Taunting Glaciers explora novas texturas e camadas no confessional “Bloom”
Muitas vezes momentos críticos podem servir como inspiração para transformações e mudanças. E na música não seria diferente. Após quase encerrar suas atividades após o ótimo primeiro disco, Threshold (2015), a banda catarinense Taunting Glaciers teve que se reinventar para seguir em frente.
“….Well I got my head up in a critical mess,
Fighting like a demon in a shell I possess.
Gnashing my teeth and speaking in tongues,
Still shaking something mental at a loss for the words I’d once known.
Something’s rattling my bones…”, Hot Water Music “Drag My Body”, Exister (2012)
Após saber sobre a história, a única música que me veio a cabeça foi “Drag My Body” do Hot Water Music. Não pela sonoridade ser a mesma que a dos brasileiros mas por todo esse sentimento de estar prestes a desistir de tudo mas ao mesmo tempo ter o poder de encontrar uma luz no fim do túnel.
“Foi uma mudança de paradigma bem grande na minha vida. De encarar a banda como um trabalho e ao mesmo tempo como uma recompensa. Ao longo do processo fui desenvolvendo novos gostos e novas formas de pensar”, conta o vocalista e guitarrista Roberto de Lucena, o “Swan”, que também faz parte da Between Summers e comanda o selo Aquagreen Records
O Choque e a Mudança
A transição sonora e mudança sobre a visão da banda ficaram perceptíveis desde o primeiro single “Hyper“, lançado no fim de julho. Além do post-rock, shoegaze, post-hardcore e referências noventistas, de bandas como The Smashing Pumpkins, o trio adicionou em sua sonoridade elementos do post-punk de grupos como Pere Ubu, Bauhaus e The Cure.
“Antes de escrever esse disco, tínhamos um outro praticamente pronto intitulado Posthaste, e foi um processo extenuante, aliado à vários problemas externos. O disco chegou a ser cancelado e com ele quase a banda. Foi de atingir o ponto mais baixo que veio a resolução de criar algo novo e com outra atitude.
Tirando isso, existe uma mudança sonora perceptível. O disco é mais rápido, mais estruturado – coisa que nunca aconteceu antes, e conta com vocais dos três integrantes”, comenta Swan
Para continuar os preparativos para o disco no dia 25/08 veio o segundo single, “Pale”, que ganhou um videoclipe dirigido por Roberto de Lucena, e tem inspirações em Kim Gordon, do Sonic Youth, como comenta Lola.
“Mais do que musicalmente, a referência se deve ao fato de ser uma música sobre uma mulher criativa, que é mais do que uma ‘menina’ no palco e mesmo assim não sente que está sendo ouvida da forma merecida”, diz Lola
“A letra [de “Pale”] foi escrita pra Lola após várias conversas, mas os vocais eram meus e parecia estranho ouvir essas palavras com a minha voz. Foi nesse ponto do processo que conversamos sobre a Lola e o Tony cantarem e foi uma decisão que deixou todos mais próximos dos temas do disco”, afirma Swan.
Taunting Glaciers – Bloom (14/09/2018)
Assim como no primeiro álbum, o disco está lançado pelo selo paulista Hearts Bleed Blue (HBB). O registro sai tanto em CD como em K7, ou seja, os colecionadores de fitinhas podem ficar tranquilos.
Em sua formação a banda conta com Roberto “Swan” de Lucena (Guitarra / Vocais), Lola Belli (Baixo / Vocais) e Antonio Augusto (Bateria / Vocais). Como podem reparar os três cantam neste disco, uma das mudanças desta nova fase do grupo de Blumenau (SC).
Como referências a banda cita Turnover (a capa de Bloom inclusive me lembra vagamente a arte de Sunshine Type), Smashing Pumpkins (que Lucena em entrevista para o Hits Perdidos já revelou ser sua banda favorita), Citizen e Hundredth.
“O começo de tudo foi bem parecido. Eu tenho o hábito de começar tudo pelas batidas. Disso eu vou pras linhas de baixo e guitarra, passando pelo sintetizadores e só então eu caso as ideias de letras com as músicas. Depois disso, rolaram muitas conversas entre nós 3 e ideias sobre o rumo que iríamos tomar em questão de timbres, mixagem e etc.
Eu e a Lola fizemos nossa parte aqui em Blumenau e depois viajei pra SP pra terminar de gravar as partes do Antonio na casa dele mesmo. Nunca trabalhamos tanto em um lançamento até então.”, conta Swan sobre o processo em entrevista para o Popload
O disco conta com 37 minutos e tem 10 canções. A que abre justamente é o single “Hyper” que traz uma nostalgia eminente em suas guitarras, e fria imersão, já mostrando o encontro do shoegaze e post-punk com as influências de Turnover e Citizen.
Sua letra soa como um desabafo em trechos que clama por liberdade. Particularmente o vocal nesta canção me lembra um pouco o jeito de Mark Hoppus (Blink 182) cantar – e isso a deixa de certa forma mais “pop”.
O choque mais forte se da em “Bloom” que já começa com sintetizadores e uma levada ainda mais intimista. Uma canção que ao mesmo tempo sai da zona de conforto do primeiro álbum em texturas…deixa clara as influências de grupos como Swervedriver, My Bloody Valentine e Slowdive.
Quem é fã de The Smashing Pumpkins ao bater o olho em “Adore” irá remeter ao álbum do grupo que neste ano completou 20 anos. Assim como na obra da banda de Chicago, o emocional fala mais forte e post-rock é notório.
O riff da guitarra com certeza vai ficar ecoando na sua cabeça logo após sua primeira audição. Fãs de Dream Pop terão sua favorita aqui, me agrada muito os últimos 30 segundos que deixam com gostinho de quero mais.
O post-punk mais macabro ganha ares na introdução de “Exciter”, que me remeteu ao clássico “Bela Lugosi’s Dead”, do Bauhaus, mas calma são só os primeiros segundos. Depois o som vai para uma linha entre o post-hardcore e o shoegaze, sendo uma das mais caóticas e reverberantes do registro.
Um fato a se elogiar no disco são as transições entre as músicas que parecem encaixar seu final com o começo da seguinte. “Ouasi” faz um mix interessante entre a bateria dançante, as interferências de sintetizadores, as guitarras viajantes – e delicadas, e seu sentimentalismo à flor da pele.
As referências de bandas mais modernas como Turnover e Citizen voltam a reluzir em “Blush” e o disco chega a sua metade. Chegamos a “Pale” que como já dito anteriormente tem inspirações em Kim Gordon, Sonic Youth, esta em que Lola assume os vocais em uma canção escrita por ela, e traz consigo toda a sinceridade daqueles versos.
“Dancingly” é a mais rápida de Bloom e tem guitarras que me lembram os discos do Dinosaur Jr. e traz consigo melodias dos primeiros álbuns Tigers Jaw. Já “Brava” que o nome me remete a “Super Brava” do Samiam, também tem referências do segunda leva do emo e acredito que agradará a fãs de Basement.
Quem tem a missão de fechar o álbum é “Afterglow”, uma das mais delicadas do registro. A canção que fala sobre se sentir perdido de certa forma busca por redenção – e superação. Suas guitarras, suas subidas e descidas, dão ainda mais o clima dramático que de certa forma sintetiza a caminhada do disco até seu lançamento.
Pontos de quebra são tensos mas sempre possibilitam novos recomeços. É deste ponto de vista que devemos observar o nascimento do segundo álbum dos catarinenses do Taunting Glaciers.
Após quase encerrar suas atividades por motivos externos, eles decidiram reinventar sua própria sonoridade trazendo referências de outros estilos e catalizar todo esse sentimento aprisionado em um belo disco que busca de certa forma a redenção. Misturando shoegaze, post-punk, post-rock, emo e post-hardcore, Bloom, consegue ser introspectivo, explosivo, sentimental e carrega uma mensagem de superação.
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