Alguns buscam refúgio como foi o caso de Renan Vasconcelos da banda Avec Silenzi. O músico e designer, esgotado da agitação e tensão da capital carioca se refugiou em Búzios para controlar sua inquietação. Eis que nasce Dramón.

“Búzios foi um lugar extremamente acolhedor nesses 6 anos e meio que vivi lá. Cumpriu muito bem seu papel de refúgio. Encontrei um pouco de paz para pôr ordem na cabeça, e consegui deixar para trás determinadas angústias que sentia no Rio. O nome do primeiro EP é Ansiedade Morte, uma referência à lembrança do porque fui parar lá em Búzios”, reflete Renan.

Deste retiro ele produziu material suficiente para dois EPs que estão sendo lançados pelo selo independente Sinewave. Para sua empreitada solo, e confessional, ele nomeia o projeto como Dramón.

O lançamento do primeiro EP, Ansiedade Morte, em agosto do ano passado também marcou a mudança do músico para São Paulo (SP) onde desde então ele tem vivido.


Nesta segunda-feira (18) o músico carioca lança seu segundo EP, Equilíbrio Utopia. – Foto Por: Natália Salvador

Transição

O novo EP, Equilíbrio Utopia, diferentemente do debut foi composto praticamente todo em São Paulo, segundo Renan apenas uma canção foi feita em Búzios (RJ). Ele ainda conta que o novo material foi realizado de forma mais objetiva e que também fecha um ciclo.

“O Ansiedade Morte foi mais experimental, e eu ia achando as musicas entre coisas que eu grava e deixava de lado por um tempo, e depois identificava uma potencial música. Nesse eu fui mais pra cima, tipo, vou fazer desse som uma música.

E acho que ele representa um pouco o fechamento do primeiro ciclo de trabalho desse projeto. Eu já estou repensando muita coisa, e quero lançar logo esse EP para começar a executar coisas novas.”

Desta vez o EP teve uma série de participações especiais, Marcelo Malni (Zander) gravou o baixo e Victor Cardoso faz participação especial em “Insular”, uma das 5 faixas do disquinho. A gravação, edição, mixagem e a arte da capa são assinadas pelo próprio Renan.

Sobre a transição sonora e o conceito central da obra o músico carioca relata:

“O título Equilíbrio Utopia, acho que ele é meio auto-explicativo. É sobre essa coisa utópica de caçar equilíbrio nas coisas. Tipo alimentação equilibrada, equilíbrio entre trabalho e lazer, etc. Equilibrar alguma coisa, sempre acarreta desequilibrar outra. Acho que hoje em dia eu entendo isso melhor, e consigo viver melhor também!”, reflete Dramón



Equilíbrio Utopia começa logo em brasa com “Fogo” e desde seus primeiros segundos já demonstra que a experimentação e o ambient vão pautar o lançamento. Seu instrumental gélido vai crescendo aos poucos e nos passa a sensação de caos e alerta.

“Raumadá” já trabalha mais seus loops, e transições, podendo facilmente ser adaptada para uma trilha de filme de ação. Parece até fazer uma conexão ocidente-oriente por conta dos samples que traz e de sua verve energizada.

Quem tem um universo mais enigmático é justamente “Cherry Plum” que nos passa a sensação de falsa calmaria feito uma valsa orquestrada por robôs. Despertando emoções em meio a uma forte energia que se dissipa.

O futurismo e as máquinas do trabalho do dia-a-dia chegam com tudo em “Robbin B”, e de certa forma parecem fazer uma crítica a nossa rotina acelerada e automatizada. Onde o desequilíbrio faz com que jamais nos sentamos satisfeitos.

Quem encerra o EP é justamente “Insular” que vai progredindo de forma silenciosa e caótica. Se você gosta de NIN com certeza vai escolher esta como sua favorita devido ao seu experimentalismo, desgaste e intensidade.

Equilíbrio Utopia carrega um conceito mais forte e uma linha de raciocínio mais lógica de seu início ao fim conseguindo reproduzir através de experimentos emoções de nosso desgastante – e extenuante – cotidiano. Entre nossos desequilíbrios, vitórias e descompassos.

Entrevista

Conversamos com Renan Vasconcelos, Dramón, para saber mais sobre o EP, as origens do projeto e inspirações.

Após o primeiro EP enfim temos a oportunidade de conversar sobre este projeto. Como surgiu o Dramón e como tem servido de terapia para você?

Renan Vasconcelos: “Eu tava a fim de aprender como gravar e produzir sozinho e acabou que o projeto nasceu daí, através de experimentações e tentativas. Chegou uma hora que achei que tinha algo para mostrar que foi o primeiro EP. Eu realizo tudo sozinho de acordo com as técnicas que aprendo, equipamentos e tempo que tenho disponível. Então essa é a terapia: ficar em casa testando sons, decifrando onde posso ir com eles e tentando aprender alguma coisa.”

O projeto também é um pouco da sua transição de vida e emoções, tanto é que a sua vinda de Búzios para São Paulo já mostra uma mudança sonora. Mesmo ainda introspectivo e questionando o equilíbrio, você vê ele mais “otimista” que o anterior?

Renan Vasconcelos: “Não sei se mais otimista, mas acho que não estou mais tão refém das minhas (faltas de) habilidades como produtor. Aos poucos tenho encontrado alguns caminhos. Em quanto o Ansiedade Morte é fruto de muita tentativa e frustração, nesse eu consegui assumir mais as rédeas da coisa. Embora isso tudo seja muito novo e eu ainda seja iniciante eu consegui minimizar o fator frustração

E eu tenho vivenciado muita coisa que almejava em minha vida pessoal por conta de minha mudança. Talvez haja alguma conexão aí…”

A sonoridade é bastante experimental e gostaria que comentasse mais sobre sua pesquisa por loops, elementos, samples e como funciona seu processo criativo.

Renan Vasconcelos: “Eu sou mais interessado por sonoridade do que por melodia ou composição. Sempre fui. Inclusive em bandas que toquei no passado. Eu mal sei compor uma canção com estrofes, refrão, etc. Gosto de imaginar aonde determinado timbre ou som me leva, e meu processo de composição é guiado por isso.

Muita coisa começa em idéias de guitarras, que é meu primeiro instrumento, mas como o processo não segue nenhum ritual, as decisões são tomadas de acordo com o que me agrada naquele momento: a guitarra que deu início à música pode acabar ficando de fora.

Esse tipo de coisa, faz com que eu acesse alguns sons que eu não acessaria de uma forma lógica, e é isso que me interessa na composição. O Malni do Zander colabora com os baixos que nem sempre entram na música gravada, mas no ao vivo sim.

Eu acabo utilizando o que está a meu alcance em termos de samples e elementos, mas eu abuso mesmo é de processamento nos instrumentos (guitarra, drum-machine e sintetizador), e depois me fodo para reproduzir ao vivo, apesar de sempre anotar num caderno as regulagens de tudo.De qualquer jeito, a música eletrônica tem uma forma completamente diferente de se pensar e fazer. Ainda estou engatinhando.”

Acredita também que a quantidade de softwares e músicos experimentando bastante acaba contribuindo? Quais artistas mais tem ouvido que de certa forma te provocaram a experimentar ainda mais?

Renan Vasconcelos: “Com certeza sou muito influenciado por esse momento que estamos vivendo. Eu vim do rock, e tenho algum conhecimento de música brasileira. Mas em algum momento morando em Búzios eu me interessei bastante pela música eletrônica, e comecei a me interessar pelos equipamentos e suas possibilidades. Mais ou menos por essa época, 2 discos me marcaram bastante: o Space Is Only Noise do Nicolas Jaar e o Progress Chance do Ricardo Donoso (artista brasileiro que mora nos EUA).

As construções músicas e do disco em si do Nicolas Jaar me instigavam a curiosidade, em quanto que o disco do Ricardo me bateu muito na sonoridade e ambiência. De lá para cá, flertei com vários estilos dentro da eletrônica, mas hoje em dia ouço muito ambient, que é mais ou menos o que tenho feito. Mas é claro que qq artista que me diga algo vira referência e inspiração.”

E como anda o Avec Silenzi? Ainda continua contribuindo na banda a distância? Como de certa forma vê que estar na banda contribuiu para sua formação musical?

Renan Vasconcelos: “O Avec está parado no momento. A banda durou quase 10 anos ao todo e foi meu principal foco musical durante esse tempo. Então com certeza trago muito dessa experiência comigo.”

This post was published on 18 de março de 2019 10:10 am

Rafael Chioccarello

Editor-Chefe e Fundador do Hits Perdidos.

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