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Dramón detalha os processos e particularidades por trás de “C É U S”

O músico fluminense Renan Vasconcelos mergulhou em um novo processo para construir o que viria a se tornar C É U S, o novo disco do Dramón. Se no Brasil explorar influências do ambient e eletrônica experimental, soa como ousado e muitas vezes o mercado não abraça, a demanda no estrangeiro é interessante, o que fez com que neste novo lançamento ele lançasse o trabalho além de trabalhar no Brasil através de dois selos (Figa MusicSinewave), também distribuindo o material via Samsara Records do Chile, Templo Animal da Argentina, Mystery Circles dos EUA.

Como proposta conceitual C É U S propõe investigar os mistérios, o sagrado, o sombrio e o solar que vêm do firmamento.

“Nada (ou quase nada) é tão especial como o céu e tudo o que vemos nele. A possibilidade de observá-lo daqui de baixo e interpretar seus humores faz dele um dos principais guardiões dos mistérios desse mundo. No plural, transforma-se em um lugar sagrado para onde confidenciamos nossos medos, desejos e buscamos respostas. Este novo disco é uma ode aos céus. Fiel depositário de nossas esperanças que, em troca, nos oferece sanidade frente às angústias da vida. O Reino dos Céus, morada da eternidade”, resume Renan sobre o projeto

Antes do disco ele já tinha apresentado anteriormente o single “oscilar” (2020) e quatro EPs: Afã (2020), Bétula//Membrana (2021), “pra hoje” (2021) e “Performar Selvagem” (2022). Além disso, ele lançou o disco completo Àspero em 2021.


Renan Vasconcelos aka. DramónFoto Por: Clara Miloski

Pré e preparação do Dramón

“2019 foi um ano bacana até pro projeto. Eu fiz uns shows legais, toquei em Lisboa e viajei pro Chile. Fiz 5 shows lá. Mas estava me sentindo meio travado para produzir coisas novas, e sem direcionamento. As únicas coisas que produzi em todo o ano foram duas músicas meio longas que se completavam, e mesmo assim não consegui finalizá-las.

Tava com dificuldades de me concentrar. Aí recebi o convite para participar do disco Urucum do Kovtun, projeto do Raphael Mandra que também é da Sinewave. Esse disco, ele basicamente distribuiu rascunhos de músicas e deu liberdade total para que, a partir dali, outros produtores fizessem algo completamente novo. Como eu estava um pouco atarefado com o trabalho e desorganizado nas criações, quando vi tinha 2 dias para mandar a música finalizada pra ele. Me concentrei nesses 2 dias e consegui. E me dei conta que ter prazos bem estipulados era o que eu precisava para conseguir produzir.

Mais ou menos nessa época eu li uma entrevista com um animador que eu seguia no IG chamado Erik Winkowski, que se propôs a fazer e postar uma animação (curta) por dia. Na entrevista, ele contava que não importava o que estivesse acontecendo em sua vida pessoal e profissional, ele tirava duas horas do dia para essa atividade. Eu juntei a experiência recém adquirida com a música pro Kovtun e mais a inspiração desse cara, e comecei a formatar um projeto pra chamar de meu.

Fazer algo por dia, seria muito insano, e fazer algo mensal ou quinzenal seria muito espaçado. Tenho certeza que se eu tivesse 1 mês para produzir algo, eu deixaria tudo pra última semana. Então o prazo de 1 semana parecia adequado e realista. Outro ponto que eu já planejei desde o começo foi, o fato de que ao final do ano eu teria 52 músicas e sabia que nem tudo seria interessante ou expressivo para o projeto. E como as plataformas de streaming pedem uns 15/20 dias de antecedência pra vc fazer o upload, decidi que essas músicas iriam inicialmente para o soundcloud (onde elas ficariam disponíveis instantaneamente após o upload), e ao final do ano eu formataria EPs, discos e singles, e os lançaria “oficialmente” nas demais plataformas.

Isso, eventualmente condicionou a produção, pois às vezes eu produzia alguma musica para fazer par com outras já produzidas, e juntá-las em algum lançamento futuro. E o último ponto que amarrou isso tudo, foi torná-lo público (para meus amigos mesmo e pessoas próximas), para que eu não caísse na tentação da preguiça e abandonasse o projeto.

Então no fim do ano de 2019 eu tava lá anunciando pra todo mundo o que eu iria fazer ao longo de todo 2020 e recebendo as reações de “quero ver hein?”, o que pra mim é um combustível e tanto (ah é? tá duvidando que eu mergulho nessa piscina gelada nesse frio de 2 graus??).

O desenvolvimento do projeto em si

“Bom, comecei 2020 à todo vapor, mas já em janeiro peguei um trabalho presencial meio grande, e tive que usar os coringas que tinha na manga (faixas praticamente prontas ou bem adiantadas). Quando esse trabalho acabou, tava zerado desses coringas, e tive que ir pra cima mesmo da produção. E em março começou a pandemia. O fato do meu trabalho poder ser feito à distância (ja fazia isso esporadicamente antes da pandemia) e não poder sair de casa acabou ajudando a me organizar melhor.

Os desafios como se pode imaginar foram múltiplos. Desde a falta de tempo, passando a falta de estímulos e concentração, até um backup mal feito que me fez perder todos os arquivos de projeto de metade dessas músicas.

Mas em condições normais o processo era basicamente assim: aos domingos eu buscava alguma inspiração em outras músicas/outros artistas. Na segunda-feira (máximo terça) eu tinha que inventar uma forma de iniciar o processo.

Valia tudo: eu tentava emular sintetizadores modulares (eurorack) com minha guitarra e pedaleira, ou então iniciava o processo por drum machine e synth se eu estivesse interessado em algo mais eletrônico no momento, por exemplo. À partir do momento em que achava algum som que me interessasse, eu abandonava a referência inicial e o som ia tomando seu próprio rumo. A lupa muda nesse estágio de micro (referências imediatas) para macro (referências que fui absorvendo na vida e que nem sempre a gente tem consciência). E aqui começavam à entrar também algumas participações.

Às vezes o som que aparecia me lembrava o trabalho de alguém ou imaginava que determinada pessoa poderia trabalhar bem naquilo, e aí eu convidava. Sempre pessoas próximas à mim que já estavam interadas no projeto. Terça, quarta e quinta eu caía dentro de transformar aquele som em uma música, para sexta de manhã subir no soundcloud.

Como o Dramón é um projeto orientado por sons e sensações, a mixagem faz parte do processo criativo. Eu já ia mixando desde o início e criando coisas novas de acordo com as necessidades. Os resultados são muito variados: tiveram musicas que tive tempo de sobra para trabalhar e não ficaram muito boas, e outras que tive que fazer tudo em 6 horas (como a música “Afã”) e o resultado foi muito expressivo.

Um projeto desses tem que ter regras bem estipuladas, e de cara eu já limitei o equipamento que iria utilizar. Os equipamentos físicos como pedais, synths, etc. estavam liberados para serem usados livre e infinitamente, mas limitei a quantidade de plugins e instrumentos digitais que poderia usar, pois a pirataria te permite ter tudo hoje em dia. E quem tem tudo, não tem nada, certo?

Então, abandonei a grande maioria dos plugins piratas (deixando só mesmo umas poucas exceções que julguei essencial) e passei a usar plugins gratuitos e os que eu comprava. É necessário ter uma caixa para eventualmente pensar fora dela, e dessa forma fui criando as paredes da minha caixa.

Rapidamente eu senti que minha qualidade técnica estava sendo aprimorada, que estava conseguindo desenhar melhor os sons e identificando os que melhor representavam algo para mim. Nem sempre o que é legal te diz respeito, então essa curadoria de sons é muito importante e foi ficando cada vez melhor com o tempo.

Assumi que os climas mais darks representam um lugar de conforto para mim, mas meu jeito de tocar guitarra é em geral muito limpo, o que cria pontos de cristalinos nessas escuridões.

Ah! Não tenho como não falar da importância da guitarra pra mim. Antes de ser produtor, artista ou qq coisa, eu sou guitarrista. Ela é sempre minha âncora e muitas vezes até mesmo uma muleta. E eu curto tanto fazê-la soar como de forma clássica como fazer sons que não se identifica como sons de guitarra. Acho que não tem nenhuma música que ela não esteja presente.”


Dramón tem o disco lançado por selos do Brasil e exterior como parte da estratégia de distribuição. – Foto Por: Rodrigo Gianesi

Pós (a partir de 2021)

“Acabado o ano de 2020, eu já tinha o material praticamente compilado ou pelo menos uma idéia dessa compilação, e comecei a entrar em contato com os selos que eu imaginava que determinados materiais poderiam servir. A resposta em geral foi positiva, e consegui trabalhar com selos que também são pequenos, mais ou menos do tamanho do projeto: Samsara Records do Chile, Templo Animal da Argentina, Mystery Circles dos EUA, Figa Music daqui do Brasil e a própria Sinewave, que eu já tinha trabalhado anteriormente.

E como se pode imaginar terminei o projeto completamente estafado, e mudei o foco de produção desde então para montar minha apresentação ao vivo, que hoje em dia é basicamente eu fazendo versões dessas músicas apenas na guitarra (e não mais com computador, synths, e etc). Ou seja, ainda estou trabalhando essas musicas de certo forma.

Desde que comecei a me envolver com musica na adolescência, todas as experiências criativas tiveram sua importância em seu momento, e essa obviamente não é diferente. Com certeza a mais intensa e tbm a mais reveladora. Meus discos são e vão ser sempre eu dizendo “olha os sons que eu achei e o que consegui fazer com eles”, mas à partir de 2020 eu adquiri mais controle sob esse “consegui”.

Ainda tem um material legal que não consegui compilar e poderia lançar, mas agora to precisando colocar um ponto final nesse processo para me abrir à outras possibilidades. Então tenho anunciado o C É U S como o último material referente à esse período. Se eu for lançar algum desse material que ficou para trás será sob uma nova ótica de trabalho. Pra onde eu vou e o que eu vou fazer eu ainda não sei, mas preciso de fato colocar 2020 no passado para começar as novas descobertas.”

Dramón C É U S



Tracklist C É U S:

1 – Um Céu Negro e Suas Promessas
2 – Ouro Cinza da Terra
3 – Convalescente
4 – Ao Meio
5 – Deserto Lá Fora
6 – Comunhão dos Santos
7 – O Tempo Abaixo dos Céus

Ficha técnica

Composto, produzido e mixado por Renan Vasconcelos
Masterizado por Pedro Serapicos
Engenharia de som em “Um Céu Negro…” por Pedro Serapicos
Voz em “Um Céu Negro…”: Andréia Barana
“Ao Meio” composto por Renan Vasconcelos e Bruno Weilemann

This post was published on 23 de agosto de 2022 11:00 am

Rafael Chioccarello

Editor-Chefe e Fundador do Hits Perdidos.

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