Nina Maia revela as nuances por trás de “INTEIRA”
No fim de outubro, uma das grandes revelações do ano do cenário musical paulistano, a mineira de nascença Nina Maia, lançou seu ótimo álbum de estreia, INTEIRA. Reunindo 8 canções, o material é daqueles que reúnes canções de toda uma vida, com suas vivências pessoais da juventude, servindo como norte para os processos de amadurecimento e cura pessoal.
“Esse disco traz uma eu-lírica-personagem que vive uma jornada. Começa trancada, questionando a si mesma e o mundo ao redor. Aos poucos ela passa a entender o que aconteceu dentro de si e o que a deixou nesse lugar. É a partir daí que ela busca se revelar, vai ganhando coragem e encara tudo isso, com amor e perdão. No final ela se liberta, depois de juntar todos os cacos e se refazer. Ganha força e vai pro mundo, inteira”, comenta a artista
A cantora de 21 anos, com ainda muito futuro pela frente, dividiu a produção musical com o músico e produtor paulista Yann Dardenne (Seloki Records). Como todo álbum surge de processos, muitos deles oriundos de testes de tentativa e erro, acerto e maturação, foi a partir dos shows ao vivo que os caminhos foram se concretizando.
“Fomos testando propostas diferentes nestas apresentações, sentindo as possibilidades dos arranjos de cada canção. Depois disso, mudanças também aconteceram na fase do estúdio, com alterações, distorções e adições de elementos eletrônicos na parte da produção”, crava Nina Maia
Além de Nina (piano, rhodes e guitarra), a banda completa que participou das gravações conta com Thalin (bateria), Valentim Frateschi (baixo), Francisca Barreto (cello) e Thales Hashiguti (viola e violino). Estes que compõe uma cena proeminente contemporânea em seus respectivos projetos.
Jazz, Indie Pop e a MPB acabam aparecendo entre as referências, muitas vezes de forma sutil e plástica com direito a colagens sonoras que criam atmosferas intensas em um disco que olha para o passado pelo retrovisor. As influências fundem o contemporâneo, como ela mesmo revela em entrevista exclusiva para o Hits Perdidos, mas também olha pelo retrovisor grandes clássicos da música brasileira.
“A gente trouxe referências de cantoras do samba canção, do Clube da Esquina e seus membros, artistas que influenciaram a formação musical da Nina, sem deixar de lado sonoridades contemporâneas que ela escuta com a mesma intensidade”, expõe o co-produtor musical Yann Dardenne.
Projeto Multidisciplinar
INTEIRA também se destaca pela atenção na produção artística e nos detalhes além do som. O que transparece na linguagem visual, nas cores, vestimentas, narrativa e na produção audiovisual. Um grande exemplo disso é o videoclipe de “SUA”, este produzido por uma equipe majoravelmente composta por mulheres.
A parte estética-visual foi desenvolvida em parceria com Duda Granato e Mariele Scholl, no figurino; Marina Novelli e Elisa Mendes (Fabulosa.CC) nos vídeos e fotos; e Otto Dardenne (Seloki Records) na direção criativa.
A paleta passa pelas cores bege, marrom, rosa e vermelho, já o figurino explora o branco e o preto por meio de peças feitas da junção de cortes e retalhos distintos que, costurados, se integram para revelar sua unidade. Tudo isso para entrelaçar o conceito de INTEIRA.
“Ficou evidente no processo de escolha do figurino a necessidade de desenvolver algo que traduzisse essa sensação dos ‘pedaços’ que me fazem ‘inteira’. Parte das peças têm assinatura da Duda Granato, que me ajudou a expressar essa ideia, criando figurinos customizados ao meu corpo”, reflete Nina
Entrevista Exclusiva: Nina Maia sobre INTEIRA
Como foi o processo de amadurecimento até chegar ao álbum? Quando sentiu que era o momento certo e o que precisou desenvolver ao ponto de se sentir segura para entrar em estúdio e gravar?
Nina Maia: “A maioria das músicas do álbum são composições que venho guardando há muito tempo e tive, nos últimos três anos, a oportunidade de rodar com elas no palco. Isso foi essencial para o amadurecimento de cada uma – pude testar diferentes arranjos, acompanhamentos e sonoridades.
Na paralela, fui gravando demos e juntando referências. Então quando eu e o Yann Dardenne, que é o co-produtor do INTEIRA e me acompanha nos shows desde 2022, nos juntamos para gravar e produzir tudo, sabíamos aonde ir.”
Aliás, como as parcerias com produtores e em projetos envolvendo outros grandes artistas te ajudaram nisso? Teve algum destes projetos de trilhas que acabou trazendo ideias para o que viria na carreira solo?
Nina Maia: “As experiências que tive com trilhas sonoras como compositora e cantora foram essenciais. Estar em estúdio criando com um direcionamento comum, em prol do filme, cena ou projeto, me ensinou bastante. Essa canalização de ideias para uma mesma direção, em conjunto, é bastante poderosa. Viver isso foi muito importante para que eu pudesse co-produzir meu primeiro álbum. Além disso, pude ver de perto o trabalho de tantos musicistas que admiro.”
A narrativa do disco foi pensada para soar mesmo como um filme? Como foi lidar com tantas memórias?
Nina Maia: “Uma das partes mais legais do processo foi ao final da fase de produção, quando me deparei com as oito faixas e fui procurar a ordem. Ali, entendi que apesar de serem um compilado de composições pessoais, aquelas músicas contavam suas próprias histórias, e sobretudo, tinham algo em comum. Entendi que ali tinha um arco narrativo, uma jornada, e me propus a olhar para o álbum assim. Isso potencializou o projeto.”
Aliás, o trabalho é multifacetado nesse sentido, tanto na estética das fotos, como nas produções audiovisuais ao figurino, como foi pensar na extensão da narrativa?
Nina Maia: “O momento de pensar a identidade narrativa do álbum foi bem especial.
Primeiro, me juntei com o Otto Dardenne, do Seloki Records, e Duda Granato, minha amiga e colaboradora. Juntos, ouvimos o disco e falamos sobre a narrativa de cada música e do todo.
Nisso nos propomos a juntar imagens, cores e símbolos que representassem o INTEIRA – sempre numa busca por síntese, minimalismo e elegância. Dali, nasceu uma paleta de cores, um conceito, etc. Então levamos isso para mais artistas e colaboradores do projeto, fizemos um shooting, e dali nasceu a capa e os outros materiais.”
Meu primeiro contato foi justamente com o videoclipe “SUA”. Durante uma palestra na UNICAMP mostrei ele como exemplo para os alunos do curso de multimeios e eles ficaram impressionados com a produção, tanto pela direção de arte, como pelos frames. Gostaria que contasse mais sobre o processo, montagem e da equipe que participou do vídeo.
Nina Maia: “Que maravilha! Fico honrada, muito obrigada! O clipe de “SUA” foi dirigido pela Gabriela Boeri, que trouxe grande sensibilidade para a representação visual da música.
Foi um processo especial e tivemos uma equipe majoritariamente feminina. A montagem é da Duda Casoni, que amarrou lindamente as imagens com as minúcias do som, e a capa é um still feito pela Liz Dórea.”
O que quis trazer na parte das temáticas? Tem alguma música que quando canta sente que volta para o momento em que viveu a situação?
Nina Maia: “As temáticas variam de música pra música, mas sinto que tem uma linha em comum entre todas, que é a busca por si mesma. Entre falar sobre estar trancada e admitir isso (“MAR ADENTRO”, por exemplo) ou falar sobre estar perdida, mas seguir procurando o caminho (“KAÔ” e “AMARGO”), a jornada do disco se desenvolve, e termina, por fim, no encontro.
A maioria das composições parte de experiências pessoais minhas, mas no palco, o que acabo acessando é muito mais a emoção que a letra e a sonoridade convocam do que as situações ou momentos que as inspiraram.”
Entre as referências está a samba canção, mas o que de moderno e contemporâneo quis trazer também? Quais artistas sente que mais te inspiram no momento, algum deles surpreenderia as pessoas?
Nina Maia: “Pra mim era fundamental que a produção do álbum não fosse inteiramente orgânica, porque muito do que me influencia são sonoridades eletrônicas atuais. Kicks, 808s e autotunes são alguns elementos recorrentes que percorrem as músicas do álbum, mesmo que de forma singela.
Sobre referências, Rosalía é uma das minhas maiores inspirações na música contemporânea. A qualidade da síntese e apelo popular, e, ao mesmo tempo, a complexidade e tradição que ela consegue oferecer nas músicas são aulas para mim. Outros artistas que me influenciam de forma parecida são Kanye West, Ibeyi e Dadá Joãozinho.”
Como aconteceu a parceria com a Chica Barreto? Como foi o convite e como aconteceu seu desenvolvimento?
Nina Maia: “Conheci a Chica em 2021, pela internet. Estava montando meu show pela primeira vez e queria muito outra mulher para integrar a banda.
Nossa conexão musical foi instantânea e profunda, o que resultou também no início num formato de shows em duo (vozes, piano e cello), que rodamos durante 2022. No final deste ano, gravamos nossa primeira parceria juntas, “Gosto Meio Doce”, do Felipe Távora, e depois veio “AMARGO”. Seguimos nos apoiando e acompanhando sempre, somos grandes amigas.”