A banda que vamos falar hoje promete colocar os mods e os beatnicks para dançar. O ar empoeirado de mexer nos vinis de seus pais e avós e achar verdadeiras pérolas entre um lado A e um lado B são elementos que de certa forma compõe e som da Maria Augusta.
Erra feio quem pensa que eles não souberam colocar tudo num caldeirão e fazer um bom caldo. Afinal de contas as influências passam pelo território do rock britânico dos 60s/70s, da “nouvelle vague” New Yorker mas sem esquecer da música brasileira e seu tropicalismo.
Mas para chegar nesse resultado não foi nada fácil. Em 2010, o grupo se formou em Uberlândia – no triângulo mineiro – tendo em sua linha de frente: Mateus Leão (voz), Guilherme Vasconcellos (guitarra), José Guilherme (guitarra e voz), Victor Buttignon (baixo) e Pedro Suricate (bateria).

Maria Augusta é uma das novas bandas que vem se destacando no cenário do rock mineiro.

A banda começou a se apresentar pelo circuito boêmio da cidade interpretando canções universo do rock alternativo e do rock’n’roll. A ideia de evoluir para um projeto autoral sempre esteve lá mas foi amadurecendo aos poucos após as primeiras composições.
Estas que foram saindo em sua maioria nas jam sessions feitas em grupo durante os ensaios. O que facilitou bastante a qualidade do resultado final foi a convergência tanto de influências como a química adquirida ao longo dos anos tocando junto.
A ideia de iniciar o trabalho autoral começou a ganhar asas em 2014, quando “Quando Dá” ganhou vida. A partir disso a busca por acelerar a transição entre projeto de covers para fazer música própria começou a deslanchar.
No ano seguinte eles começaram a gravar sua primeiras composições no Estúdio Caverna (Uberlândia/MG), mas como disse nem tudo foi fácil na trajetória da Maria Augusta. Tendo como plano inicial lançar o primeiro EP, Maria Augusta, ainda no ano passado eles tiveram complicações. Estas que fizeram com que o lançamento fosse adiado para o último mês de maio. Mas o que importa é o resultado no final das contas, não é mesmo?
A capa do primeiro EP, Maria Augusta, teve sua arte feita pelo fotografo Caio Vasques.

O primeiro registro de estúdio do grupo teve a produção e mixagem realizadas por Rafael Vaz (Caverna Estúdio) e masterização feita por Gustavo Vasques (Rocklab Produções Fonográficas).
Outro parceiro importante e que vem sendo um grande polo de descobertas do cenário de rock mineiro é a Cena Cerrado Discos. Uma iniciativa que vale desde já conhecer por ser um projeto que realmente está sendo bom para os artistas da região.
O coletivo Cena Cerrado tem sido fundamental para uma nova cena forte em Minas Gerais.

O projeto é feito por artistas e colaboradores com o intuito de criar um novo movimento. Assim como um coletivo a ideia é não só ajudar artista no campo da música, como da literatura e dos outros tipos de arte. Assim o apoio se da na base do mutualismo realizando intervenções, eventos e festivais. Assim a disseminação de ideias e experiências realmente agrega valor tanto para os envolvidos como para o “como fazer”.
Assim como outros projetos com uma veia mais transparente – em descriminar custos, despesas e lucros – todo lucro dessas atividades realizadas pelo coletivo é revertido para projetos e custos do dia-a-dia dos artistas envolvidos. Assim todo processo que envolve o ecossistema da música como promoção, mídias sociais, assessoria de imprensa, e manutenção da cena gira e ajuda com que a cena prospere de uma forma sustentável.
E não demorou para eles conseguirem montar um casting com bandas talentosas da região como por exemplo: Senomar, Lava Divers, Cachalote Fuzz, Blue Bottles, No Defeat, Canábicos e a própria Maria Augusta.
Mas vamos voltar ao lançamento tão suado e aguardado dos caras da Maria Augusta!


O disco já abre com a potente “Step Out”, como o nome já diz: já dando o pontapé inicial para a peleja. Ela tem uma dose de fúria na medida certa, uma rebeldia presente em grupos como The Kinks, The Who e Forgotten Boys. O baixo parece que pula de tão alto que ele se apresenta e conduz os riffs de guitarra.
Assim como “Chelsea Dagger” do The Fratellis ela tem um combustível que faz suas pernas chacoalharem no ritmo da batida da bateria. Let’s Twisted! Ela é meio acelerada e isso faz com que você não fique de braço cruzado. É um belo convite para a pista de dança.
Cadenciando sem perder aquele espírito Libertines despretensioso, vem “Vou Estar Lá”. Esta em português e com uma levada que te remete a grupos como Vanguart e Molodoys. Aquela atmosfera brasileira que compositores como Arnaldo Antunes e Arnaldo Baptista sabem tão bem explorar.
Ela consegue capitar de fãs de grupos como Tame Impala, Caetano Veloso a Los Hermanos. Sim, artistas tão diferentes mas isso só mostra como as influências de uma vida toda ouvindo bons discos, convergem em um resultado digno. O destaque fica para o solo de guitarra do meio da canção que tem uma aparente influência de Jimi Hendrix.
Em seguida temos “Papercut”, que já chega mostrando que no som da Maria Augusta existe lugar sim para o peso. A canção me remeteu a grupos como Veronica Kills e Thrills And The Chase, talvez pela atmosfera garagem mesclada com o som dos anos 70. Mais uma vez o riff do solo ganha destaque, agora com um peso ainda mais acentuado e uma atmosfera que flerta com o rock psicodélico.

O som da Maria Augusta passeia pelo rock derretido dos anos 70 mas flerta com a música brasileira.

Quem chega de mansinho mas que lentamente entra na sua mente é “Flea Bitten Dog”, uma viagem densa pelo rock psicodélico, desert rock de grupos como 13th Floor Elevators indo de colisão com a atmosfera stoner de grupos como Black Sabbath. Sinceramente eu acho que Jimmy Page e Eric Clapton não ficaram decepcionados em ouvir esta canção.
Em ritmo desconcertante e feito um blues temos “Without Me” para acalmar os ânimos. Uma canção que dialoga com a essência do ser humano, suas trilhas e escolhas. Calcada no som de grupos como Cream, Beatles e com pés cravados na psicodelia.
A canção que pois a banda nos trilhos do rock independente de Uberlândia, “Quando Dá”, tem a responsabilidade de fechar o disquinho. Mais uma vez vemos o rock’n’roll se mesclar numa balada com todo swing e ritmo presentes em nossa identidade brasileira.
O som dos teclados deixa a canção ainda mais densa e bonita em seu ponto mais calmo, logo após isso podemos ver riffs alá Strokes que dão toda uma magia alternativa a canção. Sutileza, delicadeza, compasso e ritmo são cartas marcadas nessa canção de encerramento.
O primeiro registro da Maria Augusta mostra uma maturidade que apenas o entrosamento e a experiência poderiam os guiar para esse resultado. Tem um pouco de tudo que eles ouviram na vida com certeza ali.
E é natural, puro e consegue tocar o ouvinte com a delicadeza com que os detalhes são milimetricamente colocados em cada arranjo. Talvez os problemas que tiveram para lançar o disco antes só fizeram com que fizessem algo ainda melhor do que o inicialmente planejado.
Para entender melhor o som da Maria Augusta o Hits Perdidos entrevistou o quinteto mineiro.

[Hits Perdidos] A banda foi formada em 2010 porém o primeiro EP, Maria Augusta, apenas saiu esse ano. Porque tanta demora?

Maria Augusta: “Ficamos fazendo cover um tempo, porque a ideia do autoral na nossa cena ainda era despretensiosa e foi tomando força aos poucos, enquanto o cover veio servindo de escola e uma fonte de renda durante esse tempo. Começamos o processo em 2014. “Quando Dá”, última música do EP, era a única que já existia antes.
Começamos a compor e a mudar as músicas. Chegou um momento que não dava mais pra postergar tudo aquilo, estávamos entalados com as músicas e fizemos uma parceria com o Estúdio Caverna, daqui de Uberlândia, que apoia nosso som. Começamos a gravar em 2015, mas sempre aparecem problemas pra se resolver, que levou o EP a ser lançado somente agora.”

[Hits Perdidos] O som da banda é calcado no rock alternativo britânico, na psicodelia dos anos 60 e também bebe do tão brasileiro, tropicalismo. Como sentem que cada influência agrega no resultado final?

Maria Augusta: “São muitas na verdade, somos 5 integrantes e cada um de nós somamos tudo o que pensamos musicalmente, cada um possui uma influência, sempre gostamos das mesmas bandas, mas cada um tem sua “área de pesquisa” e acaba mostrando para os outros, além disso cada um absorve coisas diferentes de outras bandas, dá uma bela lista de tudo que nos influenciou mas não chegamos a pré-definir algumas referências pra esse EP.
Algumas ideias de timbres e levada de música sim, mas nada muito forçado, sempre tentamos tudo natural, o que vinha de nós sem tentar parecer com algum determinado tipo de som, o que ajudou pra dar esse formato abrangente do EP.”

[Hits Perdidos] Consigo sentir Beatles, The Who, Arctic Monkeys e um pouco do Mutantes. “Flea Bitten Dog” me remete a uma das fases mais malucas dos besouros, em que chegaram a compor “I am the Walrus”. Quais os discos preferidos de vocês?

Victor (Baixista): Terra (1973), Sá Rodrix e Guarabyra. Rubber Soul (1965)Beatles. Lola versus The powerman and The moneygoround (1970)The Kinks.

Zé (Guitarra e Voz)Sticky Fingers (1971) – Rolling Stones  e Heart of Saturday Night (1974) – Tom Waits.

Matheus Leão (Voz): Gilberto Gil (1969)Gilberto Gil, The Velvet Underground and Nico (1967) – The Velvet Underground, Rubber Factory(2004)Black Keys, Their Satanic Majesties RequestRolling Stones.

Pedro Suricate (Bateria) Clouds Taste Metallic (1995) – The Flaming Lips. Transformer (1972) – Lou Reed. Unknown Pleasures (1979) – Joy Division.

Guilherme (Guitarra): Pode ser Is This It (2001)Strokes, Cê (2006)Caetano Veloso, Plastic Ono Band (1970)John Lennon, Are you Experienced (1967)The Jimi Hendrix Experience, Grand Funk (1969) – Grand Funk Railroad .

[Hits Perdidos] Ouvindo também senti um pouco de 13th Floor Elevators. Uma banda que infelizmente foi ofuscada por muitas outras durante esse processo ao mesmo tempo que o som do Cream. Qual seria o line-up dos sonhos de vocês fossem convocados para montar o Woodstock? (podem ter bandas que já não existam mais)

Maria Augusta: The Racounters, Queens Of The Stone Age, The Kinks, Radiohead, Joy Division.

[Hits Perdidos] Porque decidiram optar por um disco que tivesse tanto músicas em português como em inglês?

Maria Augusta: “Essa é uma pergunta recorrente, mas não optamos, aconteceu assim. E a gente foi limando coisas e deixando outras no tempo em que elas foram surgindo. Pensamos que tudo bem ter mais de um idioma, muitos discos que a gente curte são assim, não teve porque evitar isso.”

[Hits Perdidos] É muito interessante como em “Vou Estar Lá” consegue te remeter a Caetano Veloso, passando pelo blues e inde de encontro com a psicodelia. Como é o processo criativo?

Maria Augusta: “Cada faixa teve um processo diferente, algumas foram sendo montadas dentro do estúdio desde o início, outras já entraram mais adiantadas. As letras são iniciadas sempre por um de nós e finalizamos juntos.
Rolou um final de semana em uma chácara pra desenvolver as estruturas de cada uma e vários ensaios no Caverna Estúdio para finalizar a pré-produção. O impulso de criação não para né? Por isso muitos dos detalhes foram criados já na produção, principalmente as vozes de apoio e os efeitos, como a sonoplastia do Bukowski em Vou Estar Lá.”

[Hits Perdidos] “Step Out” tem uma rebeldia que costumávamos ver em grupos como Forgotten Boys e no The Kinks. E para mim talvez seja uma das que mais se destaca dentro do disco. Podemos esperar um videoclipe?

Maria Augusta: “Outra faixa já está com um clipe engatilhado, mas o próximo pode ser pra “Step Out”, ótima idéia! Do jeito que o mercado vem se comportando, acho válido fazer o máximo de clipes possíveis, se der fazemos pra todas.”

[Hits Perdidos] Vocês estão envolvidos com a Cena Cerrado Discos que tem feito um excelente trabalho e recentemente lançou inclusive uma excelente coletânea interessantíssima com bandas do triângulo mineiro. Como é trabalhar com eles e estar nesse ambiente rodeado de bandas incríveis?


Maria Augusta: “É um privilégio fazer parte dessa turma que se ajuda tanto e se importa realmente um com a pira de todos. Não só trabalhamos com eles como somos parte do coletivo e o plano é continuar fazendo crescer esse belo projeto, liderado pelo nosso inquieto amigo Arthur Rodrigues!
A cena daqui de Uberlândia é muito unida que acaba fortalecendo todos os trabalhos e somando cada vez mais ao som independente. Uberlândia estava perdendo aos poucos o som independente mas agora parece que esta tomando forma.”

Maria Augusta (2016) estrela o casting de lançamentos do coletivo de Uberlândia.

[Hits Perdidos] Vocês exploram bastante o fuzz. De uma maneira até quanto interessante, as distorções são sempre bem colocadas e os arranjos são precisamente calculados assim como os efeitos de delay. Ambos guitarristas se aventuram nessa “onda”. As músicas costumam ser elaboradas como? Chegam com uma ideia pronta ou vão testando riffs durante os ensaios?

Maria Augusta: “A maioria desses arranjos foram feitos em equipe, chuto que uns 80%. Dividimos tudo: bases, solos, riffs principais e arranjos. Revezamos também os timbres, os dois brincam no fuzz, no overdrive e nas guitarras clean, evitando bater em mesmas frequências… Tudo foi sendo decidido naturalmente, sem forçar a barra, no correr do processo.”

[Hits Perdidos] Como veem cada vez mais surgirem excelentes bandas de rock psicodelico no país como a The Outs e a Bombay Groovy, por exemplo. Acha que isso pode abrir mais portas para vocês?

Maria Augusta: “Sim, é sempre importante a cena independente aumentar, não importa se não conseguirmos entrar no meio da cena nacional (mas queremos, risos). É importante ir em shows e quanto mais bandas boas surgirem mais portas se abrirão para todos e quem sabe assim também conseguimos usufruir de tudo isso.”

[Hits Perdidos] Quais bandas da região vocês indicariam para os leitores do Hits Perdidos prestarem mais atenção?

Maria Augusta: “Cara se eu for citar todas vai ficar enorme e não rola falar de umas e não de outras, temos um site do Cena Cerrado, com muitas bandas da região lá, como Muñoz, Lava Divers, Surreal, Cachalote Fuzz e várias outras muito boas, recomendo que os leitores entrem e sintam-se a vontade pra escolher em qual sequência ouvir: http://cenacerrado.com.br/siteband/

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This post was published on 28 de junho de 2016 9:30 pm

Rafael Chioccarello

Editor-Chefe e Fundador do Hits Perdidos.

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