Enfim o dia chegou! Foi o que eu disse ao saber que a Emerald Hill de João Pessoa (PB) finalmente iria lançar seu primeiro álbum. É o resultado de um longo processo visto que eles tem lançado ao longo dos últimos anos EPs e singles soltos.
Mesmo tendo alguma ideia pela tracklist, e sabendo que “Presciência” e “Nos Seus Braços” completaram 2 anos de seu lançamento em agosto, fiquei curioso para desbravar as canções que ainda não tinha tido a oportunidade de ouvir.
Por mais que em seu som eles misturem emo, shoegaze, post-punk e post-rock como influências mais notáveis, eles já me confidenciaram algumas vezes se amarrar em bandas como Weezer – e claro videogames.
Não é à toa que a banda leva em seu nome Emerald Hill, a fase do Sonic. Em entrevista em Janeiro Vitor contou que o disco já estava nos planos.
“Todo mundo da banda adora videogames, acho que o nome da banda foi uma escolha bem feliz por isso; quanto à história, honestamente, é bem boba: a gente não conseguia por nada decidir um nome, todos os nomes que eu queria dar já tinham sido pegos, a gente chegou numa fase de só ficar olhando lista de coisas na Wikipédia pra ver se saia algo bom, mas não deu em nada.
Na mesma época, eu tava jogando uns jogos no emulador de Mega Drive e logo a primeira fase do Sonic 2 se chamava Emerald Hill Zone, eu achei que dava um nome legal sem o Zone e a gente meio que ficou nesse mesmo. Na real, não sei se foi uma boa ideia porque ninguém nunca entende quando eu falo pessoalmente (Risos).”, relata Vitor
“2018 (finalmente!) é o ano que a gente lança nosso primeiro álbum, com certeza, e ele vai se chamar Para Sempre Conectados Mas Eternamente Distantes. Todas as músicas já estão compostas e mais da metade do disco já estaria pronta pra sair hoje se a gente quisesse. Rolaram alguns contratempos previsíveis nos últimos tempos, pra uma banda de pessoas que não vivem de música, mas agora tudo tá bem tranquilo.”, deixa claro o músico
O duo formado por Vítor Figueiredo de Almeida (Guitarra / Vocais / Sintetizadores) e Gabriel Novais (Baixo / Vocais) traz um mix de influências bastante diverso que passam por artistas como Blur, Interpol, My Bloody Valentine, Joy Division, Lupe de Lupe, Neutral Milk Hotel, Brand New, Gorduratrans, New Order, Ludovic, The Strokes, Death Cab for Cutie e Kanye West.
Eles inclusive tocam o selo Fiasco Records e já apresentaram alguns artistas por aqui, inclusive o próprio projeto solo de Gabriel, o NVS. Antes do lançamento do disco, além das faixas de 2016 já citadas no texto, eles disponibilizaram neste ano três canções que serviram de aquecimento para o disco: “Recomeço“, “João Pessoa” e “Memórias Involuntárias”.
“Quando conheci o Vitor, no meio de 2016, depois de ter lançado meu disco pela Fiasco, conversávamos sobre o primeiro disco da Emerald Hill e ele me mandava algumas demos que soavam muito diferentes uma das outras, mas ainda com os genes do primeiro EP, Dreams to Come, aquele post-punk com mil faixas de distorção.
Acho que em “Memórias Involuntárias”, a banda alcança tudo que um dia quis fazer, somando todas as influências, algumas que já conhecíamos e outras que eles sempre tiveram mas só ressurgiram agora, com a experiencia desses anos trabalhando no disco novo e em trabalhos solos. Ela pulsa e explode como o post-punk dos trabalhos anteriores mas também lembrando o darkwave dos anos 80, Siouxsie and the Banshees, Sisters of Mercy.
Minha mãe sempre curtiu essas bandas, desde adolescente, e ouvindo essa música lembrei de quando sentava no banco do carro dela separando os discos que ela colecionou pra ripar no meu computador, coisa que na hora a gente nem dá bola, mas constrói muito o que a gente é de um jeito meio involuntário.”, conta o músico Vinicius Mendes
As faixas do álbum de estreia do Emerald Hill, Para Sempre Conectados Mas Eternamente Distantes, foram mixadas e masterizadas por Braz Torres Neme. Com excessão de “Coisas Feitas Para Acabar, Pt. 1”, “João Pessoa” e “Tudo Que Eu Devia Ter Dito Antes de Você Ir Embora”, que foram escritas por Gabriel Novais, todas as outras são manuscritos de Vitor Figueiredo.
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O álbum se inicia com “Recomeço” que já se inicia com a guarda baixa, o olhar caído e a sensação de ver os erros do passado e não poder fazer nada. Angústia, auto-flagelo e tons cinzas dão o norte da canção que corrói feito o cortar de uma navalha.
Os beats eletrônicos do teclado dão a noção de amplitude da vala que o interlocutor se encontra. Da mesma forma rápida que a canção se introduz, ela vai esvai feito um tiro curto.
É incrível como o som deles me leva para a industrial Manchester e sua obscura cena eletrônica local. 24 Hour Party People! Ao mesmo tempo que seus versos mais autodestrutivos tem aquela áurea moribunda das letras do Jair Naves.
O equalizar dos beats de “Presciência” nos levam para um universo à parte frequentado por Depeche Mode, Bauhaus, The Sisters Of Mercy, A Certain Ratio que com seus sintetizadores nos convida para adentrar a batcave.
Assim como sua melodia marcada pela tensão, sua letra é confessional e emotiva. O tom pessimista – e de decepção – é flagrante na canção que transforma todo seu sofrimento em uma balada corta pulsos capaz de tirar Robert Smith para dançar.
A delicadeza da balada (quase) powerpop, “João Pessoa”, traz as angústias, receios e aflições do cearense Gabriel que em seu projeto solo, NVS, já nos mostra o conflito de ser um migrante na capital paraibana. O misto de auto-flagelo, penitência, insegurança, contestação e paranoia ganham versos em que ele se expõe de corpo e alma.
A parte que ele relata a relação familiar é de quebrar o coração do ouvinte. Inclusive na faixa há uma citação a Vitor Brauer, da banda Lupe de Lupe, de Governador Valadares (MG), que é uma das influências confessas da Emerald Hill.
“Um Ano a Mais” já traz referências do “rock triste” em uma faixa acústica e intimista que evolui através de um punch de guitarras típicas do emo noventista, de bandas como Jawbreaker, para uma calmaria perturbada. Assim como os sentimentos indefinidos que sua letra traduz em versos tortos – e escorregadios.
Com estética lo-fi que agradará fãs de Wavves, “Vivendo à Margem da Minha Vida”, coloca sua vida nas mãos de uma desilusão. O coração está tão destroçado que ele até perde o fôlego em seu último verso. Assim apagando a última chama de esperança que se restava .
“Coisas Feitas Para Acabar, Pt. 1” parece que vive no plano dos sonhos. Desde sua melodia até mesmo sua letra que lembra de detalhes de um passado que foi sendo consumado com o passar do tempo. Afinal, o que fazer com aquelas memórias que não fazem mais sentido?
A frase que ecoa na cabeça é seu potente refrão: “Não tá tudo bem, mas tá quase lá / Todo fim é uma chance de recomeçar / Nem tudo tá bem, mas tá quase lá / Tem coisas que são feitas para acabar.”
Sua parte final é ainda mais dramática e sintetiza toda sua resistência e resiliência em desistir: “Tem coisas que são feitas para se esquecer / Mas isso não vale, para eu e você”
“Coisas Feitas Para Acabar, Pt. 2” já faz todo um anticlímax e da uma quebra no andamento do disco. É estranha e mostra claramente a impotência em saber lidar com finais.
Se fosse um EP definitivamente seria um lado B devido a sua experimentação eletrônica com vocais que ecoam no horizonte dizeres fortes como: “Você merece alguém melhor do que eu”.
Se teve uma música que fez eu me apaixonar pelo som da Emerald Hill foi “Nos Seus Braços” devido ao equilíbrio de sua melodia, sintetizadores e riffs açucarados de guitarra. Ainda por cima a faixa ganhou um videoclipe marcante e intenso – assim como seus versos que falam sobre o desconforto de não estar nos braços de quem ama.
Na reta final do disco nos deparamos com “Tudo Que Eu Devia Ter Dito Antes de Você Ir Embora” que faz o paralelo entre o calmo e o peso das guitarras para descrever sua rotina autodestrutiva. A frustração é descarregada de uma forma tão intensa que me lembrou um pouco Alkaline Trio – e sua forma particular em falar sobre seus medos e vícios.
O single “Memórias Involuntárias” foi lançado na semana passada e traz a levada New Order de volta para o registro. Seus beats me lembram até um pouco a música tema de Stranger Things. O sufoco por se sentir invisível para quem se gosta continua a corroer, só que eles transmitem essa “dança de cadeiras” de maneira bastante energética.
A canção mais trabalhada do álbum é justamente a que o encerra, “Para Sempre Conectados Mas Eternamente Distantes”. Que experimenta dos sintetizadores, linhas de baixo e imersão profunda até a entrada das guitarras, assim como o Angels & Airwaves sabe fazer de maneira bastante efetiva.
Ela é sinfônica, espacial, intensa, explosiva, reverberante e cria todo um universo à parte para mostrar a dicotomia das emoções e seus desdobramentos. Os vocais só entram em seu quarto minuto e deixam claro que para esta história não existe final feliz. Apenas memórias que os conectam mas que com o passar do tempo vão se transformando em apenas vestígios de algo que (algum dia) aconteceu.
O primeiro álbum da Emerald Hill, de João Pessoa (PB), Para Sempre Conectados Mas Eternamente Distantes funciona como um recorte fragmentado dos dois longos anos do processo de sua gravação – e até por isso mostra diversas facetas e experimentações da banda. Você poderá encontrar o post-punk flertando com o emo, o post-rock, o shoegaze, eletrônica e o punk rock que traduzem um pouco da essência criativa do trio.
No campo das composições conseguimos notar como a personalidade de Vitor e Gabriel se destacam na forma em que desenvolvem suas narrativas e relatam seus sonhos interrompidos. Um disco para ouvir diversas vezes independente de estar ou não em sua ordem cronológica. Confuso e neurótico como nossos tempos; e sentimental feito o jorrar um coração partido ao meio.
This post was published on 20 de setembro de 2018 5:30 pm
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