Heal Mura viaja pelo universo cósmico das ondas neurais em “The Limited Repetition Of Pleasure”

 Heal Mura viaja pelo universo cósmico das ondas neurais em “The Limited Repetition Of Pleasure”

Heal Mura lança o álbum de estreia “The Limited Repetition Of Pleasure” (2025). – Foto Por: Vitor Bossa

The Limited Repetition Of Pleasure viaja por ondas psicodélicas em direção da cura

Os pilares que fundamentam o álbum de estreia do Murilo Faria, conhecido pelo trabalho a frente do Aldo, The Band, vão além do plano do mundo físco em uma experiência sensorial que viaja por ondas psicodélicas, fundindo uma pesquisa musical extensa com o campo da literatura e do universo místico. O produtor musical trabalha como DJ e pesquisador musical há mais de 25 anos, e também atua com a Evil Twin Music, premiada produtora de som e estúdio responsável por trilhas de todos os tipos, de campanhas globais à trilha de games.

O álbum, The Limited Repetition Of Pleasure, que está sendo lançado nesta sexta (24) em Premiere no Hits Perdidos, é fruto de uma verdadeira experiência de cura, tanto no campo espiritual com uma experiência com um Xamã que lhe permitiu destravar o bloqueio criativo como também uma mudança de como conduz a vida, como também uma mudança de como se relaciona com sua atuação no campo da arte. Tanto no campo da expectativa mercadológica, como também das possibilidades de realizar algo que não tivesse fronteiras fisicas.

“O disco e o projeto são inspirados pelas minhas experiências psicodélicas de cura e ressignificação após algumas imersões intensas com um misterioso xamã brasileiro completamente maluco e fora desse plano, pelo budismo theravada, por algumas viagens pela Ásia que fiz ao longo dos anos.”, conta Murilo em seu material de divulgação


Heal Mura - The Limited Repetition Of Pleasure (2025) - Foto por Vitor Bossa 02
Heal Mura lança o álbum de estreia The Limited Repetition Of Pleasure (2025). – Foto Por: Vitor Bossa

As Influências por trás de The Limited Repetition Of Pleasure

Entre as influências no campo musical estão nomes como Flying Lotus, Four Tet, Brian Eno, Aphex Twin e Chemical Brothers, no campo da eletrônica, mas também dialoga com referências do indie e do rock, de grupos como Sterolab e The Brian Jonestown Massacre.

No campo da literatura, ele reconhece que as obras imersivas de autores como Alan Watts, Ram Dass e JIiddu Krishnamurti, serviram como grande fonte de inspiração para as letras presentes em The Limited Repetition Of Pleasure. Além disso tudo, as andanças pelo globo e o contato com artistas locais, sejam eles do nordeste brasileiro, como de uma tribo do Gabão, acabaram entrando na narrativa imersiva, sensorial e expansiva do disco que te convida para uma viagem neural.

O material teve o lançamento do primeiro single (“Wu Wei”) pelo selo indie alemão Traum Schallplatten, conhecido por artistas como Max Cooper e Nathan Fake, em que ele em entrevista exclusiva para o Hits Perdidos conta um pouco mais sobre a relação que irá surpreender quem conferir. A faixa “Tantrum”, por exemplo, ganhará uma versão do DJ e produtor musical brasileiro reconhecido internacionalmente, Renato Cohen. Confira a entrevista e saiba mais detalhes!

Entrevista: Heal Mura sobre The Limited Repetition Of Pleasure

Você tem uma vasta trajetória como integrante do Aldo, DJ, pesquisador, produtor e também atuação no mercado audiovisual. A partir de que momento entendeu que seria a hora de produzir um trabalho solo?

Murilo Faria (Heal Mura): “Depois que o Aldo, The Band deu uma pausa sem horizonte para volta, eu pensei: “para onde vou agora? Eu nunca vou deixar de fazer música, eu tenho um estúdio completo, mas a forma de lançar um disco tá muito diferente de quando comecei. Ainda tem sentido fazer música, disco? Quero fazer show? Tenho 40 anos já, será que vou ser o “tiozinho do som”? Tenho que fazer dancinha no TikTok? Tenho que me preocupar com plays em streamings? Fazer esse tipo de som no Brasil? Cantando em inglês de novo…”

Decidi baixar o volume dessas “vozes da cabeça”, tirei a poeira da minha coleção de synths e comecei a empreitada. No paralelo, estava produzindo o debut de um artista que admiro muito chamado “Late Again”, do Rafa Mello (ouça). Pude acompanhar de perto a sua trajetória e decidi pegar o vácuo (desculpa, Rafa!).”

Você comenta que o trabalho é resultado de várias experiências tanto ancestrais como também de observação de diferentes culturas e suas manifestações. Como foi esse encontro com esse xamã e de que forma afetou sua percepção e sensibilidade para adentrar nessa fase?

Murilo Faria (Heal Mura): “Esse xamã apareceu misteriosamente em uma fase bem maluca da minha vida. Com ele, tive experiências psicodélicas que até hoje não consigo colocar em palavras. Foi uma espécie de morte e renascimento e morte de novo (para depois renascer). Não foi apenas o psicodélico pelo psicodélico, foi com a forma como ele me guiou nesse processo.

Depois de tanto morrer e renascer, eu simplesmente abri mão de qualquer necessidade de agradar alguém ou fazer um som para determinado público ou até mesmo julgar se o que estava fazendo era bom ou não. Deixei de esperar o momento perfeito para começar e apenas… comecei a compor.

Para mim, a composição desse disco foi a forma musical da técnica literária de “fluxo de consciência”. Eu tentei ao máximo gravar tudo em um take para não perder isso. Deixa para a produção e mixagem a parte mais “racional”.

Esse xamã não só me tirou de um bloqueio criativo, mas também mudou minha vida.”

Entrando mais no campo das referências, você cita o uso de elementos de rituais do Gabão e samples de artistas como Fernando Falcão, além das experiências psicodélicas. O que me lembra bastante as experiências dos Beatles, na Índia, e ainda mais a do Joe Strummer, que em seu documentário conta como morar em 24 países e querer conhecer o cerne cultural fez tudo se expandir, o resultado pode ser visto em seu projeto de world music, The Mescaleros.

Além disso, se soma a referências de toda uma vida como Flying Lotus, Four Tet, Brian Eno, Aphex Twin e Chemical Brothers. Como foi para você esse processo, tanto na parte de elaboração artística, como na de pesquisa?

Murilo Faria (Heal Mura): “Como produtor musical e DJ, a pesquisa é um modo de vida. Você está o tempo todo procurando instrumentos musicais diferentes, estilos musicais poucos conhecidos, movimentos culturais específicos. A questão que tive foi: como fazer isso tudo isso virar música?

A música eletrônica dos anos 90 sempre foi para mim o alicerce. Não quero soar saudosista, mas ter vivido na adolescência os lançamentos de discos como Mezzanine (Massive Attack), Surrender e Dig Your Own Hole (Chemical Brothers), Beaucoup Fish (Underworld), Homework (Daft Punk), Moon Safari (Air) os singles do Armand Van Helden, Aphex Twin, Autechre foi uma sorte danada..

Claro, meu pai sempre gostou de música e desde de criança coloca no toca discos Philip Glass, Ryuichi Sakamoto, Astor Piazzola, Egberto Gismonti.

Com meu irmão veio o indie rock: My Bloody Valentine, Yo La Tengo, Pavement, Guided By Voices

Essas influências todas sempre ficaram e ficarão comigo, mas depois que eu pude entender melhor o som do Flying Lotus quando eu vi ele tocando em um inferninho de SP em 2018 – após ele ter tocado junto com o Aldo no festival do Radiohead – eu vi a possibilidade de atualizar e desconstruir todas essas referências, trazendo não apenas a psicodelia pela psicodelia, mas buscando a origem dela em diferentes tribos e práticas e culturais, como os Bwiti do Gabao.”

Assim como as referências eletrônicas, mesmo longe da Aldo, você também não deixa o lado indie/psicodélico mais roqueiro de lado, até citando Sterolab e The Brian Jonestown Massacre, como sente que a fusão destes universos distintos contribui para a experiência imersiva e neural que propõe?

Murilo Faria (Heal Mura): “Esse lado mais indie veio do meu irmão e do nosso amigo de longa data (o baterista , jornalista e autor do livro Do Vinil ao Streaming) Daniel Setti. Eu nunca vi (respectivamente) um guitarrista e um baterista tão bons na minha vida. E não. Não estou exagerando…

Os dois são 6 anos mais velhos e fizeram uma lavagem cerebral quando eu era criança. Ninguém aguentava mais eu ouvindo o vinil “Xuxa Contra o Baixo Astral” em umas férias no Guarujá no começo dos anos 90. Eles sumiram com o disco e me doutrinaram forçosamente no rock. Anos depois eles me apresentaram ao Milo Garage e ao Dj Guab (que mudou a minha forma de discotecar), que simplesmente não se preocupava com nenhum gênero, apenas tocava o que gostava.

Essa parte mais psicodélica veio de um período em morei na Nova Zelândia e Austrália no começo dos anos 2000… Digamos que lá os cogumelos crescem nas calçadas o ano inteiro…Faz todo sentido bandas como Tame Impala, Pond, King Gizzard virem dessa região. O som psicodélico como um todo sempre foi ouvido em alta rotação lá e ficou sempre comigo.

A fusão desse indie com o eletrônico sempre fez parte do Aldo, mas eu nunca tinha explorado a psicodelia nas composições. Acredito que essa parte é a que mais contribui para o processo de imersão do disco. É o que faz com que uma faixa funcione tanto na pista quanto nos fones de ouvido.

Para mim, quem sintetiza isso de forma perfeita é o Chemical Brothers. Eu ví o show deles em 1999 e nunca senti algo igual. Principalmente forma como eles te levam para dentro da música.”

Aliás, a mixagem tem essa proposta mais expansiva também, tempos atrás falava-se muito sobre 8D e todas as possibilidades, algumas audições de disco tem usado a experiência Dolby Digital para amplificar propostas assim, pensa em fazer uso disso em algum momento em algum?

Murilo Faria (Heal Mura): “No lugar que hoje é a D-Edge funcionou uma casa noturna muito boa cujo nome eu não lembro. Foi lá que eu ví o primeiro Live P.A da minha vida: Renato Cohen, tocando um techno pesado e alto em mono. Ele não precisa de muito para uma experiência absurdamente imersiva e hipnótica.

Pessoalmente, eu não sou muito fã de Dolby Atmos. Eu acho que é um fator a mais para você te distanciar da música. Porém, uma ideia que venho amadurecendo é fazer um som imersivo, com elementos visuais, ao vivo em algum lugar que o artista não seja o ponto central – como um planetário por exemplo.”

Sinto que a narrativa audiovisual também pode contribuir tanto para produção de videoclipes como também para encaixar em trilhas sonoras, como vê que tanto synch e a expansão de narrativa contribuem tanto para o alcance da obra como também para o retorno de um projeto experimental?

Murilo Faria (Heal Mura): “Embora eu trabalhe há anos com isso, nunca pensei em expandir o alcance do disco dessa maneira. O synch continua sendo muito importante para um artista aumentar o alcance do seu trabalho, meu sonho é fazer algo com o Off The Air do Adult Swim.

Por outro lado, eu tive a oportunidade de trabalhar com a melhor equipe de designers, que não só fizeram a capa do disco como também criaram toda a identidade visual do projeto. A dupla Cacá Barabás e Gabriel Grossi conseguiram colocar todo o meu som em imagem (em apenas um “take”) e o Everton Guilherme ainda fez animações surreais em cima disso.

Além disso, tem o fotógrafo Vitor Bossa (parceiro de longa data do Aldo) e o videomaker Icaro Silva.

Para mim, trabalhar com essas pessoas (todas brasileiras e todas com portfólios internacionais e todas completamente malucas) já é o maior retorno do meu projeto.

Infelizmente, aqui no Brasil, ainda há pouco espaço para o experimentalismo, por isso que eu fui bater na porta da gravadora alemã Traum Schallplatten para lançar um single com eles. Estar na mesma gravadora que o Max Cooper e Nathan Fake foi uma grande honra.”

Capa de The Limited Repetition Of Pleasure


The Limited Repetition Of Pleasure - Heal Mura - Capa por Cacá Barabas e Gabriel Grossi
Capa por Cacá Barabas e Gabriel Grossi

Como as obras de Alan Watts, Ram Dass e JIiddu Krishnamurti, ao seu ver, contribuem para a narrativa e se amarram no conceito que pensou para o trabalho?

Murilo Faria (Heal Mura): “Esses três em específico não só conseguiram colocar em palavras tudo o que senti nas minhas imersões com o nosso amigo xamã, mas também nos ensinam como viver com um pé na terra e outro no céu. Como trazer para o dia a dia essas experiências e como ser uma pessoa melhor para você e para os outros.

Toda a vez que eu entrava em um beco sem saída no processo criativo, bastava entrar em contato com qualquer um deles para sair da lupa e ir para o telescópio.

Como não se inspirar com essa frase do Alan Watts?

“Existência é basicamente um tipo de dança ou música – um padrão de energia imensamente complexo que não precisa de explicação além de si mesmo – assim como não perguntamos qual é o significado das fugas de Bach ou das sonatas de Mozart. Não dançamos para atingir um certo ponto na pista, mas simplesmente para dançar.”

Eles conseguem colocar conceitos complexos de uma forma que nossas mentes ocidentais não apenas consigam entender, mas praticar. Em especial a meditação. Muitas idéias do disco também vieram pela meditação.”

Como surgiu essa conexão com o Traum Schallplatten? E como observa as oportunidades para este trabalho além das nossas fronteiras?

Murilo Faria (Heal Mura): “A síndrome de vira-lata brasileira nos leva a crer que “gringos” são pessoas organizadas, claras e metódicas. Principalmente alemães.

Nada disso é verdade no caso da Traum Schallplatten. O caos reina lá.

Isso me fez ficar encantado com o trabalho deles. O Riley, um dos fundadores, já poderia ter vendido seu selo há anos, mas ele continua apaixonado pelo que faz. Pelo novo e pelo diferente. Ninguém alí se preocupa com sucesso ou fracasso.

Não importa de onde venha, qual a idade, etc. O foco é a música. Ainda existir um lugar desses no mundo é um alívio para mim.

As pessoas que estão no selo pensam da mesma forma. No fim do dia, é uma comunidade muito rica. Com certeza terão parcerias com artistas do selo mais pra frente.

E isso foi o mais legal de tudo: eu cheguei neles apenas mandando um email e ficamos amigos de cara.”

Vejo que parte estética é muito importante no trabalho do Aldo, já vi o André comentar sobre Bowie nesse sentido, no passado. Sendo assim, como foi amarrar o conceito na capa e como foi o desenvolvimento dela?

Murilo Faria (Heal Mura): “Como eu disse acima, a capa foi um processo incrível que ajudou a música a ter vida. Em muitos casos, em especial a música eletrônica, o design é tão importante quanto a música.

Temos casos clássicos, como o selo francês Ed Banger e So Me, Chemical Brothers e Adam Smith e Marcus Lyall, Radiohead e Stanley Donwood

Eu me sinto honrado pelo Heal Mura ter Cacá Barabás e Gabriel Grossi. Em apenas uma reunião de uma hora eles sacaram todo o conceito e a capa foi aprovada em um “take”. Como eles fizeram essa bruxaria, só eles sabem…”

Por aquelas tristes coincidências da vida, perdemos nos últimos dias David Lynch que também lançou um disco experimental eletrônico, sei que é uma das inspirações do universo que construíram com o Aldo ao longo dos anos, e ele disse que jamais tocaria aquelas canções ao vivo, até fez analogias que ele teria que estar em transe de drogas para isso, ao falar sobre apresentações artísticas ao vivo.

Você pretende apresentar essas canções no formato banda ou por meio de DJs sets em algum momento, ou vê apenas como um projeto de estúdio?

O estúdio sempre foi o meu primeiro instrumento musical. Ele ficar como um projeto de estúdio apenas dentro do estúdio seria um desperdício. Por outro lado, levar um estúdio para fora de um estúdio demanda desapego com os equipamentos, cabos (muitos cabos), pessoas desavisadas achando que você está discotecando e pedindo para tocar Lady Gaga.

Mesmo assim vale a pena, porque a troca e a conexão – principalmente em momentos de improviso – é indescritível! Mas, como é um projeto solo e independente, as coisas demandam mais tempo… Paciência é a maior das virtudes :)”

Ouça o disco do Heal Mura agora mesmo em sua plataforma de streaming favorita

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