Shows em sua maioria são o verdadeiro momento da catarse coletiva. É neles que conseguimos despertar e trocar de fato uma série de emoções entre um berro que vem de dentro da alma e o balançar dos quadris. É nele que a mágica ganha forma. Onde bons discos ganham corpo e vida através da interação entre artistas e público.
Afinal de contas do que adianta cultura sem ser compartilhada? Do que adianta um sentimento sem ser vivido? É humano, aquela carga emocional daquele momento da gravação em estúdio se transforma. O fator carne e osso, olho no olho é tão poderoso quanto a força de um solo de guitarra ou da energia de uma jam freestyle.
Para não dizer que é uma experiência quase cármica, você guarda aquele momento em sua memória e de certa maneira aprende com uma perspectiva diferente. E talvez essa troca junto da leitura sejam nossas maiores armas para lidar com um mundo bastante duro e cruel.
E nesta quinta-feira (14) essa troca ganhará novos elementos, afinal de contas será realizado no Centro Cultural São Paulo (CCSP). Para quem ainda não teve a chance de assistir um show no local: será uma oportunidade única de poder ver duas experientes bandas que vem a anos desenvolvendo um trabalho de respeito no underground brasileiro dividindo o palco.
Para um conjunto ter a oportunidade de tocar neste palco é um momento ímpar e sonho de muitos. Afinal de contas o palco possibilita uma interação entre banda e público em 360. Muitos inclusive aproveitam o momento para gravar o show para futuros clipes ou DVDS. O resultado é bastante interessante além do local ter uma arquitetura nada convencional.
Quem comanda a noite representando o selo Transfusão Noise Records (RJ) são as bandas Giallos e Lê Almeida. Ambos farão show de lançamento de seus discos, respectivamente: Amor Só de Mãe (2016) e Mantra Happening (2016).
Em abril a banda do ABC paulista em meio a momento político conturbado lançou seu segundo disco, Amor Só de Mãe. Um disco necessário e com uma carga emocional bastante pesada contextualizando muito bem o momento social e político vivido pelo país.
Temas como o conservadorismo sendo manifestado sem máscaras e o sofrimento que esta opressão causa a milhões de brasileiros tem o foco principal na obra. Esta que é um tremendo “tapa na cara” a cada faixa. Tudo isso embalado num rock que combina influências de outros gêneros musicais como o rap, blues, jazz e o punk.
Para entender mais as expectativas para o show nada como passar a palavra para eles. Assim, conversei com Claudio Cox (voz, teclado e theremin).
[Hits Perdidos] O show que acontece no CCSP de certa forma apresenta em alto nível o lançamento do disco Amor Só de Mãe (2016. Quais as expectativas para tocar nesse palco tão especial?
Claudio Cox: “Tocar no CCSP é um sonho, cara. As expectativas são as melhores, fazer o lançamento do “Amor” lá, junto com o Lê e o João, os produtores da parada, vai ser sem dúvida um marco na história da banda, tipo a “cereja do bolo”, esse disco merece esse prêmio.”
[Hits Perdidos] O formato do palco possibilita diversos recursos e intervenções artísticas durante as apresentações realizadas no local. Uma destas razões é seu formato e poder interagir em 360 com o público. Vocês estão preparando algo especial?
Claudio Cox: “Será um show especial em todos os sentidos. Tocaremos o “Amor” na íntegra e faremos participações no show do Lê e eles no nosso. Na verdade será um show só com duas bandas, sem intervalo, com todos os músicos juntos no palco em alguns momentos, uma explosão.”
[Hits Perdidos] O disco como disse em recente resenha por aqui é bastante pontual e traduz de maneira bastante clara o viés político e social que o país está vivendo nos últimos anos, mas que neste 2016 se desenhou ainda mais “gritante”. Como ele tem sido recebido e como enxergam as transformações vividas nos últimos meses?
Claudio Cox: “O “Amor” está sendo muito bem recebido pela rapaziada, é um disco forte musical e textualmente e as pessoas se atentaram a isso, no contexto em que ele foi concebido. Nesse momento histórico importantíssimo do nosso país, da nossa sociedade, ele funciona como uma espécie de retrato, saca?!
Não é difícil se encontrar ali, em alguma frase, em algum pensamento perdido, enfim. Quanto ao momento, ainda acho cedo pra analisar, estamos no meio do furacão, a poeira tem que baixar um pouco, mas uma coisa que já julgo positiva é que o interesse pela política floriu nas pessoas, mesmo que de maneira equivocada, falar sobre o assunto é um avanço pra nossa jovem sociedade.”
[Hits Perdidos] A veia mais crítica vem a partir das letras bem escritas e viscerais. Cox é inclusive um estudioso e tem formação acadêmica em história. Como enxerga a onda de conservadorismo e opressão social que tem ganhado corpo recentemente?
Claudio Cox: “O Brasil é um país conservador, com uma sociedade moldada pra agir dessa maneira, quem rege o jogo aqui desde sempre são as mesmas figuras. Nos últimos anos houve um pequeno avanço progressista no país, isso molhou a bunda dos que sempre foram de alguma maneira privilegiados socialmente, daí a treta.
O que está acontecendo agora é que esse conservadorismo, que sempre foi velado, foi pra vitrine, ganhou caras e bocas, partiu pro “vamo vê” e eu particularmente acho isso ótimo, porque acredito que não existe avanço sem discussão, sem questionamento, saca?!
[Hits Perdidos] O bom humor, o deboche e o tapa na cara não ficam de fora do contexto do disco tendo referências a livros e autores importantes da história mundial. Carregando um engajamento forte.
Muitos dizem que a mensagem ao longo dos anos foi sendo deixada de lado pelas bandas em geral e que poucas tem a capacidade de “colocar o dedo na ferida” e mostrar seu posicionamento.
O hábito em da leitura em paralelo também foi se perdendo e ao meu ver isso contribui bastante para o empobrecimento das composições em geral, independente de ter uma postura engajada ou não. Como vê isso?
Claudio Cox: “Particularmente eu não gosto dessa regra de ter um posicionamento político dentro da música ou de qualquer outra arte. Acho que devemos ter um posicionamento político como cidadãos, como seres sociais, as artes entram nesse contexto, mas a expressão tem que ser livre, ou seja, fale sobre aquilo que sente de verdade.
Fizemos um disco assim porque estávamos envolvidos emocionalmente com as coisas, mas não somos uma banda ativista, se no próximo disco der vontade de falar sobre chocolates, sobre sexo, sobre gnomos, nós vamos falar sem (quase) nenhum constrangimento (risos). Quanto a leitura, ela serve pra vida, bicho! Vai te fazer ser uma pessoa melhor e sendo uma pessoa melhor, tu vai fazer coisas melhores… Como disse o mestre Tim Maia: “Leia o livro!“
Além da participação do Giallos teremos a apresentação mais do que especial do Lê Almeida direto do Rio de Janeiro. Ele que vem acompanhado de sua banda composta por Joab Régis (bateria), Bigú Medine (baixo) e João Casaes (guitarra).
A banda da baixada fluminense tem uma estética moldada ao longo dos anos. A atmosfera é caótica, muito fuzz, distorção, experimentação em um som que engloba o lo-fi e jams de improviso. Não fossem esses alguns dos ingredientes para já ficar ansioso para a apresentação a formação encontrou no último disco uma evolução e conexão sonora.
A rápida passagem de Lê Almeida por São Paulo tem quatro shows marcados: CCSP (quinta-feira – 14/07), Casa do Mancha (sexta-feira – 15/07), 74 Club (Sábado – 16/07 em Santo André – com o Cosmos Amantes) e a Intervenção sonora durante a exibição do filme Sem essa, Aranha (1970) do diretor Rogério Sganzerla no MIS (Domingo – 17/07).
Com tanto assunto para conversar, batemos um papo com Lê Almeida.
[Hits Perdidos] No livro Rcknrll do Yuri Hermuche, você fala sobre as dificuldade do começo em conseguir com que a banda da baixada ganhasse respeito e prestígio no Rio de Janeiro. Conta também como mudou e tudo que passou até de fato conquistar seu espaço. Acredita que isso ajudou a moldar o caráter e entender melhor o público?
Lê Almeida: “Eu acho o fato da gente vir de um lugar com poucas condições e acessos fez demais a nossa cabeça valorizar as pequenas experiências e de certo modo foi definindo nossas metas com mais focos direcionados, em especial as gravações, capas de discos e cartazes de shows. Hoje em dia por causa do Escritório a gente lida com pessoas de todos os lugares do Rio e só vai aprendendo mais e mais.”
[Hits Perdidos] O rock experimental e o “faça você mesmo” sempre estiveram marcados no som da banda que chama a atenção pelo arriscar e a energia dos shows. Como pretendem usar o palco do ilustre CCSP para conseguir mostrar o melhor de vocês?
Lê Almeida: “Esse show novo é basicamente só o Mantra e ao vivo ele sempre é diferente a cada tocada, no CCSP estamos planejando umas coisas em conjunto com o Giallos e o show vai ter muito improviso e solos e mais solos de guitarra.”
[Hits Perdidos] Como enxergam a evolução de Manthra Happening para os discos anteriores?
Lê Almeida: “O Mantra é meu disco preferido, foi a coisa mais divertida que já gravei e as faixas foram moldadas durante a gravação, tem muito improviso e meu modo de tocar guitarra é dividido entre antes e depois dele.
Acho que pro pessoal também tem um gosto especial, é um disco diferente, de superação, encontro. Gravado no nosso lar, o Escritório, e acho que existe uma conexão espiritual entre o Amor Só de Mãe com o Mantra. Eu realmente amo esses caras e fazer algo em conjunto com eles é uma realização.”
[Hits Perdidos] No livro do Yuri você conta que a iniciativa de criar o selo veio justamente da dificuldade de alguém querer lançar seus trabalhos. De lá para cá já se foram mais de 12 anos de Transfusão Noise Records, diversos lançamentos e inúmeros shows realizados no Escritório. Atualmente quais são os maiores desafios tanto de um selo como de um agitador cultural (tanto no Brasil como no RJ)?
Lê Almeida: “Os desafios vão mudando de tempos em tempos, acho que hoje em dia o maior desafio seja expandir os horizontes dentro do rock, explorar métodos de gravações diferentes e fazer as festas mais insanas e chapadas do Rio.”
[Hits Perdidos] Além do show no CCSP, no domingo (17) no MIS vai rolar uma intervenção artística na linha jazz/ experimental/ kraut rock/ Noise Rock sua com outros artistas durante a exibição de um filme do Sganzerla da década de 70.
O que espera desse encontro que ganhou asas lá atrás na residência do Red Bull Station? Já tinha feito algo do tipo – cinematograficamente falando – anteriormente ou será algo inédito? E aproveitando o enfoque, como foi a experiência no Red Bull Station e como vê sua importância para os artistas em geral?
Lê Almeida: “Esse show no MIS é o segundo que participo desse tipo, como Lê Almeida já trilhamos o Over The Edge e alias foi essa trilha que gerou o Mantra. Dessa vez agora é algo muito novo é diferente pois é com uma banda que se formou ai em SP a bem pouco tempo só pra tocar e improvisar. Acho que vai ser uma coisa mágica e doida. Por mim eu trilhava um filme por mês, experiência cósmica.
A residência na Red Bull Station foi demais, aprendi um monte de coisa com uma galera que fazia algo totalmente diferente do que faço e a maior onda foi ter rendido essa banda nova de improviso com a Jú, o Cacá e o Diaz. Mesmo sendo com pessoas de fora da residência ela só aconteceu por causa da residênciaAlém desses dois shows eu também toco com a Cosmos Amantes ai em SP, é uma banda nova que nasceu também do exercício do improviso e hoje já temos algumas canções e alguns bons shows feitos pelo Rio. Sexta a gente toca na Casa do Mancha e sábado no 74 Club, em Santo André.”
Além claro das camisetas das bandas, outros lançamentos do selo carioca, você poderá experimentar os já tradicionais cookies psicotrópicos do Joab (Lê Almeida). Vai encarar?
Serviço:
Giallos & Lê Almeida
Dia: 14 de julho (Quinta-Feira)
Local: Centro Cultural São Paulo
Endereço: Rua Vergueiro, 1000 – Paraíso, SP
Hora: 20h
Entrada Gratuita
This post was published on 13 de julho de 2016 7:57 pm
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