O abominável mundo monstro do Moblins

 O abominável mundo monstro do Moblins

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Talvez depois do lançamento do primeiro disco do Death Grips, nada tenha te deixado tanto “dando TILT” como a banda que apresentaremos hoje.

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Hoje vamos falar de uma banda recém formada, que só agora começa a colher os frutos de suas primeiras composições. Isso devido a um conjunto de clipes surreais lançados no apagar das luzes de 2015. Com uma pluralidade de influências que vão muito além do campo musical, o grupo nasceu para dar uma chacoalhada no cenário musical paulista.

A banda Moblins nasceu por meio do tédio e desespero. De mentes sujas, sem disciplina e irreverentes. De um descaso pelo “aceitável” e “palatável”. Segundo palavras deles mesmos: “Permanecemos juntos porque são poucos os que sabem o quão importante é o som de um tanque de gás quebrado.”

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Moblins em ação.

No meio dessa atmosfera caótica e aparentemente anárquica, eles até que dividem funções – mesmo que não seja o tempo todo, veja bem. Sara Cruz toca percussão, bateria electrônica/samples, teclados e os sintetizadores/osciladores (muitas vezes ao mesmo tempo). Stefano di Pace (Steve) é o compositor, toca guitarra e canta.
Já Viviane Barbosa por sua vez toca baixo, stylofone e canta. Para quem acha que ainda é pouco, ela também é a responsável por construir os sintetizadores/osciladores que a banda usa.

“Na hora de gravar, em estúdio, todo mundo toca tudo.” diz a banda Moblins

Em minha primeira audição consegui captar um mar de referências mesmo não tendo conversado com eles até o momento. De rock industrial, passando pelo rap, com o adendo de cavalgadas alá Heavy Metal, rock alternativo, indie pop, shoegaze e trip-hop: Ufa!.

Em certo momento eu senti uma levada de músicas de video-game (que inclusive foi usada já no hardcore tendo surgido um sub-gênero, autoplocamado: Nintendocore). Uma estranheza que para mim ao menos pareceu bastante curiosa.

Uma curiosidade também está no significado da palavra Moblin. Segundo o Zelda Wiki, os Moblins são os inimigos mais comuns da Saga. Uma espécie monstro, meio humano, meio Bulldog. Segundo a mesma fonte, eles não são as criaturas mais para lá de inteligentes do jogo. No game eles são mais comuns nas florestas e soltam bombas. Porém nem todos Moblins são inimigos: alguns até ajudam Link a conseguir imprescindíveis rúpias ao longo de sua jornada mítica.

Ao ler a descrição da banda, eles ainda citam a influência de compositores clássicos japoneses e como se não fosse já muita bagunça para a cabeça do ouvinte, eles rotulam o som como Dark Pop.

Com uma série de pulgas atrás da orelha, não podia deixar de perguntar para tentar entender – e dirigir o som deles melhor.

[Hits Perdidos] Como nasceu a ideia de misturar tantos estilos?

“A gente não sentou e decidiu misturar tudo, só meio que aconteceu. Não é uma decisão consciente, foi até inevitável pensando bem. As baterias são eletrônicas porque no começo não tinha baterista nem bateria. O baixo é assim porque o Stefano assistiu um documentário sobre heavy metal e se empolgou. Foi como ter um filho, quando ele nasce você quer que ele se forme e tenha um emprego de verdade, dai ele decide que quer ser músico e fudeu. Vai fazer o que?”

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Viviane também é responsável por construir os sintetizadores/osciladores que a banda usa.

[Hits Perdidos] Como definiriam ”Dark Pop’, nas palavras de vocês’?

“Na verdade, a gente meio que inventou isso porque gente nunca sabe o que falar quando as pessoas perguntam “o que vocês tocam?“. A gente fala que é rock progressivo de garagem as vezes também. Na hora de compor, tentamos fazer uma musica pop mas nunca da certo. O que você acaba ouvindo é a gente errando feio. Nos impomos certas regras que o pop tradicional usa mas não temos a disciplina necessária para escrever uma musica pop do começo ao fim. Tem que destruir ela de algum jeito. É a nossa versão pervertida do pop.”

[Hits Perdidos] Qual a mensagem querem passar através das letras? 

“As letras tentam falar da intimidade e do caos e como os dois se relacionam. Cada letra diz uma coisa diferente, mas esses temas persistem e aparecem, querendo ou não.”

[Hits Perdidos] Como foram as gravações? (quem produziu? Onde gravaram?)

“As gravações foram incríveis. A maioria dos demos e rascunhos a gente gravou em casa mesmo. O resto nos gravamos com um produtor, o Joe Moghrabi la na casa dele perto de Mogi Das Cruzes. Ele era professor do Stefano (ou pelo menos ele tentou, o Stefano é um péssimo aluno).

Ele e a mulher dele, a Marina, são as as melhores pessoas do mundo. Eles receberam a gente na casa deles e foram incrivelmente pacientes enquanto a gente passava a tarde la aprendendo a tocar e gravando as músicas (a gente ia uma vez por semana). O Joe também mixou as músicas e a Marina tenta nos ensinar como administrar uma banda como gente grande. Não existiria Moblins sem eles. Ou até existiria, mas seria uma bosta.”

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Os instrumentos da Moblins são um show a parte.

[Hits Perdidos] Mesmo a banda existindo a pouco tempo, já possuem dois clipes. Falem um pouco sobre eles: Estética, conceito e inspirações…. 

“Quando nos lançamos as músicas, mostramos para um amigo do Stefano, o Luis Otavio, que faz parte do coletivo Hausu Yume la no Rio. A ideia era fazer um clipe com trechos deles, queríamos imagens de todo mundo se preparando pra sair, tipo botando maquiagem e escolhendo as roupas, esse tipo de coisa. Mas dai deu uma puta sorte por que eles tinham um amigo ficando la com eles, o Jetmir Idrizi que por acaso é um fotografo maravilhoso. Ele ofereceu filmar tudo e mandar as imagens pra gente fazer o clipe. Mas dai ele acabou indo pra festa também com todo mundo e filmou la também! Quando a gente recebeu tudo, o Stefano se empolgou e a gente acabou fazendo os 2 clipes no iMovie.”

Vamos ao faixa a faixa com direito a comentários da banda, clipes e análise pitoresca deste mero editor:

[youtube https://www.youtube.com/watch?v=0T8h7b12oVA]

A faixa: Fica até difícil ser breve ao falar sobre a  primeira faixa “Ghosthouse”. Ela tem um teclado new waver, um beat na linha do Rock industrial do Nine Inch Nails, uma atmosfera de hip-hop experimental – alá Death Grips – e diversos samples. Tudo isso claro somado a um vocal que sussura no pé do seu ouvido.

O processo de composição e seus significados:

“A primeira coisa que o Stefano e a Viviane fizeram juntos, quando a banda nem era banda ainda, foi gravar os gritos e ruídos “de fantasma” que aparecem na musica. A base ou esqueleto inicial da música era uma faixa instrumental de hip hop que o Stefano fez pra um amigo mas nunca usou. Depois disso a gente num sabe direito o que aconteceu, tem batida la dentro que a gente roubou da trilha sonora do Zelda. A letra fala de amizade e isolamento.” conta a Moblins

O clipe: Como eles contaram logo acima, o clipe nasceu da parceria com o coletivo Hausu Yume e é o resultado de gravações feitas durante uma festa do coletivo.

Com visual carregado, repleto de adereços, maquiagens e muita transgressão na parte teatral, o coletivo passa sua arte através de suas manifestações artísticas para lá de outro mundo. Através do universo imaginativo dos Animes, mangás e artifícios da cultura pop japonesa.

O que combina perfeitamente com a sensação de estranheza que a banda parece querer transmitir através de suas canções. Ainda mais com esse tema central sobre amizade e isolamento. A relação de intimidade, transmissão de pensamentos e fuga da realidade.

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Ao ouvir “Berços” mudamos 100% as referências que sentimos ao ouvir. A canção que se inicia como uma canção de ninar macabra com a voz doce – ao mesmo tempo aterrorizante – de Björk com samples alá a trilha sonora da cidade de Lavander no jogo para game boy, Pokémon (Red, Blue, Green e Yellow).

Conforme ela cresce entram os vocais graves de Stefano e o som fica mais pesado com o adendo do baixo com linhas com pegada Heavy Metal: o que provoca ainda mais o ambiente disruptivo. Logo em seguida entra a guitarra numa levada post-rock ao mesmo tempo que se choca com aquela pegada shoegaze/lo-fi do The Horrors.

Os beats de trip-hop se acentuam e os osciladores ganham o centro da música. Se vocês ouviram já o clássico OK Computer do Radiohead, entenderão um pouco da atmosfera caótica e matemática da canção. É como se a canção fosse formada por uma porção de clímax contrastando com anti-clímax.

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[Hits Perdidos] Já ”berços” senti uma vibe Bjork ao mesmo tempo que Radiohead, seriam influências?

“Sim!! A Gente ama a Björk! Essa musica foi pra Vivi cantar, e ela fez a letra também. O Stefano tocava essa musica no violão e nos montamos a música em volta disso. No verso ficou uma coisa parecida com os trabalhos acústicos do Omar Rodrigues Lopez mas no refrão ficou uma coisa um pouco mais White Stripes. Só que a nossa parte favorita da música é o stylophone. Foi um presente que o Stefano deu pra Viviane.”

[youtube https://www.youtube.com/watch?v=sUGSOI-adtk]

“Mud & Flame” já começa com a bateria eletrônica e o baixo ditando o ritmo da batida, o stylophone entra para dar mais uma camada substâncial a faixa. Os riffs de guitarra dão o caos que a faixa parece estar buscando. O vocal tem uma levada R&B mais para o lado do hip-hop freestyle. A voz dele nessa faixa em sí ainda me lembra como se Matt Bellamy (Muse) estivesse se jogando nessa experiência transcendental.

[Hits Perdidos] Pude sentir um pouco do som do trip-hop na faixa ”Mud & Flame” e vocais alá Muse. Me lembrando um pouco o som do Chromatics, que esteve por aqui no ano de 2013 em uma festa da Ray Ban. O que vocês costumam escutar para se inspirar? 

Um dos discos favoritos do Stefano é o Brand New Second Hand do Roots Manuva e essa musica nasceu dessa paixão. É tipo um filho bastardo desse CD. Também foi a primeira vez que ele se sentiu 100% a vontade com o som da própria voz pra cantar. Ta, 95% vai. Por isso que ele canta baixinho daquele jeito.

A gente ta sempre escutando alguma coisa, trocando CDs e bandas e referencias. Essa e uma das partes mais legais de ter uma banda. Um truque que a gente usa quando a gente fica encalhado ou quando uma musica não vai pra frente, é escutar alguma coisa que não tem nada a ver com o que a gente ta tentando fazer. Tipo, se a gente ta indo gravar uma balada acústica, a gente bota Motörhead pra tocar. Ajuda a dar uma desencanada e uma desentupida na cabeça.”

 

O clipe: Inicialmente os clipes de “Mud & Flame” e “Ghosthouse” eram unificados através de um curta produzido pelo coletivo Hausu Yume mas como isso tinha confundido a cabeça dos fãs, eles resolveram destrinchar em dois vídeos. Neste vídeo para “Mud & Flame” consiste na ideia inicial do clipe, que como dito anteriormente, era de mostrar o coletivo se aprontando e aquecendo para as festas: colocando maquiagens, adereços e fantasias.

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“Маша” é a canção mais caótica e apocalíptica do grupo. A sensação que ela transmite é a de que o mundo está desabando e tudo que conseguimos ver são fragmentos de concreto se despedaçando. Poderia claramente ser trilha sonora dos mini comerciais de motorola dos anos 90 ou entrar na trilha de um filme numa curta cena de ação.

No campo das influências parece ter um pouco de punk, um pouco de pós-punk e eletro-bits de games. Claramente muita informação para pouco mais de um minuto de música, o que te deixa certamente transtornado.

[Hits Perdidos] ”Maшa”  tem uma levada perturbada que combina metal com teclados e sintetizadores. Ao mesmo tempo que tem pouco mais de um minuto a torna meio que punk. Fatos que fazem dela ótima como uma trilha de comercial (como vocês mesmo brincam na descrição da banda). Ela por acaso nos shows tem uma versão um pouco mais extendida? Aliás como tem funcionado os shows? Como é a dinâmica no palco?

“Маша” com o “ш” do alfabeto russo é um apelido para Mariya. A versão final dessa música ficou parecendo um pouco The Birthday Party só que começou mais “comportada” tipo The Seeds. Um dia a Vivi mostrou Le Tigre pro Stefano, ele se empolgou e enfiou um o sintetizador no refrão. Essa música começou quase como uma piada, quando o Stefano tocava com uns amigos dele, a brincadeira era tentar tocar ela em menos de um minuto. Ninguém nunca conseguiu.

Nos shows a gente toca ela junto com um cover, e acaba virando uma jam. Em vez de tocar os teclados do refrão, a Sara toca um dos osciladores que a Vivi construiu (que age quase como um teremin) com uma mão e manda ver com o resto da percussão com a outra e os pés.
Para nós, os shows precisam ter um elemento de risco. Tudo tem mais valor se existe a possibilidade de dar errado. Toda vez que a gente ensaia alguma coisa acaba mudando, mesmo que o show seja no dia seguinte.
Como as músicas foram compostas e gravadas antes da gente tocar ao vivo, a banda teve que quase aprender as próprias musicas, e acabamos interpretando elas de um outro jeito. Arranjos diferentes, timbres trocados, qualquer coisa para fugir do “karaokê”.
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Para o trio quanto maior a chance de dar tudo errado ao vivo: melhor. A catarse vem realmente do caos e as apresentações são totalmente imprevisíveis.

O caos para o Moblins vem como necessidade criativa. A inquietação e a ansiedade parecem ser o combustível para o cataclisma sonoro que eles produzem. A naturalidade de um raciocínio não-linear de criação apesar de tudo tem muita coerência pois o lado auto-destruitivo está presente em todos os momentos da arte: da composição a apresentação.

Apesar deles brincarem rotulando de Dark Pop, deveríamos tentar rotular menos e sim tentar absorver tudo que eles tem a nos ensinar. Afinal de contas: no campo da criatividade não existem limites ou barreiras. No trabalho do grupo camada a camada são importantes, o conceito global de tudo é bastante detalhista, na estética, passando pela atmosfera dark e tendo como produto final: um mar de devaneios e uma explosão de catarses. Altamente recomendável para fãs de Explosions In The Sky. E agora nos resta observar os caminhos que o trio vai trilhar através das próximas produções.

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