Após hibernar por 3 anos, Wolken acorda de sono eterno em delicioso debut

 Após hibernar por 3 anos, Wolken acorda de sono eterno em delicioso debut

Eu realmente não sei o que colocam na água de Santa Catarina mas que nos últimos anos tem surgido projetos interessantes que passeiam pelas águas turvas, e coloridas, do dream pop é um fato.

Se no ano passado demos destaque a álbuns como da Adorável Clichê e do Taunting Glaciers, e o EP da La Leuca (mais psicodélico é verdade mas com aquele pézinho no dream pop), hoje contamos nossas impressões do álbum de estreia do Wolken.

Fato que a maioria dessas bandas procuram o produtor Roberto Lucena, conhecido como Swan, que traz em sua bagagem e experiência, tanto no estúdio como em suas bandas, para dar aquele “talento” aos discos que trabalha.

Por aqui lá no já distante ano de 2016 comentamos justamente sobre seu selo, a Aquagreen Records, que estava no momento lançando o primeiro EP de uma jovem banda.

Esta que ainda se agarrava em suas influências seminais mas que já trazia a tristeza dos discos emos para traduzir tudo aquilo em açucaradas e “abraçantes” melodias dream pop.

Essa banda era a Wolken que com o passar do tempo passou por algumas mudanças. O projeto que nasceu no pequeno quarto de uma antiga casa em Alto Benedito Novo, (interior de SC), a partir de despretensiosos encontros musicais entre os integrantes Leo e Duda já não é o mesmo.

Apesar das influências de Real Estate, Mac DeMarco, The Walkmen ainda se manterem presentes, a banda ganhou corpo e trouxe mais referências para seu som, ao menos senti um pouco de The War On Drugs em certos momentos, e bandas que recentemente estiveram no país como DIIV e Wild Nothing. Então, por exemplo, se você gostou do divertido, e chicletudo, álbum de estreia da Brvnks, talvez devesse apertar o play.

Um dos grandes acertos foi justamente apostar em canções em português. Não que acredite que “só existe banda boa brasileira cantando em sua língua natal”, muito pelo contrário, tem muitas bandas que fazem a transição do idioma e perdem sua essência…mas no caso deles agregou bastante e acredito que se aproximará de seu público. Talvez uma das bandas que tenha inspirado eles seja justamente o Terno Rei.

A instabilidade, e suas águas nada calmas, também fizeram parte dos últimos 3 anos do grupo que chegou próximo de um hiato indefinido. Mas nem tudo foram correntes, e um bom marinheiro é feito de tormentas. Eles contaram com a passagem de Pablo Grubert, da Hovel, que trouxe uma série de novos universos para explorar.

Em sua formação o grupo catarinense conta com Felipe Locks (voz e guitarra), Leo Koprowski (guitarra), Billy Girelli (baixo) e Eduardo Marcel (voz e bateria).


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Mais maduro, Wolken agora é um quarteto. – Foto Por: Bruno Pereira (@bpruno)

Wolken – Sono de
Inverno (02/07/2019)

O debut foi gravado, mixado e masterizado por Roberto “Swan” de Lucena no Estúdio Aquagreen (Blumenau / SC).

Já o título do álbum foi retirado do filme turco “Kis Uykusu” dirigido por Nuri Bilge Ceylan e escrito por Ebru Ceylan e Nuri Bilge Ceylan.

O que faz até sentido já que os conflitos e sentimentos à flor da pele parecem fazer parte da essência do disco.



Seus 31 minutos e 8 faixas que caem bem para nossos tempos. Podendo nos trazer sensações distintas como a de insegurança, despretensão, belas melodias e porque não dizer: um certo ar de nostalgia. Já que toda esta onda revival de dream pop sempre parece um filme noir rebobinando.

O “Nó” da garganta parece desentrelaçar logo na primeira faixa com acordes em marcha lenta que criam todo um clima de vazio e solidão. O universo dos sonhos, os desejos desatados e os “quases” parecem ganhar uma canção para remoer todos aqueles sentimentos aprisionados.

“Sono de Inverno”, faixa título, já tem uma verve mais dançante e blasé ao mesmo tempo. Com direito a aquela energia que consagrou o Real Estate, e que roubou a cena lá em 2014.

Mas é este sentimento de estar perdido e procurando uma direção que a faixa caminha. Ferido, o interlocutor parece procurar por escudos para se recompor e partir para a próxima paixão avassaladora.

O espírito da “Cidade”, e suas faces, servem de cenário para expor os conflitos e a falta de palavras. A busca por superação e as longas caminhadas em vão, por sua vez, ajudam a compor sua extensão. O powerpop, o chillwave e o dream pop mais delirante deixam “o amanhecer” da faixa mais agridoce. Fazendo parecer até ter uma luz no fim do túnel.

Senti um pouco de Death Cab for Cutie, The Walkmen nos acordes mais suaves de “Domingo”. Parece rebobinar memórias não muito positivas sobre os momentos de dificuldade envoltos em uma impiedosa e torturante calmaria.

“Frio” arrepia a alma e feito uma foice atravessa o coração dos jovens. Utilizando de metáforas para falar sobre a dicotomia que o frio pode proporcionar. Tortura, dói e renasce.

Já a instrumental “Surfando Montanhas” flerta com a surf music de maneira um tanto quanto Pixies e cria uma deliciosa sensação de libertação. Ao mesmo tempo que é um paraíso perdido para fãs de My Bloody Valentine e grupos de post-rock.

“Maré” parece chegar literalmente após a ressaca. É uma faixa para se deixar levar mas para ter cuidado para não perder o chão.

A conexão com a lua e a maré, fenômeno natural, ganha o artifício mais uma vez do uso das metáforas. Passar pelas correntes, e maremotos, podem conduzir por sua vez a novos caminhos. Particularmente eu acho que a canção agradará a fãs dos paulistas do Raça.

Mas quem fecha é justamente “Dias Cinzas” que tem cara de canção que ganha clipe por sintetizar bem o conceito do álbum. Fala de tempos ruins mas com a ironia de acordes felizes. Me lembrou particularmente os nova iorquinos The Drums e bandas do começo dos anos 00. Com o adendo da mesma ironia do dançar do Joy Division, o debut se encerra.


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A Wolken continua uma banda jovem, com sonhos e potencial. Mas definitivamente parece agora ter encontrado um caminho mais pop através de uma identidade, roupagem e conceito mais bem amarrados.

Com canções em português, o dream pop de Sono de Inverno ainda fala sobre os dolorosos, e impiedosos, fins de ciclos mas conceitualmente já ressoa mais maduro. São 31 minutos que passam voando e agradarão a fãs de Real Estate, Mac DeMarco, The WalkmenThe War On DrugsDIIV, Beach FossilsTerno Rei, Brvnks, TurnoverRaça e Wild Nothing

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