Nesta sexta (01) Gabriel Franco, artista carioca que assina seus projetos como Abril Belga, lança seu terceiro álbum de estúdio, Metrô Hi-Fi. Antes disso temos a honra de realizar a Premiere no Hits Perdidos com direito a entrevista exclusiva com o músico que em sua discografia conta com os discos 99 (2018) e Sol de Mel (2022).
Indo contra a corrente do mainstream, o projeto tem justamente como foco a guitarra. Até por isso, este novo lançamento pode ser considerado “um disco de guitarra”. Foi justamente esse o ponto de partida de uma conversa divertida sobre referências, atualidade, contextos e frustrações dos 30 e poucos.
Bom humor e inspirações em sua própria vida, e a dos amigos que o cercam, acabam entrando como referências na narrativa que versa sobre não monogamia, decadência da classe média, influência digital e a automação do cotidiano ao longo de 11 faixas. Tudo muito leve e sem querer se prender a conceitos cabeçudos, como gosta de frisar.
“Não tentei fazer nada muito conceitual, acima de tudo quis me divertir no processo de compor e ter algo simples e honesto – a intenção era fazer uma coisa divertida, com foco na ironia das letras. A guitarra, nesse sentido, caiu como uma luva, por ser um instrumento ótimo para esse tipo de letra.”
Foi o rock alternativo e o Indie Rock que inspirou o projeto, tanto que ele cita que uma playlist com discos de artistas como Blur e Courtney Barnett, que ouvia no trabalho, naquela dicotomia de odiar estar ali, e a distância dos amigos por suas rotinas, que serviram como impulso para sacudir a poeira do instrumento e produzir.
“Como boa parte das pessoas da minha idade, eu sinto que falhei em diversos aspectos. Mas o que esse álbum tenta propor é que, de repente, por 32 minutos, a gente não deva levar isso tão à cabo e apenas curtir, com velhos amigos e canções divertidas. E é isso que convido vocês a fazer.”
O videoclipe para “Sempre Lotado” também está sendo lançado hoje. A produção audiovisual, assim como a sua letra, faz uma crítica à vida atribulada do trabalhador brasileiro em meio ao capitalismo tardio e foi dirigido por DirectorStudio.
Gabriel Franco (Abril Belga): “Acho que hoje, com Spotify e tudo mais, a gente tem muito acesso a todos os tipos de música. Então, fica muito natural pra o pessoal mais novo — e não só o pessoal mais novo, da minha idade também — explorar e misturar muitos elementos, o que é super positivo! Até porque o computador e os programas de gravação viraram instrumentos autônomos e os sintetizadores vem nesse pacote. Sintetizadores são muito bons pra brincar e experimentar.
Desde que comecei o Abri Belga, eu compunha no violão. Quando o violão quebrou, eu só senti que tava no meu momento de fazer algo mais de guitarra, e daí resolvi ouvir MAIS menos coisas, menos referências. Em meio a esse excesso de informação da internet de hoje, optei por me organizar dessa forma e focar mais nas letras. Eu acho que música “de guitarra” e mais minimalista cai bem com esse tipo de letra. Mas eu sempre fui um pouquinho do contra, então a opção pelo instrumento vem dessa minha necessidade boba também.
Ainda em relação à guitarra, eu assisto a shows de bandas novas e vejo que existem muitas que usam esse instrumento prioritariamente. Então, o que eu quero dizer com isso é que a guitarra não sai de moda tão cedo.”
Gabriel Franco (Abril Belga): “Sério? Não tinha pensado nisso. De repente é algo tão natural que eu nem percebo. Acho que o sotaque traz uma certa construção na melodia que remete ao Rio de Janeiro, né? Quase inevitável (risos).”
Gabriel Franco (Abril Belga): “Creio que as referências e letras vieram de observações cotidianas e nem sempre são autobiográficas. Na maioria, elas falam mais do que eu vejo os meus amigos e amigas vivendo e comentando, como estão os temas discutidos no geral. Daí, quando escrevi sobre rotina corporativa, relacionamentos modernos, comida processada, pais abastados que ajudam os filhos a saírem de casa, acho que as referências vieram dessas observações, das conversas do meu círculo social. Da mesma forma que, quando a gente era mais novo, os assuntos eram outros, saídas noturnas, etc. Foi só uma questão de transpor pra outra época da vida.
O recurso do bom humor vem mais das influências musicais no momento de escrever as letras. O nome do disco vem de uma playlist que eu usava pra ir e voltar do trabalho. Nessa playlist tinha o álbum de 2015 da Courtney Barnett e os álbuns do Blur daquela época chamada de “life trilogy” (1993-95). Eu ouvi esses álbuns até dizer chega (risos). Acho que esses artistas citados fizeram isso muito bem, pegaram referências cotidianas e trataram de um jeito divertido, criando personagens, por vezes caricaturas.
No final, a intenção era fazer algo que o meu pessoal pudesse se identificar e achar divertido. Falar das nossas vidas no momento mesmo. E talvez boa parte da galera esteja sentindo que queria estar em outro lugar da vida, ter conquistado mais.
Ainda acerca do humor, acho que não dá pra ser muito sério fazendo música sobre não monogamia, comida processada, concurso público, né? Até porque é um pouco ridículo, mas a gente tem que assumir que a gente é um pouco ridículo. Não faz mal ser feliz, ou infeliz às vezes, no caso.”
Gabriel Franco (Abril Belga): “(risos) sempre dá tempo! Quanto ao recado pra quem tá nesse miolo, talvez fazer tudo diferente do que eu fiz? Porque tem horas que eu acho que só fiz besteira da vida. Mas brincadeiras à parte, de repente um recado é não se cobrar tanto, não se comparar tanto. Cada um faz as coisas no seu tempo e nossa geração pegou um mundo muito diferente da geração dos nossos pais, as cobranças têm que ser diferentes também.”
Gabriel Franco (Abril Belga): “Como eu não gostava do meu trabalho, a música veio como um lugar de conforto. É bem comum a gente ter uma rotina de só ida e volta do trabalho, ter pouco contato com os amigos antigos, até porque tá todo mundo cansado e ocupado trabalhando. Mas a música tá sempre presente pra mim. Também é bom porque ela contrapunha a formalidade desse ambiente de trabalho. Tem gente que chega em casa e vai assistir Netflix, eu gosto de compor. O projeto veio desse lugar. Se uma fuga honesta da realidade tá em outros cantos pra algumas pessoas, pra mim tá na música, mesmo que falando da realidade, ela serve pra colocar as angústias pra fora, acho que é isso.”
Gabriel Franco (Abril Belga): “Essa pergunta é muito muito boa e eu não sei responder com nitidez. Eu não sei em qual perfil me encaixo. Eu continuo ouvindo coisas novas e ainda tenho vontade de experimentar muito na música, mas, ao mesmo, depois desse álbum, eu acho que me entendi melhor como compositor. Muito provável que eu nunca vá ser um grande compositor de MPB, nem da música experimental, mas acho que dá pra adicionar pequenos elementos.
Um amigo meu brinca que quando você começa a gravar piano, sopros, arranjos orquestrados, começam a falar que você amadureceu musicalmente. Eu acho que não é bem por aí, isso não demonstra maturidade musical, não que eu seja maduro, (risos). O que eu sei é que eu vou manter a guitarra, certamente, mas tentar compor com outras referências no próximo! Talvez voltar pra algo mais abrasileirado, quem sabe? Vamos ver o que vem por aí (risos).
Para os leitores eu recomendo o Ivan Paiva. Se vocês ouvirem o disco dele, vão entender a equivalência nas letras. O Pedro Tambellini, que tocou baixo e produziu esse meu álbum tem um trabalho sensacional pra quem curte algo mais psicodélico e ele também tocou no disco do Ivan.
Quanto às bandas novas eu gosto da Bella e o Olmo da Bruxa. Também adoro a Sophia Chablau. Eu gosto de tudo que ela faz, é uma compositora fenomenal. É impressionante como ela cria tanta coisa boa, em tanto volume.”
Gabriel Franco – composições (exceto faixa 6 por Gabriel Franco e Pedro Tambellini), letras, guitarras, vocal principal e teclados.
Pedro Tambellini – Baixo, vocais de apoio, mixagem e masterização.
Pedro Richaid – Bateria e percussão.
Bateria e baixo gravados no Estúdio Casa do Mato.
Guitarras gravadas entre o Estúdio Casa do Mato e o home estúdio do Gabriel Franco.
Vocais principais gravados no home estúdio do Gabriel Franco.
Vocais de apoio gravados no home estúdio do Pedro Tambellini.
Faixas 8 e 11 gravadas no home estúdio do Pedro Tambellini.
Produzido por Pedro Tambellini.
Técnico de som da gravação no Estúdio Casa do Mato – Rafael Sentoma.
Arte da capa por Mike Zimmerman.
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