Às vésperas das eleições, artistas comentam sobre o avanço do fascismo (Parte 3)

 Às vésperas das eleições, artistas comentam sobre o avanço do fascismo (Parte 3)

Estamos a poucos dias do primeiro turno das eleições onde serão eleitos representantes para assumir os cargos de Presidente, Senador, Governador, Deputado Federal e Deputado Estadual.

Em tempos de polarização política, ou ao menos tentam “criá-la”, é notório o crescimento candidatos trazendo discursos conservadores, outros até contendo racismo, homofobia, misoginia, preconceito religioso, xenofobia, discurso de ódio entre outras atitudes definitivamente reprováveis. Estas que além de irem contra os direitos humanos, ainda estimulam a violência, vão contra os valores morais e a ética.

Um movimento que foi ganhando força nos últimos anos, não só no Brasil mas como no mundo inteiro onde vemos sendo eleitos políticos com um perfil agressivo, xenofóbico, com pautas retrógradas e com atitudes dignas de tirania.

A classe artística por sua vez costuma se manifestar contra atitudes retrógradas e nos últimos dias não foi diferente após assinaram um manifesto coletivo online. Falar que fazer arte é política é chover no molhado porém é necessário lembrar de como a opinião dos artistas sempre teve peso ao longo da história do nosso país. Por isso decidi fazer uma série de entrevistas com artistas de norte a sul do país. Confira a segunda parte.

Confira também a Parte 1
Confira também a Parte 2

Minas Gerais (MG)

Lava Divers (Uberlândia / MG)


Screen Shot 2018-10-02 at 16.07.39
Lava DiversFoto: Divulgação

Joe Porto: “Uma vez, numa reunião de 40 anos de formado do meu pai, conversei com um médico que tinha sido tenente na época do golpe em 64. Ele disse que ele mesmo mal sabia o que estava acontecendo, só recebeu ordens pra exercer presença militar em pontos estratégicos, como hospitais, correios, delegacias… as pessoas entravam pra mandar uma carta pro filho distante, diziam “bom dia” pro homem fardado portando uma metralhadora e seguiam suas vidas comuns.

Eu achei isso muito emblemático, porque mesmo com a presença militar ostensiva, pro cidadão comum às vezes é difícil perceber sinais de que alguma coisa diferente está acontecendo. Vivemos momentos de ocupações militares em favelas sem nenhuma justificativa de segurança (os números da violência no carnaval do rio nesse ano, da ocupação, foram inferiores aos do ano passado), com truculência, com mortes e mortes de inocentes (gente morrendo porque tá com guarda chuva na mão), onde figuras ativas e protagonistas de movimentos sociais são mortos (ativistas políticos e até representantes eleitos democraticamente), de golpes administrativos que nem aconteceram (segundo pareceres oficiais) justificando destituição de presidenta eleita, de restrição aos direitos dos trabalhadores, do crescimento vertiginoso de grupos de ódio e de direita (muitos disfarçados de liberais, outros da direita conservadora mesmo).

Já existe controle de movimentos estudantis e sociais com informantes (como foi evidenciado em declarações auto impugnativas recentes do exército), temos já pessoas boas compactuando com ideias torpes por conta da difusão de ideia de medo (“ninguém está seguro, os criminosos vão tomar o poder”), de vociferar discursos anti-esquerda como se a mesma fosse a responsável pela deterioração moral da política brasileira e inclusive concessões em relação e liberdades individuais, com tolerância a abusos de poder por parte do poder policial por grande parte da população.

Se juntar isso a um sistema prisional em vias de ser privatizado, um sistema eleitoral que vai excluir 4 milhões de eleitores pelo não cadastro biométrico (excluindo grande parte dos votantes mais ao centro/esquerda) e o fato de a chapa vencedora do primeiro turno ser composta por um admirador do Ustra e um general ensandecido, eu acho que temos aí um cenário perfeito pra um regime fascistóide, com tudo o que ele necessita: apoio popular e aparato econômico e burocrático.

O curioso é que isso já é percebido empiricamente justamente pelas minorias, que veem o discurso de ódio como um todo ter picos surpreendentes, entre cidadãos comuns, em notícias diárias e no próprio cotidiano.

A cena alternativa, que tem proporcionalmente uma representatividade maior em relação a essas minorias de direito, sente isso cada vez mais, em relatos ou oportunidades, isso é bem nítido.

No fim, um artista é o agente responsável por desencadear, facilitar ou evocar experiências e sensações em si e no seu público; partindo do pressuposto que qualquer atitude pública é um ato político e que qualquer ser humano é fruto do momento político em que vive, eu não só acho que é esperado, mas que é desejável que o artista traga essa discussão à tona ao seu modo, com a sua visão e a sua honestidade.

Se a arte corrompe, se a arte transforma, se a arte é uma necessidade, que seja ela então uma das nossas armas contra o que pode estar se tornando um retrocesso civil, cultural, social e, ao contrário do que dizem os liberais, econômico.”

Miêta (Belo Horizonte / MG)


fernando yokota 01
Miêta – Foto Por: Fernando Yokota

Como você vê o crescimento do Fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo?

Miêta: “Enxergamos o crescimento do fascismo como um conjunto de anseios de esferas da sociedade que, em momento de crise generalizada, perdeu totalmente suas referências de estabilidade social, de estruturas comportamentais que consideram seguras pra si. E, por isso, se apegam a discursos de ódio simplistas que vão contra tudo que represente pluralidade e ascensão de pessoas e formas de se viver que antes eram invisíveis.

A vida conectada em rede é um canal de construção não só para nós bandas (com outras bandas e produtorxs), mas para esse pessoal também. Quando se percebe parte de um grupo radical que antes parecia estar extinto e que mais gente compõe esse grupo, as pessoas perdem o medo de exporem seus ideais mais conservadores, acreditando na proteção e no respaldo recebido pelo restante do grupo.

Para nós, é triste, deplorável e, em alguns momentos, inevitavelmente apavorante enxergar a propagação de pensamentos e agendas políticas que vão contra nossa existência. Ao mesmo tempo, temos culpa nesse cartório. Passamos muito tempo debatendo o sexo dos anjos e perdemos o foco de que combater o conservadorismo é uma luta diária.

Basta ver que, no Brasil, se antes tínhamos uma polarização “esquerda-direita”, hoje a própria esquerda está polarizada. Ou seja, deixamos esse discurso ganhar ainda mais campo. Mas, ainda que preocupados, não é hora de se desesperar. É hora de repensar mais mil vezes nossas ações e discussões, mantendo a sobriedade, para priorizarmos as estratégias certas no combate ao fascismo de todo dia.”

Como enxerga o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições?

Miêta: “Nós temos que nos posicionar diariamente, não só antes de eleições. Como uma banda com três mulheres, é impossível limitar nossas lutas e posicionamentos a poucos meses e de dois em dois anos. Pelo contrário, ela é diária seja em nossos trabalhos, faculdades, círculo de amizades ou no palco.

Estamos expostas diariamente a opressões, não só em período eleitoral. E se posicionar significa assumir nossa responsabilidade enquanto sujeitos dentro do tecido social. Além de mostrar que sempre é nós por nós. O sangue jorrado de qualquer opressão sempre respinga na gente.” 

Santa Catarina (SC)

Taunting Glaciers (Blumenau / SC)


Murilo Amancio
Taunting Glaciers Foto Por: Murilo Amancio 

Como você vê o crescimento do fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo? 

Roberto de Lucena: “Resultado de séculos de um sistema educacional falho. Um país onde não existe estrutura mínima para os anos de formação da expressiva maioria de nossas crianças, aliado a um conservadorismo seletivo, que atua apenas no cerceamento de liberdades individuais e na manutenção de uma economia truncada que impede o país de se desenvolver nas mais variadas esferas em prol do benefício de uma casta que daqui só extrai e pouco, ou nada, devolve.

Porém é um tanto maniqueísta acreditar que todos que estão nesse “trem”, sabem exatamente o que estão fazendo. Aproveitam-se dessa maciça falta de instrução para manipular uma fatia da população frustrada e que provavelmente sofreu também com uma educação castradora oriunda de uma história de patriarcado e religiosidade cegante. Serão anos de trabalho até um reposicionamento moral que seja mais humano e justo mas é importante continuar o diálogo e aprendermos a simpatizar com a frustração alheia e mostrar caminhos melhores. “Olho por olho e o mundo acabará cego”, como disse uma vez Mahatma Gandhi. O mundo precisa é de mais amor e solidariedade. E bons professores…”

Como enxerga o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições?

Roberto de Lucena: “Importante tal qual qualquer outra pessoa. Temos que parar de idolatrar artistas, celebridades, políticos e começarmos a respeitar e valorizar a voz de todos, enquanto as falas sejam benignas para o desenvolvimento de uma sociedade mais justa, mais plural e mais livre.”

Paraná (PR)

Lia Kapp (Curitiba / PR)


Lia

Lia Kapp – Foto: Divulgação

Como você vê o crescimento do Fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo?

Lia Kapp e Erich Zimmermann: “A história do nosso país já começa com um ato de intolerância. Como todos nós sabemos, os portugueses quiseram acabar com a cultura dos índios, e posteriormente, com a escravidão das pessoas negras, começou aqui o racismo que se instala até hoje.

O fascismo não necessariamente veio crescendo nos últimos tempos. Ele sempre existiu, mas agora tem vias para que ele possa ser expressado, visto que existe uma figura (não diremos quem) que incentiva e fala sobre esses atos abertamente, fazendo com que as pessoas que sempre tiveram esses pensamentos se sintam legitimadas.”

Lia Kapp: Preciso confessar que sinto muito medo da possibilidade do país se tornar uma ditadura ou algo parecido. Eu, como mulher, vejo cada dia mais o machismo sendo escancarado e sinto às vezes que estamos a um passo de perder mais direitos.

Nesse dia 29/09 fui à manifestação contra o Bols*naro aqui em Curitiba e senti um pouco de esperança, pois haviam muitas mulheres e homens também que estavam ali juntos pela mesma causa. Quem sabe consigamos fazer a diferença.”

Como enxerga o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições?

Lia Kapp: Eu acredito que o posicionamento seja importante não só para artistas, mas também para não artistas. É preciso escolher um lado, porque se não escolher serão os outros que o farão por você. Não dá pra se isentar nesse momento da história do nosso país, onde há ameaças reais contra mulheres, negros/as, LGBTs, etc. É claro que não é tão simples e que eu sozinha não irei mudar muita coisa, mas de pouco em pouco a gente consegue ir juntando mais pessoas com posicionamentos parecidos e assim faremos juntos a mudança.

Meu objetivo como artista sempre foi deixar bem claro meus posicionamentos e acolher no meu universo pessoas que também são a favor de que todos tenham uma vida digna com seus respectivos direitos.

Não quero que pessoas homofóbicas, racistas, machistas, que tenham preconceito com nordestinos, entre outras coisas ruins, cheguem perto de mim, porque não é isso que sou, não é isso que defendo. Espero um dia ter visibilidade o suficiente para poder realmente abrir esse debate com muitas pessoas e influenciá-las.

Indo para o outro lado desse assunto de defender uma bandeira, existem também aquelas pessoas que o fazem apenas por dinheiro. No caso dos LGBTs, por exemplo, existe o termo “pink money” que representa isso.

Acho muito feio se vender desse jeito. Nesse caso é melhor não falar nada mesmo. Tudo já é artificial demais, não precisamos de pessoas que pregam coisas que não acreditam de verdade, que são falsas. Precisamos de coisas reais. De pessoas reais fazendo coisas reais e ajudando os outros.”

Erich Zimmermann: “Infelizmente acho que, quanto a nós que ainda somos pequenos, é quase um esforço vão, porque pessoas como a gente costumeiramente vivem dentro de uma bolha. A gente argumenta pra pessoas que já pensam como nós, tentando defender um ponto de vista que já está estabelecido nos nossos círculos sociais, então ficamos presos nisso. Mas se estamos falando de alguém com um apelo mais mainstream, público dedicado, aí tem toda outra jogada, porque se trata de alguém que de fato é um formador de opinião, uma figura influente.” 

São Paulo (SP)

Bolerinho (São Paulo / SP)


Bolerinho - Rebecca Figueiredo
Bolerinho – Foto Por: Rebecca Figueiredo

Como vocês vêem o crescimento do Fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo? 

Bolerinho: “Sentimos que há um medo generalizado resultante de um projeto político e midi ático que insiste em manter os privilégios de um grupo pequeno no país. Por isso há pouca informação sobre como funciona a política de forma acessível, o que colabora para que grande parte da população brasileira siga repetindo frases de efeito que repelem o “desconhecido”.

É super necessário que tentemos dialogar (dentro das possibilidades).

Outro ponto: a internet, nessa parte, tem seus lados bom e ruim, já que os grupos se fortalecem e as pessoas acabam tendo mais coragem de expor suas opiniões, ou de entenderem que elas não são “equivocadas” já que outros também pensam o mesmo.

Por isso o discurso de ódio infelizmente tem reverberado.”

Como enxergam o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições?

Bolerinho: “É fundamental.

Primeiro por nossas condições e escolhas de lutar pelos direitos das mulheres e LGBTQ.

Depois porque temos consciência de que somos privilegiadas no que diz respeito a raça e classe. Queremos que tudo, mas principalmente educação e cultura, que estão em nosso dia a dia, sejam democraticamente distribuídas à população brasileira.”

Skamoondongos (São Paulo / SP)


SKA
SkamoondongosFoto Por: Cacá Diniz (@cacadiniz1)

Como vocês vêem o crescimento do Fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo?

Skamoondongos: “Alguns pontos a serem observados sobre o fascismo no Brasil devem ser colocados em questão antes desta constatação.

Inicialmente devemos entender que a estrutura de poder instalada no Brasil, desde a invasão portuguesa continua sendo a mesma  ainda que por derivações de nomenclaturas nos tempos, o domínio de um minoria classistas, racista e  sectária que advém da  herança colonial e imperial se mantém até os dias de hoje . Sendo assim, devemos entender que  assistimos nos últimos anos uma pequena melhora na quebra deste poder, houve  uma melhora na distribuição de renda e avanços sociais, no combate a miséria, na educação,  no combate  a fome  e o reconhecimento  da falta de oportunidades a maioria pobre do pais, e reconhecer isso  é saber que este modelo de avanço contra as misérias só foi possível através de acordos e concessões com quem detém  este poder.

No entanto, o ultimo capítulo de um modelo político nomeado de democracia gerado no ventre laboratorial do poder sem limites de Brasília no regime militarista com participação do MDB e da arena que nasce envolto em contrapontos desde o voto obrigatório, a chancela do estado para criação de partidos, o financiamento estatal  ou privado, a escolha de candidatados nas legendas sem a participação do povo e por último a legitimação deste modelo eleitoral  com seus candidatos  pelo voto popular  mostrou que este  poder   é  na verdade uma ditadura participativa.

Fato facilmente compreensivo visto que uma presidenta com perto de 55 milhões de votos, leia se aqui a vontade popular de 55 milhões de pessoas foi deposta pelo poder mostrando que a vontade popular neste modelo é um detalhe e não o objetivo concreto da democracia, fato peculiar também em alguns outros pleitos como o de São Paulo (SP) onde João Doria conseguiu se tornar prefeito com minoria de votos frente a maioria em abstenção e nulos e brancos, perto de 4 milhões entre abstenções, brancos e nulos  tendo perto de 3,1 milhões a sua candidatura, isso sem contar os votos populares a outros candidatados. Visto isto no nosso ponto de vista Anarco-Sindicalista, falemos sobre o fascismo a brasileira.

A sociedade brasileira, em particular a classe média tradicional e a elite, carrega fortes sentimentos anti-republicanos e anticonstitucionais, herdados da sucessão de classes dominantes sem conflito e mudança estrutural, sem qualquer alteração substancial de sua posição material e política, perpetuando suas crenças e cultura de Antigo Regime. Privilégios conquistados por herança ou na amizade, contatos pessoais, indicações, nepotismos, fiscalização seletiva e personalista; são todas marcas tradicionais de nossa cultura política.

A lei aqui não tem peso, do mesmo jeito que para nazistas a palavra pessoal era mais importante que a lei. Há um paralelo assustador entre a teoria do fuhrerprinzip (principio da infalibilidade da liderança do nazismo)  e a prática da autoridade coronelista, à revelia da lei escrita, presente no pais. Também por isso tenhamos como a base social do fascismo de antigamente, uma profunda descrença na política e nos políticos.

Cansada de jogar o jogo sujo da política tradicional, das trocas de favores entre empresas e políticos que se fundem dentro do estado, como os repetidos casos de corrupção entre políticos  X políticos, ou políticos X empresas, a classe média tradicional brasileira se ilude com aventuras políticas onde a política parece ausente, como no governo militar ou na tecnocracia de governos de técnicos administrativos neoliberais. Ambos altamente políticos, com sua agenda definida, seus interesses de classe e poder, igualmente corruptos e escusos, mas suficientemente mascarados em discursos apolíticos e propaganda, seja pelo tecnicismo neoliberal ou pelo nacionalismo vazio dos protofascistas de 1964, levando incautos e ingênuos a segui-los como “nova política” messiânica que vai limpar tudo que havia de ruim anteriormente por ela mesmo gerada.

Outro ponto em comum, partes das classes médias tradicionais e a elite tem um ódio acéfalo de comunistas, mesmo sem saber quais as diferenças entre o socialismo e o comunismo, idiotas nomeados de  bastiões intelectuais  da elite brasileira, como tantos que se empilham na mídia, que no Brasil é concessão ou seja mais um braço do estado.

Vomitam ódio de todas as formas sempre associando a um pseudo movimento comunista internacional para subjugar o mundo cristão ocidental. Esse argumento em é o mesmo de Adolf Hitler: o marxismo e o capital financeiro internacional estão combinados para destruir a nação alemã (Mein Kampf, 2001[1925], p. 160, 176 e 181).

A violência fascista, por sua vez, é apresentada na escalada de repressão punitivista e repressora do Estado, o anticomunista está alinhado com o discurso neoliberal mais radical e dos neo pentecostais, que já não têm mais vergonha de expor sua crença no direito natural de governar e dominar os pobres  e o país de forma fascista, deixando o submundo envergonhado da extrema direita para entrar diariamente nos nossos televisores, rádios, internet e redes sociais.

Assim, com uma profunda descrença na política tradicional e no parlamento, somada a um anti-republicanismo dos privilégios de classe e herança, temperados por um anticomunismo acéfalo e irracional sob auspícios de um domínio  social histórico e latente, unificado a uma escalada punitivista alinhada a econômica neoliberal, temos um neofascismo à brasileira que tenta no ódio e na crise econômica profunda se fundamentar. O Brasil vive esta realidade. O estado está morrendo, as classes médias tradicionais e elite estão gradualmente se radicalizando à extrema direita muito mais por uma sensação de declassmént do que por uma proletarização de fato, causada por alguma crise econômica.

Esta sensação vem, não do empobrecimento das classes médias tradicionais, mas por uma ascensão econômica das classes historicamente subalternas. Uma ascensão visível.  Seja quando pobres tem poder de compra, podem e frequentam universidades antes dominada por ricos e branco, ou ainda famílias antes excluídas lotando aeroportos para visitar parentes em toda parte. Esta elite dominante  e antiga classe média cultivaram por tanto tempo a sua pretensa superioridade cultural e evidente superioridade econômica, seu sangue-azul e posição social histórica; a sua situação material foi por tanto tão sem paralelo num dos mais desiguais países do mundo, que a mera percepção de que um anteriormente pobre pode ter hábitos de consumo e culturais similares aos dela, gera um asco e uma rejeição e um ódio tremendo.

Estes setores tradicionais, tão conservadores que são tão elitistas e mal acostumados que são, rejeitam em tal grau as classes historicamente humilhadas e excluídas que ganham através das suas lutas direitos e oportunidades, e fazem com seu ódio escondido atrás de mascaras de juízes, policiais, campanhas de combate a corrupção e ou em defesa de valores que nunca  existiram aflorar todo o ranço elitista que permanecia oculto ou disfarçado em anti-esquerdismo ou em valores familiares conservadores.

Não há mais máscara, a elite e a classe média tradicional estão mais e mais fazendo coro com os históricos setores neofascistas, racistas e pró-ditadura. Elas temem não o seu empobrecimento de fato, mas a perda de sua posição social histórica e de privilégios e no fundo a antiga classe média teme saber  que sempre foi pobre em relação à elite que bajula e que a verticalização da sociedade em avanços a todos irá o fazer trabalhar de forma igualitária, eles sabem que  enquanto houver miseráveis a perder de vista, sua impotência política e vazio social serão suportáveis.”

Como enxerga o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições?

Skamoondongos: “Este papel deve ser de toda sociedade de todos os indivíduos que lutam pela liberdade plena, mas em principal dos artistas que de dentro de sua  forma cultural  tem mais facilidade em divulgar as idéias humanistas, libertárias e evolutivas que  combatem  o fascismo em amplitude. É importantíssimo  tornar límpido que o fascismo não é opinião, nem forma de plano de governo, Fascismo é crime! Não podemos nos esquecer que com o fascismo a mínima chance de diálogo legitima todas as atrocidades já cometidas por eles  com a humanidade.

Reprima, argumente, lute e combata no dia a dia!

Nossa liberdade não cabe nas urnas, mas os fascistas NÃO PASSARAN!”

Recentemente a banda disponibilizou através de um videoclipe uma versão para o hino antifascista “Bella Ciao”.



Gagged (São Carlos / SP) 


Gagged
Gagged – Foto Por: Deivede Leme

Como você vê o crescimento do fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo?

Zeca Ruas: “São muitas as forças impulsionando a intolerância nos dias de hoje. Nem todas são simples e superficiais como podem parecer… Acho que vale a pena destacar duas delas:

Uma primeira segue um movimento é estrutural e mundial. Vivemos hoje com um sentimento difuso de insatisfação e injustiça. Nos é prometido que o esforço e o mérito são caminhos para uma vida. Como a maioria de nós não atinge esse objetivo, vivemos frustrados. Esse sentimento de insuficiência permanente está presente em quase todo o mundo ocidental hoje, onde se vive uma grande crise. A grande maioria das pessoas trabalha duro, mas não se sente realmente justiçada em relação ao seu esforço. O capitalismo promete, mas não entrega por completo. Somente fragmentos. Insatisfação e injustiça são as grandes fontes de raiva, raízes da nossa dor, mas não sabemos como endereça-las. Questionar as estruturas da nossa organização social é, para a maioria de nós, como tirar o próprio chão. É sempre mais fácil imaginar que existe algo ou alguém que atrapalha o funcionamento desta grande máquina e que, uma vez ausentes, será possível acertar o passo e atingir algum tipo de plenitude.

No Brasil, esse processo ganhou contornos intensos nos últimos anos. Vivemos uma crise profunda e as poucas conquistas econômicas do final dos anos 2000 derreteram tão rápido que quase nem parecem ter existido. Brigamos por migalhas, com a sensação de “cada um por si”, do salve-se quem puder.

Por isso, tanto no Brasil como em boa parte do mundo em crise, as respostas mais imediatas para a sensação de insatisfação e injustiça passam pela busca de um inimigo a atacar, como no fascismo. Mate-o e a prosperidade retomará.

Mas, por aqui esse processo se reveste de verde e amarelo. Promovemos o retorno de velhos fantasmas. Ao perceber que a democracia vinha sepultando os candidatos mais conservadores, parte importante dos grandes interesses econômicos, incluindo a grande mídia, e de grupos políticos mais conservadores, como partidos políticos de direita e parte do judiciário, se associaram num projeto de eliminação do Partido dos Trabalhadores, que inequivocamente afundou na mesma lama de corrupção do sistema político brasileiro.

Pra vencer essa batalha as força conservadora atacou ferozmente o conjunto de ideias e valores progressistas ou de esquerda. Atacou-se a solidariedade, o sentimento de coletivo, a corresponsabilidade pelo outro, associando-os à corrupção e à ineficiência. Nessa jornada destrutiva foram convocados todos os demônios, inclusive o anacrônico ódio ao comunismo, típico dos anos 1960 e da Guerra Fria. Primeiro em guetos, e depois a céu aberto, exumou-se o pior do nosso passado, a violência antidemocrática e seus abusos sadistas, e os elevou ao posto de memórias a serem cultuadas.

Se a política e a democracia desfavoreciam nas urnas os partidos de direita, esmerou-se em destruir também os pilares da democracia partidária, já apodrecida pela associação corrupta com os grande interesses econômicos. Dobrou-se a Constituição e a norma jurídica. Transformou-se todo político em corrupto. A política, em si, tornou-se corrupta aos olhos do homem comum. Validou-se a justiça com as próprias mãos. O governo e o Estado, instrumentos do povo e da própria democracia, foram vendidos como indesejáveis… em nome da crença da liberdade econômica e da seleção natural do mercado. Dobra-se a aposta no capitalismo selvagem.

O sentimento de insatisfação e injustiça do nosso tempo histórico exigiam um inimigo. Esse inimigo foi sendo cuidadosamente esculpido por grupos político-econômicos e pela mídia: a esquerda, as minorias, a política, os direitos humanos, o Estado. Sobram o ultra liberalismo, o ódio raso, os fantasmas da Guerra Fria e as assombrações de nosso passado cinza. A intolerância e o irracional revigoram-se em muitos lugares do mundo, mas ganham roupagem especial por aqui.”

Como enxerga o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições?

Zeca Ruas: “O artista deve iluminar as sombras. Deve ser o contraponto, observar a realidade à margem do tempo cronológico, do ritmo da máquina diária. O artista não pode se conformar apenas com o embelezamento estético, em ser trilha sonora quase imperceptível no mundo em decomposição. A grande arte sempre foi uma interpretação da vida. Um instrumento de elevação do espírito, da transformação do homem e suas relações.

Por isso o artista não pode se furtar a assumir posição sobre ideias cruciais de seu tempo… se não puder ser farol, apontar para as necessárias mudanças vindouras, deixará um legado supérfluo, se tornará coadjuvante da história, incapaz de colocar-se como intérprete e transformador da vida.

Em última instância, se não souber que sua arte é um posicionamento, inclusive quando omissa, talvez não possa ser artista com “A” maiúsculo. Pode até ser uma bela engrenagem, um belo enfeite… mas será esquecido tão logo mudar a moda estética que favorece seu “produto”.

Mas as eleições se tornaram espaço de paixões irracionais e nem sempre tomar posicionamento partidário é fácil e inevitável. Muitas vezes é melhor ter o artista como farol, iluminando o futuro, do que submerso numa disputa pelo imediato, pela política vulgar. Não se pode exigir do artista que lute todas as batalhas. Mas ele precisa estar presente nas mais importantes. Nosso atual momento é perigoso… e penso ser indispensável se manifestar, de maneira coerente com o passado e futuro de cada artista, pois os riscos de barbárie que se avizinham com algumas das opções políticas são evidentes.”

Wiseman (São Paulo / SP)


Wiseman_Fabrique
WisemanFoto Por: Carol Folha

Como você vê o crescimento do Fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo?

Thiago: “O Brasil é um país complicado. Nós nunca acertamos as contas com o nosso passado. Não resolvemos de verdade e de uma vez por todas a escravidão, não punimos os torturadores do regime militar (se não me engano, o único país da America do sul que não puniu) e assim por diante.

Em um cenário em que negamos e desconhecemos a própria história, é muito fácil que ele se repita. Parece clichê, mas é a realidade. O discurso é antigo, porém, ele sempre ressurge em tempos de crise com uma roupagem nova.

Eu sempre achei o Brasileiro meio que um cão raivoso preso pela coleira. Depois do golpe, da solidificação das redes sociais como “fontes de notícias”, da bancada da bíblia mais forte do que nunca, a coleira foi solta e agora estamos nessa situação.”

Como enxerga o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições?

Thiago: “Arte é sinônimo de liberdade, é expressão. Não é aceitável neste cenário atual em que o país flerta com um fascismo à brasileira (novamente) que um artista se omita.

Não se trata só de política, se posicionar de maneira contrária a essa onda conservadora (que é violenta e antidemocrática) é questão de ética, moral e de ser humano.

O artista tem uma voz, atinja grandes massas ou pequenos nichos, há um alcance. E neste importante momento, este alcance tem de ser usado!”

Pitaias (São Paulo / SP)


Screen Shot 2018-10-02 at 17.02.19
PitaiasFoto Por: Julia Dolce

Como vocês vêem o crescimento do Fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo?

Pitaias: “É triste porque vemos direitos fundamentais sendo perdidos e sobretudo o respeito entre as pessoas, que deu lugar ao ódio, um ódio desenfreado e sem precedentes, sem razão. Fora isso há um retrocesso nas leis e na sociedade, seja com a reforma trabalhista, onde a classe trabalhadora perde como um todo, com jornadas de trabalho cansativas, grávidas podendo trabalhar em ambientes insalubres, seja na criminalização de movimentos populares, de grupos LGBT’s, de negros e mulheres, que lutam para ter seus direitos garantidos como qualquer outro cidadão.

A partir do momento que se vive numa sociedade que é fomentado o individualismo acho que esse pensamento egoísta e intolerante começa a aparecer.

As pessoas têm muito medo. E não se aceitam como ser humano. Ao se julgar é intolerante ao outro. Pelo lado positivo é que antes tudo era tratado com panos quentes…. Somos um país racista homofóbico e machista.

Sabendo disso temos a oportunidade de mudar.

Agora cabe termos paciência e formas de mostrar a essas pessoas que tudo bem ter escolhas diferentes.

No Brasil, depois de um período de pujança, diminuição drástica da fome no país com o Bolsa Família e tantos outros programas, uma mulher chegar à presidência simbolizou uma conquista histórica. Mas essa mesma mulher, que conseguiu se eleger democraticamente, foi destituída de seu cargo com a desculpa de ter praticado algo que outros presidentes já haviam feito e nem por isso sofreram impeachment. Ela ainda foi dada como “desequilibrada” por vários jornais, coisa que presidentes homens nunca passaram, foi a legitimação do golpe, além de reforçar um tremendo machismo.”

Como enxergam o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições?

É essencial que músicos, artistas, todos se posicionem, porque temos um candidato totalmente despreparado com a maioria das intenções de voto. Um candidato que representa tudo que a gente rechaça, que é homofóbico, racista, machista e que pretende cercear mais ainda os direitos das minorias, que não liga para a cultura, que é conservador e medonho.

Por isso é extremamente importante que o artista se posicione… A arte comunica de diversas formas e nós podemos acessar as pessoas com linguagens que elas dão mais abertura. Plantar sementes…Falar sobre questões sérias de uma forma mais leve.

Nós precisamos continuar com os movimentos do #EleNão, para impedir que ele assuma a presidência e que o fascismo tome mais força e adeptos.

E é lindo ver colegas do meio musical levantando a bandeira contra o fascismo, porque música é isso, é expressão, é o espaço para discutir insatisfações e problemas da sociedade. Fazendo um retrospecto curto, a gente lembra da contracultura, dos músicos do período da ditadura militar, que denunciavam as mazelas de uma época sombria que jamais deve voltar.” 

Molodoys (São Paulo / SP)


Screen Shot 2018-10-20 at 12.38.27
MolodoysFoto Por: Lheka Andrades

Como vocês vêem o crescimento do Fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo?

Leo: “Pois é, mudam-se apenas os nomes, mas a essência é sempre a mesma em qualquer contexto, é aí que as pessoas tem dificuldade pra identificar o discurso fascista, principalmente em tempos de crise, que soa atraente por propor medidas extremas maquiadas de soluções rápidas, mas que se você prestar um pouco de atenção na raíz dos problemas, percebe que essas medidas não fazem o menor sentido.

Além do egoísmo/individualismo e apatia, também acontece de muitas pessoas estarem perdidas, essas infelizmente acabam sendo iludidas e enganadas facilmente pelo discurso fascista.”

Vítor: “Acredito que foi esperado. O fascismo está sempre esperando para se reerguer, e isso se intensifica em momentos de crise socioeconômica e institucional. E como estamos em uma espiral decadente há alguns anos já, e o discurso proto-fascista naturalmente ficou atraente, pois promete um retorno à uma suposta “época melhor”, onde as instituições pareciam mais confiáveis. E, infelizmente, ninguém levou isso à sério como deveria antes, e cá estamos nós.”

Como enxergam o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições?

Leo: “Se posicionar é importante, há uma extrema urgência em derrubar o ressurgimento do fascismo, qualquer ação conta, como artistas e principalmente como cidadãos, nós precisamos de organização e união nesse momento, só espero que não seja tarde demais pra isso.”

Vítor: “Qual papel do artista? Eu sinceramente acredito que, pragmaticamente falando, nessa altura do campeonato que estamos, não há muita diferença para a sociedade e resultados. Mas, acredito que se posicionar é importante.”

Ceano (Campinas / SP)


Screen Shot 2018-10-02 at 17.07.15
CeanoFoto Por: Izadora Nardi

Como você vê o crescimento do fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo?

Ceano: “É preocupante devido ao número de jovens que aderiram a esse movimento. O resultado de duas décadas de governo “de esquerda” deu à luz pessoas que não conheceram o outro lado, o país realmente falido e sem rumo. É irônico que a maioria dos que pedem a volta do Brasil a esse estágio sequer sabe exatamente O QUE eles querem que volte.

Como as ideias de esquerda se encontravam em evidência, a contracultura mudou de lado, e de repente ser “rebelde” e “contra o sistema” é ser conservador de direita, “falar o que pensa”. A banalização do absurdo é tão grande  que um comprovado monstro truculento como Alckmin por exemplo possa ser considerado uma opção “moderada” ao Outro Candidato.”

Como enxerga o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições?

Ceano: “O artista que não se posiciona politicamente não tá fazendo arte, tá fazendo média. É muito importante que artistas (que, sabidamente, podem influenciar toda uma geração de pessoas) se posicionem abertamente principalmente CONTRA o fascismo e ideologias absolutamente desumanizadoras como o racismo, o machismo, a LGBTQ+fobia. Nesses casos não há relativização, não há diálogo com alguém que acredita que sua existência por si só é uma afronta. isso se combate. Todos os dias.” 

Airan O Turco (Piracicaba / SP)


Airan o Turco - Big Mouth
Airan o TurcoFoto Por: BIG MOUTH

Como você vê o crescimento do Fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo?

Airan O Turco: “Eu vejo como resultado das manifestações de 2013, que começaram por vinte centavos mas que, depois, foram apropriadas pelas narrativas da direita. Daí, surgiram MBLs, Bolsonaros etc. Muito disso é culpa do PT, que não apoiou Ciro Gomes nestas eleições, manteve a polarização que desestabilizou o país e quer liberais para o seu governo.”

Como enxerga o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições?

Airan O Turco: “Fundamental. Muitos têm se escondido, outros apoiam fascistas. Temos que dar a cara a tapa contra essa aberração fascista que está aí.”

SURR (Santos / SP) 


Screen Shot 2018-10-03 at 15.52.29
SURRFoto: Divulgação

Como você vê o crescimento do Fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo?

Yuri Costa: “É impressionante que quando se vive uma crise financeira é preciso culpar alguém. E isso acontece em todas as épocas da história mundial.

É quando a gente percebe que alguns sentimentos de ódio estavam apenas guardados e quando falta dinheiro é preciso culpar alguém. E o fascismo é covarde, ele culpa quem ele acredita ser mais fraco do que ele.

Uma das armas do fascismo é a histeria coletiva, quando você está entra nesse processo acredita em qualquer coisa que te falam. Hoje, no Brasil, é em muitos lugares do mundo é isso que se vê… Uma população incapaz de pensar e sentir empatia, pensando apenas na sua certeza e destruição do outro.

É uma vergonha que artistas com alcance mundial não se posicionem contra isso. Já vimos a história uma vez, como formadores de opinião e pessoas públicas é preciso falar porque muita gente sofreu e morre para nós termos a liberdade que temos hoje.”

Como enxerga o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições?

Yuri Costa: “A música sempre teve um papel fundamental na política nacional. Ela foi uma das formas que enfrentamos a ditadura militar nos anos 60. Nos anos 80, a música foi uma arma democrática. Ouvimos Cazuza pedindo que o Brasil mostrasse sua cara, Renato Russo falando que gostava de meninos e meninas…

Estávamos no caminho onde a música ajuda a criar uma sociedade mais tolerante e reflexiva. Infelizmente, isso se perdeu nos últimos anos, principalmente no rock e pop. Este papel de questionamento político hoje é feito, sempre de forma incrível pelo rap.

Chegamos em 2018… E “o fascismo é fascinante, deixa a gente ignorante fascinada””

Limonge (São Paulo / SP)


Limonge Divulgação
LimongeFoto: Divulgação

Como você vê o crescimento do Fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo?

Renato Limonge: “É assustador ver tanta gente que você considera “sã” que, de repente, aparece apoiando o #elenão, disseminando atitudes e pensamentos fascistas, misóginos, extremistas e preconceituosos sem ter a menor noção do impacto disso. O que mais dói é que eles não entendem esse discurso de ódio como algo nocivo, ancorados no antipetismo, e no “deus” acima de todos (que belo deus esse hein) qualquer um que aparece falando um A sobre esse imbecil vira inimigo número um, vagabundo, ladrão, cúmplice do Lula, merecedor de todo tipo de ofensa maluca e justificativa pro Brasil acima de tudo… virou um culto, esse cara conseguiu se tornar um semideus de ignorantes (já vimos essa história antes).

Não dá pra não lutar contra, isso só mostra que o racismo e a intolerância não diminuíram em nada nos últimos tempos, apesar de tantos esforços, as pessoas se calaram mas o pensamento não mudou, agora tudo que tava represado voltou apoiado por um candidato a presidência. É questão de sobrevivência (da democracia e de grande parte da população, e até de quem inclusive vota nele) lutar contra isso com todas as forças possíveis.”

Como enxerga o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições?

Renato Limonge: “Acho essencial… o artista querendo ou não se transforma em uma vitrine, consegue fazer com que o público que o admira pense e repense. O questionamento faz parte da arte, a opinião também. Se um posicionamento contrário a esse cara conseguir fazer com que um eleitor mude de opinião e entenda quão nocivo um governo Bolsocoisa pode ser, já terá valido a pena.

Não é momento de ter medo de “perder fãs” (como já vi alguns dizendo), mas de fazer desse país um lugar melhor.” 

Ceará (CE) 

Mad Monkees (Fortaleza / CE) 


Mad Monkees - Raphael Villar
Mad MonkeesFoto Por: Raphael Villar

Como você vê o crescimento do Fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo?

Mad Monkees: “Enxergamos com perplexidade, como boa parte dos cidadãos com alguma humanidade dentro de si. Infelizmente é uma tendência mundial e no Brasil, não seria diferente. É muito oportuno um discurso populista, após uma crise tão agravada como estamos enfrentando.

Nós achamos inadmissível qualquer pessoa, sendo de qualquer parte da sociedade, qualquer ser humano querer descriminar, retaliar, violentar qualquer outra pessoa pelo motivo que for! Por isso nossa posição sempre foi e sempre será ao lado dos menos privilegiados, buscamos igualdade como principal bandeira. Só assim caminharemos pro caminho da real liberdade.

O papel dos políticos deveria ser criar um ambiente de discussão e inserção do povo entre as decisões, mas infelizmente na república das bananas o poder vive pra gerar mais poder. Temos muito receio que o avanço do candidato líder, se conclua em uma eleição, gerando assim uma espécie de carta-branca pra o cidadão que se diz “de bem” tenha uma espécie de carta-branca pra despejar mais violência que certamente cairá dentre os que mais sofrem com a violência e o preconceito: mulheres, negros, pobres, homossexuais.”

Como enxerga o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições?

Mad Monkees: “Achamos fundamental! A democracia está ai pra isso e todos podem se manifestar como quiserem, embora hoje grande parte dos eleitores querem um candidato que é a favor de calar os contrários na porrada.

Nossa obrigação com as pessoas que curtem nosso som é de conscientizar, chamar atenção para as coisas, a arte é isso! Nossas letras têm isso bem inserido, como os lucros em cima de guerras ou fundamentalismos religiosos.

Hoje, poucos dias antes da eleição se vê uma pá de gente falando muita coisa, inclusive gente se aproveitando disso, como marcas com suas propagandas nos intervalos de debates na tv, querendo pegar o gancho e trazendo a atenção pra seus produtos. Esses escrotos não cansam de se aproveitar do caos.

Nós como Mad Monkees sempre estaremos a favor do mais fraco, e se esse mais fraco se tornar mais forte e pisar no outro, nós o cobraremos. Somos a favor da democracia e da liberdade principalmente.” 

Old Books Room (Fortaleza / CE) 


Screen Shot 2018-10-02 at 17.29.26
Old Books RoomFoto: Divulgação

Como você vê o crescimento do Fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo?

Reinaldo Ferreira: “Acho que todo tipo de discurso que chega em momentos de crise e que fala diretamente com o povo que se sente angustiado, sem esperança, e com raiva das dificuldades enfrentadas, e  que faz promessas, que estabelece os culpados, que tira parte dessa culpa também do próprio povo, é um discurso que atrai. Mas sobretudo, é um discurso mentiroso. Ele não assume responsabilidades, que se alimenta dos nossos sentimentos ruins, e acima de tudo, é um discurso altamente perigoso.

Já vimos isso se repetir em diversas partes do mundo, em diversos momentos históricos diferentes, mesmo agora, após ao crescimento absurdo das tecnologias e facilidade para se obter informação. Precisamos manter a calma, acreditar no poder do dialogo como a forma mais viável para quebrar essa intolerância que nos separa. A lucidez ainda é a única saída pra tudo isso.”

Como enxerga o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições?

Reinaldo Ferreira: “Ao meu ver, a arte sempre foi libertária, em todos os seus mais lindos sentidos. Sempre lutamos pela quebra de paradigmas, preconceitos, pensamentos. A arte também foi construída no campo de batalha.  O artista deve SIM se manifestar, faz parte do seu papel também. Principalmente em momentos como este, se omitir agora, é consentir com o futuro sombrio depois.”

Rio de Janeiro (RJ) 

Drápula (Niterói / RJ) 


drapula
DrápulaFoto: Divulgação

Como você vê o crescimento do Fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo?  

Pinx: “Particularmente, creio que isso seja fruto de uma sociedade que ainda engatinha na era digital. A internet estimula o encontro de pessoas com ideais similares, para o bem e para o mal. Isso foi ótimo pra unir e fortalecer grupos e pautas sociais progressistas tornando o combate ao machismo, racismo, lgbtqfobia (e muitos mais) cada vez mais presente e indispensável no imaginário conceitual do cidadão brasileiro.

Ao mesmo tempo, esse contexto também promove o encontro de pensamentos opostos. Partindo da liberdade estimulada pelo caráter anônimo das pessoas dentro da internet, perdeu-se a vergonha de se defender coisas absurdas publicamente. É embasbacante como o número de terraplanistas assumidos só aumenta (substitua ‘terraplanistas’ por qualquer grupo de ideias bizarras). Expandiu-se a conversa tanto para pautas progressistas quanto retrógradas. Só que é muito mais difícil convencer alguém conservador de que coisas muito bem estabelecidas pra ela precisam ser completamente mudadas.

O fato de muito da discussão política tomar espaço no Facebook, polariza os “lados” cada vez mais porque não existe mais diálogo saudável na internet. Os algoritmos te direcionam para falar mais e mais com pessoas que pensam igual a você e quando surge alguém que pense diferente, debate vira briga. Devo constatar o óbvio de que a briga começa em função da falta de empatia de alguém sem vergonha de defender publicamente alguma pauta absurdamente retrógrada.”

Como enxerga o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições?

Pinx: “Tudo tem teor político. Escolhas artísticas tem teor político, mesmo que não seja óbvio ou até mesmo pensado. Ser direto ou não a respeito da posição política é intrínseco à proposta artística da banda. No meu caso, eu enxergo arte como sutilezas empilhadas uma em cima da outra. Para outros artistas o discurso abertamente político é essencial. A política é um dos aspectos que estão no meu trabalho, mas que entra em cena sutilmente, permeando outros temas. As músicas do Drápula não são imediatamente identificadas como políticas, mas são as minhas visões sobre o que me cerca e dessa forma meu pensamento se transfere pra música.

Estamos num contexto em que provavelmente terá o segundo turno mais polarizado de todos os tempos com Haddad vs Boçal. Pessoalmente não gostaria que o PT voltasse ao poder, mas Bolsonaro é o grande representante de toda a intolerância unida à ignorância que alimenta o racismo, lgbtqfobia, machismo, violência e mais ignorância. Ser contra esse cara deveria ser óbvio, mas infelizmente ele lidera as pesquisas. Então penso nas consequências reais de se posicionar claramente contra ele. Receio virar aquele meme de gente que não vota nele, querendo convencer pessoas que já não votam nele a não votar nele. Quem não vota concorda e continua não votando.

Quem vota pode “panhar ranço” e quebrar o diálogo com esse artista que eventualmente poderia plantar “sementinhas de empatia”. Quem está em cima do muro não vai mudar de ideia pelo simples posicionamento do artista, ou pelo menos não deveria. Acho que o convencimento parte do esclarecimento. Mas isso tudo que eu disse pode cair por terra, uma vez que as falhas, mentiras, canalhices e crimes comprovados do candidato se transformam e argumentos positivos para seus eleitores.

Afe, muito complicado isso.”

Banheiro Azul (Mesquita / RJ)


Banheiro Azul
Banheiro AzulFoto: Divulgação

Como você vê o crescimento do Fascismo e o reflexo da intolerância generalizada no momento em que estamos vivendo? 

Banheiro Azul: “Vemos com muito receio. Estamos numa posição vulnerável: somos de esquerda, de uma cidade de subúrbio, onde as minorias são ainda mais oprimidas.

Mais do que a liberdade de expressão, o fascismo vai refletir numa total desarticulação da música independente, que tem por vocação dialogar com a sociedade e falar das contradições do seu entorno. Perderemos a razão de ser ao perdermos nossas vozes.”

Como enxerga o papel do artista em se posicionar a poucos dias das eleições?

Banheiro Azul: “O artista deve se expressar sempre. Sob o risco de viver dias de censura e medo então… é obrigação do artista entender o sentido do seu tempo e o nosso tempo agora clama por união e mobilização contra as forças do atraso.

Se o mercado já sufoca a voz da música independente, imagina o mercado enamorado com um governo ditador e antidemocrático. Temos que colocar a boca no trombone!”

Confira também a Parte 1
Confira também a Parte 2

3 Comments

Leave a Reply

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

error: O conteúdo está protegido!!