As Paradas Musicais ainda são relevantes?

 As Paradas Musicais ainda são relevantes?

Quem escreve sobre música está cansado de receber releases que parecem estar focados em plays, alcance nas redes sociais e destaque em playlists. Essa métrica ou validação, muito mais vale para outras plataformas, como, por exemplo, em pitchs para alcançar playlists ou para dialogar com marcas e outros parceiros da engrenagem mercado.

Particularmente, posso falar em nome dos sites independentes que não são escravos do algoritmo ou das ferramentas de busca. E, por aqui, procuramos a validação pela qualidade do material apresentado. Além, de claro, do material se adequar aos nichos que realizamos a cobertura.

Se formos buscar na história da música, a procura por métricas de sucesso sempre estiveram presentes. Muito disso para que as gravadoras justificassem os seus investimentos. Em tempos de alta vendagem de discos, tivemos discos de ouro e platina para validar as vendas – e servir para validar o sucesso na mídia.

Depois disso, tivemos as paradas musicais, essas em que o jabá, acabou corrompendo. Com o salto ao digital, o número de plays acabou sendo, por um tempo, uma forma de metrificar. Claro, que em tempos de compras de plays e de fazendas de bots, isso acaba sendo uma métrica cada vez mais frágil.

Esses dias pipocou uma discussão interessante que não é justamente sobre a validação. Mas de como ela influencia no consumo de música perante o público final. Neste caso, deixando as métricas de indústria um pouco de lado e sim, observando o comportamento de cada geração.

Mas antes de entrar nisso, como funcionam a paradas musicais?


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Parada Musical da Billboard em 1940. – Foto: Reprodução/Billboard

Como funcionam as Paradas Musicais?

Descobrir exatamente como as paradas musicais oficiais do mundo são determinadas pode ser um negócio complicado, muitas vezes com muitos fatores diferentes em jogo, incluindo downloads, streaming, transmissão em rádio e vendas físicas. Um artigo da Ditto Music, no UK, tira algumas dúvidas sobre o mercado deles.

Como são calculados as paradas musicais do Reino Unido?

A paradas musicais do UK são calculados pelas vendas, bem como pelos streams de música e vídeo, com uma taxa de streaming variável dependendo se o usuário tem uma assinatura gratuita ou paga. Isso significa que 100 transmissões pagas equivalerão a uma venda, assim como 600 transmissões gratuitas.

Por exemplo, se a sua faixa obtiver 100.000 streams pagos em várias plataformas de música e vídeo online como Spotify, YouTube, Apple Music e outras, elas serão contadas como 1.000 vendas pelas paradas e incluídas no total final de vendas, enquanto você precisa de 600.000 streams gratuitos para gerar o mesmo número. Outras vendas incluem downloads digitais pagos e lançamentos físicos.

E o Top 40?

Existem algumas regras em vigor para promover novas faixas e artistas que entram nas paradas. O Top 40 restringe os artistas principais de terem mais de 3 faixas nas paradas ao mesmo tempo – pense em quando grandes artistas como Stormzy e Drake lançam álbuns e eles têm várias faixas nas paradas ao mesmo tempo.

Outra regra entra em jogo se uma música tiver queda nas transmissões por três semanas consecutivas. Se isso acontecer, a parada musical do UK aplica uma proporção de fluxo para venda de 200:1.

Se os streams de uma música caírem mais do que a queda média de todos os singles, suas vendas de streaming serão contadas de acordo com uma Accelerated Chart Ratio (ACR).

Basicamente, isso significa que os ouvintes que pagam pelo Spotify e Apple Music… precisam tocar uma música 200 vezes para que ela conte como uma venda, e aqueles que ouvem em contas gratuitas precisam tocá-la 1.200 vezes.

A ideia por trás desse processo é dar às músicas mais recentes uma chance melhor de subir nas paradas e evitar que músicas mais antigas e transmitidas de forma consistente permaneçam no Top 40 para sempre.

Saiba mais sobre o funcionamento das Official Charts, do UK, aqui.

Quantas vendas eu preciso para entrar nas paradas oficiais do Reino Unido?

Nos últimos anos, a média do single Top 40 do Reino Unido terá feito pelo menos 8.000 vendas, enquanto a faixa número um terá vendido cerca de 100.000 cópias. Os números da parada oficial de álbuns do Reino Unido são semelhantes, com a média dos 40 álbuns mais vendidos vendendo mais de 4.000, e o número um normalmente alcançando vendas de cerca de 60.000.

Como as paradas musicais da Billboard são calculadas?

Uma curiosidade: A Parada Musical da Billboard existe desde 1913, quando foi lançada a primeira lista com os 10 álbuns mais vendidos.

As paradas musicais da Billboard são calculadas por vários fatores diferentes, dependendo da parada específica. Por exemplo, a Billboard Hot 100 e outras paradas baseadas em gênero levam em consideração as vendas, o streaming e as transmissões de rádio.

Faixas e álbuns que lideram podem ser conduzidos por um ou todos esses caminhos diferentes, com algumas das maiores músicas nas paradas graças à extensa exibição nas rádios, enquanto outras sobem nas paradas por meio de seu poder de streaming.

Quantas vendas eu preciso para entrar nas paradas da Billboard?

A Billboard gerencia uma ampla variedade de paradas com base em uma série de fatores, incluindo vendas físicas, downloads digitais, transmissão em rádio e streaming. Como tal, é difícil estimar com precisão o número de “vendas” que você precisará para entrar em qualquer uma das paradas da Billboard.

No entanto, aqui você pode encontrar uma visão geral detalhada de como a Billboard decide suas classificações.

Saiba também como é calculado o Top 100 da Billboard.

Como são calculadas as paradas musicais ARIA da Austrália?

As paradas musicais ARIA na Austrália consideram o streaming, bem como as vendas de downloads físicos e digitais, mas não divulgaram a proporção que o streaming conta para o total de vendas de um artista e a posição nas paradas.

A ARIA também afirma em seu site que as vendas múltiplas de um único consumidor podem não ser incluídas no total de vendas e que só aceita vendas digitais e de streaming de determinados varejistas, incluindo as maiores lojas de música online.

Aqui você pode ver a lista completa de varejistas aceitos.

Quantas vendas eu preciso para entrar nas paradas musicais da ARIA?

Embora não seja necessário um número específico de vendas para entrar nas paradas ARIA, é conhecida por ser relativamente fácil subir na classificação sem milhares e milhares de vendas.

O ARIA Charts reivindicou recentemente o álbum mais vendido de todos os tempos, alcançando o primeiro lugar na Austrália, após vender apenas 2.140 cópias. Então, logicamente, apenas algumas centenas de vendas lhe darão uma chance significativa de aparecer nas paradas australianas.

Outras Paradas Musicais

  • The Circle da Coreia do Sul, lançado em 2010, é a versão local da fórmula da Billboard.
  • A Oricon do Japão vem produzindo classificações baseadas nas vendas físicas de singles desde muito antes de adotar os downloads digitais em 2017.

Paradas Musicais - Official Charts UK
Official Charts UKFoto: Reprodução/Divulgação Official Charts UK

Mas as Paradas Musicais ainda são uma métrica relevante para o público?

As paradas musicais ainda são a medida definitiva do sucesso de um artista ou perderam sua relevância na era do streaming? É o que questiona o artigo do site Kill The DJ.

“A ascensão do streaming afetou o trabalho das paradas. Plataformas como Spotify, Apple Music e até outras peculiares como o Bandcamp mudaram a forma como descobrimos e ouvimos música. Não dependemos mais apenas das transmissões de rádio e das vendas físicas para nos dizer quem está dominando o mundo.

Temos algoritmos para isso agora, muito obrigado. Esta mudança levanta uma questão importante: as paradas musicais ainda importam em 2024?”, diz o artigo do portal

As mudanças no molde do cálculo foram bastante significativas e hoje em dia o Hot 100 classifica as músicas com base na “atividade de streaming de fontes de música digital rastreadas pela Luminate, nas impressões do público de rádios medidas pela Luminate e nos dados de vendas compilados pela Luminate. Tudo de certa forma foi automatizado.

“As paradas tradicionais nunca foram uma ‘fonte de verdade’ completa sobre a popularidade e o impacto de um artista. Ainda é relativamente fácil manipular uma posição nas paradas da Billboard.

A maioria dos especialistas da indústria reconhece que essas paradas musicais existem principalmente para vender anúncios em revistas e satisfazer/aplacar a equipe de um artista.”, diz Eric Stensvaag, curador do Feed.fm na reportagem

A Billboard teve nos últimos tempos que ajustar continuamente as suas metodologias para acompanhar as mudanças no cenário do consumo musical. Desde agrupar downloads digitais de músicas com ingressos para shows, mercadorias e outras coisas até contar músicas tocadas no “Roblox”.

Mesmo com estes ajustes, está se tornando cada vez mais claro que as paradas musicais simplesmente não conseguem acompanhar o mundo fragmentado e acelerado da música do futuro. É o questiona o artigo.

A invasão das fazendas de Bots e a manipulação

  • Streams e bots falsos são um grande golpe nas paradas musicais.
  • Para cada ouvinte legítimo, existe um exército de contas falsas que inflacionam os números e poluem o conjunto de dados, tornando a metodologia por trás das paradas musicais completamente inútil.

Recentemente um homem na Dinamarca foi condenado a 18 meses de prisão por usar contas falsas para enganar serviços de streaming de música e receber 290 mil dólares em royalties. O cara montou bots para ouvir suas próprias músicas por meio de perfis falsos no Spotify e Apple Music, arrecadando royalties no processo.

De acordo com um estudo, entre 1 bilhão e 3 bilhões de streams falsos ocorreram em plataformas de música popular somente em 2021.

O problema é muito maior do que parece e por isso as plataformas estão vigiando e punindo cada vez mais. O Spotify até mudou suas políticas para tentar reprimir serviços pagos de terceiros que garantem streams, mas o problema ainda persiste.

Mas não são apenas os indivíduos que manipulam o sistema. Mesmo os artistas que não estão tentando trapacear nas paradas podem cair nos esquemas.

O artigo cita alguns casos alarmantes.

  • O cantor e compositor Jonah Baker, que recebeu um aviso de greve da sua distribuidora, a DistroKid, indicando fluxos artificiais significativos em sua música, embora ele diga que não tem ideia do porquê.
  • Viper, artista que usa o DistroKid para distribuição, que teve sua música “Fusion” removida com um aviso indicando streams “100% artificiais”, apesar de a música ter sido incluída em playlists oficiais do Spotify

“Quando se trata de streaming, há a enorme questão da manipulação das paradas/impulso artificial, bem como das vantagens dadas aos artistas que assinam com grandes gravadoras. Uma grande mudança aqui porque, não só o fato de alguns partidos terem descoberto como manipular o sistema de formas desagradáveis ​​é injusto para os pequenos artistas, como as consequências começaram a prejudicar também os pequenos artistas.”, disse a guitarrista de blues Curse of K.K. Hammond


Spotify - Paradas Musicais
Fazenda de Bots do Spotify, como funciona. – Foto Por: lunio.ai

Um grande problema

Mesmo que os números de streaming fossem completamente precisos, ainda assim não seriam suficientes para paradas musicais precisas, pois são apenas uma parte da história.

“Até mesmo novas ferramentas como Soundcharts e Chartmetric, que prometem uma compreensão melhor do que a Billboard sobre a sempre fraturada realidade musical, estão simplesmente maquiando a realidade. E à medida que a descoberta e o consumo de música se tornarem mais diversificados, será cada vez mais difícil sintetizar todos esses dados em algo significativo.

Portanto, embora as paradas musicais, seja ela do Youtube ou do Spotify, provavelmente continuem sendo o padrão da indústria e algo para se gabar, mas elas não significam mais necessariamente muito para os fãs de música.”, sintetiza o artigo

Boa parte do público também enxerga assim…

“A música está mais acessível agora do que nunca. O lado bom: faz com que artistas obscuros tenham destaque mundial […] a maioria dos meus artistas favoritos nunca chegou ao topo da Billboard 100 ou de outras paradas musicais parecidas.”, disse um usuário do reddit mas isso poderia ser muito uma frase que você que está lendo diria, não é mesmo? 

Mas como os millennials e a Gen Z veem isso?

“O papel do TikTok no lançamento de músicas nas paradas/rádios convencionais e no ressurgimento de artistas de catálogo como Fleetwood Mac indica como as gerações mais jovens são mais propensas a moldar essas paradas do que a segui-las.”, diz Eric Stensvaag

“As gerações mais jovens são mais propensas a descobrir e compartilhar músicas via TikTok ou várias playlists de streaming.”, completa.

A mudança de consumo das novas gerações também implica nisso tudo.

“Antigamente, ouvíamos os álbuns do início ao fim ou, pelo menos. Lembro de entrar no iTunes e ouvir as prévias de cada faixa individual e decidir quais músicas colocar no meu carrinho de compras.

Hoje em dia, muita música é encontrada através do TikTok, Instagram Reels e shorts do YouTube… e a indústria musical como um todo começou a se concentrar em formas de encurtar o conteúdo musical – concentrando-se menos em lançamentos de álbuns e mais em vendas individuais de singles.”, ressalta o produtor Nic Gitter


Paradas Musicais Billboard
Parada Musical Hot 100 da Billboard. – Foto: Reprodução/Billboard

O produto de marketing e a pressão

Andria Parides, produtora executiva e fundadora da Showstopper Lane Productions, acredita que “[paradas musicais] geram manchetes que merecem atenção, permitindo que os artistas reivindiquem títulos como ‘álbum número um’ ou ‘single número um’, o que é importante do ponto de vista de marketing. No entanto, ela observa que há uma diferença notável entre as tendências musicais nas redes sociais e o que aparece nas paradas musicais, e isso se reflete nas indicações para premiações em todos os padrões da indústria.

Para os próprios artistas, fazer parte das paradas musicais pode ser uma experiência de validação, mas também pode trazer muita pressão.

“Na minha experiência como terapeuta em Los Angeles especializada em músicos, é muito comum que os artistas experimentem um aumento no estresse, ansiedade, baixa auto-estima e síndrome do impostor quando sua música não está indo bem nas paradas musicais.”, disse a terapeuta holística Jenny Flora

Para a artista Curse of K.K. Hammond….

“Criar paradas musicais é inegavelmente uma experiência muito validadora para um artista, especialmente para pequenos artistas independentes ou aqueles de pequenas gravadoras populares que dependem mais do apoio dos fãs do que de campanhas de marketing fortemente manipuladas por grandes gravadoras (que dizem ter perto, sob o acordos de mesa com plataformas de streaming para priorizar seus artistas.)

Alcançar uma medida visível de sucesso no cenário mundial por meio do meu sucesso nas paradas foi uma grande surpresa para mim e me encorajou a continuar avançando. As paradas musicais oferecem ao artista mais oportunidades de exposição e podem ser uma ferramenta de marketing útil que irá torne sua música mais visível para a imprensa, playlisters, promotores, novos fãs, patrocinadores e colaboradores em potencial. Tudo isso aumenta a conveniência das paradas.”

Já o público…

“A única vez que penso em paradas musicais é quando um artista que sigo fica animado com sua posição no gráfico e eu penso ‘bom para eles’ e sigo em frente com meu dia.”, disse usuário do reddit

E o futuro das Paradas Musicais?

“Assim como a Billboard introduziu o TikTok Top 50 no ano passado, essas paradas musicais se adaptarão para destacar novas tendências ou absorvê-las nas classificações gerais dos rankings.

O modelo de cima para baixo de controle limitado das paradas com guardiões definidos já se foi há muito tempo, mas enquanto ainda existirem funções humanas (cada vez mais auxiliadas pela IA), como programadores de rádio, curadores, etc., as paradas musicais persistirão.”, conclui Stensvaag

Alternativa as tradicionais Paradas Musicais no Brasil


Lista das Listas - Paradas Musicais


Lista das Listas

Há 10 anos Pena Schmidt criava a Lista das Listas. Na época ele atuava como Diretor no Auditório do Ibirapuera e buscava por uma métrica que ajudasse a validar as curadorias, já que dados de plays, likes e views se mostravam frágeis e de fácil manipulação. Algo que logo notou que tudo passava pelo âmbito da reputaçãofator que as listas de melhores do ano conseguiam captar de forma singular. Outro parâmetro apontado ao longo dos anos é o fato de que os discos apontados pelas listas dificilmente fazem parte das listas dos “mais vendidos”.

O produtor musical, ex-executivo e diretor de gravadoras (esteve na Warner Music e é o responsável direto pelo surgimento dos TitãsIra!, Ultraje a RigorMagazine entre outros), também foi proprietário do selo independente Tinitus, ex-presidente de Associação Brasileira da Música Independente (ABMI), diretor de palco e proprietário da empresa de produção musical StageBrainz. Atualmente atua na Vida_Boa, pesquisa, consultoria e curadoria musical.

Em 2013 Pena começou a planilhar anualmente – e disponibilizar uma pequena amostra com os TOP 50 discos brasileiros citados ao longo do primeiro trimestre do ano seguinte – época em que as listas se encerram. No começo eram poucas listas que ao lado de Tassio LopesGabriel Ruiz e Uirá Porã encontrava, mas ao longo do tempo notou que elas começaram a se proliferar.

São listas de veículos tradicionais, blogs independentes, rádios, podcasts, canais de youtube, páginas de instagram e até mesmo publicadas por pessoas comuns em suas contas no medium. Os formatos são variados, de listas individuais passando pelas coletivas de especialistas do ramo (de redações a um time de jornalistas convidados – como é o caso da do site Scream & Yell – também inclui outras que abrem a votação para o público do canal. O próprio Google possui uma baseada em seu monitoramento das redes, esta também é contabilizada e conta como uma lista.

Os resultados que são divulgados meados de março do ano seguinte acabam refletindo nas programações dos principais festivais e casas de shows do país, servindo como ferramenta para medir reputações, entender fenômenos e mostrar a consistência de trajetórias artísticas.

O contexto do surgimento da Lista Anual

“Em 2010 eu era Diretor do Auditório Ibirapuera e fazia a curadoria e sua programação. Era uma batalha para conseguir descobrir e apresentar novos artistas, era impossível acompanhar as carreiras, ouvir todos e não tínhamos referências funcionando. Não haviam mais as paradas de sucesso de rádios nem vendas e ninguém confiava nos likes e views, facilmente manipuláveis. Anos depois, em 2013, fui colaborar com o “Toque No Brasil“, um programa/site que conectava artistas e bandas com casas e palcos, especialmente com os festivais, espalhados pelo Brasil todo. No ambiente das conversas sobre o TNB estavam alguns personagens que têm uma visão privilegiada do chamado Brasil profundo, os produtores de festivais e casas de música, onde circulam artistas de muitos estilos e extrações, onde se forma público para estéticas mais autorais e menos da indústria.

Conversando com esse povo que circula e partilha seu conhecimento e esperteza de lidar com arte e precariedade, fico mais atento ao que sucede fora da TV, fora da mídia, fora do negócio da música mas perto do público. Em SP, e no Rio, também temos lugares onde acontecem coisas que não se vê na TV, mas que geram resultados. Artistas que se desenvolvem porque existem circuitos de pequenas casas de música onde há curadoria que sabe reconhecê-los e buscá-los para sua programação.

Pois numa conversa sobre como criar critérios para avaliar estes artistas autorais apareceu uma ideia para avaliar “reputações”, reconhecidamente o mais forte valor para os curadores. Sim, curadores prestam muita atenção na reputação das bandas, no que se fala delas, em quem gosta ou defende o artista, no artista que consegue criar público, trazer público. Sim, existem valores estéticos e valores de produção também. O som da banda presta, mesmo que sejam 14 para viajar e hospedar? Apenas um pianista vai ser capaz de segurar a atenção, com o bar aberto? Ser curador, ou programador artístico envolve uma equação interminável, mas a reputação é fundamental para a decisão. E “listas de melhores do ano” são observadas pelos curadores.

As listas de melhores do ano ajudam a reputação dos artistas, claro. São uma declaração pública de importância, uma recomendação. Estes aqui são os que você tem que ouvir. As listas de melhores do ano contam pontos para a reputação de um artista e podem interferir na opinião de todos. Mas qual lista de melhores? A tradição privilegiava a imprensa especializada, a crítica, estas eram listas influentes. A lista da Rolling Stone que uma vez elegeu Macaco Bong. Mas hoje, essa multidão de sites de especialistas votando em listas próprias, todo mundo, os blogs de música, os caras que falam dos gêneros musicais, das bandas que passam por suas cidades, todo mundo e sua lista.

Claro que cada um tem influência para seus leitores, o seu público. E cada um puxa sua sardinha para a brasa, rola brodagem e simpatia pelos parceiros. Os bons curadores são os que percebem as brodagens entre amigos e dão o desconto devido. Da mesma forma, os artistas movidos puramente a jabá, os artefatos comerciais, vem com CNPJ estampado, não fazem parte do universo dos artistas que se recomenda, dificilmente participam de listas de melhores, fazem parte das listas dos “mais vendidos”! E ainda, toda lista é parcial, fala apenas dos que conseguimos ou escolhemos para avaliar. E são listas de melhores discos, esta é também a tradição, é uma competição entre produtos iguais, os discos com 12 músicas, fenômeno anual.

Entretanto, os discos dos artistas de hoje são autorais, refletem 100% o desejo do artista, desapareceu o intermediário que representava o interesse do mercado na hora de escolher repertório, de fazer arranjos comerciais ou parcerias de conveniência. O artista autoral está inteiro dentro do seu disco. Portanto, listas de melhores discos representam sim os artistas, são listas de melhores artistas do ano.”, contextualiza Pena

O formato das Listas das Listas

Uma nova forma de validação.

“Em 2014 Elson Barbosa, da comunidade Sinewave, se juntou à captura de listas e em 2017 o grupo foi se ampliando com a chegada do Rafael López do site Hits Perdidos e Juliano Polimeno da Playax e recentemente o Uri Daian, pesquisador da MPB. Ao longo do tempo foi se refinando o conceito e o entendimento do processo e das listas. Uma boa parte são listas individuais, pessoas que têm este olhar catalogante, jornalistas, profissionais que cobrem a área, blogueiros e amadores que se dispõem a organizar suas preferências e anunciá-las.

Outra parte dos criadores de listas são coletivos, comunidades, ou comitês que se juntam no esforço de debater, compilar e promulgar uma lista dos seus destaques e preferências numa lista única. E ainda existe um número de listas que são consequência de apuração de votos de leitores, exercícios de democracia do gosto, algumas listas onde se votou numa pré lista organizada e em outros o voto é da livre escolha dos votantes. Como curiosidade, mas com razoável grau de acerto com relação à nossa #LdL final, bem coerente, juntamos uma lista que é o resultado de uma busca no google por “melhores discos de 2022” e vem uma lista de cerca de 50 discos, com uma apresentação especial das capinhas dos álbuns de música, como ele chama.

Mas como evitar distorções que pudessem vir de panelinhas, das brodagens ou de manobras ilícitas? Chegamos à conclusão que votações de grupos de interesse vão se diluindo no conjunto das listas. Sempre é uma constante preocupação de curadores não ser apanhados em manipulações que criam falsos públicos, tão comuns em likes e números de seguidores. Isto ficou fácil de perceber, pois existem listas que votaram apenas em discos de seu estado ou em gêneros bem estreitos, nestas listas aparecem alguns que se destacaram por serem votados em outras listas e é por isto que estas listas contribuem no resultado final, sem deformá-lo. Além disso, uma boa votação pode até ser resultado de um bom trabalho de divulgação dirigido, isto é lícito e mais ainda, saudável demonstração de profissionais trabalhando no ambiente da música autoral.

Então, temos um conjunto de obras da mesma espécie, sendo votado por outro conjunto de votantes razoavelmente heterogêneo, gerando uma espécie de estatística que está se dispondo a apontar os mais recomendados como melhores, no campo minado do gosto pessoal. Claro que isto não é rocket science, está mais para humanas. O que nos interessa mesmo é como a observação do fenômeno pode gerar entendimento, opiniões, e especialmente descobertas sobre o que acontece na Música Popular Brasileira neste momento.”, aponta Pena sobre o fator humano das listas em entrevista para o blog da Algohits

E você, como observa a importância das Paradas Musicais no seu consumo e para a indústria?

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