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Supervão passa a limpo o passado mirando o futuro em “Amores e Vícios da Geração Nostalgia”

Supervão evoca a geração nostalgia para uma pistinha indie 30+

Às vezes a gente esquece sobre a nossa relação com o tempo. Sentimento esse que a música do Pato Fu, “O Tempo”, capta com perfeição. Pude conhecer a Supervão, ainda em meados de 2016, época do Lua Degradê, e logo depois na mini-turnê do TMJT (2017), pude assisti-los ao vivo em uma casa no centro de São Paulo.

De lá para cá muita coisa aconteceu, de no ano seguinte este que voz escreve teve a oportunidade de compor o time de curadoria do Natura Musical. E, neste momento, fui para a banca avaliadora de mais de 2300 projetos de todo o Brasil com uma jaqueta com o patch do agora quarteto que comprei naquele show. Por uma dessas coincidências da vida, o projeto acabou sendo selecionado no edital.

Por mais que meus colegas de banca depois disseram que passei uma mensagem subliminar, feito uma clássica propaganda de cigarros pós-anos 90, acabou que Faz Party (2019), álbum de estreia dos gaúchos de São Leopoldo, foi lançado pela plataforma de fomento.

Anos depois encontrei a equipe de marketing da Natura e eles me disseram “aqueles emos da Supervão eram as pessoas mais legais de todo edital daquele ano”. Tentei até explicar que não eram emos (mas talvez eles sejam sim).

Assim como muitos artistas, na pandemia as coisas ficaram esquisitas, e muitas dúvidas pairavam no ar. Eles chegaram a lançar durante esses dois anos o EP Depois do Fim do Mundo (2020) e entre 2021 e 2022, uma série de singles experimentais que iam da energia das raves digitais, passando por uma imersão e experimentação eletrônica a até mesmo o trap. Quando tudo dava a entender que o projeto ia encerrar as atividades de vez, o “por que continuar fazendo música os salvou”.

O novo registro marca também a entrada de Olimpio Machado, no baixo, e Rafaela Both, na bateria. Entre as influências diretas ele citam The Strokes, The Smiths, El Mató a un Policía Motorizado, Men I Trust e Happy Mondays.


Supervão em sua atual formação. – Foto Por: Sara Tavares

Supervão Amores e Vícios da Geração Nostalgia

Cabelo“, composta em 2017, acabou não fazendo parte, de Faz Party (2019). Mas no momento em que estavam cogitando jogar tudo para o alto devido ao sentimento de desconexão com as raízes musicais, a canção serviu como motivação para todo um novo ciclo.

No processo de olhar para a estrutura da faixa, eles trouxeram para a nova versão influências de shoegaze e grunge. O que os motivou a convidar Andrio Maquenzi, ex-vocalista da cultuada banda dos anos 2000, Superguidis, para participar.

Cabelo explora temas de identidade e percepção, refletindo sobre o que permanece constante em meio às mudanças da vida.”, conta o Supervão

No momento do lançamento do single, escrevemos.

“Em fase mais madura da vida, as novas canções já trazem temáticas mais inerentes ao universo dos 30+ e questionamentos sobre essas mudanças de vida que os caminhos que escolhemos nos proporcionam. Entre identidade, reavaliação de perspectiva de vida, mudanças de ciclos sociais e o sentimento de empatia em meio a conflitos inerentes a individualidade… entre afastamentos e as nostalgias desta fase.

As guitarras garageiras cheias de distorções devidamente calculadas, aliadas aos diálogos olho no olho, já dão algumas dicas do que esperar do segundo álbum do quarteto da região metropolitana de Porto Alegre.

Em acordes estridentes, a rebeldia indie continua viva, mas talvez um pouco diferente daqueles dias que virávamos a noite para ver o nascer do sol. Reflexão que dialoga diretamente com a nostalgia de “Dias da Juventude”, dos paulistas do Terno Rei.”

Ironicamente, uma música 7 anos depois do primeiro rascunho serviu como combustível para uma série de novas composições que nortearam a vontade de lançar um segundo álbum.  Mario relembra: “foi essa música rejeitada do passado que fez a Supervão voltar.”

A Nostalgia é foda

Essa música foi lançada como segundo single de Amores e Vícios da Geração Nostalgia. A primeira mostra foi através do sentimento que eles queriam alcançar com o lançamento, o debate sobre a “Nostalgia“. O single, aliás, tem todo aquele veneno dos Vaccines. Tanto é que eles detalham todo o processo de feitura do disco em um blog.

“Saiu o primeiro single do nosso próximo disco… e sei lá, é o som mais honesto em sonoridade e sentimento que já lançamos. O disco todo tem essa vibe, de se mostrar o mais próximo possível do que se é, de falar o que se vive sem muita metáfora ou filtro, sem muita poesia ou clareza na linguagem….

“Nostalgia” é um som que veio como um fluxo de consciência. Foi a música que quando ficou pronta a demo a gente pensou bah se pá tem algo aí, se pá temos algo a dizer nesse momento.

Fala dos nossos erros, fala de saudade, fala de quem se é, de quem se foi. É meio sobre nós mesmos, assumindo a nossa história, nossos amores e vícios.”, comentam os integrantes da Supervão na época do lançamento

A parceria com Papisa

O último single a ser revelado antes do álbum foi justamente “Querendo Um Tempo”, este que eles consideram o mais romântico do material. A faixa introspectiva conta com a participação da artista paulistana Papisa e tem como referências o indie rock e o dream pop, de nomes como Men I Trust e Mac DeMarco.

Eles revelam que a canção foi inspirada pela busca por autoconhecimento e conexões profundas, estabelecendo um diálogo entre tempos de presença e ausência. Desta forma, refletindo o processo emocional e filosófico dos relacionamentos.

“O curioso é que a gente tinha feito todo o disco, tinha ideia já do nome “Amores e Vícios da Geração Nostalgia” e aí chegou a música “Querendo um Tempo”… vimos ali uma voz vindo, uma voz que não era nossa. ao nos perguntarmos de quem, veio logo o nome da Rita Oliva, a Papisa. Amiga de longa data (que conhecemos em algum festival – não lembro qual – e fomos encontrando em diversos momentos como Bananada, Morrostock, momentos em SP…).

Aí fui mostrei “Querendo um tempo” pra Rita e perguntei se ela se pilhava de participar da faixa. Foi um prazer para nós quando topou (imagina a satisfação de ter a poesia, a expressão e a voz linda dela no nosso disco). Mas, conversando sobre a vida, sobre como estavam os trabalhos no momento, vi que a conexão era mais profunda do que apenas um feat momentâneo.

Por alguma coincidência dos fluxos do mundo, ela também estava trabalhando em um disco indie sobre o amor: era “Amor Delírio“, disco maravilhoso que foi lançado no primeiro semestre de 2024.”, revela Leonardo


Arte Por: Filipi Filippo

O Álbum

“E vamos lançar… 08.11.2024 o Amores e Vícios da Geração Nostalgia entra em todas as plataformas de streaming. E 22/11 e 23/11 acontecerão os shows de lançamento.

AVGN é um disco real. É o acúmulo do que foi vivido até aqui. Só de banda 10 anos. De rolê indie, fritação, festas, ressacas, uns bons 20 anos. Era hora de olhar pra trás e agradecer por tudo, pelos altos e baixos, aceitar toda a história que foi para conseguir olhar pra frente com convicção.

Esse é o álbum que sentimos como o mais verdadeiro até aqui. Tem os temas, os timbres, as harmonias, as velocidades que mais nos tocaram nessa vida vivida. É como um grande diário que vem a público. Talvez uma biografia especulada, às vezes baseada em fatos reais que vivemos na pele, às vezes em fatos que assistimos acontecer com amizades muito próximas.

É um disco sobre nós e sobre quem viveu com a gente todo esse tempo. Sobre a nossa geração e sobre as pessoas que queremos conhecer e formar vínculos verdadeiros daqui pra frente.

É um disco de agradecimento ao universo.

E é a volta do indie! E FDS, vamo dale que não tem nada melhor do que viver intensamente a vida como ela é.”, contam os integrantes no post do blog oficial

A Hora do Play de Amores e Vícios da Geração Nostalgia

Depois dos singles, é a hora de dar play no disco. Sendo divulgadas anteriormente respectivamente as faixas, 2, 3 e 4, das 10 que compõe o lançamento, não seguiremos nesta resenha a “ordem” natural do seu andamento.

Quem abre o disco é “Love e Vício em Sunshine”, faixa que tem a participação da Gabriela Lery, da banda instrumental porto-alegrense As Aventuras. Como eles mesmo dizem, olhar pros erros é parte do processo do disco, entre a desilusão e a busca pela sorte, a música tem acordes que nos remetem as baladas dos Strokes e até mesmo dos Los Hermanos. E momentos sem filtro ao falar sobre as tretas e o sentimento de “a gente já se fodeu” – mas estamos aí.

A quinta faixa, é “Tudo Certo Para Dar Errado pt. I”, que tem pouco mais de um minuto no melhor estilo “Sentimental”, dos Los Hermanos. Ela que foi quebrada em duas partes emenda na parte II, esta que faz uma imersão na sonoridade de grupos como Strokes, Arctic Monkeys, The Courteneers e Keane, que tava aqui no Brasil nessa semana mesmo. Saudade poderia ser o nome da canção e traduz essa dor do afastamento. Entre noitadas, ressacas e uma boa dose de arrependimentos.

Entre androides e sonhos junkies

Com nome todo cibernético que me levou diretamente para “Androides sonham com ovelhas elétricas?”, romance de Philip K. Dick que explora uma atmosfera sombria e perturbadora, “Androides” tem esse niilismo e dialoga com esse pós-humanismo dos nossos tempos. Entre escapismos, caos, vampiros, desequilíbrios e fúria. Memórias que reluzem no horizonte feito um “clarão”.

Aliás, lá no começo da carreira eles já falavam em “Vitória Pós-Humana” para se referir a este processo que tantos têm verdadeira paura. Mas aqui o tema é mais a nostalgia e a sensação de estagnação, um certo desabafo sobre todo esse momento vivido em suas vidas e como tudo muda.

“O passado não volta e quando volta ele é diferente”, áudio que fecha a canção, traduz todo o sentimento envolvido.

O Futuro é Vortex

“Noia York”, faixa que tem a participação do conterrâneo Roger Canal, começa parafraseando “Fake Tales of San Francisco” dos Arctic Monkeys nos primeiros versos e “rouba” em parte seu instrumental. Seu título, tem como referência a canção de Gil Scott-Heron e Jamie xx (“NY Is Killing Me”), até por isso está imersa na poesia marginal. Mais uma que lembra das doideiras das noites, entre amores, drogas e sopros de jazz.

Em frequência mais baixa, “Sei Lá, Não Deu” é praticamente a antítese de “Heroes”, de David Bowie. É imerso nas recaídas, entre ver os sonhos da juventude se esfacelarem e tentar ressignificar histórias. A dor está ali e não há mais como tapar o sol com uma peneira (“eu já não me lembro mais do sol”).

Imersa na melancolia, “Geração Nostalgia” dá um tapa na cara da busca pela nostalgia. Esta muitas vezes idealizada pelos mais jovens de tempos que não viveram e que, sim, tinham suas inerentes complexidades, problemáticas e dificuldades. Um ciclo que nunca se encerra, mas que é constantemente alimentado pelo capitalismo.

Seria o futuro vórtex?

Os Replicantes cravaram isso lá atrás e quase 40 anos depois outros gaúchos replicam em alto e bom coro que talvez seja mesmo.

Para marcar o lançamento de Amores e Vícios da Geração Nostalgia, a Supervão realizará um show especial no HUM Rooftop, em Porto Alegre, no dia 23 de novembro. A festa indie clássica, terá shows e discotecagens, contando com as DJs Luiza Pads e Jade Primavera, além da banda Ovo Frito como convidados.

Ouça em sua plataforma de streaming favorita



Ficha Técnica

Supervão em AVGN é Mario Arruda e Leonardo Serafini
Músicas por Supervão
Produção e mixagem: Mario Arruda
Masterização: Olimpio Machado
Contrabaixo na música “Love e Vício em Sunshine” por Gabriela Lery
Composição e voz em “Querendo Um Tempo” por Rita Oliva (Papisa)
Trompete e Poesia em “Noia York” por “Roger Canal”
Distribuição: Frase Records
Apoio: Marquise 51

This post was published on 8 de novembro de 2024 12:01 am

Rafael Chioccarello

Editor-Chefe e Fundador do Hits Perdidos.

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