A cidade é São Paulo. Sua cor é cinza. Seu céu é dividido entre grandes os arranha-céus e as nuvens que se misturam com a poluição. Cenário próprio de uma grande metrópole moderna que sofre com os mais diversos tipos de problemas.
A capital paulista não para e não descansa. Seus cidadãos sofrem com suas marcas, o tanto que tem a agradecer também tem a repudiar. A cobrança perante seus sonhos, suas conquistas, seus deveres e o que “esperam” de você estão estampados nas faces de seus habitantes entre um pingado e uma cerveja. Entre engravatados e ambulantes a pluralidade da cidade se mostra a cada esquina, a cada rusga ou conflito. Seja ele interno ou externo.
Essa angústia, agitação, caos e descompasso podem ser ouvidos através dos acordes cirúrgicos do Poltergat no incrível Blanka lançado no ano passado pelos selos Howlin’ Records e Sinewave Label.
Hoje vamos falar de outro lançamento com o selo de aprovação Sinewave, Pausa do Testemolde. Assim como o post sobre o disco do This Lonely Crowd, a dupla Elson Barbosa e Lucas Lippaus preparou um vídeo especial para introduzir o trio.



Como o próprio Elson, um dos responsáveis pela Sinewave, comenta no vídeo: “O epicentro é São Paulo. A cor é cinza. A base é rock. Assim como o concreto que envolve a cidade. Em 2017 a frase do release da banda de 2014 está mais atual do que nunca”.
Através de seus tempos quebrados, peso do metal misturado com o grunge a banda se fosse americana facilmente estaria presente no livro Nós Somos A Tempestade – Conversas Sobre o Metal Alternativo Dos Eua do jornalista Luiz Mazetto.
Do Neurosis passando pelo Helmet ao Melvins, a série de livros mostra através de suas páginas como o metal alternativo foi se moldando na terra do Tio Sam. Inclusive estou ansioso para começar a ler o volume dois lançado no fim do ano passado pela editora Ideal.
Talvez as bandas citadas logo acima sejam ótimas para explicar a vitalidade e agressividade do som do Testemolde. Na ativa desde 2008 eles contam em sua trajetória com um álbum cheio (Testemolde – 2014), e agora dois EP’s, Hidroxila (2015) e Pausa (2017).
Algo que vale ressaltar sobre o trabalho do trio formado por Azeite De Leos (guitarra), David Menezes (baixo) e Guilherme Garcia (bateria) é o teor “rueiro” dos trabalhos. Afinal de contas a cidade cinza e suas vivências que os inspiram a produzir sua música, também é o grande palco para a apreciação do seu som.
Em 2014 por exemplo após o lançamento do disco de estreia eles realizaram intervenções sonoras durante Bienal da Arte na praça Vitor Civita. A rua ainda serve de palco e nestes quase 10 anos de trajetória faz parte também de sua identidade.
No ano passado eles tiveram a oportunidade de excursionar pelo nordeste onde participaram do festival Under the Sun (Natal / RN). Outro acontecimento que marcou o ano de 2016 para o projeto foi o show simultâneo com a banda Ralo que eles fizeram no fim do ano tocando com duas baterias, duas guitarras e dois baixos simultaneamente.
Desta forma chegamos a Pausa. O EP foi gravado ao vivo no Family Mob Studio em São Paulo por Hugo Silva e mixado e masterizado por David Menezes Davox no estúdio Rolo de Lata 77 Produções.

A capa é uma foto do artista plástico e guitarrista do trio Azeite de Leos.

O EP conta com as faixas “Somália” e “Helena”, as duas com um tempo parecido, cerca de três minutos e meio de duração, muitas quebras e o equilíbrio e peso de estilos como o post hardcore, o metal e o grunge. Uma curiosidade em seus primeiros dias o trio contava com vocais mas isso não durou muito tempo. Desde então o som é instrumental.
*Outra curiosidade: O processo de composição como eles falarão veio das linhas de baixo. Após isso foram encaixadas as linhas de guitarra e bateria.
“Somália” já começa transgressora com um riff hipnótico com uma viajante linha de baixo, as guitarras entram dando o peso e deixando o clima tenso. Cheia de quebras a bateria tem a missão de segurar o tranco. Conforme a canção vai progredindo começa o duelo entre guitarra x baixo que equalizam e criam o clima “acinzentado”.
“Helena” poderia estrelar facilmente alguma fase da série de video games Tony Hawk. Consigo fechar os olhos e observar uma fase do jogo onde o cenário parece “estar dando curto”. É nessa atmosfera um tanto quanto “sombria” e densa que a ambientação ganha destaque. A introdução dura cerca de um minuto e depois somos surpreendidos com novos riffs e viradas de bateria. Impossível ouvir sem ficar com o eco do barulho de “interferência” que acompanha a canção na cabeça.O mais interessante do curto EP é observar a cada audição novos detalhes em cada instrumento. Com destaque para o single “Helena” que tem um poder magnético de faixas de artistas como Melvins, Fu Manchu e Sleep.

[Hits Perdidos] O Testemolde está em atividade desde 2008 e o som sempre teve o ar urbano como fonte de inspiração. Como o cotidiano que estamos vivendo afetou no resultado do novo EP?

Testemolde: “Bom, difícil dizer exatamente o que nos influenciou, mas com certeza, seguimos um caminho de formatar os sons diferentes, os riffs não se repetem, a musica é como uma historia, as coisas (riffs) acontecem uma vez e depois são passado, como no nosso cotidiano. E também, a dinâmica das músicas mostram isso, elas começam mais lentas e baixas, e vão ganhando riffs e volume, como um dia/semana que vamos vivendo.”

[Hits Perdidos] Nos últimos anos o espaço público para intervenções urbanas teve ganhos significativos como a abertura da Av. Paulista entre outros espaços. Acreditam que essa tendência com a mudança de gestão na cidade se manterá?
Testemolde: “Boa pergunta! Esperamos que sim, mas, ao invés de ficarmos esperando atitude dos outros, podemos nós mesmos se mexer e fazer acontecer. E também, cobrar dos responsáveis pra não deixar a cultura no geral, morrer.”

[Hits Perdidos] Ainda falando de políticas públicas. A música tem inspiração no cinza da cidade e nas últimas semanas através do “Cidade Linda” muitos grafites e pixes tem sido removidos de São Paulo. Sendo considerado por alguns como um “acinzamento da cidade”.
Qual a visão de vocês sobre isto? A tendência é a música de vocês ficar ainda mais cinza?

Testemolde: “Esperamos que não, e uma coisa não esta liga diretamente a outra. Culturalmente sim, mas são nichos diferentes. Como falamos antes, ao invés de nos conformarmos com a cidade cinza, vamos correr atras, assim como sempre foi na música. E duvidados da música ficar mais cinza, claro que como qualquer coisa que tem monte, nem sempre tudo é bom, mas tem muita musica boa surgindo por ai.
O Testemolde está na ativa desde 2008 e tem como as principais influências Helmet, Unsane e Melvins. – Foto: Divulgação
[Hits Perdidos] Em 2014 vocês lançaram o primeiro álbum (Testemolde), depois veio o EP (Hidroxila – 2015) e agora o Pausa (2017). O que aprenderam ao longo do tempo com erros do passado que se pudessem voltar no tempo alertariam?

Testemolde: “Acho que não classificaríamos como “erro”, e sim como experiência. Musicalmente evoluímos, mudamos, dentro do nosso estilo, a sonoridade da banda. E pelas experiências, ou erros como falaram, aprendemos a mudar o caminho, fazer de um jeito diferente. Acho que não voltaríamos no tempo, como nossa nova forma de compor esta mostrando, as coisas acontecem e depois fica pra trás, as vezes de uma forma boa e outras vezes ruim, e “corrigimos” isso no proximo passo o que acharmos que deu errado.”

[Hits Perdidos] Contem um pouco mais sobre cada uma das canções do novo EP.

Testemolde: “Como são só duas músicas, por falta de tempo, não tivemos muito pra produzir e fazer novas musicas. Foram riffs que nosso guitarrista apresentou, e como dito antes, resolvemos contar historias, riffs que não se repetem. Estamos numa fase sonora diferente, riffs mais lentos, mas dinâmicas nas músicas, e muitas vezes o baixo é a linha principal das melodias, e não a guitarra.
Criamos as músicas meio em paralelo, tínhamos duas bases e fomos ajustando os detalhes depois, uma de cada vez. E sinceramente, nossas musicas não tem muita firula, são sons diretos, porrada e volume, realmente só acertamos os riffs e ordem da história.”

[Hits Perdidos] Como foi a experiência de fazer um show simultâneo com a banda Ralo? Como rolou a dinâmica e o entrosamento entre os projetos?

Testemolde: “Pô, isso foi do caralho. Primeiro, que o Ralo são nossos irmãos, temos a mesma formação, guita, baixo e batera, isso ajudou muito. Temos referencias muito parecidas, entao não foi problema nenhum escolher as músicas que íamos fazer juntos. E não podia ter sido melhor, o entrosamento foi instantâneo, as músicas saíram na hora. E o show, entrou pra história. Além disso, alguns de nós já temos outros projetos com os integrantes, o que também ajudou. E não paramos por aí, nosso plano é evoluir e fazer muito mais coisas juntos.”

Playlist Especial de Lançamento no Spotify

O trio preparou especialmente para o Spotify do Hits Perdidos uma playlist com 15 sons que retratam o universo cinza do Testemolde. Não deixem de seguir o perfil para novas playlists e muitas novidades!



Saiba quem escolheu o que da lista:

David (baixo)
– Black Sabbath – Paranoid
– Alice In Chains – Them Bones
– Helmet – Drug Lord
– Raul Seixas – Al Capone
– Frank Zappa – Prelude to King Kong

Azeite (guitarras)

– Bad Brains – Big Take Over
– Helmet – In The Meantime
– Deftones – Rickets
– Unsane – Only Pain
– Shellac – Ghosts
Guilherme (bateria)
– Helmet – Unsung
– Russian Circles – Mota
– Mastodon- The Motherload
– Norma Jean – 1,000,000 Watts
– Anup Sastry – Lion

Vale lembrar que a Sinewave nessa semana através de seu perfil oficial no Spotify estreou a série “Sinewave 7” na qual a cada semana 7 artistas do casting ganharão destaque na plataforma. Algo similar ao que é feito nas playlists bombadas do Spotify. Não deixe de acompanhar!


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This post was published on 22 de fevereiro de 2017 9:24 am

Rafael Chioccarello

Editor-Chefe e Fundador do Hits Perdidos.

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