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PLUMA desafia a gravidade para se conectar em “Não Leve a Mal”

São raríssimos casos em que podemos estar presentes no primeiro lançamento oficial de uma banda. Mas com a PLUMA isso aconteceu. Foi no dia 26 de junho de 2020, que o single “Esquinas” foi disponibilizado com direito a Premiere no Hits Perdidos. Quem diria que 4 anos e 22 dias depois teríamos a honra de voltar a escrever sobre o quarteto logo no dia do lançamento do primeiro álbum.

São coisas mágicas do jornalismo cultural que ficam  ainda mais especiais quando vemos a evolução tanto estética como sonora de um projeto que teve como origens um projeto de TCC da faculdade Belas Artes (confira entrevista onde eles contam mais detalhes).

“Nesse projeto de TCC tínhamos que escolher alguns gêneros musicais, fazer um estudo sobre a história e estética deles, e por fim, montar um show audiovisual coeso com composições inéditas que incorporassem elementos desses estudos.

O processo não podia ter sido melhor, desde a primeira vez que nos reunimos pra começar as primeiras músicas sentimos uma facilidade muito grande pra tocar juntos.”, conta o tecladista, Diego Vargas, em entrevista para o Hits Perdidos 4 anos atrás

Eles ainda conseguiram a proeza de conseguir manter neste meio tempo a formação original que conta com Diego Vargas (teclado/synth), Guilherme Cunha (baixo), Lucas Teixeira (bateria) e Marina Reis (vocal).

Na época o som englobava ritmos como o jazz passando pelo rock psicodélico e o pop, o que ao longo do tempo foi englobando novas referências que foram dando corpo para a natureza prolífera e agregadora sonora da PLUMA.


PLUMA lança álbum “Não Leve a Mal” pelo Selo Rockambole. – Foto Por: Maria Cau Levy

A Audição do Álbum

Na noite da terça (16) aconteceu uma audição para imprensa aberta aos fãs na Casa Rockambole, casa do selo que lança os materiais do grupo desde o início desta jornada musical. E o testemunho do baterista Lucas Teixeira, que também integra O Grilo, outra banda do coletivo paulistano, teve a oportunidade de comentar sobre sua entrada no projeto.

Ele relatou que apesar de conhecer um dos integrantes nos corredores da Belas Artes, não era amigo de ninguém até se aproximar de fato. Marina, adicionou, que achava que ele era muito do rock, e como ele mesmo completa: “Foi justamente este choque que ajudou em conjunto a construir a identidade do projeto”. 

Após o primeiro single, vieram dois EPs, Mais do Que Eu Sei Falar (2020) e Revisitar (2021), além de um projeto em conjunto com O Grilo, O Grilo + Pluma, em que gravam faixas em conjunto, o que só mostra a proximidade entre as bandas. Lucas, inclusive, conta que a parceria vai além da parte comercial e dos palcos, com direito a réveillons e viagens em conjunto. O que mostra como o fator construção coletiva de cenas, embora raro em tempos de internet, ainda existe no offline. 

Nesse meio tempo, ritmos como jazz contemporâneo, o neo soul, o rock psicodélico, o dream pop, R&B, o drum’n’bass, o jungle e a música brasileira foram sendo incorporados a sonoridade do grupo que elevou a potência no quesito experimentar sem perder a aura pop açucarada. Os sintetizadores no novo trabalho ganham ainda mais protagonismo dialogando com a sonoridade de grupos contemporâneos com os franceses do L’Imperatrice e os australianos do Parcels

O background de “Não Leve a Mal”

Nada melhor do que eles falando um pouco mais sobre os desdobramentos envolvendo o novo álbum. Durante a audição realizada diretamente do palco da Casa Rockambole eles contaram que justamente aquele palco foi também usado para captar o som das baterias presentes no disco. Para quem não sabe, a casa também conta com um estúdio dentro da sua estrutura e foi lá que boa parte do disco foi captado por Hugo Silva.

“Vemos esse álbum como uma mistura bem equilibrada do que descobrimos e aprendemos no primeiro EP, com experimentações e ferramentas do segundo EP. Foi uma chance de executar tudo que a gente queria e sabia em relação à composição, produção, captação de áudio, podendo apresentar isso junto com conceito, num projeto maior.

Não rolou uma decisão sobre o que iria conduzir o disco, foi baseado em nossa bagagem, nas referências de música gringa como R&B, Neo Soul, Jazz, Indie e psicodélico, até algumas referências pop, mas tentando fazer tudo conversar com a música brasileira e com nossas canções.”, comenta o baixista Guilherme Cunha.

O título bastante provocador que parece como uma mea culpa tem um motivo especial, como relata a vocalista Marina, que vinha trabalhando nas composições desde 2022.

“‘Não Leve a Mal’ é uma frase que soa como um pedido de desculpas, mas não é. Vem como um pedido de aceitação de que algumas coisas são inevitáveis e acontecem em ciclos. Apreciar o começo, o interesse, o clímax e entender a perda de sentido, o final – tudo isso pode se repetir inúmeras vezes, cada uma vai deixar sua marca e abrir espaço para uma nova história. É importante mergulhar dentro de si sem culpa, dizer o que deve ser dito, e não falar o que não quiser. ‘Não leve a mal, é mais sobre mim do que sobre você.”, comenta Marina Reis. 

A faixa, inclusive, ganhará um videoclipe dirigido por Gabriel Rolim que será lançado na sexta-feira (19). O material foi gravado em 16mm e conta a história da música acompanhando o relacionamento de Marina Reis com um “ser de luz” por meio de animação, efeitos visuais e enquadramentos não convencionais que buscam demonstrar visualmente os contrastes da música.

Entre as principais referências do trabalho, segundo os integrantes, estão Rita Lee a Tame Impala. Já as letras discorrem sobre experiências universais que expressam o momento artístico da banda, como aceitação de términos e libertação de culpas. Além do Drum’n’Bass e o Jungle, o material também explora outra vertente da música eletrônica, o house, justamente na parceria com o duo Deekapz em “Sem Você”.


PLUMAFoto Por: Maria Cau Levy

Algumas Impressões sobre “Não Leve a Mal”

Não Leve a Mal é uma espécie de viagem sonora por diferentes frequências e cenários, muitas vezes cruzando os limites entre o real e o irreal. Tanto que as experiências universais das suas letras mostram como eles querem abrir a roda para se conectar musicalmente com outros espaços onde antes não tinham lastro.

De lidar com traumas mundanos a não enxergar limites para onde pode chegar, o upbeat das músicas é naturalmente dançante e justamente isso faz com que as fronteiras do que é indie, do que é dance músic, do que é groove, do que é música brasileira, do que é psicodelia se entrelaçam em um movimento onde as respostas são encontradas ao longo do caminho.

São ao todo 12 faixas e pouco mais de 45 minutos de duração, em um momento onde poucos param para ouvir um disco todo, é um desafio por si só captar a atenção mas toda essa natureza fonográfica da PLUMA em transformar tudo em sinergia com o movimento, com as artes visuais e com a vibe, algo tão em busca pela Gen Z, pode servir como elemento surpresa em uma indústria cada vez mais tomada por fórmulas e algoritmos que empobrecem a música que consumimos dia após dia.

Em tempos onde muito se discute e se estuda sobre “A música não está piorando; gêneros estão”, como apontado em artigo da MIDiA, vemos como eles estão construindo algo que talvez seja maior do que uma banda, maior do que um pequeno coletivo de músicos que nunca sonharam em fazer música até a faculdade, mas que inspire outros artistas e cenas a explorar a música como um exercício para quebrar paradigmas e regras mercadológicas (empurradas diariamente goela abaixo).

Encontrar o Zeitgeist de uma geração, em uma velocidade em que cada vez mais evoluem e se entrelaçam em menor período de anos, é um desafio sentido à flor da pele por criativos que muitas vezes tem que antever o futuro mesmo temendo pelo fracasso.

Uma cruz dividida e carregada por diversos artistas, em tempos de uma competição digital e horas logado, o disco da PLUMA parece nos convidar a deixar o celular um pouco de canto para experimentar um pouco a vida offline. Ou como eles dizem em “Se Você Quiser”: “Queria ficar te admirando de perto/mais perto/assim… Só quero agora eu quero ter/No seu tempo/ Um minuto de atenção/Um momento/Nada Mais/Que um vapor no ar”.


PLUMA comenta o debut em faixa a faxia. – Foto Por: Maria Cau Levy

Faixa a Faixa: Não Leve a Mal por PLUMA

“Quando Eu Tô Perto”

Para mim, essa é a que mais tem cara das nossas músicas antigas, com muitas partes diferentes e quebras de tempo. [Dizzy] 

“Se Você Quiser”

Essa faixa é uma das mais descontraídas do disco. A letra é bem direta ao ponto e eu busquei descrever sensações carnais sem me filtrar tanto. Essa descontração também é explorada no instrumental, com o refrão mais dançante. [Marina]

“Corrida!”

É uma das faixas que representa a reflexão sobre uma relação que já acabou. Talvez tenha o ar mais pessimista dentre o álbum. Quando escrevi a letra, sentia que realmente todo relacionamento tem um fim e algo que já pareceu tão intrigante não passou de uma história sem sal, sem graça. [Marina]

“Jardins”

Compus essa música bem na virada de ano de 2021 para 2022. Foi uma daquelas que vem toda pronta, letra, melodia e harmonia. É uma música bem imagética que mistura e relaciona coisas imensas e fora de alcance com coisas do dia a dia, mais mundanas. [Dizzy]

“Mais Uma Vez”

Amo a correlação entre letra, estrutura e sonoridade dessa faixa.  Ela também fala sobre desejos carnais e as dúvidas que permeiam quando suas vontades podem machucar outra pessoa. Os versos mais contraídos falam mais sobre a voz da razão, enquanto os refrões, principalmente o segundo, representam o lado explosivo e passional que habita em todos nós. [Marina]

“Preguiça”

Essa faixa tem um clima bem diferente do resto do álbum e foi a única que eu gravei sozinho. A intenção era gerar o máximo de sensação de letargia e lentidão, quase indo para trás, uma música que não dá pra escutar sem bocejar no final. [Dizzy]

“Não Leve a Mal”

Lembro que essa música nos ajudou a dar a direção do álbum, todas as partes dela fluíram de forma muito natural de uma forma que fazia sentido, não à toa leva o nome do disco. Ela também foi uma descoberta de um lado novo nosso, com climas, timbres e texturas diferentes, onde achamos um lugar novo para a voz da Marina.

Exploramos samples de uma forma diferente e o som que tiramos de cada instrumento foi bem individual. A letra dela carrega um dos sentimentos principais do álbum, é sincera e tem uma dualidade de ser pesada e leve ao mesmo tempo, também faz referência a primeira música do álbum, pois realmente surgiu de um recorte dela. Para mim, foi a música onde os quatro se encontraram. [Gui]

“Plano Z”

A única faixa do disco de outro compositor, não tinha como não ser especial. Já tivemos algumas oportunidades anteriormente de trabalhar em cima de uma canção pronta, de outra pessoa, respeitando a letra e a história que está sendo contada, pensando apenas no arranjo e na produção dela, em como transformar a letra em som.

Nosso grande amigo Pedro Martins trouxe essa canção incrível, que coincidentemente ou não, tem tudo a ver com o sentido do álbum. Na primeira vez que ouvimos, já sentimos essa sintonia dela dentro do todo, inclusive nos ajudou a traçar o caminho de outras músicas. Além de tudo isso, conseguimos colocar referências de drum’n’bass e jungle num BPM mais alto, explorando uma sonoridade que curtimos muito, mas que ainda não tinha rolado a oportunidade pra gente aplicar. [Gui] 

“Sem Você” (feat. Deekapz)

Acho que é a que mais tem a ver com nossas músicas anteriores, vai mais pra um lado jazz e groove. Curto demais a sonoridade e os timbres que tiramos nela e o feat com o Deekapz somou demais, a mistura do house meio gravado em banda, meio produzido no computador ficou especial. Ela ainda tem uma das letras mais diretas e fortes do álbum. [Gui]

“Doce/Amargo”

O Dizzy trouxe essa canção quase finalizada e o começo de todo o processo foi desafiador, pois normalmente fazemos o inverso. Tentamos trazer algumas referências diferentes, mais dançantes, meio música brasileira dos anos 70, 80.

Mais pra frente, ela tomou outro rumo e se misturou com synths e samples, mas lembro que ficamos um tempo ouvindo muito Rita Lee pra achar o caminho dela. Isso foi bem importante, pois foi uma das faixas que puxou esse clima de dança, de show – que era uma vontade nossa desde o começo da criação do álbum. [Gui] 

“Quanto Vai Ficar?”

Essa foi uma das últimas músicas a tomar forma porque rolou um bloqueio em relação a ela. Mas, quando retornamos para o processo de criação, sinto que tudo fluiu de uma forma incrível. O refrão com cordas e sem letra, a estrutura e diferentes momentos dessa faixa a tornam bem diferente e especial. O groove, os timbres, os respiros e, na ordem do álbum, dos ciclos, ela tem um lugar muito sincero e denso. Sinto que a Marina usou muito bem o espaço que ela tinha liricamente e instrumentalmente usando a voz de uma forma que eu amo. [Gui]

“Sonar”

A primeira ideia dessa música nasceu quando a gente estava planejando um feat com a banda Pelados que nunca saiu. Fala sobre projeções astrais, ter calma e olhar pra dentro, um pouco sobre medo também. [Dizzy] 

Ela tem um ar de conclusão que fechou bem o álbum. A letra é um pouco mais subjetiva, mas me traz a sensação de tranquilidade e aceitação. O solo de trompete do Lucas Gomes sobrando sozinho enquanto a banda desaparece fecha a obra quase como se estivéssemos nos despedindo. [Marina] 

Ficha Técnica

Composição e Interpretação: Diego Vargas, Guilherme Cunha, Lucas Teixeira e Marina Reis, exceto a faixa 8 (Plano Z) composta por Pedro Martins
Pré-produção: Hugo Silva
Captação: Hugo Silva
Produção: Hugo Silva, Diego Vargas, Guilherme Cunha, Lucas Teixeira e Marina Reis
Mixagem: Hugo Silva
Mastering: Fernando Sanches (Estúdio El Rocha)
Sax: Lucas Gomes (Doce/Amargo e Sonar)
Guitarra: Felipe Martins (Quando Eu To Perto)
Gravado no Estúdio Rockambole


This post was published on 18 de julho de 2024 9:00 am

Rafael Chioccarello

Editor-Chefe e Fundador do Hits Perdidos.

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