Conexão Jamaifrica: Uma viagem no tempo e o espaço através da musicalidade africana e afro diaspórica (Parte 2)
Outro evento relevante e que nos ensina acerca da produção cultural no caso feita por africanos no Brasil foi o “Gringa Music” do congolês Yannick Delass. Cantor, compositor e guitarrista com dupla nacionalidade congolesa e são tomense, desde 2016 no Brasil, já tem um álbum lançado cujo título é “Espoir” (Esperança)-, o repertório da obra é influenciado pela rumba congolesa, o afrobeat e o reggae; as canções cantadas em Francês, Português, Lingala e kikongo.
O músico lançou em 2019 o single “Balancê” (2019) em que usa da Rumba e o Funk na composição musical com uma letra irônica ao jeito brasileiro de falar Francês. Outro material lançado pelo artista foi o single “Testment” inspirado no ritmo “Kassa” (do Oeste da Guiné ligado a cultura Malinké) e nas batidas eletronicas; em parceria com o coletivo brasileiro Treme Terra lançou o vídeo clipe de mesmo nome produzido pela Coleta Filmes. Ambas sonoridades, também, fazem parte do repertório do Projeto Conexão Jamaifrica.
Yannick em sua estadia no país, até então, performou em espaços culturais, casas de show, bibliotecas, festivais com sua banda formada pelos brasileiros Daniel Doctor (Baixo), Rafael Oliveira (Bateria) e Le Andrade (Guitarra). Ele já possuía passagens pelo Brasil com contrato assinado com uma gravadora e shows agendados, mas, foi a partir de sua vivência no país sem uma produtora mediando seu trabalho que passou a lidar com a racialização que está presente no campo da música que muitas vezes leva a ausência de oportunidades.
O Gringa Music emerge, portanto, como um projeto cujo objetivo, como ele dizia, “revolucionar” a cena musical na cidade de São Paulo oferecendo palco a músicos de distintas nacionalidades. No ano de 2018 o projeto possuía quinze meses. Na prática significou uma série de apresentações musicais no bar palestino Al Janiah com média de valor de R$ 10,00 e no segundo semestre de 2018 ocorreu na Biblioteca Mario de Andrade com entrada gratuita durando quase dois anos adquirindo um reconhecimento institucional.
Acompanhar a trajetória de Yannick foi um aprendizado da importância de sustentar conceitos musicais e planejar projetos, observando o contexto onde será aplicado, além disso, a partir dessa situação comecei a conhecer outras musicalidades não apenas africanas (como o Soukous ou Rumba Congolesa), mas Sul Americanas, do Oriente Médio, Ásia e Árabe. Além de que foi importante para eu perceber, a partir das críticas em como o contexto musical brasileiro produz uma certa homogeneização das distintas propostas musicais e origens sob as categorias “imigrante e refugiado”, as quais ele em muitas ocasiões se opôs.
Outras importantes artistas que pude acompanhar foram Lenna Bahule e Jéssica Areias.
Atualmente vivendo em Moçambique, embora volta e meio em passagens pelo Brasil e Europa, Lenna Bahule (cantora, compositora, orientadora vocal e ativista cultural) é uma artista de grande visibilidade devido a sua originalidade musical e sua visão crítica das relações raciais no Brasil. Ela tornou-se referencia em razão não apenas das palestras e entrevistas realizadas sobre esse tema do racismo, mas aos shows e oficinas sobre cultura Chope e Zulu desenvolvidas no país.
A experiência de sua residência no país lhe gerou, igualmente, mudanças em sua proposta de pesquisa passando a dedicar-se mais ao “roots” de sua cultura, digamos assim, especialmente, mas não apenas, pesquisa da musicalidade dos Chop´s (povo originário do sul do país) e aos cantos populares de trabalho.
Um de seus projetos desenvolvidos no Brasil foi a parceria com João Taubkin, ambos se conheceram por volta de 2015 no projeto Gumboot Dance Brasil, desde então realizaram apresentações musicais unindo a voz, a música corporal e percussiva de Lenna e o baixo elétrico de Taubkin, criando um diálogo experimental entre Moçambique e Brasil. Em 2016 lançou seu álbum solo “Nômade” (Loop Discos) que, posteriormente, tornou-se projeto artístico multicultural formado com mulheres do Brasil, Uruguai, Portugal e Moçambique denominado grupo Nômade – participavam ela, Camila Sonza, Luana Baptista e Lílian Rocha (quem me apresentou).
Com Lenna Bahule pude conhecer outro ponto de vista sobre as relações raciais e o racismo contra afro brasileiros e africanos no Brasil, mas, também a reflexão daquilo que seria a africanidade brasileira e de que modo pensam e vivenciam os africanos a sua africanidade.
A outra artista com quem formei-me, digamos, foi Jéssica Areias de Angola, cantora, compositora e educadora, à época a mais de 6 anos no Brasil. Ela possui um repertório sofisticado que navega por múltiplas referencias da música popular de seu país de origem, a MPB brasileira, o Fado e a música Cubana. No Brasil tem um álbum lançado em 2014 denominado Olisessa (Distr. Tratore) o título significa em Umbundo “Licença”. No país fez apresentações em canais televisivos e de internet e performou em espaços artísticos como a FNAC, rede SESC, embora, tenha tido passagem por Portugal.
É uma destas artistas cujo repertório aborda temas universais cuja voz explora distintos tons em uma mesma canção. A universalidade de seus temas, por exemplo, evidencia-se na canção “Guarani” homenagem as várias nações indígenas brasileiras, sem esquecer, contudo, de homenagear povos de seu país como o caso da música “Angola Kandenge” – que costumo tocar nas festas do Conexão Jamaifrica; em suas apresentações ela canta em crioulo de Cabo Verde, Umbundo (uma das línguas mais faladas de seu país natal) e português.
Afim de aprofundar as referências que ambas apresentavam e, também, após a leitura do livro “África Lusófona: Além da Independência” de Fernando Arenas, conheci outro gênero musical da região dos países africanos de língua portuguesa que hoje integra meu repertório o “Funaná”.
Continua na terceira parte
Conexão Jamaifrica: Uma viagem no tempo e o espaço através da musicalidade africana e afro diaspórica
This post was published on 10 de novembro de 2022 10:00 am
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