AdonFoto Por: Descasco Abacaxi

Como você vê o crescimento do Fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo?

Lucas Adon: “Vejo de forma preocupante. As pessoas que defendem seus lados com paixão narcísica e vivem em um mundo osgasmicamente impotente cheio de mal amados. Eu acredito vivermos em uma plutocracia e me considero estudante de teorias da conspiração. Na democracia que vai além do voto. Que o fascismo não é apenas um preconceito ou um militarismo para a segurança. É cego e muito perigoso porque move as massas e o coiso personifica isso.”

Como enxerga o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições?

Lucas Adon: “Enquanto refletor de sua época e seu tempo é um dever moral e ético. Se posicionar é existir, a imparcialidade é a indiferença e não dá pra ser indiferente ante a violência e a intolerância que mata.”

Asfixia Social (São Paulo / SP)


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Asfixia SocialFoto: Divulgação

Como você vê o crescimento do Fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo?

Asfixia Social: “O ódio e preconceitos aflorados são reflexo de uma sociedade extremamente desigual, cada mais individualista e que perdeu sua identidade cultural ou sentimento coletivo, e pauta cada vez mais sua vida pelo padrão de consumo americano.

É uma crise cultural, onde falta empatia mesmo, em que os valores não estão no desenvolvimento das pessoas, dos nossos vizinhos, do país em conjunto. Os valores foram subvertidos a uma disputa individual e mesquinha pra ver quem pode mais financeiramente, quem grita mais, quem acessa os melhores lugares e se isola mais do povão, num momento em que as elites se esforçam pra manutenção do que herdamos da escravidão.

E como vivemos no país mais violento do mundo e um dos mais desiguais, essa disputa realmente fica mais violenta e agressiva infelizmente. Estamos vivendo uma crise moral e cultural, num país constituído de imigrantes que deveriam conhecer melhor sua história!”

Como enxerga o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições?

Asfixia Social: “É fundamental se posicionar, estudar as pautas políticas e compartilhar informações pertinentes ao papel da arte na vida das pessoas e na história do mundo. Estamos vivendo uma crise que envolve todo o setor da cultura, em que artistas e população estão sendo excluídos do processo democrático e o investimento no setor tem sido cerceado.

Congelaram os gastos públicos por 20 anos, enquanto nós somos um dos mais ricos países do mundo e essa riqueza está sendo desviada aos grandes bancos pra pagar juros da dívida pública. É inaceitável, e é necessário falar de maneira clara que propositalmente o setor público está sendo fracassado por políticos e corporações que lucram com as mazelas do povo e priorizam a manutenção das regalias das elites. É preciso mudar o quadro político e a forma como lidamos com política no Brasil, e o artista tem papel fundamental nisso como formador de opinião sensível às diferenças de um país tão grande.

É um momento em que o povo tem acesso instantâneo à informação, mas a qualidade dessa informação é questionável em 80% das fontes, e muitas vezes as pessoas repetem mentiras como se fossem verdades, adotando discursos que misturam alhos com bagulhos.

A arte estimula o senso crítico, e é vital que o artista tenha senso crítico e conheça sua história para ajudar seu público a refletir melhor neste momento de predominância da ignorância e ausência de compaixão. Nós acreditamos na arte como forma de vida, do entretenimento à filosofia, mas realmente como ferramenta de transformação e disseminação do (auto) conhecimento!”

Vento (São Paulo / SP)


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Capa do álbum de estreia da Vento, Verde, que está sendo lançado nesta quinta-feira (27).

O fascismo vem nos últimos tempos se aproveitando de mecanismos da comunicação moderna para crescer. Infelizmente, tudo tem um lado negativo, a facilidade de comunicação dos dias de hoje também favorece grupos de extrema-direita, através da internet esses grupos conseguem se organizar para manipular a opinião pública a favor de um candidato que represente eles.

Estamos em um país onde pra grande parte da população a internet se resume ao Facebook e WhatsApp, isso favorece quem faz uso da desinformação e de fake news para atingir seus fins. Pra quem enxerga a internet através de apenas uma rede social e um aplicativo de mensagens, ir em algum site de checagem de fatos para ver a procedência de uma fake news é algo que nem se passa pela cabeça, infelizmente. Dessa forma, agora o fascismo consegue manipular a opinião pública de uma forma que não se consegue apenas com os meios tradicionais de comunicação.

Temos que ter consciência que parte do eleitorado de um candidato fascista se trata de uma parcela desprivilegiada da população que tem meios precários de acesso à informação e acaba enxergando o fascista como uma solução pro país, às vezes acaba enxergando o fascista como uma grande vítima da mídia.

No WhatsApp não chega que o Paulo Guedes falou sobre aumentar o imposto de renda e que em seguida o Bulbassauro falou pra ele ficar quieto, sendo que o Bulbassauro sempre disse que vai “perguntar pro Paulo Guedes”, exemplo de uma notícia que mostra como o candidato, além de fascista, é despreparado para assumir a presidência; mas chega a “notícia” de que a Fátima Bernardes pagou a reforma da casa do homem que deu a facada no Bulbassauro, e que esse cara é do PSOL.

Por causa da desinformação, muitas pessoas não enxergam o fascismo e a incompetência política de Jair Bulbassauro, eu gosto de acreditar que uma parte do eleitorado dele não é necessariamente fascista, apenas estão sendo enganados.

Daí tem um ponto onde é importante o posicionamento político de um artista nesse momento. Os artistas extremamente populares involuntariamente são formadores de opinião. O público desse artista vai parar pra ouvir a opinião dele. Isso pode fazer com que uma pessoa que, por algum motivo que não seja ser fascista, faça uma reflexão e escolha um candidato melhor.

E claro, artistas de maneira alguma devem deixar de se posicionar contra um candidato que considera educação e cultura como gastos e apoia tetos para o investimento nessas áreas, e que também defenda a ditadura militar que tanto atacou e prejudicou a cultura e os artistas do nosso país. Temos nosso papel em fazer o que estiver em nosso alcance para para impedir que tamanho regresso aconteça no nosso país.”

Quasar (São Paulo / SP)


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Quasar Foto Por: Bárbara Martins

Quasar: “Achamos que o posicionamento dos artistas tem que se intensificar nos próximos dias, principalmente por essa eleição ser marcada por uma forte onda de informações falsas e omissões da grande mídia, além disso nosso posicionamento pode iniciar o diálogo entre o público mais jovem, que é maioria no nosso nicho.

Outro ponto que pensamos é manter constantemente o diálogo sobre politica, assim os argumentos vão se solidificando melhor ao longo dos meses.”

Fábio Cardelli (São Paulo / SP)


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Fábio CardelliFoto: Divulgação

Como você vê o crescimento do Fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo?

Fábio Cardelli: “O fascismo é um filhote do medo. Estamos vendo uma indústria do medo com as asinhas de fora, o marketing do medo, a política do medo. “A solução é fazer o outro ter medo de você”. E vejo isso como uma doença na nossa sociedade; o respeito precisa tomar urgentemente o lugar do medo. Com o respeito, a diversidade de pensamento pode existir; mas através do medo, não.

O fascismo busca te alienar do seu próprio poder transformador – obedecer sem questionar – com a sofisticação do século XXI da ilusão de poder criada com as mídias sociais. Cada pessoa da massa de manobra acha que está fazendo a diferença quando tudo o que está fazendo é ser mais um duto no grande esgoto de compartilhamento de whatsapp de ideias de eugenia, desconfiança, ódio.

Se o fascismo falhou em uniformizar o pensamento e espalhar medo nos anos 40 num mundo de 2,5 bilhões de pessoas, não acredito que vai ser agora com 3 vezes mais pessoas no mundo. Estamos numa ressaca da globalização em que a voz dos diferentes começou a incomodar, estamos no meio de uma baita crise de imigração – mas sinto que estamos chegando finalmente num momento que as pessoas que acreditam na tolerância e na diversidade não estão mais tão passivas assistindo à destruição da diversidade. As pessoas estão finalmente acordando para a noção de que é necessário ser intolerante com a intolerância.”

Como enxerga o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições?

Fábio Cardelli: “No geral, acho importante que o artista não fique refém de sua postura política, geralmente os artistas que insistem nesse caminho acabam virando caricaturas, como Roger, Lobão, Tico Santa Cruz, esses posicionamentos rançosos “de esquerda”, “de direita”. O artista tem uma missão por natureza de sublimar a realidade, e sua arte é o caminho ideal.

Muitos artistas se expressaram politicamente de uma forma brilhante através da sua criação; acho que falta pra esses artistas “pseudopolitizados” de hoje largar um pouco a preguiça e o imediatismo das redes, e criar. Olha a elegância de um Childish Gambino, de um Rincon Sapiência, por exemplo; eles podem até se manifestar por fora, mas o discurso artístico sozinho é muito potente e transformador.

Não acho que nenhum artista seja obrigado a se manifestar politicamente, mas acho que eles devem sim lealdade à sua base de fãs, como diz o Pequeno Príncipe “tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas”.

Você tem que conhecer um pouco a “vibe” da massa de gente que você está se comunicando. Não quer dizer que a Anitta tenha que mandar necessariamente um #EleNão mas certamente ela poderia ser uma voz na defesa dos LGBT+, ser mais veemente nesse sentido, porque a vida e integridade deles estará mais ainda sob ameaça dependendo de quem assumir o poder.

Eu entendo a cultura como a vitamina da sociedade; quando ela está presente, muitos não percebem sua existência, mas a falta dela deixa as pessoas doentes. Com os vírus a lógica é mais fácil: o problema é um agente externo maligno e a solução é se fortalecer e eliminar o agente externo. Precisamos pensar menos como vírus e mais como vitamina.”

>>>>>>>Confira Também a Parte 2<<<<<<<<

10 Comments

  • Hoje no Brasil nesse clima político fica até complicado falar de racismo e intolerância, pois nunca vimos uma campanha política tão marcante em todo esse tempo, democracia brasileira é muito nova e acreditamos que muitas pessoas ainda não sabem de fato o que é democracia, liberdade de expressão e etc.
    Se postar sua opinião em uma rede social, logo aparecerão inúmeros haters, isso me faz lembrar o motivo pelo qual Sócrates se suicidou, a Grécia gozava de uma suposta democracia, contudo Sócrates fazia oposição ao governo vigente, o dele sempre expor seu pensamento contrário era motivo de repressão, até que ele disse preferir a morte do que viver na hipocrisia, para Sócrates a democracia grega não estava preparada para lidar com a oposição, então não de todo democrática, nos dias atuais vemos fatos que nos remete a esse pensamento.
    O racismo sempre esteve ligado a momentos de crise, onde procurá-lo um culpado e não a solução para a crise, uma identificado, ou personificado esse culpado ele será perseguido e terá sua cabeça em uma bandeja, o fato dele ser declarado culpado e ser eliminado, não traz solução ao problema, mas une pessoas com pensamentos e ideais compatíveis e essas pessoas unidas se tornam fortes e podem até causar uma guerra mundial, como de fato já ocorreu.
    Acreditamos que a intolerância não tenha apenas crescido no Brasil, mas ela se tornou mais visível, ela sempre esteve dentro dessas pessoas, contudo a internet deu voz aos intolerantes que foram se encontrando, simpatizamos das ideias e criando uma consciência coletiva, hoje de fato temos vários grupos que agem, pensam e sentem da mesma forma, não como um sendo comum, mas como uma consciência coletiva que foi cultivada por meio de redes sociais, que aliás o motivo da rede social seria socializar, mas existe o efeito oposto também e o Brasil encontra-se como um navio sem leme completamente a deriva, pois dois extremos nunca se tocam, assim como os pólos terrestres, nascemos para ser diferentes, nenhum ser humano é igual em todo globo terrestre, conviver com as diferenças seria o principal aprendizado.
    Tivemos longos períodos ditatoriais e somente a partir de 1989, desde 1960 é que passamos a eleger um presidente por voto direto, 1989 foi o ano da queda do muro de Berlim, que antecederia o fim da União Soviética e do comunismo; da morte de três mil manifestantes na Praça Celestial da Paz, em Pequim; do Prêmio Nobel da Paz concedido ao Dalai Lama; e da posse na presidência dos Estados Unidos do primeiro George Bush.
    Não vemos outro motivo a não ser pensar que um povo que clamou e lutou tanto pela democracia hoje implore por intervenção militar esteja completamente acuado, ou não tem conhecimento do que houve de fato.
    Ganhamos liberdade, mas muitos a transformaram em libertinagem, ganhamos o direito de eleger nossos representantes, mas a maioria deles não nos representa mais, a corrupção tomou proporções irreversíveis, a pobreza tornou-se mais evidente, não só pelo crescimento populacional, mas também pela polarização entre pobres e ricos, apenas 1% da população detém mais de 80% de toda a riqueza do País, com tantas frustrações e natural que apareçam líderes políticos querendo se aproveitar do momento, pois todos eles tem o livro de Maquiavel na cabeceira.
    Enfim torcemos para que o brasileiro evolua nesse aspecto, contudo com a crescente depreciação da cultura e da educação pelo poder público, fica difícil imaginar um cenário positivo em curto prazo.

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  • […] já estava presente. Aliás até antes. Embora a consumação do pior viesse a prosperar com as eleições de 2018, desde 2013 o cenário político e as redes sociais inflaram sentimentos como o ódio, o […]

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