Internacional

Lianne La Havas convida Mestrinho e Pretinho da Serrinha para o palco em noite inesquecível no Cine Joia

A vida muitas vezes escreve roteiros por linhas tortas. Um convite. Uma porta aberta. O acaso. Outro continente. Uma catarse. A princípio a vinda de Lianne La Havas viria ao Brasil para gravar com Milton Nascimento um projeto em homenagem a Ella Fitzgerald e depois passaria um tempo de férias no Rio de Janeiro. Um rascunho. Um Script. Um roteiro.

Eis que em uma noite notam a presença dela na noite carioca e o entusiasmo pela presença gerou o convite para shows por lá. A informação correu e chegou a São Paulo. Numa tacada duas datas ali, no pequeno Clube Manouche, e duas datas para cá, no Cine Joia, não apenas se tornaram realidade mas como se esgotaram em questão de minutos.

O primeiro show em São Paulo, da quinta-feira (09/02) evaporou em coisa de 5 minutos. Já a segunda data (desta sexta-feira, 10/02) se esgotou em pouco mais de uma hora. Sim, até a data do show era possível ver pessoas no twitter e facebook procurando urgentemente por ingressos. Não é a toa, ícone do soul, folk e R&B, e com três discos de estúdio (Lianne La Havas [2020], Blood [2015] e Is Your Love Big Enough? [2012]), ela foi indicada para o Grammy Award para melhor álbum contemporâneo de R&B (2016) e duas vezes para o Brit Awards, em 2017 e 2021.

A série de quatro shows celebra a segunda passagem da artista pelo país. Em 2016, Lianne fez os shows de abertura para a turnê do Coldplay no Brasil mas ter esse momento como solista e sentir o calor de um público sedento por sua apresentação talvez faça com que ela repense em voltar em breve para a terra brasilis. Fato é que a imersão no Rio de Janeiro também proporcionou poder conhecer e interagir com artistas brasileiros.

O convite para Luciane Dom abrir seus shows veio de uma amizade por lá. Fato que a cantora e compositora brasileira, natural de Paraíba do Sul e atualmente vivendo no Rio de Janeiro, celebrou trazendo para seu repertório canções autorais e até mesmo homenagem a Gal Costa e versão para canção de Zé Manoel em um show acompanhada apenas pelo guitarrista Pitter Rocha e segurando tudo no gogó.


Luciane Dom acompanhada de Pitter Rocha abrindo para Lianne La Havas no Cine JoiaFoto Por: Rafael Chioccarello (Hits Perdidos)

O show de Lianne Havas

A lógica do encontro com os brasileiros nos palcos fez com que o roteiro ganhasse novos capítulos. O resultado? Felicidade instantânea para os felizardos que conseguiram vencer a árdua batalha contra a loucura das vendas online de ingressos. Isso por si só dá um texto repleto de polêmicas (e processos para a eventim, não é mesmo?). Fato é que o show marcado para às 21:30h acabou começando por volta das 22:01h com Lianne La Havas entrando tímida no palco e já sendo ovacionada entre as luzes que refletiam no palco do Cine Joia.

Acanhada ela parece tímida até nos primeiros versos ganhar a companhia do coro de uma casa lotada. O que deu ânimo para ela na seguinte já se sentir em casa. Aí que o show começa a crescer e entrar no clima de uma noite que já estava ganha (só ela não sabia ainda).

Seu lado doce em lidar com o público se reflete nos pequenos gestos. Um pequeno deslize numa casa da guitarra e ela toda já querendo se justificar dizendo “Its my friends guitar” (“é a guitarra do meu amigo”), querendo dizer que o seu equipamento era emprestado. Sabe aquele erro bobo que ninguém percebe só o próprio músico? Acabou soando como graça para uma plateia que acompanhava boquiaberta a cada movimento, expressão e dedilhado.

Na primeira salva de palmas ensurdecedora, que veio logo após a terceira canção ela diz que São Paulo ela tava sentindo que ia ser especial. Talvez memórias da noite com o Coldplay? Essa ela vai ter que nos contar em uma próxima vez.


Lianne Havas no Cine JoiaFoto Por: Rafael Chioccarello (Hits Perdidos)

Ela para o show por alguns segundos e…pede chá. Toma um gole e diz: “Sometimes nothing better than a good cup of tea. I’m from England, so that’s what we do” (“Às vezes nada é melhor que uma boa xícara de chá. Eu sou da Inglaterra, então é o que fazemos lá”) antes de tocar “Paper Thin”. Graciosa até quando erra algum acorde, ela pede desculpa quando esquece alguma ou outra introdução. Brinca com isso e toma mais um gole da sua caneca de chá.

Transita com facilidade por canções do primeiro ao terceiro disco e o público reverencia a cada impressionante abertura vocálica que deixa qualquer presente de queixo caído. São muitos assobios, muitos dos presentes gritam linda, alguns em inglês, ela entende e agradece feliz.

Lembram que disse que os encontros com brasileiros fizeram sua passagem por aqui ainda mais incrível? Ela tem a oportunidade de levar para o palco, primeiro Mestrinho, depois Pretinho da Serrinha, elevando as possibilidades sonora para outro nível de experimentação e conexão com a música brasileira. De emocionar qualquer um que ama a mistura e nossas raízes brasileiras.

A participação especial de Mestrinho com sua sanfona agiganta ainda mais a apresentação trazendo um pouco do Brasil e de contornos para a apresentação. A versão para “Weird Fishes”, do Radiohead, com a sanfona é um show a parte que Thom Yorke definitivamente precisa assistir para se apaixonar.

Após tocar duas músicas ao lado de Mestrinho ela diz “eu estou muito feliz de ter vindo pro Brasil”. Aí que entra Pretinho da Serra em cena com seu pandeiro. Ela sempre que pode trocar nomes das cidades citadas nas músicas coloca SP para chamar o público para mais perto (como se isso fosse necessário). Mestrinho ainda acompanha em algumas músicas e no nosso imaginário o encontro recria automaticamente universos paralelos do que ela poderia extrair para seu som se tivesse nascido por aqui. Quais vivências e oportunidades teria de diferente. Toda aquela mística. Fato é: ela se sentiu em casa.

Ela agradece a todos e exalta o calor ímpar da plateia de São Paulo. Parabeniza Luciane Dom, nova amiga que convidou para abertura. E ainda dá mais uma canja com hits (como “Can’t Fight” e “Green & Gold”) que o público canta do começo ao fim com direito a palmas ritmadas.

Antes do BIS ela diz: “Eu nunca planejo nada. Talvez por não ser tão grande ainda “But I Want to Thank You From The Bottom of “meu coração” (“Mas eu quero agradecer do fundo do meu coração”).

Se preparando para tocar a última música ela chama Pretinho da Serra e Mestrinho e diz “Eu sinto como se fosse meu aniversário” e sorri para o público. Dessa vez Pretinho deixa o pandeiro de lado e toca pad, deixando a versão ainda mais eletrônica e quebradiça. Noite inesquecível e nesta sexta-feira quem puder ir, não deixe essa oportunidade passar batido. Prepare-se para se emocionar.

A vida parece fazer mais sentido quando temos a oportunidade de assistir a um show.
A vida coloca você de cabeça para baixo quando você tem a oportunidade de ver algo fora da curva.
Quando o artista tem alma cristalina e esbanja humildade: se torna inesquecível.

O show da Lianne La Havas foi isso e um tanto mais.


Lianne La Havas, Mestrinho e Pretinho da Serra no Cine Joia – Foto Por: Rafael Chioccarello (Hits Perdidos)

Setlist Lianne La Havas – 09/02/2023 – Cine Joia

  1. No Room for Doubt
  2. Don’t Wake Me Up
  3. Sour Flower
  4. Wonderful
  5. Tease Me
  6. Paper Thin
  7. Weird Fishes/Arpeggi (Radiohead cover)
  8. Courage
  9. Please Don’t Make Me Cry
  10. Can’t Fight
  11. Au cinéma
  12. Seven Times
  13. Midnight

    Encore:

  14. Bittersweet
  15. Green & Gold

This post was published on 10 de fevereiro de 2023 2:47 am

Rafael Chioccarello

Editor-Chefe e Fundador do Hits Perdidos.

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