Luiza Lian vai das trevas ao céu para se reconectar em “7 Estrelas | quem arrancou o céu?”
Após apresentar “Eu Estou Aqui“, primeiro single do sucessor de Azul Moderno (2019), com direito a Premiere no Hits Perdidos, Luiza Lian lançou “Desabriga“, última canção a ser revelada antes de 7 Estrelas | quem arrancou o céu?, seu quarto disco de estúdio, ir para o mundo.
O novo álbum lançado na sexta-feira (28/07) conta com 10 faixas é mais uma produção da cantora e compositora com seu parceiro de longa data Charles Tixier e será lançado no Brasil pelo selo paulistano RISCO e o lançamento internacional fica a cargo da ZZK Records. “Tecnicolor”, segunda faixa do disco tem a participação especial da cantora Céu.
7 Estrelas | quem arrancou o céu? é o terceiro álbum ao lado do produtor musical Charles Tixier. Os dois, que já trabalham juntos há doze anos (Charles foi o baterista da primeira banda de Luiza). O novo disco chega ao mundo quase cinco anos depois do Azul Moderno (2019).
Luiza Lian 7 Estrelas | quem arrancou o céu?
É impossível para mim começar essa resenha sem voltar para o momento da audição. Até por isso fizemos um vídeo que foi para o TikTok do Hits Perdidos. Ao longo da noite quem esteve presente pode ouvir o álbum de quase 34 minutos duas vezes. Na primeira audição ainda entrando no clima do disco senti como seu andamento fosse uma parábola de diferentes frequências no qual começa no cume, dá uma descida e volta a subir da metade para o final. Porém a mágica acontece quando você ouve ele pela a segunda vez, o que felizmente pude fazer ainda no local. Sem olhar para o celular, sem me distrair com uma aba de navegador, apenas com os olhos semi fechados tentando sentir suas frequências eletrônicas e também como ele “batia” em quem estava por lá. Algo que para mim é complementar e impossível desassociar.
Índice
O fato de “A Minha Música” abrir os trabalhos soa como uma bússola (ou um prefácio). Entre texturas, teclados e beats eletrônicos, que são um primor ao longo do registro dois versos te colocam dentro do seu universo onírico.
“a minha música é / uma paisagem / pra você entrar /e fazer sua viagem”
“a minha música é / uma miragem / pra você olhar / conforme a sua verdade”
Essa abertura a interpretação e a poder correlacionar sua própria realidade abre um diálogo muito mais amplo. Como ela mesmo disse durante a audição embora seja um trabalho idealizado antes da pandemia muitos questionamentos já pairavam no ar, o sufoco seja pelo campo político como social em sua arte apenas ganhou novas possibilidades de interpretação. Tanto é que outro verso deixa esse cenário de reconstrução interna ao longo da sua jornada pessoal.
“luzes que nela correm / são um espelho / pra cada um iluminar / o próprio desterro”
O próprio rap que tem na música deixa o contexto político evidenciado. Seja pela cegueira do rebanho do mito, seja pelo necropolítica do período.
A busca pelo reconectar
O disco tem um pouco dessa universalidade também. O fato dela estar com mais dificuldade a se conectar com a espiritualidade se reflete em ter abertura para diferentes temáticas – e de certa forma podendo até alcançar um público maior mesmo que de forma indireta.
Essa própria dor coletiva ganha mais evidência em “Tecnicolor” poderia ganhar e interpretação do reflexo do distanciamento social e a saudade do que costumávamos chamar de vida. Nesta Céu participa. Citar quem arrancou o céu, parte do título, mostra como ela opta por começar o disco nume frequência mais pesada para mais tarde chegar mais perto de se conectar com as 7 estrelas.
Um lado mais solto aparece em “Homenagem” e vamos dizer assim sensual. Lembro que no momento da audição que aconteceu na Casinha (@casinha.cc) o interessante foi ver como a combinação letra mais instrumental fez com que as presentes dançassem. Ou seja, um acerto com quem gostaria de cativar.
Para quem já leu 1984, do George Orwell, ou estudou em algum momento da vida sobre a Revolução Francesa, vai identificar as analogias presentes em “Força”. Esse sufoco dos anos que envolvem o período de composição do material principalmente por quem tem ideias progressistas reluz em seus versos. O querer ver o sol e as estrelas….para chegar mais longe. O deslumbre da esperança pela reconstrução de um amanhã possível.
“Cobras na Sua Mesa” traz os males do sistema capitalista e da sede pelo poder sem qualquer tipo de escrúpulos. Sendo atemporal e aberta a interpretação, talvez disso venha a beleza da composição que espertamente usa a voz como instrumento. A mixagem que é um grande destaque dessa jornada nesta música em si vale a pena o exercício de revistar a faixa só para estudar.
O mix de brasis
A homenagem aos beats do funk carioca aparece em “Viajante”, faixa que tem uma frequência mais baixa e auto-tune mas sem perder sua identidade. O fator de estar nessa jornada sozinho independente da arte dos encontros aparece na composição. O verso “vivo de mundos entro em mundos / dentro de mim” evidencia a complexidade da nossa experiência terrestre.
Os questionamentos de “Eu Estou Aqui” são daqueles difíceis de encontrar uma única resposta. Em seus versos ela reverbera para o horizonte – que provavelmente no momento da composição eram as paredes de sua casa – um pouco da raiva e da insanidade que co-habitou nossas mentes durante aquele período:
“Onde é o fim do mundo? Que horas chega o futuro? Qual é a altura desse muro?” (Luiza Lian)
De dilacerar o coração e com aquele sentimento embargado de “o pulso ainda pulsa” apesar dos pesares. Ela ainda trás o lado dos trópicos ao resgatar a memória de Ataulfo Alves, ao cantar em um dos trechos: “Morre o homem, fica o drama”, em vez de “fica a fama”, como no samba original. Aliás, o lado político do momento também transparece de forma bastante categórica em momentos onde cita a “Terra Plana” e “Mar Avermelhado”, alusão clara as políticas tomadas (e não tomadas) pela alta escala do governo federal do período.
“Eu sinto que esta música é como um manifesto sobre o disco e também sobre a importância da presença e a falta de presença”, explica a cantora e compositora, enfatizando que o novo álbum também fala sobre essa era virtual e plástica que vivemos atualmente.
“É o momento de dizer ‘eu existo’, apesar do mundo estar acabando, apesar das pessoas estarem perdidas em seus espelhos, a gente ainda está aqui, a gente ainda vive e ainda morre, o mistério segue sendo um mistério, vida e morte com sua dádiva e desorientação.”, finaliza a artista
Sufoco D’alma
A intensidade deste momento repleto de questionamentos (e outros delírios), entre o sufoco d’alma e a vontade de se mostrar em movimento, evidencia como o mistério da vida ainda se faz presente e pulsante. Através da poesia, e do seu verso cheio de sentimentos acumulados, que ela trás para si o microfone e vocifera tudo que estava entalado no peito. É desta forma que sua arte ganha cor e percorre os corredores de onde quer que ela seja executada com muita vivacidade.
A parte final descarrega uma metralhadora de sensações, e de quereres, onde só quem é vivo se faz presente.
A canção manifesto chega acompanhada de uma obra audiovisual, uma animação de Brunno Balco, que convida o ouvinte a adentrar ao universo da canção através de um jogo de palavras.
O poder da reconexão
“Desabriga” tem DNA quente e envolvente. A canção trás consigo o aconchego, desde as texturas a quentura da mistura de ritmos como afoxé, a chillhouse e o pagode baiano, deixando ela moderna mas sem perder a tradição – uma das marcas já impressas ao longo da sua discografia. Com frescor, assim como as brisas que vem do mar, ela reconhece a parceria como elo de construção, manutenção e constante aprendizado. Parceria que se faz presente de corpo em alma independente do balançar que a correnteza da vida traga.
Já as ambiências até lembram sorrateiramente as trilhas dos videogames 8-bits dos anos 90, o que deixa o synth ainda mais repleto de texturas, dialogando também com o l0-fi que tem feito tanto sucesso em playlists feitas para se concentrar. Por sua vez, esse “aconchego” e lugar de paz, se balanceiam feito uma marola de calmaria, trazendo a sensação de reconforto e porto seguro ao longo da composição de Lian.
“É uma canção romântica sobre o cuidado e parceria durante as adversidades da vida”. A cantora usa a metáfora do barco em alto mar que atravessa uma tempestade como uma forma de traduzir as dificuldades de uma relação a dois e como elas só podem ser superadas a partir desta união.
Uma música sobre acolhimento e sobre reconhecer que o amor não se faz sozinho e sim a partir do encontro”, disserta Luiza Lian sobre “Desabriga”
Antes de falar sobre um dos pontos mais altos do álbum, a canção “7 Estrelas” é importante revisitar o significado do número 7. Ele é o número da Perfeição Divina, pois no sétimo dia Deus descansou de todas as suas obras. Ele representa a harmonia, resultante do equilíbrio, estabelecido por elementos não semelhantes. O 7 nos transmite a ideia de totalidade, interação, conclusão, perfeição e consumação. Mas mais do que tudo isso ele representa a transformação e esse é a força motriz desencadeada neste “segundo ato” do álbum.
“7 estrelas na minha cabeça
7 cores do astral
7 sóis que fazem a dança da essência divinal
7 estrelas formam uma trança multidimensional
7 ervas que lambem os campos da vibração
7 leis que conforme os tronos da vibração
vão descendo da minha cabeça em forma de canção7 estrelas me ama
7 estrelas me deu
7 estrelas essa chama
que me leva no breu7 me ama
7 sou eu
vibração das galáxias
espelho do céu”, “7 Estrelas, Luiza Lian
Esse é o momento em que ela se reconecta com a sua espiritualidade. Onde Luiza permite encontrar uma saída por meio da fé. Seja pelo desejo por tempos melhores como uma espécie de ponte para um período de reconstrução através da experiência de se reconectar com a sua (verdadeira) essência.
A luz do amanhã
“Desagua” brinca com frequências explorando a fusão de diferente ritmos brasileiros indo do samba ao tecnobrega. Sua letra diz como para ter cura é preciso sentir toda a dor. E como se sentir sem chão é parte do processo como evidenciado no verso “Busquei eu busquei uma cura / Me indica o rumo a tomar”.
7 Estrelas | quem arrancou o céu? tem a força de uma fênix em busca por tempos melhores. Onde a luz para transformar o amanhã parte de cada um de nós – e como juntos podemos fazer essa experiência ainda mais potente.
Ficha Técnica
Todas as faixas por Luiza Lian e Charles Tixier, exceto faixa 02 (Tecnicolor) com participação de Céu (voz).
Direção artística: Luiza Lian
Composições: Luiza Lian e Charles Tixier
Produção, Direção musical e arranjos: Charles Tixier
Mixagem: Gui Jesus Toledo e Charles Tixier
Masterização: Vlado Meller
Produção Executiva: João Bagdadi (Mantura Estratégia Cultural)
Identidade Visual: Maria Cau Levy
Capa: Maria Cau Levy em foto de Larissa Zaidan
Comunicação e Estratégia: Mantura Estratégia Cultural
Ass. de Imprensa: Francine Ramos
Lançamento: selo RISCO (Brasil) e ZZK Records (Internacional)
Fotografia Capa
Direção Criativa: Luiza Lian
Foto: Larissa Zaidan
Assistente de fotografia: Ênio Cesar e Rafael Mattar
Direção de Arte: Karla Salvoni
Assistente de arte: Nicoli Cahali
Contra Regra: Caio monteiro
Figurino: Ateliê Vivo| Carolina Cherubini, Dea Guerra, Flávia Lobo de Felicio e Gabriela Cherubini
Beleza: Leon Gurfein