Minor Alps

“A gente conseguiu nosso espaço no rap mesmo sendo diferente para c**” diz Hot e Oreia que virão para a SIM São Paulo

A SIM São Paulo chega as sua sétima edição nesta semana e como sempre traz destaques do cenário musical do Brasil e do mundo. E se teve um duo que roubou a cena em 2019 foi o Hot e Oreia, de Belo Horizonte (MG).

O festival tem previsão de reunir um público aproximado de 40.000 pessoas, realizar mais de 400 apresentações noturnas espalhadas por mais de 50 casas da capital paulista.

Além disso este ano mais de 3.500 credenciados circularão pelo centro de convenções do CCSP durante o festival que começa nesta quarta-feira (04/12) e se encerra no domingo (08/12).

Mais de 300 palestrantes dos mais diversos cantos do planeta se dividirão em cerca de 90 painéis entre palestras, debates e workshops. Uma grande oportunidade do mercado da música se reunir para fechar o calendário global de Music Conventions.

Hot e Oreia na SIM São Paulo

O duo mineiro se apresenta no dia 07/12, das 19:00 às 19:20, na Sala Adoniran Barbosa no CCSP, dentro da programação dos showcases diurnos da Music Convention. Ainda na SIM São Paulo eles sobem no palco do Z – Largo da Batata na Noite S.E.N.S.A.C.I.O.N.A.L. (06/12 – 22h – R$ 30,00). Hot e Oreia no dia 07 também tem show marcado no SESC Belenzinho (21:30 – R$ 30,00) .

Em 2019, eles lançaram o álbum Rap de Massagem que mistura linguagens musicais e fogem do padrão tradicional de seus projetos dos últimos anos. O disco satiriza o governo atual e inspira sentimentos, ancestralidade e vida.

Naturalmente ganhando evidência após a promoção do registro que contou com participações especiais de nomes como DJONGA, Luedji Luna, Luis Gabriel Lopes, Marina Sena e Rafael Fantinni.



Entrevista

Conversamos com o duo para saber mais sobre suas origens, disco, transformações, comportamento, visão de mundo e o background que permeia seus trabalhos. Confira!

Como hoje em dia observam a trajetória de vocês dentro do rap mineiro, das batalhas de MCs, passando pelo DV Tribo a chegada do disco?

Oreia: “A gente considera que aonde a gente passou a gente revolucionou da nossa forma com nosso estilo, nossa lírica e nossa estética. Foi uma trajetória bem árdua apesar de não parecer pelo nosso jeito engraçado.
Batalha de MCs representando também. DV Tribo representamos daquele Naipe. E agora o disco representando daquele Naipão. Botando BH sempre na cena do rap nacional, tanto nas batalhas como no DV e no disco a gente sempre ganhou destaque de alguma forma”

O Rap Mineiro

Hot: “No rap aqui de Minas, de BH, sempre teve uma galera muito massa fazendo a parada. Sempre teve uma galera muito foda no trampando com rap por aqui, porém eu acho que com o DV Tribo a parada ganhou uma representatividade diferente, assim, eu vi que a juventude do nosso estado, da nossa cidade, começou a se vê na gente muito assim, porque a gente tem uma característica própria de gíria, de jeito de se vestir, de mistura também. A figura mineira dos rolê de rua que é uma mistureba maluca.

Por isso eu acho que no DV como é bem diversificado, tinha a Clara que é uma mina lésbica de quebrada, o DJONGA que é um estilo mais agressivo também, o FBC que é um representante das favelas, das batalhas de MC, tudo. Tinha eu que vim de um rolê de teatro de bonecos, né? Minha família é do Giramundo, Oreia que também tem outra característica, uma figura excêntrica e tudo mais, acho que as pessoas começaram a abraçar o corre a partir disso. De se enxergar na gente.

Depois de DV a gente juntou eu e o Oreia, antes a gente já tava junto antes do DV, na verdade. E decidiu fazer o nosso corre, cada um foi gravar uma parada. Clara lançou disco, FBC, o DJONGA, e a gente num processo mais lento, um pouquinho, construiu o nosso disco, né?”

Como foi o processo de construção do disco? Desde as inspirações, passando pela estética a até mesmo a escolha das parcerias?

Oreia: “Foi uma doideira que quando a gente decidiu fazer o disco Rap de Massagem a gente já tinha uma letras prontas e a gente já tinha a ideia do conceito. Aos poucos foram se formando as participações, elas combinam com as músicas. Rafael Fantini, Marina, DJONGA, Luedji Luna combina com Rap de Massagem.

Construção do disco, tinha vez que a gente escrevia junto (sic), cada um escrevia na sua casa, a gente ficou fazendo a pré-produção no estúdio do Henrique, fantasmatic, separando e escolhendo música, escrevendo umas novas até que bumba.

A estética a gente quis usar o nosso de estilo, puxado um pouco para o Rap de Massagem e tal e bumba la catumba!”

Quando vi pela primeira vez o vídeo para “Eu Vou” fiquei impactado tentando pegar todas as referências, e são muitas. Provavelmente algumas escaparam e talvez essa seja a graça de uma ótima sátira.

Então queria que vocês contassem mais sobre como foi a construção da peça audiovisual, seu storytelling, locação, bastidores da gravação, direção….

Oreia: “O clipe “Eu Vou” foi muito louco a história da letra, da construção, das referências e ligações. Eu tinha feito uma letra pensando na vida, na situação do país, mostrei para Hot e ele escreveu rapidão e a gente decidiu que tinha que ter DJONGA. E para não escrever sobre a mesma coisa DJONGA começou a falar sobre nós, nosso rolê tudo no DV em BH. E João Grilo e Chicó, HotOreia igualzinho, Jesus Negro do Auto da Compadecida, é o DJONGA, é o Deus DJONGA.

A gente gravou em Sabará (MG), a MINA Produz ajudou a gente na produção, audiovisual foi a Belle Melo e Vito Soares, a gente junto com eles, a gente queria impactar mesmo. A ideia de juntar o Auto da Compadecido com as letras e tudo foi do Hot mas ao longo do clipe a gente foi dando várias ideias e construindo o roteiro. A direção é nossa da Belle e do Vitor também.

O clipe revolucionou a cena do rap, mostrou pro mundo o nosso estilo e causou nas famílias. Entre os evangélicos e os católicos.”



O Efeito Auto da Compadecida

Hot: “O clipe de “Eu Vou” nasceu quase que 100% do Auto da Compadecida. Eu tava na casa de uns amigos e a gente colocou o filme para ver, tinha um tempão que eu não via, e o Oreia tinha escrito o verso da música e eu tava no meio do meu verso, começando e escrever e tudo, e eu vi o filme. E quando eu vi o filme nasceu a ideia do roteiro e nasceu a ideia de chamar o DJONGA. Aí ia complementar a parada com Jesus, ali, e foi até antes de ele escrever. A gente pensou no clipe até antes do DJONGA escrever o verso dele.

Aí enviamos pro DJONGA ele terminou a música e começamos a encontrar semanalmente, foi um processo um tanto demorado, inclusive, e começou a construção desse roteiro assim a partir da facada que foi a primeira ideia que eu tive, que aí linkava o Auto da Compadecida com rolê político atual que o que o Oreia falava no verso dele e no refrão.

A gente contou com a Belle e o Vitor que são um dos maiores expoentes do audiovisual  da nossa cena, tão trabalhando com uma galera massa Lagum, Rosa Neon, enfim. E aí eles começaram a fazer o corre de locação, começaram a colocar o roteiro escrito, organizado e meio que deram a direção para a gente”.

O Rap mineiro tem tido a cada dia maior visibilidade nacional depois de muitos anos em um “corre” forte. Como é para vocês observar o crescimento do DJONGA (agora confirmado no Lollapalooza), FBC, Mc Ohana, Sidoka, Chris MC e tantos outros que tem surgido a cada dia após a repercussão do trabalho dos coletivos locais?

Oreia: “BH sempre foi foda e isso não é surpresa para nós. Desde que a gente veio morara aqui, dos grupos antigos, ao duelo de MCs aos nossos amigos sempre foram os melhores. E o mundo tá vendo que BH é foda. Cada dia surge mais coisa nova, não só do Rap mas também de outros estilos musicais, do audiovisual, tudo que envolve arte. BH tá no topo, às vezes pode não estar reconhecido ainda mas a gente que mora aqui a gente sabe que são os melhores.

Hot: “Eu acho que do mais precário a gente conseguiu vislumbrar um caminho. A gente tem uma escola que é a galera da família de rua. Do duelo de MCs que foi onde geral desses nomes todos aí conheceu a cultura hip hop e isso foi fundamental. Isso possibilitou a gente se conhecer, todos os nomes aí, DJONGA, eu, Coyote, FBC, Ohana, Chris, geral, geral se conheceu no duelo. Ali foi o verdadeiro templo, onde a gente começou a dar os primeiros passos.

A gente veio de um rolê assim: “estamos no templo mais foda do Brasil mas não temos condições de fazer o nosso trabalho porque: sem grana, porque não tem trabalhadores para apoiar, não tem gente para fazer clipe, não tem estúdio e etc. E a gente começou começou a fazer a parada na tora mesmo. Coyote começou a botar uns beats e chamar a gente para gravar.

A Virada

O Chris colava lá direto com a galera do DV e a gente começou a se organizar, começou a entender o que era a parada, começou a fazer evento trazendo gente de fora, entender como a rapaziada se comportava fora do estado deles.

A gente começou a trazer o FROID, trouxe o BK, trouxe Nectar começou a perceber como essa rapaziada trabalhava e começou a tentar fazer não igual mas da nossa maneira se espelhando nessas pessoas.

E sobre o que falei na primeira pergunta. O DV foi uma explosão. Quando o DV explodiu pro Brasil o pessoal começou a olhar para nossa cena de verdade e eu acho que começou essa mudança aí.”


Hot e Oreia. – Foto: Divulgação

Além da contextualização e diálogo com os temas mais explosivos, como a política de nossos dias, queria que falassem mais sobre o papel da internet na difusão do som de vocês? Como pensam as estratégias para o som chegar ainda mais longe?

Oreia: “Hoje em dia a internet tem muita influência no trabalho. Faz muita parte do trampo de divulgar, de fazer as conexões com as pessoas, e organizar os eventos e organizar as coisas.

E é isso, basicamente hoje em dia é isso, um som bomba na internet e vai bombando. Hoje em dia é youtube, é isso, é internet, ou seja, é igual como qualquer outro artista, tem que lançar os trem na internet e não deixar de ser artista de rua ainda. Tem que tá na internet e na rua.”

Como enxergam a maior aproximação do Rap com o público jovem e o papel de fomentar politicamente uma nova geração?

Oreia: “O rap sempre foi uma música de revolução. A pouco tempo ele é considerado um hit musical, sempre foi algo muito de revolução, principalmente com os jovens. E hoje em dia como ele tá bombando muito isso é muito importante, para cada vez mais os jovens mais ouvirem e entenderem o que a gente tá falando e criar caráter, forma caráter e passar para frente.

“Os menino” tá pegando a mesma visão em nós. Isso é muito foda! Mais importante que a política dos engravatados e tal, é essa política!”

Hot: “O rap é jovem, né? A cultura hip hop nasceu de uma festa. Uma festa na rua, uma festa na tora, no suor, na guerrilha, frequentava por jovens. As block parties e tudo mais e eu acho que isso nunca mudou. É isso né? A diversão, o lazer e o entretenimento linkado naturalmente com a política. Porque é um meio de dizer: “Eu tô aqui, eu quero assim, eu quero assado, eu tô vendo que tá errado, eu não tô gostando assim”.

A nossa escola ensinou isso para gente, né? Isso é fundamental. Hoje eu vejo que por um tempo isso teve perdido, sim, na cena de rap nacional. Mas ali bem quando nasceu Nectar Gang no Rio, quando nasceu o Baco Exu do Blues, em Salvador, quando nasceu o DV Tribo, em BH, esse momento e vários outros nomes, eu vi que a juventude tava voltando a clamar por ser ouvida. Dá um grito coeso, político, sobre o que ela quer no país. O que ela quer no mundo. É fundamental para ligar as pessoas também.”

Vocês me passam a impressão de ter uma preocupação em relação a temas sociais nos mais diversos âmbitos, como é para vocês ver essa transição e abertura disso dentro do rap atual? Onde vemos cada vez mais diversidade entre culturas, discursos e backgrounds?

Oreia: “A gente se preocupa muito com os temas mas na verdade a palavra preocupação não existe. É muito natural também as coisas que a gente fala pela vivência que a gente tem. E por tudo que tem acontecendo no mundo pelas discussões, pela atmosfera e o clima que gere o mundo, a gente se abriu para entrar nisso e vem aprendendo com isso, vem aprendendo a reconhecer nossos privilégios.

Aprendendo a reconhecer as outras pessoas como elas são, a aceitar mais as pessoas e tentar ser aceito, ninguém precisa ser igual a ninguém e essa abertura no rap hoje em dia é muito foda.

O rap que sempre foi muito fechado, eu também acho na época que foi e tinha que ser, mas agora como tá assim, a gente tem que aceitar e agradecer. Foda que a gente conseguiu nosso espaço no rap mesmo sendo diferente para caralho. Mais foda ainda ver que a molecada está se inspirando em nós.

Muitos moleques que escutavam rap e tem um pensamento parecido com nós, e as vezes é mais sensível mesmo, e querer usar certo tipo de roupa e tinha vergonha e agora que a gente apareceu eles tão se sentindo mais seguros, se inspirando em nós e mandando em bronca.

Então acho que é isso, destravando as pessoas de uma a uma para cada um ser o que quiser e o rap tá foda por causa disso. Muito bom.

Vemos muita diversidade. Na rua, nas excursões, com seus amigos, onde frequentamos é onde observamos esta diversidade.”

Diversidade

Hot: “A gente tem essa preocupação natural né? Justamente por conta do lugar que a gente foi criado, BH, que é um lugar preocupado com esses temas desde sempre. É um lugar que participa ativamente das movimentações sociais mesmo. Galera que sempre esteve na rua fazendo sarau, fazendo duelo de MCs, e a gente aprendeu a ser assim, e hoje para nós é natural se preocupar com esse tipo de coisa.

Mas dentro do rap mesmo, a gente sempre foi tido como esquisito, estranho, sabe? Foi bem difícil de a gente trocar com as pessoas de fora no primeiro momento. A gente via o DJONGA, a Clara, o FBC, o Coyote, que eram da mesma banca que a gente, se envolvendo de um jeito mais de boa, digamos, e a gente sempre foi tido como estranho porque sei lá. Porque a gente tem uns assuntos diferentes, porque a gente é diferente na forma de agir e de se colocar, enfim.

Mas eu acho que hoje a gente tá tendo mais facilidade assim, são 3 anos desde o DV, a parada tem mudado, o rap tá abrindo para a galera chegar. Para trans, para gay, para a diversidade, né? Acho que agora a parada tá tendo essa abertura, sim.”

E conta para gente, qual são os novos nomes da cena que mais têm curtido ouvir e que mereciam mais espaço? E quem é consagrado seja brasileiro ou da gringa que vocês admiram / ou tem influência no trabalho de vocês?

Oreia: “X Sem Peita e Zé Maru. Dos consagrados, Sombra, Sidoka, Kamau e Clara Lima.”

Hot: “Eu acho que meus amigos do X Sem Peita, rapaziada de Contagem (MG), tenho escutado muito, são amigos que estão no corre tem muito tempo e merecem mais espaço. O Zulu, que é um mano nosso que teve preso, passou muito perrengue. Cabou de gravar um disco maravilhoso e merece muito mais espaço.

Da gringa, Travis Scott, Trippy Head, uma rapaziada mais recente do trap. E uma rapaziada que eu sempre escutei, Erykah Badu, Mos Def, rapaziada do rap mais clássico. Ibeyi que são as meninas cubanas/francesas também, gêmeas, e Flatbush Zombies, Joey Badass, rapaziada que tem um coletivo chamado Beast Coast, que é de Nova Iorque, que a gente escuta desde que a gente começou e escuta ainda mais hoje em dia.”



Ouça Rap de Massagem



SERVIÇO:
NOITE S.E.N.S.A.C.I.O.N.A.L.

Criado em 2010, o S.E.N.S.A.C.I.O.N.A.L. é conhecido por surpreender. Pela primeira vez na SIM, o festival oferece uma noite com três bandas mineiras em ascensão: Rosa Neon e a dupla de rap psicodélico Hot e Oreia.

A argentina Sol Pereyra também integra o line up, seguindo a tradição do festival de incluir artistas latino-americanos na programação. A festa é uma prévia da 8ª edição do S.E.N.S.A.C.I.O.N.A.L., que será realizado no dia 8 de fevereiro, durante o pré-carnaval em Belo Horizonte (MG).

Data: 6/12
Horário: 22h
Local: Z – Largo do Batata
EndereçoAv. Brg. Faria Lima, 724 – Pinheiros
Ingresso: R$ 30,00
Censura: 18 anos
Programação:
Rosa Neon (MG)
Hot e Oreia (MG)
Sol Pereyra (Argentina)

This post was published on 2 de dezembro de 2019 11:59 am

Rafael Chioccarello

Editor-Chefe e Fundador do Hits Perdidos.

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