Mariana Cavanellas junta os cacos e renasce das cinzas na realtape “KINTSUGI”

 Mariana Cavanellas junta os cacos e renasce das cinzas na realtape “KINTSUGI”

Mariana Cavanellas lança a realtape KINTSUGI via PWR Records – Foto Por: Rafa Chernicharo

Antes de apresentar seu álbum de estreia, Mariana Cavanellas apresenta a REALTAPE, KINTSUGI.

Conhecida como co-fundadora das bandas Lamparina e A Primavera (2017), atualmente conhecida como Lamparina, e também o fenômeno Rosa Neon, a mineira Mariana Cavanellas desde 2020 vem lançando uma série de EPs em carreira solo, tendo nesse meio tempo emplacado feats com nomes em ascensão no cenário nacional.

Entre as participações ela tem no currículo parcerias com Tropkillaz, Djonga (canta em três faixas do álbum LADRÃO) FBC (em “Não dá pra explicar” do álbum BAILE), Hot e Oreia (primeiro feat. de sucesso da dupla é “Relação“), Maíra Baldaia, Bernardo Bauer, Claudia Manzo (“Vacilão”) ao lado de Baianasystem, Naroca, Gabriel Bruce, Lafetah e mais recentemente ao lado de Haroldo Bontempo, dos belo horizontinos da Mineiros da Lua

A Filosofia japonesa por trás da REALTAPE KINTSUGI

Agora é a vez da artista apresentar uma mixtape, que ela prefere chamar de REALTAPE, com o nome de KINTSUGI. Para quem não sabe Kintsugi (金継ぎ?, きんつぎ, “emenda de ouro”) é a arte japonesa de reparar uma cerâmica quebrada com laca espanada ou misturada com pó de ouro, prata ou platina, um método semelhante à técnica maki-e.

Como uma filosofia, kintsugi pode ter semelhanças com a filosofia japonesa de wabi-sabi, a aceitação do imperfeito ou defeituoso. A estética japonesa valoriza as marcas de desgaste pelo uso de um objeto. Isso pode ser visto como uma razão para manter um objeto mesmo depois de ter quebrado e como uma justificação do próprio kintsugi, destacando as rachaduras e reparos como simplesmente um evento na vida do objeto, em vez de permitir que o seu serviço termine no momento de seu dano ou ruptura.

Kintsugi pode se relacionar com a filosofia japonesa de “não importância” (無心 mushin) que engloba os conceitos de não-apego, aceitação da mudança e destino como aspectos da vida humana. Seu conceito se relaciona com a temática do material que traz em seu conceito o fator de serem: músicas reais, “vulgo papo reto sem muito romantismo”, como define Mariana.

“Uma mistura de paixão, projeção, fantasia e realidade é o que podemos ouvir, ver e sentir. Não são apenas duas faces, mas sim seis – e cada música toca em um ponto. Às vezes vai direto à ferida: KINTSUGI traz para as mulheres um lugar de conexão profunda com a beleza das cicatrizes da vida.”, define a artista


Mariana Cavanellas lança a realtape Kintsugi via PWR Records - Foto Por: Rafa Chernicharo
Mariana Cavanellas lança a realtape KINTSUGI via PWR RecordsFoto Por: Rafa Chernicharo

Mariana Cavanellas KINTSUGI

A sonoridade é definida por Cavanellas como Pop Avant, processo de pesquisa com referências em diferentes estéticas como o pop indie, rap e trip hop. O lançamento que está sendo viabilizado pelo selo PWR Records foi produzido por Rafael Fantini (Faew), com mixagem e masterização por Victor Nery.

Assim como a arte japonesa, a REALTAPE mostra como o desgaste que as vivências proporcionam sobre o ser são capazes de gerar grandes transformações. Através da mutabilidade da identidade e da capacidade de enxergar o próprio valor: encontra a beleza na sua própria imperfeição.

Com músicas de até 3 minutos, ela mostra a sua versatilidade em criar estéticas ao mesmo tempo que traz versos rasgados com aquele punch que nos lembra o estilo da brasiliense Flora Matos. Em cada música ela trata de mostrar uma nova faceta e viés sobre suas vivências com arranjos que mesmo com beats explorando o grave, trazem diferentes soluções estéticas.

Feito um canivete suíço, cada música ela mostra seus diferentes mecanismos de auto-defesa para superar seus traumas. Em “Véu”, por exemplo, ela já mostra o clima de azaração e destoa das duas que abrem o registro (“E aí?” e “Beat”). Já os teclados aliados com beats e batuques marcam presença em “Fênix” que como o nome mesmo diz é uma canção subida com versos como “acho que a mãe voltou / acho que a mãe chegou”. “Tão Bom” e “Devagar” foram lançadas como singles promo.

Faixa a Faixa Por Mariana Cavanellas

KINTSUGI foi escrito pela mesma Mariana que encarna diferentes personagens durante uma história de amor, superação, decepção e autoconhecimento.

1) Devagar

“DEVAGAR” é a faixa que abre todo um trabalho auto biográfico sobre paixão, manipulação, ilusão e violência sexual. A música dançante traz uma composição que trata de uma fase bem auto centrada em seu trabalho, sem muita pressa e com muita sede de honestidade na narrativa.

DEVAGAR mostra a vulnerabilidade de uma mulher que acreditou em um sentimento ilusório de um homem, que por sua vez, manipulou todo o amor que foi lhe ofertado pensando apenas nos próprios benefícios. Como? Mentindo. Um clássico né? Nessas situações as mulheres se sentem impotentes, incapazes, traídas. Porém é importante lembrar que somos vítimas e nada melhor que utilizar a arte para denunciar, mesmo de grão em grão, e em pequenas doses. Uma hora a ficha cai.

2) E aí?

E Aí? é um cuspe, vem em desabafo. Por vezes no processo de KINTSUGI, a música entrou e saiu do setlist. Ela acabou ficando; “tem palavrão, estou exausta, com raiva, enganada. Decepcionada, sem muita peneira, pq a arte dá espaço pra esse desabafo e eu posso ser sincera”, diz Mariana Cavanellas.

A música narra uma história de traição e vingança.

3) Beat

Após a decepção, e após encarar o lugar de privilégio e de poder do Homem; Beat coloca a nossa personagem como protagonista, o corpo dela é protagonista; “o amor é o protagonista que me rege, respeitando os outros sentimentos”, diz a artista.

Beat também é o primeiro beat feito por Mariana, que narra seu lugar de mulher cansada e sobrecarregada.

4) Véu

Essa Mariana é uma mulher independente e autônoma, que encara a dificuldade em ter um cara que a entenda e a acolha. Narra uma situação corriqueira da busca por um amor que nos deixe voar e não cortar nossas asas, mantendo o amor e a paixão acesa.

Em Véu, Mariana divide os vocais com José Luís (Graveola).

5) Fênix

Fênix traz a clássica metáfora do renascimento, escrita por Mariana após uma depressão pós parto, um estupro e um aborto.

A letra quase crônica gira em torno do lugar e da estrutura social do ser mulher numa sociedade pouco preparada para mães; Mariana em sua carreira pede urgência para mudar a lógica educacional e estrutural da nossa sociedade, defendendo uma ótica matriarcal.

6) Tão Bom

A última música da REALTAPE também foi o segundo single do EP, ela fala sobre a esperança no afeto e aponta a importância de se ter amigos. Pisar no freio e abraçar os amigos e amigas e também os familiares, é nutriente para se manter viva.

“Muitas vezes passamos por situações tão difíceis que só quem é íntimo saberá nos fortalecer, os olhos que vêem de fora não sabe quase nada, aliás, julgar sabem muito bem”, diz Cavanellas.

“No período mais caótico da minha vida a ‘nave espacial’ chegou e conseguiu me relaxar e me colocar em um estado de espírito de descanso: com muito carinho e nenhuma cobrança. Estúdio é isso: curso de cura. Individual e coletiva. ”

Com prelúdio de Baden Powell essa é uma música low profile que pode embalar vários momentos: a sós ou com quem quer que seja, que seja com amor.


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