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Entre sirenes e alarmes de incêndio, novo álbum da Def mostra a força da superação

As vezes acho que muitos esquecem do porquê fazem música. Outros esquecem porque escrevem sobre música. No fim acho que todos que sabem do porque fazem continuam navegando no mesmo barco. Enfrentando tormentas, dias ruins e atravessando noites mal dormidas. Feito um dia de caos em Gotham City. E ouvir o som da Def sempre me trouxe uma sensação de paz.

Um EP lançado em 2016 me fez criar expectativas de quando viria a parte 2. Por mais que recebesse materiais loucamente por e-mail todos os dias, de uma forma ou outra, eu voltava para aquela página de Bandcamp tanto para ouvir, quanto para montar programas de rádio.

Não duvido da banda em algum momento se questionar: “Coé, que que esse maluco tá ressuscitando aquelas músicas velhas”. Mas talvez fosse a vontade de ouvir uma continuação.

Na mesma época eu tava ouvindo muito Theuzitz, Lvcasu, El Toro Fuerte e gorduratrans. Acho que de certa forma eu tava tentando me reconectar com parte dos sons que cresci ouvindo. E estas bandas estavam na época me proporcionando esta experiência.

Por incrível que pareça, nunca tinha escrito nada sobre a Def. Mesmo gostando muito de ouvir “Sobremesa”, e até tocar em sets em shows que me chamavam para discotecar, não tenha me ocorrido a necessidade de escrever. E as vezes acredito que temos que ouvir música sem a menor necessidade de ter que escrever sobre. Uma batalha constante em meu dia-a-dia, confesso.


DefFoto Por: Hannah Carvalho

Def: A Volta Para Casa

A continuação não necessariamente busca algo pretensioso. Não necessariamente tem letras escritas entre 2017 e 2019, como seria algo que poderíamos dizer. Em entrevista para O Hits Perdidos, eles deixam claro o quão natural foi este processo, inclusive contando com letras de Deb escritas a muito tempo, algumas entre 2012/2013.

Muita coisa aconteceu durante a volta para casa. A Bichano Records deixou de existir, a formação da Def já não é a mesma….mas os processos continuaram intensos, doloridos e cheios de verdades para o núcleo da banda.

Assim como os laços de amizade e expansão da compreensão do porque fazem música – e o caminho orgânico que escolheram por trilhar. No campo de gratas surpresas, Eduarda que entrou na guitarra, além de cantar ao lado de Deb, ainda compôs “Sardas”, uma das faixas destaque.

As Mudanças

A atual formação da Def além de Deb F., (Colombia Coffee) na voz e na guitarra, Eduarda Ribeiro (voz / guitarra), conta com Hugo Noguchi (Ventre, SLVDR, Yukio/Hugo) no baixo, e Dennis Santos (Colombia Coffee, Vinco) na bateria.

No campo das influências eles não se acanham a citar universos completamente diferentes. Desde o midwest emo do Cap’n Jazz, passando pelo progressivo do The Mars Volta, a poesia melancólica do Ludovic, as linhas alegres e pops do Blink 182 e até mesmo os pagodes antigos de grupos como o Bokaloka (Acredite se Quiser!)

As Gravações

O disco foi gravado em partes, em lugares diferentes, de forma totalmente independente. Inclusive, Deb assina a produção e todas as guitarras foram gravadas em sua casa.

Já as baterias e parte das linhas de baixo ficaram sob a responsabilidade de Pedro Garcia (Planet Hemp/Estúdio Canto dos Trilhos), que também mixou e masterizou o álbum. A outra parte dos baixos foi gravada no quarto do Felipe Aguiar (gorduratrans).

Vale Lembrar

Apesar de só conhecermos o resultado final desta parte dois, as gravações começaram muito tempo antes: ainda com a formação antiga. Nathanne Rodrigues (atualmente na Chico de Barro) ainda tocava no grupo e, posteriormente, com Victor Oliver, que gravou e contribuiu na composição de todas as linhas de baixo do disco.

Sobre os Prédios que Derrubei
Tentando Salvar o Dia Pt. 2

No campo das temáticas, o exorcizar de memórias ruins continua em pauta. Desde lidar com a depressão, transformações internas, constante mudanças e ver o tempo escoar pelos dedos. É deste brilho tão questionador e empático que faz a obra crescer dentro de você.

Tive a oportunidade de ouvir o disco por cerca de 10 vezes para tentar pegar um pouquinho mais de seus nuances e narrativas que muitas vezes soam como bilhetinhos – e conversas privadas que não ganharam o ecoar dos horizontes.



São 9 faixas e cerca de 31 minutos de duração que passam rápido feito um filme. E talvez essas memórias acabam sendo construídas dentro de uma narrativa tão sensível – e conflituosa – quanto uma produção da sétima arte.

Alarmes de Incêndio

Entre choques, sonhos em pedaços e desabamentos de suas estruturas internas na volta para casa….”Alarmes de Incêndio”, primeiro single a ser lançado através de um videoclipe ainda em janeiro mostra a importância da união com os amigos para superar momentos onde temos pouco no que acreditar. Onde as luzes e travessas da cidade parecem se fechar em meio ao trânsito e suas impetuosas sirenes.



Na sequência vem “Descanso”, uma faixa que serve como um respiro entre um turbilhão de emoções. Sua estrutura instrumental funciona feito um farol conduzindo os navios em meio a tormenta. Com estética lo fi, e acordes delicados, ela faz uma transição gostosa de se ouvir que nos leva para uma das mais belas composições do álbum, “A Cidade Onde Apenas Eu Não Existo”.

Letra que mereça toda a atenção. As sirenes voltam a ecoar e o coração abre feito o semáforo, feito um dia ruim que tem um pôr do sol para salvar o dia. Os erros, as insegurança, os desequilíbrios ganham belos versos que cortam como navalhas.

A progressão de acordes lembram um misto de Angels & Airwaves, que ao mesmo tempo flerta com o post-rock do Mogwai e traz à tona a sensibilidade das letras do Ludovic. Sem deixar de explorar os pontos altos e baixos de sua intensidade. Do ponto de vista social é a primeira que toca no campo da depressão.

Sirenes Ligadas

“Nada” continua a narrar as dores, os choques de realidade e o julgamento da sociedade perante os problemas. Os sonhos, as idealizações e as cobranças entram em cena e os heróis – e velhos paradigmas – acabam por sua vez ruindo.

O abatimento e a falta de reconhecimento da luta dia após dia ganha versos para serem equalizados nas paredes dos quartos. Dando força para o ouvinte enfrentar os problemas e sobrecargas do dia-a-dia. As linhas de bateria de Dennis lembram o estilo de tocar de Travis Barker (Blink 182 / Transplants).

Como dito anteriormente, “Sardas” é um dos destaques do álbum e também é a com instrumental mais experimental. Com camadas, entre o baixo pulsante, guitarras que se sobrepõe e justificam as influências de The Mars Volta.

A confusão ganha o embalo inclusive em sua melodia e na transição do tempo que parece se acelera progressivamente. Entre o passar dos anos, a busca pela calma e as mudanças constantes. Feito as brincadeiras, e jogos estruturais, que o Pixies costumava fazer em suas narrativas.

A poeira volta a abaixar em “Casa (Paulo)” que cria coragem para discorrer sobre os monstros que fazem mal. Faixa que controla a raiva e guarda o choro no travesseiro.

De certa forma fala sobre a força interna para reconstruir caminhos e enfrentar estes fantasmas do passado. Travando batalhas longas e cheias de marcas feito o instrumental violento dos seus últimos 50 segundos.

O baixo volta a se destacar em “Abutre” que fica entre o progressivo e o math rock. Um desabafo forte contra o que faz mal e não deixa com que a cabeça se erga em meio a um mar revolto. Entre problemas, inseguranças e a busca pela felicidade de dias melhores.

Forças para Recomeçar

A parte final deixa com um gostinho de quero mais. “Paraquedas (boddah)” traz diálogos e um estopim de emoções para o primeiro plano. Entre as cobranças do mundo externo e a dor das despedidas. Um alento à favor da vida sendo lançado em pleno mês de prevenção.

De forma poética a faixa dá fôlego a todos que estejam pensando em dar um fim. Dando um abraço firme em cada um que esteja já com as energias desgastadas e pensando no pior. Dando forças para recomeçar. A esperança vem do horizonte.

Uma das baladas mais belas tem a função de encerrar o registro. “Arranha Céu” ressoa como um suspiro por dias melhores. Carregando esperança entre a imensidão prédios que são erguidos todos os dias. Retomando forças para completar a volta para casa.

A casa não necessariamente no plano físico mas onde se sinta querido. Seja viajando, seja ao lado dos teus, seja fazendo o que mais ama. É com uma positividade em meio a acordes dissonantes que o álbum se despede. Abraçando quem ouve com melodias gostosas e afastando as nuvens do que antes eram tormentas.



Entrevista

Entrevistamos a banda para entender mais sobre as mudanças, sonoridade, construção e tudo que envolve o universo da Def. Confira o bate-papo!

São 3 anos desde o último registro da Def. De lá para cá muita coisa aconteceu, desde a mudança de formação, fim da Bichano Records, entrada na PWR Records…que deram origem a uma continuação com uma “vibe” que pode ser considerada mais positiva.

Soube que o processo demorou mais do que gostariam, como foram os bastidores “do parto” da parte dois?

Duda: “Levando em consideração que algumas das letras que a deb escreveu são de 2012/2013 é meio bizarro pensar que a gente demorou bem mais que 3 anos para serem conseguir gravar elas (risos).

Assim como nas letras as nossas vidas também são muito turbulentas e confusas. Algumas coisas acabam falando mais alto em alguns momentos, tentamos não nos perder em meio ao mar de ansiedade em que vivemos, a viagem é tentar ser o mais sincero possível em relação a todo o processo.

Quanto as mudanças… É natural que isso aconteça, todos os dias a gente vive milhões de coisas que nos influenciam em todas as nossas decisões, com a música não é diferente né, as vezes acaba sendo um processo um pouco mais doloroso, as vezes um processo mais fácil, só que no final das contas acho que isso é viver. Agora com o projeto pronto, é legal ver que tudo valeu a pena pois conseguimos chegar num formato que ilustre um pouco desse nosso sentimento.”

Lembro de ver o videoclipe para “Alarmes de Incêndio” ainda no ano passado e sentir como a coletividade dos que estão por perto ganhou um abraço em sua narrativa. O quanto os amigos foram importantes no processo do disco da Def?

Dennis: “Cara, eu penso que sem os nossos amigos nós dificilmente faríamos alguma coisa. É claro que a gente sabe que a maior parte do esforço tem que vir de nós, até por isso que a gente demorou bastante para concretizar esse novo cd, mas os nossos amigos tornaram possível a gravanço do clipe e com toda certeza influenciaram para que fosse possível a gente fechar esse nosso novo trabalho.

A sensação de se sentir só nesse mundo maluco é constante mas os nossos amigos tornam esse sentimento um pouco menor.

Seja de uma simples conversa até emprestar a casa para gravarmos um clipe (risos), nossos amigos estão sempre tentando nos ajudar com diversas questões por aqui.”


Os novos dias da DefFoto Por: Hannah Carvalho

Eu amo que vocês vão de The Mars Volta ao pagodão, passando por Blink 182 a poesia do Ludovic num piscar de olhos, como deixam bem claro quando citam referências. Além disso tem todo o cuidado de trazer uma produção conduzida pela própria Deb.

Como foi traduzir tudo isso no novo momento de vocês? Aliás porque acreditam que tantas bandas alternativas tem certo pavor em soarem pop?

Deb: “Geralmente vem de forma natural mesmo. A gente optou por não se forçar a criar nada que não estivesse conversando com a nossa vibe do momento.

Não rolou de parar pra gravar uma guitarra pensando em soar como isso ou aquilo. É apenas o resultado do que a gente ouve, e acredite, é muito variado.

Nossa única preocupação é que o instrumental também converse com o que é dito na letra, mesmo que seja algo dissonante ou confuso, os dois andam juntos.

A gente não tem intenção de fazer música para um nicho específico, nem para estourar. Só tentamos fazer algo que nos represente, e acredito que tenha algo pop no jeito que produzimos.

Talvez muita banda tente se distanciar do padrão pop de mixagem, estrutura e tals, por ter medo de soar como algo genérico e sem originalidade, ou pra se definir num nicho alternativo. É um caminho.

Acho q a Def experimenta de outras formas e tenta amenizar isso na hora de produzir para não termos limites na nossa construção.”

Precisamos falar sobre o EMO (risos).
Vi correndo na timeline do twitter infos dos bastidores de muitos abraçarem como um disco emo mas vocês rirem e não considerarem desta forma. Como tem sido isso para vocês? Dão boas risadas?

Deb: “Não temos problemas com esse rótulo, mas a gente não leva essa separação de estilos muito a serio, na real a gente pira que as vezes até enfraquece o cenário como um todo.

Dá pra ver na nossa lista de influências que rola de tudo, inclusive emo. Acho que podemos soar de um jeito emo, mas não é intencional. Acho que não ouvimos tanto do estilo no dia-a-dia, por isso é engraçado essa associação ser tão direta e obvia.”

This post was published on 30 de setembro de 2019 2:06 am

Rafael Chioccarello

Editor-Chefe e Fundador do Hits Perdidos.

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