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Mineiros da Lua rebobinam as “Memórias do Mundo Real” em segundo álbum

Mineiros da Lua lança Memórias do Mundo Real

Muitas vezes a beleza vive nos detalhes. Seja numa obra de arte, naquilo que nos fascina, como na arte de viver. Os elementos vão de encontro e se materializam quando existe uma sinergia, coesão de ideias, valores, princípios, mas principalmente esmero. Sensação essa que pode ser traduzida em acordes, harmonias e melodias, palavras muitas vezes podem vocalizar ou expressar sentimentos dentro da arquitetura sonora, mas acabam servindo apenas como mais um canal, e isso é perceptível desde o debut d’Os Mineiros da Lua.

Quando eles lançaram Queda (2019), logo após o EP Turbulência (2017) víamos um quarteto afiado com uma cozinha experimental coesa e cheia de frequências que iam do rock progressivo ao alternativo, sem perder as raízes mineiras e o gingado do Clube da Esquina.

Um som que conseguia agradar de um entusiasta do The Mars Volta a um fã de Caetano, muito por conta como eles conseguiam estabelecer uma comunicação magnética através da arte de pensar nas sensações como uma espécie de bússola sonora. Norte este que abria os caminhos para os mineiros alcançarem voos mais altos, e isso foi muito bem trabalhado em sua live session lançada ainda na época.


Mineiros da LuaFoto Por: Manuela Ventura e Gabriel Almeida

Março de 2020, o mundo parou, como se todos os sonhos fossem congelados, a esperança e o tempo roubados – e muitos planos voltando para o mundo das ideias. Acredito que todos tiveram diferentes momentos durante o primeiro ano de pandemia, da raiva aos momentos de silêncio, do burnout aos pensamentos de reconectar com a sua essência.

Nem todos conseguiram transformar em arte mas para os Mineiros da Lua, assim como tantos outros foi momento de reconectar, mesmo que  online. Algo que se materializa em Memórias do Mundo Real.

Mineiros da Lua Memórias do Mundo Real

Elias Sadala (guitarrista), Diego Dutra (baixista, teclas/samples, vocal e diretor de todos os clipes da banda), Jovi Depiné (baterista, teclas/samples e artista visual responsável por todas as capas) e Haroldo Bontempo (teclas e vocal), optaram por produzir seu segundo álbum de estúdio através de uma plataforma online.

Memórias do Mundo Real foi composto, gravado e produzido à distância pelos quatro integrantes dentro da plataforma coletiva SoundTrap que permite criar projetos musicais e compartilhá-los para que várias pessoas possam trabalhar nas faixas ao mesmo tempo, de maneira remota.

Além disso eles fizeram de certa forma um “laboratório digital” em busca por novas texturas, referências estéticas e experimentações. Aproveitaram o momento ideal para colaborar com diferentes artistas, da prolífera cena de hip hop mineira, que a cada ano que passa revela novos nomes de peso para o cenário nacional, com Nabru e Pessa, a artistas de rock alternativo que optaram por produzir em escala seus projetos artísticos, como é o caso da catarinense Helena Cagliare (La Leuca). Se no novo mundo dos Mineiros da Lua não existem fronteiras, o disco reúne ainda participações do compositor chinês Jason Qiu na faixa “A Torre”, a compositora colombiana Aniya Teno, todos na faixa “De Peito Aberto”.

O registro ainda reúne, “No Caminho Pra Piedade”, é um conto musicalizado escrito por Vitor Borges. Mostrando como a coalizão entre linguagens e diferentes universos fazem parte do DNA do quarteto. O álbum foi  mixado por Diego Dutra e masterizado por Felipe Fantoni; e é um lançamento Seloki Records.



Cores, Rimas, Balanço, Ritmo e Melodia

“Armadilha” surge como um prisma brilhante no horizonte abrindo um portal mágico para que nos desconectemos da realidade sombria do momento. Os sintetizadores são o cartão de visitas para que a experimentação e as baixas frequências criem o clima de apreensão.

Ritmado seu som vai abraçando o ouvinte com ternura e empatia, podendo até soar como algo que o Pink Floyd pudesse fazer se estivesse em atividade e com samples ao seu dispor. Mas não pense que apenas o magnetismo psicodélico dá forma as curvas do som, muito pelo contrário, ele é moderno, versátil e tem muito do trip hop.

O som com modulações voltam a reverberar com bateria jazzística e teclas suaves em “Nas Suas Mãos”, faixa que conta com a participação da Nena, do La Leuca. O sofrimento ganha as frequências e traduz os nossos dias de frequências mais baixas durante o isolamento.

A sensação do tempo, e o flow do rap, ganha as pistas (virtuais) em rimas com lembranças do mundo pré-pandemia em “De Peito Aberto”, faixa que ganha versos precisos de Aniya Teno, Pessa e Nabru. Uma faixa magnética que você vai querer ouvir mais de uma vez. As camadas dos beats te trazem uma sensação de nostalgia e completa imersão em uma realidade que parece tão distante.

“O Roubo” vai ser uma das favoritas de quem gosta de ambient music com vocais que funcionam como instrumentos. Uma pausa e calmaria necessária depois do sufoco. Daquelas que poderiam virar samples para outros músicos, e eu espero que eles disponibilizem para que possam “brincar”. Daquelas para sentir e se deixar levar com o vento batendo na cara (enquanto anda de bike).

“No Caminho Pra Piedade”, como dito é baseado na obra do compositor Vitor Borges com direito a participação Rogério Tavares. A fusão do instrumental, de uma banda que começou desta forma, com o universo da poesia e quem sabe, em algum momento, a sinestesia se completa com uma obra audiovisual. Literal, você é levado no banco do carona como se fosse uma canção dos Racionais MCs.

Segundo a banda “em seu conto, Vitor (que também estrela a trilha visual da faixa) cria um protagonista melancólico e inseguro que se encontra voltando para sua cidade natal depois de muito tempo enquanto os Mineiros criam progressões voláteis que acompanham a narrativa e trabalham o tom de mistério.”



“A Torre”, que foi composta pelo chinês Jason Qiu,é cantada parcialmente em seu idioma de berço e parcialmente em português. A faixa ganha loops interessantes, frequências, dissonâncias e sobreposições. Um flerte com a música eletrônica de forma progressiva, cheia de curvas sonoras e muita sensibilidade.

Algo que se intensifica em “Avenida de Expressão Criativa”, que ganha distorção, drama e fúria. Acelera em direção do universo dos sonhos, entre os medos e o mundo físico que nos impede de viver. A via de duas mãos, entre a velocidade da luz, a gravidade e a coalizão.

“Última Alguma Coisa” abaixa a poeira e nos recoloca nos trilhos com sua calmaria. É o respiro em meio a imensidão da tormenta, a cabeça voltando para a órbita e a chance de recomeçar após o caos. Ela progride de forma orgânica e nos convida para uma volta ao ar livre (quando isso for possível novamente) com direito ao som dos trompetes para coroar a chegada da primavera no novo mundo.


This post was published on 17 de junho de 2021 12:13 am

Rafael Chioccarello

Editor-Chefe e Fundador do Hits Perdidos.

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