Mark Arm (Mudhoney) desabafa: “Gostaria de não ter que escrever sobre lutar contra os fascistas”

 Mark Arm (Mudhoney) desabafa: “Gostaria de não ter que escrever sobre lutar contra os fascistas”

Mudhoney retorna ao Brasil para uma série de shows. – Foto Por: Emily Rieman

Dos nomes mais celebrados da cena Grunge, de Seattle, o Mudhoney desembarca mais uma vez no Brasil para uma série de shows em São Paulo (21/03), Rio de Janeiro (22/03) e Belo Horizonte (23/03). Ao lado de grupos como Nirvana, Soundgarden, Pearl Jam e Alice in Chains, eles ganharam relevância ainda no final dos anos 80.

O show de São Paulo acontece em uma sexta-feira, 21/03 acontece no Cine Joia, em mais uma produção da Maraty, com a abertura dos brasileiros da Apnea, quarteto que conta com o baterista Boka, do Ratos de Porão, com um som influenciado pela música dos anos 70 e 90, mesclando grunge, heavy metal e stoner rock.

Em atividade desde 1988, eles contam com 12 álbuns de estúdio, sendo o mais recente Plastic Eternity (2023). Neste ano os norte-americanos também completam 24 anos da primeira vinda ao país quando tocaram até mesmo no festival Rec Beat, em Recife (PE). O reencontro com os fãs brasileiros acontece após 11 anos da última vinda quando se apresentaram no Sub Pop Fest ao lado de nomes como Metz e Obits.

Tivemos a oportunidade de conversar com o vocalista e guitarrista Mike Arm para saber mais detalhes sobre a discografia e retorno as turnês.


Mudhoney - Mike Arm show 2025 no Brasil


Entrevista: Mike Arm (Mudhoney)

Mudhoney é uma banda que já excursionou exaustivamente pelo Brasil. Vocês já fizeram 29 shows em 12 cidades diferentes de 2001 a 2014. Alguns desses lugares, a grande maioria dos artistas que vem pra cá não chegam nem perto. Mas já fazem 11 anos desde a última turnê. O que vocês esperam dessa próxima passagem?

Mark Arm: “Eu não sei o que espero. Eu desejo que as pessoas que forem ao nosso show estejam tão entusiasmadas quanto as que foram das últimas vezes! O público brasileiro sempre foi incrível conosco e sempre é muito divertido tocar aí.”

Dessa vez vocês estão viajando para promover Plastic Eternity, seu último disco, e o primeiro lançado no pós pandemia. Na primeira vez que escutei o disco, a primeira estrofe da primeira música, “Souvenir of my Trip”, já ficou na minha cabeça (Todos me dizem que é legal me ter de volta / Eu não posso dizer que sei exatamente onde estou / Todos parecem os mesmos / Ainda assim, sei que tudo mudou). Como é voltar para esses lugares que vocês conhecem tão bem depois desse período difícil?

Mark Arm: “Agora já chegamos num ponto que é mais do mesmo, já que voltamos a excursionar em 2022. Todos tivemos Covid durante a nossa primeira turnê americana. Nós estávamos tentando ser o mais cuidadosos possíveis e não teve jeito.

Uma das melhores coisas dessas viagens é ir para uma cidade onde nós temos amigos e nós conseguimos passar tempo com eles. Nós não pudemos fazer isso por duas turnês, foi péssimo, muito estressante. Foi um trabalho duro e angustiante no início. Não foi exatamente muito divertido, mas as últimas turnês têm sido maravilhosas de novo.”

Algo que me impressionou bastante nesse disco é o quão psicodélico ele é. A junção das camadas de guitarras distorcidas com percussão, sintetizadores e instrumentos novos para a banda, achei os arranjos muito interessantes. Quais foram as inspirações de vocês?

Mark Arm: Foram várias coisas diferentes. Nós temos um poço gigante de influências das quais nós bebemos. A maior parte das vezes nós escrevemos algo e depois de ouvir pensamos: “Ah, isso lembra artista X”.

Por exemplo, a música “Almost Everything” tem um riff de baixo e uma linha de bateria com a qual trabalhamos desde a época do Vanishing Point (2013). Levamos quase dez anos para finalizar porque não conseguimos completar nada naquela época, mas eu nunca apaguei as demos do meu gravador porque eu gostava muito do sentimento da música.

Uma vez que finalizamos ela para esse último disco, nós notamos que parecia muito algo saído do disco Escalator do Sam Gopal Band. Quem toca guitarra nesse disco é o Lemmy Kilmister, antes de formar o Motorhead. É um disco bem psicodélico do fim dos anos 60, muito bom.

O próprio Sam Gopal nasceu na Índia oriental e toca tablas. Não tem bateria no disco. Então é meio que por isso que nós adicionamos os bongos em “Plastic Eternity”, como uma maneira de homenagear aquele disco. E também soa legal pra caramba.”

Voltando no tempo para o início da banda, seu primeiro disco Superfuzz Bigmuff (1988) foi nomeado em homenagem a dois pedais de guitarra. A guitarra sempre foi um instrumento muito importante para a banda. Eu sei que você tocava o Super Fuzz e o Steve Turner usava o Big Muff. Como vocês abordaram a criação das guitarras desse disco e porque nomear segundo esses dois pedais?

Mark Arm: “Vou ser bem sincero, eu não me lembro claramente. Faz mais de 35 anos desde que gravamos esse disco. Na prática nós apenas escrevemos as músicas que queríamos ouvir! Se me lembro bem o nome do disco veio do Steve. Ele falou que basicamente o nosso som poderia ser resumido a esses dois pedais. Isso era praticamente tudo que nós usávamos. As distorções e um Wah-Wah.”

Você ainda tem esse Super Fuzz?

Mark Arm: Na verdade não. Esse pedal parou de funcionar provavelmente antes até de gravarmos o Every Good Boy Deserves Fudge (1991). Mas eu recentemente comprei um Super Fuzz da Strömer.

Åke Strömer é um construtor de pedais de Nova Iorque e eu gosto muito do trabalho dele. Ele conseguiu um Big Muff que pertenceu a Sonny Sharrock. Alguém tinha esse pedal e levou para ele consertar. Dessa forma ele conseguiu olhar para o circuito e construir o seu próprio clone do Big Muff baseado no de Sonny Sharrock. E eu tenho esse clone também. Tanto o Super Fuzz quanto o Big Muff dele soam muito bem. Eu usei alguns outros pedais de distorção similares, mas eu nunca consegui fazê-los soar alto o suficiente com os outros pedais sem gerar muito ruído ao mesmo tempo. Mas esses da Strömer tem sido os melhores pra mim. Eu comprei pouco depois de gravar o Plastic Eternity e tenho usado desde então.”

Você mencionou “Every Good Boy Deserves Fudge” que junto com “Superfuzz Bigmuff” forma a dupla de obras primas do Mudhoney segundo críticos e boa parte dos fãs. Mas vocês têm um vasto catálogo além desses discos. Para você, tem algum disco da banda que merecia mais atenção?

Mark Arm: “Eu não saberia dizer. Eu não presto tanta atenção ao que as pessoas falam sobre os nossos discos. Se eu tivesse que dizer um, talvez o Tomorrow Hit Today (1998). Faz bastante tempo que não tocamos nada desse disco, mas recentemente nós temos ensaiado três músicas dele para serem tocadas nas próximas turnês.

Esse sempre foi um disco que eu gostei muito, mas nós temos mais de 35 anos de músicas para escolher quando vamos montar o setlist de um show, ele estava meio esquecido.”

Tomorrow Hit Today foi o terceiro último disco que vocês lançaram pela Reprise Records. Todos os outros discos da banda foram lançados pela Sub Pop.

Mark Arm: “Na verdade, acho que podemos considerar quatro discos pela Reprise se você contar com o Five Dollar Bob’s Mock Cooter Stew (1993), que por algum motivo é considerado um EP por muita gente, mas eu considero um álbum! Mas de fato, no fim das contas, esse período da Reprise Records foi um breve desvio.”

Eu sou fascinado por esse período da banda porque ele aconteceu durante um período muito turbulento para o Grunge como um todo, que foi do auge de sua popularidade até a morte de Kurt Cobain e a posterior desvalorização do gênero. Durante um período tão pesado, como foi continuar com a banda unida e seguir lançando músicas?

Mark Arm: “Eu acho que nós faríamos exatamente o que fizemos com ou sem a coisa do Grunge, sabe?

Mesmo que esse movimento gigante não tivesse acontecido, ainda seríamos essa banda de Seattle tentando lançar nossas músicas.

Provavelmente não teríamos tanta atenção do público, mas nós também nunca tivemos um holofote gigante em cima de nós, o que é um alívio. Eu acredito que nós ainda assim seguiríamos tocando, mesmo que tivéssemos trabalhos em tempo integral com coisas que não são da música. Então seguir tocando nesse período era a única coisa que conseguíamos fazer.”

Depois da Reprise, vocês voltaram para a Sub Pop. Eu sei que você trabalha na Sub Pop também, não é verdade?

Mark Arm: “Sim, na verdade eu estou falando com você do galpão da Sub Pop agora mesmo.”

Isso só mostra o quanto a sua história e a do Mudhoney estão intimamente ligadas a história da Sub Pop, não é mesmo? Como esse relacionamento segue em 2025?

Mark Arm: “Para mim é surpreendente ainda estarmos aqui depois de tanto tempo!”

A Sub Pop se tornou um dos maiores selos independentes do mundo, com artistas gigantes no seu catálogo. Como é o seu relacionamento com os outros artistas do selo?

Mark Arm: Depende de que artistas você está falando. O catálogo é tão grande que tem vários artistas que eu não conheço pessoalmente. Somos muito próximos das pessoas do Obits, do Hot Snakes e do Pissed Jeans, por exemplo. São bandas com as quais temos muita afinidade.”

Algo que me chamou atenção foi descobrir que o nome Mudhoney veio de um filme do Russ Meyer. Qual a influência do cinema e de outras formas de arte na banda?

Mark Arm: “Tem tantos trabalhos disponíveis por aí que acabam te influenciando de uma forma ou de outra, seja algo que você acha incrível e acaba se inspirando ou coisas negativas, das quais você quer se distanciar. E assim como na música, provavelmente cerca de 85% dos filmes que assisti na vida são terríveis. Mas eventualmente você acha algo incrível que muda sua cabeça.”

Acho interessante esse paralelo entre Mudhoney e Russ Meyer. Ele era um cineasta bastante transgressor, de certa forma um punk também.

Mark Arm: Acho que ele já era velho demais quando o punk surgiu. Ele era mesmo era um velho bem tarado (risos). Mas sim, ele é alguém que nos influenciou bastante. E é como eu falei anteriormente. Nós fazemos as nossas músicas e eventualmente pensamos: “nossa, isso me lembra muito tal trabalho”.

Por exemplo, em Plastic Eternity, na faixa “Tom Herman’s Hermits”, não tem nada que seja diretamente tirado de uma música do Pere Ubu, mas tem uma sensação que parece muito com a banda, na minha opinião.”

Você sempre foi, além de vocalista, um dos guitarristas do Mudhoney. Mas em discos como The Lucky Ones (2008) e Vanishing Point (2013) houveram músicas que você apenas cantou, sem a guitarra. Como foi o processo de focar apenas na voz para esses discos?

Mark Arm: “De fato, em The Lucky Ones eu não toquei nada de guitarra. No Vanishing Point e no Digital Garbage (2018) eu toquei apenas em algumas músicas, mas nos outros discos eu toco em todas as músicas. Mas na maior parte das vezes as letras são o ponto que une tudo, o que transforma um riff em uma canção.

Quando fizemos The Lucky Ones eu propositalmente sugeri que deixasse a guitarra de lado e focasse na voz. Eu então fiquei tentando achar coisas novas, linhas de voz, além das palavras de fato das músicas. Foi uma abordagem fora do comum para a nossa banda. Normalmente nós gravamos o instrumental como uma jam e depois eu escuto e tento criar algo.”

Eu li em uma entrevista da época do Vanishing Point que você passou por um tipo de bloqueio criativo porque todas as suas letras são histórias e você não queria se repetir. Já faz mais de dez anos do lançamento desse disco e vocês lançaram muito material desde então. Como você tem se sentido quanto a isso nos discos mais recentes?

Mark Arm: Eu não sei se estou me repetindo ou não. Os dois últimos discos com certeza foram um reflexo bem direto do que está acontecendo nos Estados Unidos e no mundo e eu não gosto disso.

Mas eu venho de um mundo do punk rock onde nós temos uma urgência para denunciar a realidade. Eu com certeza preferiria viver em tempos onde tudo é calmo e pacífico. Talvez escrever músicas sobre estar na praia, tomando daiquiris…”

Ao invés de ter que escrever uma música como “Flush the Fascists”, que está em Plastic Eternity

Mark Arm: “Exatamente. Eu gosto bastante da instrumentação dessa música, mas eu gostaria de não ter que escrever sobre lutar contra os fascistas.”

E isso sempre esteve no DNA da banda. Desde o início vocês denunciam injustiças e lutam contra o conservadorismo. No seu primeiro disco vocês fizeram um cover de “Hate the Police”, uma música super pesada sobre violência policial, da banda The Dicks, que era uma das únicas bandas do hardcore a ter um frontman abertamente gay…

Mark Arm: “Nós crescemos com o Hardcore. Crescemos ouvindo Crass e Discharge, dentre outras bandas muito políticas. Really Red era uma das minhas favoritas, para mim uma das bandas de hardcore mais conscientes politicamente. E é isso né? A sociedade, cara… A sociedade.”

Para encerrar, posso afirmar que o público brasileiro está muito empolgado para a volta do Mudhoney ao nosso país. Dessa vez a turnê ficará pelo sudeste, mas vocês já passaram por quase todas as regiões do país..

Mark Arm: “Isso me lembra de um dos shows mais malucos que fizemos no Brasil, em 2001 no Recife. A turnê se encerrou nesse show e foi logo no início do carnaval. Acho que foi literalmente um dia antes do carnaval.

Nosso show foi parte de um festival que estava acontecendo em uma praça muito bonita da cidade. Não sei se você está familiarizado com o conceito de “World Music”, que é como os americanos tendem a chamar as músicas de gêneros locais do mundo todo. Nesse festival eram só artistas brasileiros, tocando estilos brasileiros e naquele momento nós éramos o “World Music” (risos).”

Nota do Editor: Em 2001, o Mudhoney se apresentou na 6º edição do festival Rec Beat no mesmo dia que as bandas Faces do Subúrbio (Recife), Via Sat (Recife), Eddie (Recife), Salvador (Recife) e A Revoltosa (Recife). Sempre eclético por seu DNA, naquela mesa edição bandas como Cordel do Fogo Encantado (Arcoverde, PE), Textículos de Mary (Recife), Wado (Maceió), Devotos (Recife), Funk Como Le Gusta (São Paulo), Otto (Recife), Zeca Baleiro (São Luís, MA) e Bidê ou Balde (Porto Alegre) se apresentaram ao longo dos outros dias.

Você tem alguma mensagem para o público brasileiro?

Mark Arm: Apenas estou muito animado e emocionado de voltar ao Brasil. Espero ver o máximo de pessoas por aí em Março!”


Mudhoney 2025 - foto por Emily Rieman - Mike Arm e cachorros
Mudhoney retorna ao Brasil para série de shows. – Foto Por: Emily Rieman

SERVIÇO MUDHONEY NO BRASIL

MUDHONEY EM SÃO PAULO/2025

Data: 21 de março de 2025 (sexta-feira)
Local: Cine Joia
Endereço: Praça Carlos Gomes, 82 – Liberdade, São Paulo – SP
Ingressos:
Pista
R$ 180,00 (meio entrada estudante), R$ 200,00 promocional – mediante doação de 1kg de alimento, 1º lote) e R$ 360,00 (inteira, 1º lote)

Camarote
280,00 (meio entrada estudante), R$ 300,00 promocional – mediante doação de 1kg de alimento, 1º lote) e R$ 560,00 (inteira, 1º lote)

Venda on-line: https://fastix.com.br/events/mudhoney

MUDHONEY NO RIO DE JANEIRO

Data: 22 de março de 2025 (sábado)
Venda on-line: https://www.eventim.com.br/artist/circo-voador/mudhoney-no-circo-voador-3747504/

MUDHONEY EM BELO HORIZONTE

Data: 23 de março de 2025 (domingo)
Venda on-line: https://www.sympla.com.br/produtor/quente

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