As lendas urbanas e as conspirações sempre estiveram presentes no universo do rock. Ainda mais quando a banda tem como maior inspiração o Black Sabbath que sempre trouxe à tona ocultismo, escuridão e controvérsias.
O disco Book of Bob, primeiro trabalho full-length da banda, segundo seus integrantes conta a história do famoso caso do “Menino Diabo do ABC”. Para quem não conhece é uma série de matérias publicadas pelo jornal paulista Notícias Populares na década de 70.
Para ficar ainda mais obscuro eles trouxeram referências do problemático cotidiano brasileiro, ocultismo e cultura popular. A ideia partiu de contar a trajetória de Beelze Bob, uma figura pitoresca e digamos assim: passivo agressivo feito um caprino chapado. Sua história é narrada de seu nascimento, sob circunstâncias macabras, até sua mítica batalha final contra Zé do Caixão no Nordeste.
O grupo formado em 2013 conta em sua linha de frente com Lucas Guanaes (Voz/Baixo), Fernando Giunti (Voz/Guitarra), Paulo Silveira (Guitarra) e Rodrigo Rousseaux (Bateria). Suas influências não se restringem apenas ao stoner rock e trazem elementos do sludge, doom, hardcore e até mesmo da psicodelia.
Não é por acaso que o álbum passa por momentos entre a turbolência e a calmaria, traz a energia dos pedais de fuzz, e propõe alternâncias de tempo. Segundo Paulo a temática pelas lendas urbanas veio justamente da curiosidade pela história do Diabo do ABC paulista.
“Tem uns anos que nos deparamos com a matéria. Se eu não me engano o Giunti e o Guanaes, quando estudavam juntos, toparam com ela e acharam massa a ideia do capeta ter nascido no ABC. Pela tosqueira e daí fomos pesquisar a fundo. Nisso encontramos todas as matérias e um doc que contava a saga do menino diabo e outras lendas urbanas.”, comenta o guitarrista
Sobre a ideia de misturar com filmes de terror para eles foi algo bastante natural.
“A gente tinha interesse por filmes B e isso inclui os filmes do Zé do caixão. A partir da pesquisa sobre ele, descobrimos essas matérias do Notícias Populares dele perseguindo o menino diabo. Então a partir disso a gente foi mais a fundo e descobriu toda a história por trás e o documentário.”, complementa Giunti
“Eu vejo como uma questão de aproximação temática e estética. Quando você ouve alguma coisa clássica de metal, presta atenção nas letras e vê a imagem das bandas, percebe que o “lado negro” tá sempre ali. O rock nasce do blues, com caras tipo o Robert Johnson falando abertamente sobre vender a alma pro capeta, e o metal já começa com o Sabbath, cujo próprio nome da banda faz referência a um filme do Boris Karloff.
A temática obscura e extrema tá sempre ali, lado a lado nas artes plásticas, no cinema e na música, e isso tudo sempre despertou muito interesse em todos nós. Uma particularidade de qualquer extremo, é que ela tá sempre a um passo do ridículo. Na nossa concepção, isso é maravilhoso.
Quando você tenta fazer uma obra de arte profundamente assustadora e aquilo vira uma comédia, você gera todo um novo conceito. Boa parte da cacetada de filme B de terror que a gente assiste passeia nessa linha tênue, e é nessa linha que a gente gosta de estar. E nós não somos pioneiros.
O pioneirismo brasileiro do horror-tosquice pertence ao cinema. Quando você assiste “à meia noite levarei sua alma”, e vê o Zé do Caixão dando discursos bizarros com aquelas unhas escrotas, é quase impossível não ter algum tipo de reação.
A gente cresceu influenciado por isso; nosso senso de humor e nossa música são indissociáveis, e foram moldados por esse absurdismo todo, de cinema giallo a Hermes & Renato.
Quanto ao conceito do álbum, ele nasce como quase todas as nossas ideias: de falação de merda. A gente sempre comentava sobre aquele jornal dos anos 70, o Notícias Populares, que era um tabloide sanguinolento que vivia de fake news antes desse termo existir. Era a hiper-realidade em forma de jornal, que mostrava só o lado mais brutal, obscuro e caótico da realidade brasileira.
Um dia, falando sobre toda a saga do Menino Diabo, a história desse jornal sobre o suposto anticristo que nasceu em Santo André (No ABC paulista), nossa ideia imediata foi: “A gente precisa escrever sobre isso”. E “isso” virou um álbum conceitual. Em cima de um conceito idiota, mas ainda assim um álbum conceitual.
O notícias populares e o menino-diabo sintetizam toda a percepção sobre nosso som. Sórdido, esquisito, distorcido, e misturando a estética setentista com esse cinismo da pós-modernidade.”, enaltece Guanaes, baixista da Bears Witness
Antes do disco ser lançado eles passaram 5 anos tocando nos mais diversos lugares, de pequenas casas de show em São Paulo, passando pelo interior a festivais como o Simplão de Tudo.
Além disso tiveram a oportunidade de tocar ao lado de nomes que tem despontado dentro do cenário de Stoner / Doom nacional como Cassandra, Projeto Trator, Cattarse e Son Of A Witch.
Nos programas do Hits Perdidos na Mutante Radio inclusive chegamos a tocar algumas vezes os singles “The Sentry” e “66” que antecedem Book of Bob que está sendo lançado hoje através do selo independente carioca Abraxas Records.
O disco conceitual não poderia começar de outra forma que não fosse com uma vinheta, “Dawn”, de aproximadamente 30 segundos trazendo trechos do documentário sobre o bebê-diabo do ABC paulista. A ambiência sonora da trilha ao fundo inclusive traz recursos utilizados em filmes B.
“Harbinger” já começa apocalíptica, com acordes ásperos, linhas de baixo chapadas e logo acelera de maneira progressiva com suas guitarras – e insanidade.
Após sua introdução já conseguimos notar a influência de sludge e hardcore que irá agradar tanto a fãs de Uncle Acid & the Deadbeats como de Fu Manchu. É o prenúncio de que o caos está sendo instaurado pela presença do pequeno tinhoso.
A seguinte, “Machine”, já traz a veia psicodélica de encontro com o skate punk e stoner rock. Ou seja, se você gostar de The Shrine, essa é a pedida. Sua jornada pela escuridão e causando desordem é relatada. O anticristo age sozinho e não perdoa. O destaque fica para os solos de guitarra e as linhas de baixo pulsante.
O cruzamento entre o metal e o punk ganha contornos em “Omen” que consegue aliar o peso as melodias na guitarra, os berros típicos do post-hardcore, e a fúria de bandas como Slayer. Até por isso ela é acelerada e vê as chamas do inferno eclodindo.
Uma das influências de seus primeiros dias é notável em “Mephistopolis”, a do Black Flag. Que poucos sabem mas foi uma banda que começou hardcore, experimentou do peso do metal e até jazz em certo momento de sua trajetória se aventurou. Já a canção cita até Sodoma e Gomorra – e toda a odisseia dos “caídos do céu”. Folclórico é pouco.
Além disso tem tempo para solos derretidos, delays e experimentações em seu instrumental. O que faz o contraste entre o acelerado e o lisérgico.
“66” é uma velha conhecida dos fãs mas não teria porque deixar de fora já que é digna de uma epopeia. O lado Sleep é aflorado e sua contemplação da espaço para que o capeta assuma o comendo desta rota sinuosa e cheia de armadilhas.
O demônio faz a festa saindo do ABC com destino ao interior e baixada paulista. A condução da canção que passa por seus diversos momentos é o que chama atenção e definitivamente é a faixa para acender aquele cigarrinho (ou melhor dizendo, o bong).
Até o fim da vida de um pequeno tinhoso merece uma canção, as trevas vem buscar em “Seal”. Ela começa lenta e psicodélica mostrando que eles também conseguem variar entre o pesado e o ritmado. É um velório instrumental e uma longa estrada até as profundezas do sete pele.
Eles aproveitam para experimentar e o resultado é interessante pois conseguem fazer um passeio através de todas as suas influências e fechar o trabalho com sua assinatura própria.
O primeiro álbum da Bears Witness, Book of Bob, surpreende de forma positiva pois sintetiza a evolução sonora do quarteto ao longo dos últimos cinco anos. Se antes oficialmente eles só haviam lançado duas canções, agora se sentem seguros em disponibilizar seu conceitual – e tinhoso – primeiro álbum.
Trazendo referências dos filmes b’s, terror, ocultismo, lendas urbanas e criando todo um cenário caótico que reverencia até mesmo o mestre Zé do Caixão. Já em sua sonoridade podemos encontrar uma mistura entre stoner rock, doom, hardcore, psicodelia e até mesmo o skate punk.
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