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The Pretenders apresenta baladas, guitarras e corações partidos em “Hate For Sale”

O The Pretenders talvez seja daquelas bandas que fazem o elo entre o punk inglês, a new wave e os Estados Unidos. A história começa em 1978 na cidade de Hereford na divisa com o País de Gales, embora sua icônica vocalista, Chrissie Hynde, seja natural de Akron, cidade que integra o estado de Ohio.

Ela chegou em Londres 5 anos antes de iniciar a banda e lá começou a trabalhar na NME, ao mesmo tempo também trabalhava na famosa loja do Malcolm McLaren e da estilista Vivienne Westwood, e esteve envolvida nos primeiros dias de bandas como The Clash e The Damned. Antes de formar o The Pretenders, Hynde fez parte de duas outras bandas que não duraram muito tempo, Masters of the Backside e Moors Murderers; esta última inclusive teve problemas com o nome.

A banda surgiu quando Dave Hill, da Anchor Records, ouviu sua primeiras demos. A formação deste primeiro teste era composta por Chrissie, Mal Hart no baixo (ele tinha tocado junto com ela no Moors Murderers) e o Phil Taylor (Motörhead) na bateria.

O resultado foi tão impressionante que daí já saiu outra demo e mesmo ainda crua ele viu potencial no material apresentado. Então ele sugeriu para que ela montasse uma banda de verdade para que ele pudesse lançar novos materiais via sua gravadora a Real Records. Dessa primeiríssima formação vieram além de Hynde, Pete Farndon no baixo, James Honeyman-Scott nas guitarras e Gerry Mcilduff na bateria. Ainda em 1978 Gerry é substituído por Martin Chambers.

O nome The Pretenders também conta com uma história para lá de musical. Ainda sem nome para o projeto ela decidiu brincar e nomear como The Pretenders em homenagem a um antigo namorado que tinha como “The Great Pretender” sua canção favorita.


The PretendersFoto Por: Matt Holyoak

O Começo do The Pretenders

Uma curiosidade fica por conta que o primeiro single gravado na história da banda foi um cover de “Stop Your Sobbing” do The Kinks que foi produzido por ninguém menos que Nick Lowe durante uma session.

A versão ganhou uma boa repercussão tendo lançado posteriormente o single “Kid” e alcançado o topo das paradas britânicas no ano seguinte com o clássico “Brass in Pocket”; que também ficou bem colocado nos Estados Unidos.

O álbum de estreia lançado em 1980 teve uma ótima repercussão e abriu as portas para uma longa carreira repleta de hits radiofônicos como “Back on the Chain Gang”, (1982), “I’ll Stand By You”, “Don’t Get Me Wrong”, participação no memorável Live Aid (aliás nessa semana tivemos dia do rock), uma ponte aérea constante com os EUA e uma série de idas e vindas. A banda inclusive integra o prestigiado Rock’n’Roll Hall of Fame.

Sobre Chrisssie Hynde

Como curiosidade fica o fato de Chrissie Hynde já ter feito até mesmo uma pontinha na série Friends. Ela também afirmou em entrevista nos anos 90 ter se inspirado em Madonna “Me inspirou ver uma mulher com tamanha presença no meio de um monte de homens”, disse ela em meados dos anos 90.

Como conexão de sua carreira solo que passeia pelo folk, pelo pop, pelo jazz e até pela música brasileira veio a parceria com Moreno Veloso, filho de Caetano. Chrissie estaria trabalhando com ele, se não fosse a pandemia, e chegou a morar no icônico Copan, em São Paulo, no início dos anos 2000 para criarem juntos.

Ativista ela dedica seu tempo a lutar em prol de causas ambientais e pelos direitos dos animais. No disco ela revela também sua batalha contra o sexismo.

“Homens nunca saberão a dor que uma mulher passa”, diz ela em uma das faixas de Hate For Sale

The Pretenders Hate For Sale (2020)

Hoje o The Pretenders lança oficialmente seu décimo primeiro álbum de estúdio. O anúncio de que teríamos disco novo veio ainda em 2019 durante uma turnê conjunta com o Journey. Inclusive, ele seria lançado antes mas por conta do COVID-19 todos os planos foram revistos. Até por conta disso um intervalo tão longo entre o primeiro single, “The Buzz”, lançado no dia 17/03, e o disco.

Inclusive o nome do single, e do disco, “Hate for Sale” é uma homenagem a uma das mais clássicas bandas do punk inglês, o The Damned. O álbum também marca a volta de Martin Chambers para as baquetas, o membro original esteve ausente nos últimos dois discos (Break Up the Concrete, 2002, e Alone, 2016).

O álbum que é lançado no ano em que a banda completa 42 anos de trajetória (se somados todos os anos em que esteve em pausa), contou com as 10 canções compostas em parceria entre Chrissie Hynde e o guitarrista James Walbourne que além do The Pretenders também integra o The Rails.

“Queria escrever com James desde o primeiro dia. Ele é especialmente procurado e gravou com Jerry Lee Lewis, Dave Gahan e The Rails, para citar apenas alguns.

Sempre planejamos escrever enquanto viajávamos, mas como qualquer pessoa de uma banda diria, estar em turnê é o sonho de um procrastinador se tornando realidade”, conta Hynde sobre a demora para consolidar essa parceria.

A Produção e a atual formação

Para a produção foi convocado o veterano produtor londrino Stephen Brian Street. Ele que já trabalhou com nomes como The Smiths, The Cranberries, Blur, Suede, Morrissey, Mystery Jets, Pete Doherty, The Subways, Madness, Kaiser Chiefs, Babyshambles, The Courteeners, Feeder, White Lies, New Order, The Promise Ring, Graham Coxon, The Zutons entre outros.

Além da volta de Martin Chambers (bateria), o disco conta com Carwyn Ellis (teclados), James Walbourne (guitarra), Nick Wilkinson (baixo) e Chrissie Hynde (guitarra, vocais). O registro também é marcado por ser primeiro álbum com a formação ao vivo do grupo.

A Resenha

O disco conta com pouco mais de 30 minutos de duração no melhor esquema punk rock de se pensar um disco. No país ele está sendo lançado pela gravadora BMG Brasil e de bandeja é disponibilizado ao mesmo tempo o videoclipe para o single “You Can’t Hurt a Fool”, lançado em abril.

Hate For Sale faz um passeio pelas origens e discografia da clássica banda inglesa. Com direito a energia do punk rock, canções para dançar da new wave, reggae e até mesmo rockabilly.

Tem espaço para tudo, desde canções confessionais, passando pelo ativismo e as tradicionais – e radiofônicas – baladas para corações partidos. Joga seguro mas sem perder a elegância e frescor que consagrou a banda ainda na década de 80.

O Enredo

“Hate For Sale” homenageia a icônica banda comandada por Captain Sensible, The Damned, e tem uma introdução rockabilly no melhor estilo The Replacements, entre o punk, o blues e o rock’n’roll. Com refrão direto e guitarras aceleradas, a canção se resolve em menos de 3 minutos e tem como guia uma gaita.

“The Buzz” pisa no freio para falar sobre obsessões. O amor sempre presente nas composições do The Pretenders acaba de certa forma ganhando uma letra sobre quando um relacionamento deixa de ser saudável.

“Acho que todos sabemos que alguns relacionamentos podem assumir características de um vício em drogas. É sobre isso a música. Não é meu caso, é claro – eu nunca sou obsessiva, nunca obsessiva, nunca obsessiva…”, conta a guitarrista e vocalista Chrissie Hynde

A forte influência da música jamaicana presente em bairros de imigrantes como Brighton, em Londres, acaba transparecendo na misteriosa “The Lightning Man” que com certeza fisgará fãs de The Clash, The Specials, Madness e da última banda de Joe Strummer, The Mescaleros.

Inclusive o produtor do disco já trabalhou com o Madness, banda que ganhou uma homenagem nos Jogos Olímpicos de Londres com direito a memorável apresentação. Nossos demônios internos acabam ganhando as luzes do dia na faixa repleta de homenagens.

A Subida

O dança ganha espaço em “Turf Accountant Daddy”. Ela também ganhou clipe e é a queridinha do disco segundo Hynde.

“Essa é a minha favorita do novo disco, adoro o clima meio Top of the Pops que ela tem. Ela foi inspirada em algumas características ruins de alguns ex-relacionamentos, apesar de nunca ter namorado com alguém que trabalha com apostas”, revela Hynde

Quem já assistiu a alguma apresentação do lendário programa inglês que foi um dos responsáveis pela consolidação no mainstream do punk, reggae e new wave entenderá como o programa sempre levou Hits para a luz do dia. É realmente um ponto alto pois você consegue imaginar ela tocando em rádios com seus riffs afiados e vocais no melhor estilo jogador.

Desacelerando

Talvez a mais confessional, emotiva e bonita do disco seja a canção em que Hynde mais fala abertamente sobre ter o coração partido milhares de vezes. A guitarra mais lenta também é tocada no melhor estilo The Clash, os teclados também ganham o primeiro plano assim como os sing-a-longs, mas a protagonismo mesmo fica por conta dos vocais doces da vocalista.

A pista de dança volta a fazer sentido em “I Did Not Know When To Stop” que nos leva direto para um filme de ação onde sempre tem um bom romance. O jogo da sedução, claro, fazendo parte do enredo fatal.

“Maybe Love Is In NYC” também tem cara de trilha de um filme de amor que se passa na cidade da grande Maçã. Debaixo das luzes da quinta avenida a canção narra as paisagens da cidade dentro do contexto de dois amantes vivendo um sonho. Nela Hynde também fala sobre a busca incessante por um amor que dure.

A Tríade Final

A reta final do disco se inicia com “Junkie Walk” cheia de trocadilhos e piadas com o estilo de vida Junkie. Com ironias, deboche e bom humor a letra se diverte com um belo de um trava língua. Uma clássica canção de rock’n’roll.

“Didn’t Want To Be This Lonely” ganhou clipe de quarentena. O vídeo foi produzido e dirigido pela própria banda em parceria com o colaborador de longa data John Minton, que também já fez vídeos para Noel Gallagher, Portishead e Savages anteriormente, além de ter feito o clipe da faixa-título, “Turf Accountant Daddy” e “The Buzz”.

A faixa fala sobre o fim de um relacionamento mas com linhas de guitarras envolventes que até me lembram um pouco o jeito despojado de hits como “I Want Candy” dos compatriotas do Bow Wow Wow. Por uma coincidência da vida a banda foi montada pelo amigo de Hynde, Malcolm McLaren, com ex-membros da também ótima banda Adam and the Ants. As guitarras após seu refrão tem o melhor estilo Stray Cats de trazer riffs soltos e dançantes.

A Balada Confessional

Mas quem tem a missão de encerrar o décimo primeiro disco do The Pretenders é a sentimental, feminista e bastante confessional “Crying In Public”. Talvez também a mais significativa no quesito mensagem a se passar. Nela Chrissie abre o coração para falar sobre como “Homens nunca saberão a dor que uma mulher passa”.

Ela tem harmonias, teclados e arranjos que agradarão a fãs de Nick Cave por sua sensibilidade. Ela mostra a força de uma mulher para enfrentar situações que homens nunca saberão.

O disco acaba por si só mostrando o repertório variado que a banda consegue proporcionar. Tem hora para a diversão, para o suspense, para momentos mais intimistas, ativismo, amores e desarranjos. Uma fórmula que dá certo há 40 anos e que garantiu fãs pelos quatro cantos do globo. Como fator positivo fica provado como a banda não parou no tempo e tenta sempre ditar em suas composições o mundo em que estamos vivendo hoje. O mundo definitivamente precisa de mais Chrissie Hynde.

The Pretenders Hate For Sale


This post was published on 17 de julho de 2020 12:06 am

Rafael Chioccarello

Editor-Chefe e Fundador do Hits Perdidos.

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