Supervão reflete sobre o que permanece constante em meio a mudanças inevitáveis em “Cabelo” (feat. Andrio Marquenzie)
“No meio do caminho tinha uma pedra. Tinha uma pedra no meio do caminho.” Trecho de um poema do Carlos Drummond de Andrade que se encaixa em tantas situações envolvendo bandas independentes. No caso do Supervão, de São Leopoldo (RS), foi justamente uma antiga canção que não entrou em seu último álbum de estúdio, Faz Party (2019, Natura Musical), que fez eles encontrarem o elo que fazia a banda existir.
Para eles, a “pedra” serviu de certa maneira como motivação. “Cabelo”, composta em 2017, acabou não fazendo parte da fase mais eletrônica festiva dos gaúchos, mas anos depois, em um momento onde estavam cogitando jogar tudo para o alto devido ao sentimento de desconexão com as raízes musicais, a canção serviu como motivação para todo um novo ciclo.
No processo de olhar para a estrutura da faixa, eles trouxeram para a nova versão influências de shoegaze e grunge. O que os motivou a convidar Andrio Maquenzi, ex-vocalista da cultuada banda dos anos 2000, Superguidis, para participar. A banda gaúcha que existiu entre 2002 a 2011 é também uma das grandes referências do duo composto por Mario Arruda e Leonardo Serafini.
Ironicamente, uma música 7 anos depois do primeiro rascunho serviu como combustível para uma série de novas composições que nortearam a vontade de lançar um segundo álbum. Mario relembra: “foi essa música rejeitada do passado que fez a Supervão voltar.”
O novo álbum já tem nome Amores e Vícios da Geração Nostalgia e, inclusive, o primeiro single “Nostalgia” foi lançado em novembro do ano passado.
Supervão “Cabelo” (feat. Andrio Marquenzi)
O material foi produzido por Mario Arruda, masterizado por Olimpio Machado e o convite também mostra um pouco dessa vontade de colaboração entre gerações do indie brasileiro. Estabelecendo por si só um diálogo aberto entre o passado e o presente. Andrio também está ativo em carreira solo.
“Cabelo explora temas de identidade e percepção, refletindo sobre o que permanece constante em meio às mudanças da vida.”, conta o Supervão
Em fase mais madura da vida, as novas canções já trazem temáticas mais inerentes ao universo dos 30+ e questionamentos sobre essas mudanças de vida que os caminhos que escolhemos nos proporcionam. Entre identidade, reavaliação de perspectiva de vida, mudanças de ciclos sociais e o sentimento de empatia em meio a conflitos inerentes a individualidade… entre afastamentos e as nostalgias desta fase.
As guitarras garageiras cheias de distorções devidamente calculadas, aliadas aos diálogos olho no olho, já dão algumas dicas do que esperar do segundo álbum do duo da região metropolitana de Porto Alegre.
Em acordes estridentes, a rebeldia indie continua viva, mas talvez um pouco diferente daqueles dias que virávamos a noite para ver o nascer do sol. Reflexão que dialoga diretamente com a nostalgia de “Dias da Juventude”, dos paulistas do Terno Rei.
Letra
“Cabelo”
Eu estranhei o seu cabelo
Não sabia bem se era você
Se era você…
Eu me escondi debaixo da mesa
Só esperando você, você falar
Você Falar
Eu precisava só confirmar o seu sotaque vão
Eu precisava só confirmar o seu sotaque vão
E como perceber o seu jogral espacial
E como perceber o seu jogral espacial
Vou te olhar do jeito que eu mesmo criei
Vou te olhar do jeito que eu mesmo criei
Eu errei
Quando eu via só mentia por dentro dos meus próprios olhos
Eu errei
Quando eu via só mente por dentro dos meus próprios olhos
Eu precisava ao menos trocar as lentes usuais
As vezes a vista se cansa e ve só mundos habituais
E como perceber o outro em si sem distorção
Como perceber o outro em mim, sua visão
Vou te olhar do jeito que eu mesmo criei
Vou te olhar do jeito que eu mesmo criei