Lembro bem do começo dos anos 00′ quando o Myspace e o (saudoso) Purevolume basicamente abriram um portal pra milhares de artistas que tinham pouco mais que um laptop como recurso para sua produção. Casos como do Washed Out, e Cansei de Ser Sexy, não foram isolados e muitas bandas conseguiram ganhar proporções jamais sonhadas.
“Eu colocava músicas no Myspace e se espalhava muito rápido, pessoas escutavam e gostavam bastante. Então se nada disso tivesse acontecido 6 anos atrás provavelmente eu não teria a oportunidade de vir até aqui, fazer shows e isso absolutamente me deixou em ecstasy. Jamais poderia pensar em conhecer o mundo fazendo música, sou muito grato a tecnologia.”, contou Ernest Green, o Washed Out, em entrevista exclusiva para o Hits Perdidos realizada em 2014
De fato essa maneira instantânea de consumir música mudou o mercado e hoje em dia é difícil encontrar um artista que não tenha optado por divulgar seu trabalho em ferramentas de streaming. Essa forma de produzir mudou definitivamente a forma de relação entre diversas partes do ecossistema da música. Gravadoras nunca mais foram as mesmas e tiveram que repensar seus modelos de negócios.
Se lá para 2003 os recursos para se gravar em casa eram limitados, hoje em dia com apenas um Iphone artistas como Chuck Hipolitho conseguem gravar seus EPs. Outros artistas tem até gravado as baterias, que antes nem pensar em gravar fora do estúdio, em sua própria casa. É uma indústria em constante mutação e muitos músicos conseguem extrair o melhor disso sem dispor de muitos recursos.
O músico Gustavo Cunha, de Pelotas (RS), em 2015 lançou de forma independente seu álbum de estreia. Este gravado em seu homestudio e trabalhando camadas que passam pela psicodelia, experimentações cinematográficas, batidas eletrônicas e com texturas estéticas do lo-fi.
Agora acompanhado por um time de músicos de sua cidade natal, ele da continuidade ao processo de suas gravações caseiras. Para a empreitada de seu segundo álbum, vaga-lume-gão, ele conta com as participações de Dionísio Souza (Kiai Grupo), no baixo, as baterias César Gularte (esquimós) e as texturas exploradas por Vini Albernaz (Musa Híbrida). Também participaram Davi Raubach (acordeão na faixa “tempo e espaço”), Gustavo Silveira (violão na faixa “tempo e espaço”) e Gustavo Otesbelgue (violão na faixa “corte seco”).
O disco que está sendo lançado pelo selo gaúcho Escápula Records foi gravado por Gustavo Cunha, co-produzido e mixado por Vini Albernaz, no Estúdio Cabeça de Algodão (Pelotas – RS) e masterizado por Lauro Maia, no A Vapor Estúdio (Pelotas – RS). Já a capa do registro teve o design feito pelo próprio artista e a foto por Andressa Santos.
Segundo o músico “o disco reflete sobre a memória e a imaginação como poética predominante, percorrendo uma ambientação imaginária através de suas letras (sendo quatro delas escritas em parceria com a artista Gabriela Cunha) e de sua sonoridade, que varia entre a leveza e o peso, o orgânico e o eletrônico.”
Já sobre seu abstrato – e complexo – título ele discorre: “É como um espaço inexistente, um ambiente imagético onde a poesia das músicas habita. Nesse ambiente imaginado, cada uma das três palavras se complementam, formando o percurso de uma narrativa.
Vagar através do lume (luz, luminescência) e do grão, como acesso à memória e a imaginação, abertas à interpretação do ouvinte. Com referências à fotografia analógica (lume e grão/granulado), presente também em todo conceito do projeto gráfico do álbum.”
Deixando assim seu trabalho aberto para os mais diversos tipos de interpretação dos ouvintes. O que para nós é sempre um prato cheio para viajar por estes campos distantes.
São 8 canções e 30 minutos de duração, o que acredito que seja um tempo acertado para sintetizar um disco com um conceito tão amarrado.
Desde sua primeira faixa o músico já deixa clara a postura e estética de seu trabalho. Com melodias agradáveis, abstração, acordes simples e canções pautas em sua ambiência e melodia. É assim que o registro se inicia com a delicada “Intra”.
Fãs de Pink Floyd sentiram facilmente o groove, a conexão com a natureza, as ambiências de bateria e os efeitos de delay nos pedais. Estes que deixam tudo ainda mais reverberante.
“Grão” chega de mansinho e vai se expandindo no horizonte aos poucos com sua levada jazzística e derretida. Os vocais de Cunha me lembram o músico norte-americano Steven Paul Smith, mais conhecido como Elliott Smith, tanto pelo jeito que descreve a paisagem como pelo tenaz uso das metáforas.
Quem mergulha de cabeça no universo abstrato do disco com direito a diversos elementos e ambiências é a bela “Corte Seco”. Seu tom zen traz de volta a cena o lado tribal e espiritual do ser humano. Os ritos de passagem e a plenitude ganham novos espectros de luz.
A veia mais folk – e cancioneira – ganha ares em “Tempo e Espaço”. Que traz como elemento o uso do acordeão. Seu tom reflexivo, conta belos arranjos e a busca pelo conhecimento ganha novos cenários. Uma faixa que definitivamente merecia a gravação uma session para imortalizar sua essência.
“À flor da pele que habito” faz o casamento entre o folk e a psicodelia. É através de sua densidade e busca por “seu lugar” que a canção caminha. Uma boa faixa para fechar os olhos, se desconectar e abstrair. Em tempos de tanto ódio, e conflitos, serve quase como um oásis para a alma.
“Voo” é uma das mais abstratas e tortas do álbum. Com uma poesia flutuante e que se deixa levar pelo vento, ela traz diversos elementos rítmicos que dão desdobramentos para a experiência do ouvinte.
Os backing vocals e efeitos eletrônicos deixam a viagem ainda mais reconfortante. A viagem é tão boa que como a própria letra diz “Nem vento contrário faz descer”. Neste momento já estão todos em transe se alinhando a outras órbitas.
Após o voo, é necessário um local para um refúgio e ele busca no mar em “Áquea”. Uma faixa mais calma e espiritual. Sua energia densa se conecta com a lua, o céu, o universo e cria uma atmosfera única e de expansão energética. Sentimento à flor da pele. A natureza sendo sua ponte com o seu eu interior.
Quem tem a missão de fechar é “Corpo, Casa” que creio que irá agradar a fãs de Catavento, Diego Xavier Trio e Boogarins por sua leveza, tom lo-fi e simplicidade. Ao som da natureza vaga-lume-grão se encerra.
O músico pelotense Gustavo Cunha em seu segundo álbum, vaga-lume-grão, que está sendo lançado nesta sexta-feira em Premiere pelo Hits Perdidos mostra claramente o poder da abstração como cura interna. A procura pela natureza para preencher os espaços vazios da alma. Seu disco, feito em parceria com diversos artistas de sua cidade natal, contou com acabamentos que deixaram sua obra ainda mais imersiva e espiritual.
O lançamento realizado em parceria com a Escápula Records tem produção do próprio artista e co-produção e mixagem realizadas por Vini Albernaz, da Musa Híbrida. O disco passeia por ritmos como a psicodelia, a MPB, o Folk, a música eletrônica e o lo-fi.
This post was published on 19 de outubro de 2018 11:01 am
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