Crumb destaca a beleza da introspecção em meio a curvas psicodélicas no aniversário do Cine Joia
Da última vez que pude assistir Lila Ramani (guitarra e vocal), Bri Aronow (sintetizadores, teclados e saxofone), Jesse Brotter (baixo) e Jonathan Gilad (bateria), também conhecido como Crumb, durante o Balaclava Fest, posso dizer que olhei para o lado do copo mais vazio. Não foi um bom show, longe disso.
Claro que nunca sabemos as circunstâncias que alguns shows acontecem. Turnês tendem a serem exaustivas, muitas vezes os integrantes ficam doentes ou não conseguem ter uma boa noite de sono. Basta lembrar o Dinosaur Jr. na edição deste ano do mesmo festival. A verdade é que a empolgação pela primeira vinda ao país de um quarteto estadunidense presente nas playlists mais chill das plataformas de streaming, não foi justificada. O show pareceu mecânico e até mesmo ainda cru, principalmente pela postura no palco.
No show do último sábado (23), em produção conjunta da Áldeia Produções em parceria com o Cine Joia, casa de shows que comemorava sua semana de aniversário com shows do The Vaccines, DJ Koco + DJ Tamenpi, Crumb e Lianne La Havas, eles conseguiram de certa forma equilibrar o placar do jogo. Mesmo que ainda falte algum tempero ali, como diria o chef francês Érick Jacquin.
Os integrantes do Crumb, grupo formado Boston, se conheceram ainda na Tufts University, e hoje em dia estão baseados no Brooklyn, em Nova Iorque. Em maio eles lançaram seu terceiro álbum de estúdio AMAMA e embora o próprio show não deixe mentir… as canções do segundo disco, Ice Melt, ainda tem um espaço sagrado no coração os fãs. Afinal de contas, um hit atmosférico e imerso na psicodelia, como “Trophy”, que inclusive ficou para um pouco antes do BIS, não se produz todos os dias.
O show da PLUMA
Quem ficou responsável pela abertura do show foi a banda PLUMA que não teve o melhor som. Donos de um dos discos mais legais do indie brasileiro em 2024, sinto que escolheram utilizar arranjos que se adequassem a proposta mais minimalista e introspectiva dos estrangeiros. Desta forma construindo uma narrativa para a noite que viria.
Uma PLUMA mais calma, imersiva e até mesmo utilizando menos espaço do grande palco do Cine Joia. Algo bem diferente do disco pulsante eletrônico, de certa forma, proporcionando um anticlímax em meio a expectativa da explosão dançante habitual. Quero ver ainda um show completo desse novo disco com tudo nos trinques.
A Introspecção do Crumb
Tímidos, os integrantes do Crumb sobem e se posicionam no palco ao som de “Shahdaroba”, do Roy Orbinson. Escolhem o lead single do mais recente disco, AMAMA, para abrir, mas o show vai pegar no breu mesmo em “(Alone In) Brussels”. Pouco antes, a vocalista Lila, ensaia falar algumas palavras em português. Os esfeitos e microfonações são tantos que a voz sai até um pouco engraçada quando ela tenta falar no idioma local.
Fato é que a frágil voz da vocalista, que fala super baixo, teve justamente que ter um tratamento especial. Seu microfone estava inclusive mais alto que todos os outros instrumentos para dar aquele contrabalanceamento. Com atmosfera chill, ora psicodelica, ora jazzy, ora pop, os elementos vão se somando para criar uma colcha de retalhos e ambiências.
Fico até pensando que talvez um teatro seria o local mais propício para um show repleto de delays, teclas e experimentações. Embora, tudo fique mais legal nos momentos de pequenas explosões, seja com programações no pad, sopros de Bri, que se multiplica no palco, e o grande entrosamento entre a tecladista e o baixista Jesse.
Dos pontos altos, inclusive, estão quando Lila assume os sintetizadores e brinca de transgredir, como se estivesse discotecando e mixando ao vivo. Com direito a distorção de uma turntable.
A verdade é que o equilíbrio entre as harmonias e o baixo que dá a liga e cria todas as camadas sonoras presentes no som. Muitas músicas acabam emendando uma na outra, feito um grande emaranhado, o que faz com que muitos dos presentes não notem isso.
Da calmaria as pequenas explosões
Pouco antes do BIS, Lila que uma hora pega a guitarra e em outra tenta se comunicar com o público de forma tímida, pergunta: “Como vocês estão?”, em português. Mesmo com poucos momentos de explosão sonora, a música, que pode até mesmo ser trilha de consultório, como também servir para criar um clima durante um jantar a dois, cresce nestes momentos de alternância de vibes. Entre solos mais profundos, imersos na calmaria, e dissonâncias do sax, cirurgicamente calculadas, eles mostram um pouco mais sobre a versatilidade do quarteto.
Crumb (@crumbtheband) fechando o show em São Paulo – @Cine_Joia pic.twitter.com/9MT2z4rfJn
— Hits Perdidos (@HitsPerdidos) November 24, 2024
No BIS, bastante curto, já se aproximando dos 80 minutos de show, eles escolhem fechar com “Part III”, bastante celebrada pelos presentes. O grande hit do grupo, “Locket”, promove o maior momento de êxtase coletivo por parte de um público muito jovem ainda na casa dos 20.
É bem verdade que o setlist protocolar da turnê em que as 20 músicas se repetem sempre: tiram qualquer fator surpresa do show. Ainda torcendo para assistir a uma apresentação do Crumb quando tiverem um repertório mais abrangente, ainda tudo soa muito parecido e com soluções sonoras previsíveis. Quem sabe quando o quarto disco for lançado eles alcancem esse patamar no repertório.
Setlist Crumb @ Cine Joia – 22/11/2024
AMAMA
Cracking
(Alone In) Brussels
The Bug
Balloon
Nightly News
From Outside A Window Sill
BNR
Genie
Ice Melt
Ghostride
Dust Bunny
Retreat!
Side By Side
Crushxd
Nina
XXX
Trophy
Encore:
Part III
Locket