Bikini Kill volta 30 anos no tempo em seu segundo show em São Paulo

 Bikini Kill volta 30 anos no tempo em seu segundo show em São Paulo

Bikini Kill em seu segundo show na Audio – Foto Por: Rafael Chioccarello

Depois de mais de 20 anos fora dos palcos, o Bikini Kill, em 2017, retornou para uma série de shows nos EUA. Posteriormente, em 2019, retornaram em definitivo. Diferente de comebacks que o Brasil passou longe de ver, como o do The Replacements, em 2015, e o do Refused, que já tem data para se encerrar em maio na Suécia, desta vez não ficamos de fora.

Neste meio tempo as integrantes se dedicaram a diferentes projetos. Kathleen, no trio de dance punk eletrônico Le Tigre (1998 e 2005), que também já teve comeback, e posteriormente no projeto solo Julie Ruin. Tobi, no The Real Distractions, Morgan and the Organ Donors e gSp (Girl Sperm); e Kathi, no The Frumpies e The Casual Dots.

A primeira vez em 33 anos da banda de Olympia (WA) em solo brasileiro. Do quarteto original, o retorno manteve o trio Kathleen Hanna, Kathi Wilcox e Tobi Vail, a exceção é a guitarrista original, que também tocava baixo, Billy Karren, que esteve presente no quarteto até 1997. Quem entrou para substituir a integrante da formação original nas apresentações ao vivo é Sara Landeau.


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Bikini Kill veio pela primeira vez ao Brasil após 33 anos – Foto Por: Rafael Chioccarello (Hits Perdidos)

O Documentário da vocalista do Bikini Kill

Expoente do movimento riot grrrl, o Bikini Kill traz consigo marcas da luta pela sobrevivência em uma cena punk e hardcore dominada por homens e repleta de sexismo. Este esse que não é algo que apenas se limita ao estilo, mas como a sociedade como um todo. Não é à toa que no ótimo documentário, The Punk Singer (Sini Anderson, 2013), no qual conta a história da vocalista Kathleen Hanna.

A protagonista conta sobre o início do relacionamento com Ad-Rock, dos Beastie Boys, em que teve que lidar com conflitos nesse sentido, ele mesmo relata que aprendeu muito com a esposa (estão casados desde 2006).

Outro trecho marcante do documentário que conta o drama com a doença de Lyme, no qual chegou a ficar sem voz, é a parte em que relata a amizade com Kurt Cobain.

Em 1991, durante uma festa na casa de Kurt, Hanna pichou na parede com a frase “Kurt smells like teen spirit” (Kurt tem cheiro de teen spirit), uma brincadeira que se referia ao fato de Cobain estar com o cheiro do desodorante de Tobi Vail, sua namorada na época. O vocalista do Nirvana era conhecido por também ser aberto as discussões de temas como equidade. A frase acabou inspirando a canção “Smells Like Teen Spirit”.



Em maio, Kathleen lançará nos Estados Unidos a autobiografia Rebel girl: My life as a feminist.

O show em São Paulo

Com preços bastante salgados, principalmente para um show de Punk Rock, que teve pouco mais de uma hora, para entrar na Audio era necessário desembolsar de R$ 265 (meia-entrada solidária) a R$ 530. Antes da apresentação da banda de Washington, se apresentaram Weedra, Punho de Mahin e As Mercenárias part. Paula Rebellato. A noite ainda teve a discotecagem das DJs CamillaJaded & Erikat.

As duas datas em solo paulistano foram realizadas pela Associação Cultural Cecília e DaTerra Produções. Se o show do dia 05/03 foi marcado pelo estar sold out, com uma série de encontros e a banda se posicionando politicamente a cada oportunidade que tinha. Até mesmo pedindo para as garotas virem para frente, discutir com fãs homens que estavam atrapalhando e com discurso que abraça pessoas trans e não-binárias. No dia 14/03, o desenho do show foi diferente, casa com visualmente 70% dos ingressos vendidos, com banda mais tímida e um tanto emotiva.

Logo na terceira música,”Jigsaw Youth”, Hanna dá bronca e diz que o público está cantando a parte errada da música, o que fez ela se confundir e errar a letra. Ela diz que quer cantar certo porque é a música favorita dela, e brinca de usar a time machine. O momento é hilário e provoca gargalhadas nos presentes. Um fato legal de observar desde o show das Mercenárias foi o fato de ser possível ver uma roda punk perto no palco formada por mulheres, muitas delas eram erguidas a cada hino do Bikini Kill.

Pouco depois de “Don’t Need You”, a vocalista agradece pelo primeiro show em solo brasileiro e pela oportunidade de uma segunda data. Os setlists das apresentações na América do Sul em si não são muito diferentes, o que destoou desta apresentação foi justamente o tempo curto, foram pouco mais de 68 minutos (contando o BIS), nos anteriores o tempo médio foi de 90 minutos.

Em determinado momento, depois da dobradinha “Carnival” e”Resist Psychic Death”, ela aponta para um cartaz e fala sobre uma doença, não deu para entender muito bem se era a respeito do Lyme, no entanto, ela disse uma frase marcante, de era para todos se cuidarem, pois é importante se fazer presente. O que faz todo sentido, visto que ela lutou por anos contra a doença. Outra artista que já relatou sobre ter sofrido com ela foi a canadense Avril Lavigne.


Bikini Kill na Audio - 14:03:2024 - Foto_por_Rafael Chioccarello
Bikini Kill em seu segundo show na Audio – Foto Por: Rafael Chioccarello

Intensidade não faltou

A energia de Kathleen é algo bastante cativante. Ela se apresenta com um vestido bastante chamativo e procura explorar todos os lados do palco, para que todo fã tenha seu momento olhando no fundo do olho.

Hanna até se desculpa por tecnicamente não ser a melhor banda. Mas quem liga? A verdade é que todo mundo que ter a chance de voltar 30 anos no tempo para vivenciar a rebeldia punk.

Em tempos de conflitos entre Israel e Palestina, ao se deparar com a bandeira da Palestina, a vocalista agradece pela bandeira estar hasteada no pé do palco e lamenta o rumo da guerra.

Para quem conhece as apresentações do Bikini Kill, sabe do esperto joguete de trocarem de instrumentos, Tobi, larga as baquetas alguns momentos e vai para os vocais assim como Sara Landeau, Kathi Wilcox e Hanna, que se revezam entre bateria, baixo e guitarra. O simples ato sintetiza o lado inspiracional que conecta a banda ao público. O de “se eu posso, você também pode”, que estimulou garotas de todo o mundo a começar a tocar.

A apresentação do Bikini Kill nunca foi sobre técnica, perfeição, primor ou ser aplaudido por entusiastas da academia. Sempre foi sobre a atitude, quebrar tabus, ser um lugar de segurança, progressismo e equidade. A graça para quem esteve presente foi se conectar com memórias de tempos onde jamais pudéssemos sonhar em assisti-las ao vivo.

Na plateia era possível ver várias pessoas que tem ou tiveram bandas, que trabalham ou trabalharam como graxa dentro da indústria da música, mas que se não fosse por elas, e por mulheres como elas, talvez nunca tivessem tido oportunidades como estas.

Se o mercado da música ainda é dominado por homens em diversas frentes, com uma série de disparidades, como relata o estudo da UBC, nestes dois shows, foi possível ver uma realidade diferente do que estamos acostumados. No qual se viam mais mulheres perto do palco, com menos medo, cantando alto e sonhando com dias como estes.


Bikini Kill - 14:03:2024
Cartaz presente no show do Bikini Kill rendeu polêmica nas redes sociais – Foto Por: Rafael Chioccarello (Hits Perdidos)

Setlist Bikini Kill @ São Paulo – 14/03/2024

Double Dare Ya
New Radio
Jigsaw Youth
This Is Not a Test
Don’t Need You
Feels Blind
I Hate Danger
In Accordance to Natural Law
Carnival
Resist Psychic Death
I Like Fucking
Outta Me
Reject All American
Distinct Complicity
Demi Rep
Alien She
No Backrub
Sugar
Rah! Rah! Replica
Hamster Baby
Tell Me So
Star Bellied Boy
Suck My Left One

Encore:
Rebel Girl

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