Há um mês atrás, 17 de março, foi lançado o primeiro álbum do duo KASSEL – This is About Leaving, que traduzindo para o português significa “Isso é Sobre Partir”. O duo de indie alternativo formado pelos amigos Renan Rocha e Rodrigo Soares, ex-integrantes da banda Two Places at Once, lançou o álbum com 10 canções que, sinceramente, você nem sente o tempo passar enquanto ouve e quando nota já ouviu mais de uma vez. Nós conversamos com a dupla não só sobre o disco de estreia, mas também como é compor em inglês, sobre mudanças e como a música e a arte conversam entre si.
Nunca foi fácil falar sobre despedidas, sejam elas de lugares, momentos, pessoas. Todos os dias vivemos em plena mudança, uma partida em cada esquina, muitas deixam saudade, outras são necessárias, recomeços. Todas nos deixam vulneráveis a todos os tipos de sentimentos. É ver alguém querido partir e não saber pra onde ir, é se mudar para um lugar diferente e começar do zero. No fim todas são recomeços pra novas histórias e o que aprendemos com elas, e o duo conseguiu refletir essa linha tênue em suas canções. Foram 3 anos produzindo o álbum, longe do palco devido a pandemia, traduzindo fases da própria vida em canções.
“A maior mudança é interna, porque sinto que nos tornamos outras pessoas, de verdade. Nos despedimos de lares, de cidades, de pessoas, de ciclos sociais, de estilos de vida, de amizades, do nosso projeto musical anterior, de gostos, de tanta coisa… acho que na verdade tudo se resume em se despedir de quem nós éramos tempos atrás. Meio que abraçamos o pensamento de que há mesmo finitude nas coisas, e tudo bem.”, reflete Renan.
Já para Rodrigo, o mais interessante foi ver a diferença do retrato das pessoas que eram antes do disco e do que são hoje – “Foi um período de redescobrimento artístico, não só em relação à sonoridade, mas no propósito do papel da arte nas nossas vidas como um todo.”
Assim como as capas singles, a capa do álbum da KASSEL também foi feita pelo Rodrigo Soares – “…foi a primeira vez que eu tive que produzir um quadro “sob demanda”. Ele conta que geralmente acaba pintando de forma espontânea, mas que nesse caso foi um desafio que tirou seu sono por algumas semanas.
“Uma das coisas que eu mais gosto na KASSEL é justamente a importância e o cuidado que a gente tem com essa parte visual. Desde o nascimento do projeto, a gente tinha isso como uma prioridade, e o duo surgiu bem no momento em que a gente estava experimentando outros tipos de expressão artística além da música, como a fotografia, o cinema e a pintura. Então acabamos usando essas descobertas pra ajudar a formar uma identidade estética que dialogasse com as nossas músicas e ajudasse a contar as histórias que a gente se propõe a contar.”, resume Rodrigo.
Uma das minhas faixas preferidas, “All At Once” (Ouça), tem a participação da cantora Monnic. De acordo com Renan, a KASSEL queria muito uma participação especial nessa canção. Eles demoraram a achar a pessoa que iria cantar, até que o Saulo (saudade) que produziu o disco, sugeriu a Monnic que casou de primeira com a faixa.
“Logo de cara, quando ela mandou a primeira versão com as vozes dela, já deixou a gente arrepiado. Ficou lindo”
Todas as canções do disco são em inglês, mas abrimos um parênteses para a faixa 3 do álbum, “Zero”. Ela contém trechos em português.
“Foi muito automático. Desde 2018 a gente tem escrito coisas em português, o que tem se tornado cada vez mais frequente nesse últimos dois anos, por aí.”, relata Renan. Ele conta que “Zero” pode ter sido a primeira música composta com algumas frases em português, nada programado mas instintivo.
Já no videoclipe, o duo optou por um caminho diferente do que fizeram em “Fear” e “Headache“. Em “Zero”, a dupla quis experimentar um lado mais descontraído, orgânico, feito em stop-motion, estética perta e branca.
“Pra mim, os clipes mais divertidos de se fazer foram “Zero” e “Nightswim”, porque foi algo bem fluido: só a gente e uma câmera.”, conta Rodrigo.
Já conversei com alguns músicos e para alguns compor e cantar em inglês se tornou um hábito criado desde criança por influência da família, do que ouviam enquanto cresciam. Alguns acham mais fácil, alguns moraram fora do país e se adaptaram. Foram diversas repostas e é claro que também questionei a KASSEL sobre isso.
“Não sei se é mais fácil, depende do ponto de vista. É mais fácil eu escolher as palavras, talvez, o universo delas é menor. É mais difícil eu fazer com que essas mesmas palavras tenham efeito e emocionem quem escuta. É muito fácil o inglês virar um conjunto de palavras sem sentido mas foneticamente fácil de absorver. Você acaba cantando, decora o refrão, mas isso te toca realmente? Vale a pergunta. No fim das contas, hoje eu acho o inglês muito mais difícil de escrever”, reflete Renan.
“No nosso caso, a gente de fato não pensa muito. Acho que a gente até se força a não colocar isso em pauta na nossa cabeça. É o que o sentimento mandar. Ultimamente tem saído muito coisa em português, e é natural, é a fase que estamos vivendo. Dessa forma sinto que estamos sendo verdadeiros com nós mesmos.”
Faixa a Faixa de This Is About Leaving por Kassel
- This is About Leaving
“Essa veio de uma música chamada só “Leaving”. Tinha letra e uma estrutura completamente diferente. Construímos essa intro do álbum com a sequência de acordes da outra música, e ficou bem mais bonito.”
- Greeneyes
“A ideia inicial surgiu de um sample. Depois ainda acrescentamos outros elementos digitais, fizemos uma base, e depois veio a letra e linha vocal. Os únicos elementos orgânicos que gravamos foi Guitarra e alguns teclados. Essa tem varias influencias bacanas que surgiram na composição. Tem muito do Bring Me The Horizon pelas guitarras, os pads e produção mais digital, e o beatbox (que a gente tirou de referencia da faixa “Heavy Metal” do disco “amo”).”
- Zero
“Escrevi lá em 2018 e mandei pro Saulo (que produziu nosso disco), na época ele me falou um pouco do Udora. Foi a primeira que a gente sentou pra produzir, e uma das últimas a ficarem prontas. Deu um trabalho, pensamos e repensamos umas 15 vezes o refrão ao longo dos anos. No final, ficamos com o primeiro esboço que fizemos dele.”
- Headache
“Essa musica surgiu a partir de uma conversa bastante pessoal que tivemos sobre a dificuldade de colocar alguns incômodos para fora e confrontar as nossas insatisfações. Ela foi escrita toda após uma conversa de telefone que tivemos. Foi uma das primeiras musicas do disco a ficarem prontas.”
- All At Once
“Também veio na leva das músicas escritas em 2018. Curiosidade interessante é que comecei a escrever essa música enquanto tocava “Gymnopedie” do Eric Satie durante algumas aulas de piano. A peça do Satie é em 3/4, e daí comecei a tocar ela em 4/4, os mesmos acordes, e saiu a letra. Depois fizemos algumas mudanças de tonalidade, e chegamos no resultado ideal.”
- Nightswim
“Talvez a que tenha ficado pronta mais rapidamente do disco, e uma das nossas preferidas. A ideia central dela era ser tanto em melodia quanto letra um momento de reflexão interna. Sabe quando a gente bota a cabeça no travesseiro e se inunda de pensamentos? É por aí. Essas coisas vêm quando só tem você consigo mesmo, à noite no quarto. Daí o título “nightswim”, porque é como se fosse um mergulho nessa introspecção noturna.”
- That Lost War
Essa era completamente diferente, desde que começamos a escrever. Comecei a escrever em cima de um Beat eletrônico que criei, e a base era toda no teclado. Era uma música totalmente digital. E virou uma das mais orgânicas do disco, cheia de guitarras, violões, baixo e batera bem marcados. Ela não tinha refrão, era muito em cima do tema de guitarra. Depois foi o Saulo quem nos deu esse toque de que ela precisaria de um ponto forte, e criamos o refrão que é um dos mais legais do disco. É ao lado de “Nightswim” a que a gente mais curte tocar ao vivo.
- Until
“Essa é uma música sobre ter que lidar com distâncias e expectativas. Ela tem uma estrutura um pouco incomum, usando mais um hook do que um refrão de fato. É a primeira musica que lançamos com o Rodrigo fazendo o lead vocal.”
- Home
“Sempre fui de me mudar muito. Vivi em várias e várias casas, em cidades diferentes, em estados diferentes. E aprendi a apreciar essa cultura nômade. Mas a consequência disso é que eu sempre tive dificuldade de chamar um lugar de “casa”. Em 2018 decidi pegar minha mochila e ir pra minha primeira aventura morando fora do país. Afinal eu nunca tive problema com mudanças. Mas essa foi mais drástica, e foi uma auto procura.
Até que passado um tempo, a “casa” que eu tanto procurava, também não estava lá, e provavelmente não há lugar que eu procure que vá achar. Escrevi essa música pra entender que eu poderia ser parte de cada lugar, deixar um pedaço ali, sem a necessidade de fazer do lugar o meu ponto de identificação. Isso tá bem explicito nos versos “Home is where I wanna go / All I Wanna Say Is That Place isn’t mine” e “Can I Heat the Cold Wherever I Go?”.”
- Fear
“Essa, assim como a primeira faixa do disco, é oriunda de outra música. Mas é o processo contrário. Se em “This Is About Leaving” a gente tornou uma música com estrutura de canção, versos, refrães, em uma canção instrumental, aqui nós fizemos o processo contrário: transformamos uma música instrumental em uma música cantada, acrescentamos versos, refrães, letras, etc. É a mais cinemática do disco, e possivelmente uma das mais tristes. Foi escrita num momento introspectivo e até um pouco pessimista, também no meio do processo onde escrevi “Home”.”
This is About Leaving foi lançado em parceria com os selos Reverse Collective e Eu Te Amo Records, e conta com a produção de Saulo von Seehausen (saudade).
This post was published on 18 de abril de 2023 3:04 pm
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