Talvez estejamos vivendo mesmo um momento muito bom para a música independente num plano geral que apesar de todas adversidades tem se organizado de melhor maneira, gravado com uma qualidade ótima e principalmente proporcionado shows e eventos incríveis. E se você está lendo isso e duvida: compareça para prestigiar.

No cenário stoner/doom/psicodelico não é diferente. Muito pelo contrário, depois de uma febre em muitas bandas quererem apostar na estética começaram a aparecer catalisadores responsáveis para separar o joio do trigo. Alguns no papel de selos, outros em questão de produção e principalmente a profissionalização tem sido algo evidente.

Parcerias também passaram a surgir, afinal de contas esse país é enorme e não é possível chegar do Rio Grande do Sul ao Acre sem mobilizar todo o tipo de logística e contatos para expandir seu som. Muitas bandas tem conseguido até levar seu som para turnês fora do país e isso é o resultado de muito esforço, estratégia, comprometimento e de querer aprender sem pular etapas.


A Pantanum (PR) acredita na união como força motriz para uma melhoria da cena independente. – Foto: Divulgação

A Pantanum de Curitiba (PR) tem entendido bem o lance de união para somar. A banda é formada por Francisco Gusso (baixo e voz), Alexandre Stresser (guitarra) e Bruno Silvério (bateria) e em seu novo sete polegadas fez questão de fazer parcerias para que seu som chegasse ainda mais longe.

O trabalho que levou cerca de dois anos para ser concluído do planejamento a entrega contou com produção de Zoom Discos (PR) e parceria com Ride Ancient Waves Records (DF) e Abraxas (RJ). Assim fazendo seu trabalho ser divulgado em algumas das principais praças do país.

É uma longa correria e o aprendizado é constante. A banda paranaense foi criada em 2014 e tem em seu som uma mistura densa de stoner doom psicodélico. Mais do que isso as referências deles vão muito além desse universo, o que no fim das contas faz deles uma banda que se diferencia da sonoridade das outras.

O disquinho contendo duas faixas inéditas e uma regravação foi lançado no dia 9 de junho e contou com mais uma parceria. Para as gravações eles convocaram André Centofante para colocar o peso dos sintetizadores e completar a viagem psicodélica. O trabalho foi gravado em janeiro em curitiba por Felipe Sad (Zoom Discos) e conta com as inéditas “Stormbringer” e “Purple Blaze” além de uma jam captada pela banda durante as gravações dos singles de “Searching the Way out Through the Mind’s Door”.

Estas músicas já viam sido tocadas ao vivo porém é o primeiro registro oficial destas. A gravação e a mixagem ficou por conta de Felipe Sad (Evil idols, Faca Cega, Vida Ruim), um dos proprietários da Zoom Discos, em Curitiba (PR), e masterizadas por Gabriel Zander no Estudio Costella, em São Paulo (SP).

Mal saiu o ‘7 e eles já estão prontos para entrar novamente em estúdio já que o sucessor de Volume I deve ser lançado em breve. Com muito planejamento, os próximos meses prometem ser intensos segundo o baixista/vocalista Francisco Gusso: “A banda se encontra em estúdio compondo as músicas do próximo full, que pretendemos gravar ainda esse ano”.

O 7 Polegadas – Purple Blaze (2017)



O ‘7 já chega com o peso em camadas lentas mas com uma vibe tenebrosa com a cadenciada “Stormbringer”. E é interessante observar o trabalho de percussão que parece buscar referências em outros estilos como jazz, o pedal de fuzz fica ecoando para dar uma sensação de incômodo antes da canção crescer. Quando esta sobe o morro os sintetizadores te levam para o meio do deserto e flertam com o ar hipnótico dos anos 70. A partir de um certo momento parece que os sinos do inferno começam a tocar e o chão a se abrir no meio, é aí que a guitarra brilha com um solo rasgado e “chapante”.

Tudo isso é o plano perfeito para já ambientados com os portões do inferno abertos a fúria do single “Purple Blaze” te convidar para a batalha. E ela já chega equilibrando o peso com um Doom arrastado e furioso. Daquelas canções para descarregar a raiva de um mundo pós apocalíptico. É interessante observar e flutuar através dos loops, sintetizadores intergaláticos e a viagem que estes te conduzem.

No minuto final a grande virada acontece e peso da escola punk/thrash metal ganha terreno, o som arrastado ganha velocidade e com certeza nos shows é a hora que a roda abre e somos convidados para ir para linha de frente.

Durante o período das gravações sem compromisso de ir para o disquinho através de uma jam eles executaram“Searching the Way out Through the Mind’s Door”, gostaram tanto de como ficou que acabou entrando no resultado final como uma espécie de bônus Track.

São cerca de 8 minutos de uma viagem psicodélica, instrumental, melancólica, reflexiva e expansiva através do universo do inconsciente. Aquela viagem eterna por busca de respostas e que podem ser abertas tanto a partir da meditação como a partir de outras substâncias alucinógenas. Mas vocês são “iniciados” então não preciso especificar. Os arranjos deixam a “lombra” ainda mais equalizada com sua sensibilidade de buscar recursos em outras eras da música e seu espírito leve e viajante. É só questão de preparar as malas e embarcar nessa perdição.

O registro é interessante e dá uma boa prévia do conceito e novas influências que tem agregado no som. E uma dica para outras bandas, ir além para conseguir fazer algo único, divertido mas sem perder sua essência rock’n’roll.


Pantanum. – Foto Por: Lyrian Oliveira.

Conversamos com o guitarrista Alexandre Stresser para entender mais sobre o trabalho, visão da cena, produção, planejamento e estratégia para tanto o lançamento do sete polegadas como para o novo álbum. Claro que tivemos até uma playlist incrível e surpreendente no perfil do Hits Perdidos no fim. Confira o bate papo.

[Hits Perdidos] Foram dois anos para chegar no resultado do Purple Blaze que conta com duas faixas inéditas. Gostaria que falassem um pouco sobre cada composição.

Alexandre Stresser: “A composição da nossa banda geralmente se dá pelo processo de alguém trazer uma ideia básica, seja um conjunto de riffs ou mesmo uma ideia pictórica da música, um cenário que sonoro que queremos criar. A partir disso começamos a tocar e improvisar até conseguir um flow entre outras partes da música.

No Volume I as ideias eram bem resumidas e simples principalmente porque gravamos só para registrar o som que estávamos fazendo, sem nenhum intuito de reprodução ou publicidade, mas o processo se deu da mesma forma. Essas músicas do EP são uma sequencia ao que criamos antes, pois foi composto mais ou menos na mesma época em que lançamos o primeiro álbum. Ainda tem uma influencia clara dos anos 70 na forma e no som em geral, mesmo com a inclusão do sintetizador e algumas linhas de guitarra em forma de textura sonora.

Acho que é um passo na evolução do nosso som, mas ainda com um pé no Volume I. As músicas novas que estamos compondo para o próximo full são mais um passo na lapidação dum estilo próprio, cada vez mais distante das influencias e mais original, essa é a próxima meta, e o EP marca essa transição nesse sentido.”

[Hits Perdidos] O lançamento está sendo feito por três selos independentes, e isto está sendo cada vez mais uma prática comum entre as bandas. No que acreditam que essa união de forças agrega no resultado final?

Alexandre Stresser: “Acreditamos que quanto mais gente envolvida de coração, mais longe as coisas vão. Claramente quem tem selos independentes tem uma paixão pela música acima de tudo, o mesmo motivo que nos motiva a fazer som. Não somente os selos, mas as bandas também acabaram formando uma grande família no Brasil justamente por identificar-se com a música como expressão artística e sublime do ser.

Isso proporciona que o som chegue a pessoas interessadas em artistas com essa proposta, a música como arte e não somente um produto. Eu pessoalmente garimpo musica diariamente, mas acredito que nem todas as pessoas tenham esse mesmo empenho, e mesmo quem tenha pode não encontrar facilmente nosso som por exemplo, portanto acho que essa união dos selos faz com que as pessoas tenham acesso mais facilmente a tudo que acontece em regiões diferentes do Brasil. E a partir dai abrem se as portas para realizarmos turnês, festivais, e estar onde as pessoas nos ouvem.

Por exemplo a Riding Ancient Waves é de Brasilia. Como poderíamos distribuir nosso disco lá se não fossem eles? A Abraxas também abraçou a gente no Rio de Janeiro, divulgando em diversos canais, assim como a Zoom Discos bancou do próprio bolso praticamente toda a produção e gravação (bancaram e ajudaram a gente a fazer no estilo DIY). A união deles transformou um sonho nosso num projeto enorme, com um alcance e qualidade enorme.”


Na sexta-feira (23) eles lançam o “Purple Blaze” em Curitiba (PR). – Arte por: Alexandre Stresser


[Hits Perdidos] 
Como foram as gravações com Felipe Sad (Evil idols, Faca Cega, Vida Ruim, Zoom Discos)? A masterização ficou por conta do Gabriel Zander, porque optaram por trabalhar com ele?

Alexandre Stresser: “Nos gravamos o EP em dois dias, primeiro tocamos as músicas ao vivo ate calejar gravando tudo (foi tudo ao vivo simultâneo), no segundo dia eu gravei as outras guitarras, o Francisco Gusso gravou os vocais e o André gravou o sintetizador separadamente. A jam que tem de bônus track (“Searching the way out Through the Mind’s Door”) foi literalmente o primeiro som que captamos no estúdio, depois de ter montado tudo.

O knowhow do Sad foi legal pra gente porque ele vem do punk, e isso traduz bastante do que nós somos de certa forma. O jeito como foi gravado captou de forma mais crua o som da banda, chegamos em algo que é o Pantanum autentico graças a isso. A masterização com o Zander foi a própria opção do pessoal da Zoom, que conhecem ele e também nós sabíamos que ele havia masterizado outras bandas semelhantes a nós.

Logo que ouvimos a captação e a mixagem do Sad sabíamos que estava muito próximo do que queríamos. O processo foi bem leve e fluiu bem.”

[Hits Perdidos] Ainda este ano vocês pretendem gravar um novo full, sucessor do Volume 1 (2015). Como veem a evolução de vocês como banda e o que esperar dessa nova empreitada?

Alexandre Stresser: “Acho que estamos cada vez mais buscando fazer algo original e longe das referencias que não são inéditas há mais de 50 anos. Estamos tocando há bastante tempo juntos e esse entrosamento vai evoluindo todos como músicos e também melhorando a composição, além de afiar nossa auto percepção, saber o que podemos fazer para aprimorar a ideia que queremos transmitir sem ter que ser obvio.

Já temos uma quantidade razoável de músicas suficientes para preencher um álbum, mas justamente por essa ideia de expandir nosso som, queremos lapidá-las e sair do óbvio. Eu pessoalmente quero caminhar para algo mais abstrato do que orientado somente ao riff. Buscar um som mais atmosférico, introspectivo, com influência de outros estilos como musica oriental, jazz, noise, tudo isso somado ao que ja construímos.

É nisso que estamos trabalhando no momento, nessa evolução em busca da originalidade. A música sendo arte não tem barreiras, estamos tentando evoluir nesse sentido.”

[Hits Perdidos]
Como observam o atual momento da cena Doom/Stoner no país e quais são as maiores referências por aqui para vocês? E a cena de rock em Curitiba como está na visão de vocês?

Alexandre Stresser: “Existem muitas bandas excelentes com músicas muito fodas e produzindo coisas incríveis, com diversas sonoridades. Por exemplo temos os Stolen Byrds que lançou um álbum novo (chamado 2019) agora que caminha entre diversas dinâmicas sonoras, o duo Muñoz lançou uma cacetada chamada Smokestack que é cheio de riffs incríveis e bateria alucinadamente reconhecível, e dentro desse mesmo género temos outras bandas com o Cassandra aqui de Curitiba que é um duo de baixo e batera que difere totalmente do som das bandas que falei anteriormente. Existe uma riqueza enorme, e ver ao vivo gente tão foda é inspirador, na minha opinião muito melhor que vários shows grandes que eu fui durante minha vida. Estamos num momento muito foda, acho que daqui a alguns anos esse momento vai ser lembrado como histórico.

Aqui em Curitiba é meio devagar para bandas autorais, ainda mais no nosso estilo. Existem poucos lugares pra tocar mas ultimamente o pessoal tem aparecido bastante nos shows, principalmente quando vem um pessoal de fora como ‘O Abismo‘, que tocou com a gente um tempo atrás. As pessoas que conhecem não deixam de comparecer, perto de quando começamos a fazer show o publico cresceu bastante, mas ao mesmo tempo falta esses sons chegarem até as pessoas da própria cidade. Outro lance que rola é que muita gente prefere baladas a shows, mais no clima pegação do que curtir uma sonzeira chapada, mas tudo bem tem espaço pra todos no mundo.”


Playlist De Carona com Alexandre Stresser (Pantanum)



Para fechar o post com muito no caixa o Alexandre preparou uma playlist especial para o Spotify Oficial do Hits Perdidos. Com influências pessoais e contendo artistas como Stolen Byrds, Erasmo Carlos, Type O Negative e Pharaoh Sanders.
Alexandre Stresser: “Bem esquizofrênico mesmo, não responsabilizo o Pantanum por essa lista (risos).

This post was published on 21 de junho de 2017 10:50 am

Rafael Chioccarello

Editor-Chefe e Fundador do Hits Perdidos.

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