Canções inéditas da peça “Avenida Paulista, da Consolação ao Paraíso” viram álbum de vanguarda

 Canções inéditas da peça “Avenida Paulista, da Consolação ao Paraíso” viram álbum de vanguarda

Peça de Felipe Hirsch vira álbum musical lançado pelo selo RISCO. – Foto Por: Helena Wolfenson

Com produção musical de Maria Beraldo, e lançamento pelo selo RISCO, o disco com as canções da peça “Avenida Paulista, da Consolação ao Paraíso”, de Felipe Hirsch, reúne 26 faixas compostas e interpretada por grandes nomes contemporâneos da música brasileira

Um projeto que reuniu uma gama de músicos da música brasileira de diferentes gerações, origens, estilos e territórios se consolidou por meio de um grupo de WhatsApp. É o que comentou Felipe Hirsch, diretor da peça Avenida Paulista, da Consolação ao Paraíso, que nesta sexta-feira (18) ganha um álbum com 26 canções inéditas.

A peça, atualmente em cartaz, tem duração de três horas. Já o disco, com uma hora de duração, reúne composições e interpretações de um grande elenco. O que os une? As experiências com a primeira avenida asfaltada da América Latina, entre dores, encontros, desencontros, movimentos e as incongruências de um local originalmente construído para abrigar os casarões dos barões do café. A avenida foi projetada por um uruguaio que dá nome a uma rua da região: Joaquim Eugênio de Lima.

Inaugurada em 1891, com 2,8km de extensão e 18 quarteirões, A Avenida Paulista abriga a Casa das Rosas, Museu de Artes de São Paulo (MASP), Itaú Cultural, Japan House, além de shoppings, gravadoras, estações de rádios e centenas de empresas.

Palco de manifestações, festas, diversão e modernidade, ela abraça uma diversidade que se traduz nos versos das composições presentes ao longo do disco.

Arnaldo Antunes, por exemplo, assume papel de Camelô em sua participação no álbum — mais precisamente na faixa “Onde eu não vou”, parceria com Gui Calzavara —, onde narra suas percepções e faz críticas à disparidade de acessos, sob o olhar de alguém que batalha pelo pão de cada dia.


avenida paulista - álbum - peça de Felipe Hirsch - Foto Por Helena Wolfenson
Peça de Felipe Hirsch vira álbum musical lançado pelo selo RISCO. – Foto Por: Helena Wolfenson

Quem participa do álbum “Avenida Paulista, da Consolação ao Paraíso”?

Com exceção de “Buraco da Consolação”, de Jards Macalé e Tim Bernardes — interpretada Veronica Valenttino e Marat Lyra —, a maioria das composições do disco é interpretada pelos próprios autores.

O que chama a atenção é quantas cidades e vivências o álbum consegue abarcar: do olhar de quem nasceu em São Paulo ao de quem veio de longe tentar uma vida melhor. Reunindo da MPB, rap, funk paulista, vanguarda e o experimentalismo, o disco apresenta faixas como a incômoda “Vidro transparente”, interpretada por Nuno Ramos e Marat Descartes. Vai da vanguarda de Maurício Pereira ao funk de fluxo de DJ K, traduzindo o movimento — e os ruídos — da cidade.

As canções foram arranjadas e produzidas por Maria Beraldo que ano passado lançou Colinho também pelo selo RISCO. A parceria entre Maria e Hirsch já vem de longa data. Tudo começou quando o diretor montou para a peça uma banda singular que toca ao vivo durante toda a temporada.

“Reconheço nesse momento de São Paulo uma geração incontornável, extraordinária mesmo, criando discos inspirados, um atrás do outro, na terra da Lira de Itamar e Arrigo, na cidade de Racionais e Mutantes, de Walter Franco, Tom Zé e da Tropicália, de e Tatit, e tantas outras constelações.

Reunir quase duas dezenas desses artistas em uma criação coletiva sobre a Avenida Paulista é uma conjunção única. São encontros assim que reafirmam a cidade como Haroldo de Campos a cantou: multivária, multitudinária cidade.”, afirma Felipe Hirsch


avenida paulista - Capa do álbum por Bruno Senise
Capa do álbum por Bruno Senise.

Como aconteceu o desenrolar do projeto?

O primeiro encontro do grupo de compositores aconteceu no palco do teatro do SESI-SP, numa reunião com a direção da peça. Em seguida, seguiram trocando ideias em um grupo de WhatsApp, onde cada compositor enviaria uma canção feita especialmente para o espetáculo. Mas a toada de interações foi crescendo — e o repertório também. Canções foram enviadas por áudio de celular, geralmente apenas com violão e voz.

“Era para cada um enviar uma música sobre sua relação particular com a Avenida Paulista, mas muitos enviaram três, quatro canções.”, conta Hirsch.

A banda base reúne artistas de diferentes backgrounds, que se revezam entre os instrumentos, atuam na peça e cantam. A formação conta com Negro Leo, Thalin, Lello Bezerra, Heloísa Alvino, Fábio Sá, Julia Toledo e Gui Calzavara.

Ao todo, eles produziram 36 músicas. No fim, 26 entraram na montagem, justamente para caber dentro da peça com 3 horas de duração. O disco, por sua vez, é duplo e tem 1 hora de duração.

E a produção do disco?

Em janeiro, enquanto a réplica do edifício Conjunto Nacional (cenário da peça por Daniela Thomas) era montada no palco do SESI Av. Paulista, Maria Beraldo reuniu a banda em estúdio e gravou 22 das 26 canções do espetáculo em sessões ao vivo, recebendo os compositores para cantarem suas obras.

As outras 4 faixas — de DJ K; do quinteto de Maria Esmeralda; de Os Fita; e um remix de “Famozin” (Dupla 02) por Os Fita — foram produzidas fora do núcleo da banda, mas também fazem parte do espetáculo e completam a edição final do álbum.

A mixagem e as paisagens sonoras do disco são assinadas por Os Fita, colaboradores frequentes de Hirsch.

“Chegou um momento, enquanto estávamos criando a peça, que aquele conjunto de músicas, aquele encontro de pessoas, foi virando algo tão grande, como um tsunami que se erguia na nossa frente, que o Felipe virou pra mim — quase fatalista, mas muito entusiasmado — e disse: ‘vamos ter que gravar isso tudo. E antes de estrear a peça.”, conta Maria Beraldo que assina a direção musical

“São 26 músicas, 35 pessoas pra entrar em estúdio… pensei que era uma loucura, em tão pouco tempo. Hoje sei que a loucura seria não ter registrado essa preciosidade que caiu em nossas mãos.”, lembra o diretor artístico, Felipe Hirsch

A Peça Avenida Paulista, da Consolação ao Paraíso

Avenida Paulista, da Consolação ao Paraíso estreou em fevereiro de 2024, no Teatro do SESI-SP. A montagem propõe uma travessia sensível pela principal avenida de São Paulo, que surge como metáfora viva da cidade e de suas contradições.

Durante um evento que aconteceu no Porão da Casa de Francisca na terça-feira (15), Felipe Hirsch fez comentários pertinentes sobre o momento marcado pelo lançamento do disco. Lembrou o quão histórico foi o show do Sex Pistols em Londres, que teve apenas 40 presentes, mas que anos depois “todo mundo dizia que estava lá”.

“Temos muito poucas gravações de composições inéditas para teatro gravadas em disco nesse país. Muito pouco. Muitas gerações viveram com os discos clássicos do Chico Buarque, claro que existe, mas são poucos perante o que se produz no Brasil. Se cria muita coisa, inclusive para teatro, originais, mas não chegam num disco, não se têm acesso a isso.

E quando a gente começou esse trabalho, tivemos esse sonho maluco de reunir tanta gente que admirávamos. Podia reunir muito mais porque o que está acontecendo nessa cidade é fenomenal, mas a gente conseguiu reunir essas pessoas – e fizemos um grupo. O que está acontecendo hoje é uma realização que começamos naquele momento conversando com aquelas pessoas que compõe o projeto.”, comentou Felipe durante a audição

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